Pronunciamento de Heráclito Fortes em 24/11/2006
Discurso durante a 193ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Escândalos recentes da política nacional. Declarações do Presidente Lula quanto à atuação da Oposição. Questionamentos envolvendo dados relacionados ao programa bolsa-família. Atuação das ONGs. Crise do setor aéreo.
- Autor
- Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
- Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- Escândalos recentes da política nacional. Declarações do Presidente Lula quanto à atuação da Oposição. Questionamentos envolvendo dados relacionados ao programa bolsa-família. Atuação das ONGs. Crise do setor aéreo.
- Publicação
- Publicação no DSF de 25/11/2006 - Página 35482
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
-
- QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, GOVERNO, AGRAVAÇÃO, CORRUPÇÃO, IMPEDIMENTO, ABERTURA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, EX SENADOR, PRESIDENTE DA REPUBLICA, FAVORECIMENTO, IMPUNIDADE.
- CRITICA, RESULTADO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), BANCO DO ESTADO DO PARANA S/A (BANESTADO), FALTA, CRITERIOS, INVESTIGAÇÃO, SUSPEITO, OMISSÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).
- RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, INICIATIVA, ALBERTO SILVA, SENADOR, PESQUISA, ALTERNATIVA, COMBUSTIVEL, PETROLEO, POSSIBILIDADE, CRISE, SETOR, ADVERTENCIA, RISCOS, INSTALAÇÃO, USINA, ESTADO DO PIAUI (PI), UTILIZAÇÃO, MAMONA, PRODUÇÃO, Biodiesel.
- CRITICA, FALTA, ATENÇÃO, GOVERNO, RISCOS, INSTALAÇÃO, USINA, Biodiesel, ESTADO DO PIAUI (PI), INSUCESSO, PROJETO, AGRAVAÇÃO, SITUAÇÃO, FRUSTRAÇÃO, TRABALHADOR.
- CRITICA, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, CONCESSÃO, BENEFICIO, AUSENCIA, EXIGENCIA, CUMPRIMENTO, DEVERES.
- COMENTARIO, OPOSIÇÃO, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, GOVERNO, ESPECIFICAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG).
O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - O tempo, hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passou a ser o tema principal das minhas falas. Eu digo isso porque, com gestos desesperados, os funcionários e jornalistas invocam o inimigo tempo, pedindo que eu seja breve, porque querem aproveitar o restante da sexta-feira. Fiquem certos de que serei sucinto o suficiente para não cansá-los, mas saberei usar o tempo, contanto que não me cale.
Sr. Presidente, é preciso que se faça - e penso que isso cabe ao Governo e à Ministra Dilma Rousseff, a quem tenho respeito pela maneira séria com que trata as questões da sua Pasta, as questões do Governo - uma análise do que acontece no Senado da República e na Câmara dos Deputados no dia-a-dia.
Evidentemente, o Governo não pode tomar por base, nas suas decisões, o que diz um Senador da Oposição ou um Deputado da Oposição. Mas tem o dever, pelo menos, de ler, catalogar e guardar. Se o Governo tiver - qualquer um que seja - esse cuidado e ouvir os alertas que lhe fazem os oposicionistas, os governistas e aqueles que não são uma coisa ou outra, são apenas aqueles que se aproveitam do momento, vai chegar à conclusão de que, se não fizesse ouvido de mercador e nem tampouco a vaidade ou a soberba tomasse conta de quem tem o poder de deter a caneta, evitaria fatos graves ou a repetição deles.
Parece, Sr. Presidente, que o que estamos vendo, neste momento, no Governo do Presidente Lula, é a repetição de uma novela ou de um filme que fez sucesso. Isso parece até o pós-almoço dos brasileiros, quando, após o noticioso, a Globo apresenta um seriado chamado Vale a Pena Ver de Novo, em que as pessoas têm a oportunidade de rever, com nostalgia ou não, novelas ou seriados da sua preferência.
O que acontece hoje e estarrece o País, envolvendo um Deputado de Minas, não é novidade. O que acontece hoje, envolvendo escândalos e o Partido dos Trabalhadores - que quando oposicionista foi tão crítico com relação ao comportamento alheio -, mostra ou soberba ou, então, a determinação consciente de que se deve administrar este País não pelos caminhos da clareza, mas pelas linhas tortuosas dos atos pouco claros e da prática constante de jogar os fatos por baixo do tapete em vez de apurá-los.
O episódio inaugural de todo esse seriado triste ocorreu quatro anos atrás ou pouco menos, no caso chamado Waldomiro Diniz. Digo isso com a autoridade de quem se sente culpado, porque, dando um crédito de confiança a um Governo que se iniciava, achei por bem não assinar aquela CPI. Talvez esse tenha sido, durante este mandato, o meu grande erro - não digo único, porque não tenho soberba e sei que às vezes erramos no dia-a-dia, e os erros não têm a repercussão que lhe permita notar que praticou o ato. Dos erros que percebi haver cometido, penso que esse tenha sido único, e foi grave - menos para mim e mais para o Governo, que trabalhou muito para que aquela CPI não acontecesse. Se tivesse ocorrido o oposto, Senador João Batista Motta, ela teria sido pedagógica, teria mostrado providências imediatas do Governo e do Legislativo; o Legislativo apuraria, e o Governo adotaria medidas imediatas diante dos fatos constatados. O que vimos foi que, ao se evitar que aqueles fatos fossem apurados, os que habitavam as cercanias do Palácio ou ele próprio perceberam que havia uma brecha para que se praticassem atos que combatiam num passado recente: a brecha da impunidade. E foi um mau começo.
Logo após, vimos uma seqüência de escândalos envolvendo Governo e Parlamentares que estarreceu a sociedade. O Governo, com a força da comunicação - área que agora quer dominar de maneira legal para diminuir o impacto do envolvimento dos seus -, preferiu dar manchete e focar uma crise num funcionário de terceiro escalão que foi fotografado com três mil reais na mão do que atacar o verdadeiro foco da corrupção, a origem da corrupção, que eram os agentes poderosos de um grupo de pessoas do Governo que se intitulava “núcleo duro do poder” e onde tinha origem tudo o que acontecia.
Digo isso, Senadora Lúcia Vânia, estarrecido que fico quando vejo o Juvenil fazer sucesso no Brasil. O PT, por iniciativa de suas mais importantes lideranças, propôs a CPI do Banestado para cassar os que remetiam recursos para fora, mas não teve a cautela de separar os que faziam isso de maneira legal, baseados na lei, dos que faziam isso de forma clandestina. Começou a perseguir não os exportadores de divisas, mas aqueles que pisaram nos calos e nos calcanhares dos interesses partidários na eleição então recente. Tentou-se destruir reputações, acusar pessoas, jornalistas, empresários, e uma malha de chantagem e de extorsão tomou conta do País.
Fiz parte dessa Comissão. Com tristeza, ouvi depoimentos constrangidos de empresários como o Sr. Murilo Mendes Júnior.
Mineiro, com uma vida inteira dedicada às suas atividades, foi vítima de governos passados ao acreditar em suas supostas intenções e fazer investimentos de peso avalizados pelo Governo no Iraque, hoje tão na moda pela violência que ali reina. Vi suspeitarem de um homem. Senador João Batista, o meu constrangimento foi tão grande ao ver naquela situação esse homem de cabeça branca e uma história toda de vida, que sugeri que seu depoimento fosse feito a portas fechadas, mas ele, altaneiro, dispensou a oferta e disse: “Quero que seja feito de portas abertas, porque não tenho nada a esconder”.
Vi também ser trazido aqui para ser submetido a constrangimento um dos homens públicos mais sérios do País, o ex-Governador do Paraná Jayme Canet, que foi submetido a tortura moral por parte de pessoas que tinham contas a acertar de caráter político e que se aproveitaram do mecanismo das CPIs mal conduzidas para conseguir, de maneira torpe, sua vingança.
Vieram aqui empresários, banqueiros, foi um festival de depoimentos. Só não se sabia, Senador João Batista, que, naquele mesmo instante, crescia no seio do Partido dos Trabalhadores um militante que se estruturava para, por meio de uma rede de escritórios espalhados por várias partes do País, especializar-se exatamente na remessa de recursos para o exterior.
Como somos cegos!
Santa Catarina, que foi tão fiscalizada, impiedosamente vista e revirada pela sanha de vingança, não alcançou e não enxergou que, nas suas barbas, o Sr. Juvenil montava um escritório, não sei eu com que objetivo. No momento em que investigávamos, eles, evidentemente se aproveitando dos exemplos, aperfeiçoavam as suas atividades.
E o que vemos hoje? O Deputado mais votado de Minas Gerais, 120 mil votos, foi denunciado e acusado. Quero dizer, de público, que não o conheço, não tenho juízo de valor para fazer dele, não sei de suas atividades, se são legais ou não, mas é inaceitável e inadmissível que o PT silencie sobre um fato dessa natureza. Ontem, até às 16h, nenhuma manifestação nesta Casa sobre o fato, nem de apoio nem de condenação.
Foi preciso que eu, num aparte provocante sim, mas provocante porque a Oposição tem de provocar, mencionasse o assunto.
O Presidente da República pode dizer que só quer que se lhe oponham em 2010, mas nós não podemos aceitar isso. O discurso do Senador Cristovam foi muito a propósito. Cabe ao Presidente querer conforto e conforto terá desde que dê ao Brasil os caminhos do crescimento e da moralidade administrativa, mas terá tormentas quando o seu Governo se desviar desse rumo. É a regra da vida, e foi assim que seus companheiros se comportaram na Oposição. Aí do País no qual as partes não entendam a sua missão, porque esse é o caminho mais próximo e ligeiro para uma ditadura.
Aliás, sobre ditaduras, quero pedir perdão publicamente ao povo da Colômbia. Já fui cobrado sobre isso e quero me redimir aqui. Troquei o nome do Presidente da Colômbia e aqui equivocadamente o chamei de Evo Morales. O povo da Colômbia vive um outro regime, uma outra perspectiva e eu não sairia daqui tranqüilo, após ter sido alertado para o erro cometido, se não fizesse essa correção.
Sr. Presidente, o Presidente Lula precisa, se verdadeira for a sua intenção, ouvir melhor não seus adversários, mas os seus aliados. Digo isso num dever de justiça.
Quando se começou a falar aqui, no Governo atual, sobre o biodiesel, a propaganda forte e poderosa passou ao País a falsa impressão de que tudo estava começando naquele instante. Cometeu-se uma grave injustiça contra um homem com assento nesta Casa, Conselheiro da República, Senador de meu Estado, Alberto Silva, que, desde a década de 70, pesquisava alternativas para o combustível tradicional oriundo do petróleo, por ter a previsão e o senso, produto da sua longa experiência, de que uma grave crise no setor viria.
Colocou recursos para a Universidade do Ceará, para um professor citado em prosa e verso durante a propaganda eleitoral, o engenheiro cearense Expedito - lembrei o segundo nome dele e o remeterei à Taquigrafia, para não cometer injustiça, pois é um grande brasileiro. Falo de Expedito Parente. Esqueceu-se o Presidente da República de dizer que, por trás do Expedito, a lhe dar respaldo para conseguir fazer suas pesquisas, estava exatamente o engenheiro Alberto Silva, Senador da República. Mas Governo errar é difícil.
Hoje, talvez, quando os fatos ocorrem, eu já saiba por que o engenheiro Alberto Silva não foi citado pelo Presidente nem pela sua assessoria na propaganda eleitoral.
Anunciou-se no Piauí uma usina gigantesca de biodiesel, cuja matéria-prima seria a mamona. Alberto Silva, desta tribuna, alertou para os riscos, fez cálculos, com a capacidade que tem e com a agilidade mental de somar, dividir, multiplicar de cabeça, entre o preço de venda e o custo, que impressionaram os presentes. Ele mostrou que esse projeto não poderia se vincular apenas a uma fonte alternativa, porque não poderia correr riscos de fracasso.
Desce no Estado do Piauí, de pára-quedas, um empresário de São Paulo que também não conheço, não sei do seu passado, mas respaldado pelo Governo Federal, com a presença do Presidente da República, ali instala a empresa, sendo merecedor de discurso do Governador, do Presidente da República, e recebe as loas de tantos quantos presentes àquele ato.
Alberto Silva, persistentemente, voltou a alertar aqui, por algumas vezes, o risco da fonte que se estava usando. O Piauí, rico em solo, teria milhares e milhares de alternativas.
Aquela usina, inaugurada com tanta pompa, motivo da propaganda eleitoral, não foi usada no Estado nem Governo Federal. Estranhei, mas confesso que, na maioria das vezes, além de inocente, tenho boa-fé.
O Governo, na sua capacidade de colocar fatos debaixo do tapete, conseguiu omitir inclusive uma reunião ocorrida em Brasília, em setembro, na qual o Sr. Stédile alertava seus colegas de PT e da Base do Governo para o desastre daquele empreendimento no meu sofrido e penalizado Estado.
Esperaram passar a eleição, e agora o desastre está anunciado, o projeto está fracassado.
E os jornais estampam que a CVM toma providências porque o empresário, por motivos que desconheço, mas por erros cometidos no passado, estava, inclusive, proibido de atuar no mercado aberto. Os sócios, os que se envolveram e acreditaram no projeto, pedem na Justiça providências para o logro em que entraram. O Piauí passa pela falta de perspectiva de continuar o atual projeto, com a frustração dos trabalhadores que moravam na região e dos que para lá se deslocaram. Se não estão passando fome, é porque estão recebendo o Bolsa-Família. Para esses, creio até que o Bolsa-Família chegou em boa hora. Até porque a diferença no Programa Bolsa-Família do governo passado, que tanto combateram, era uma só: no Governo Fernando Henrique, era um programa de inclusão social em que havia a obrigatoriedade da contrapartida; o beneficiado tinha deveres e não só direitos. Agora, transformou-se em um programa de dependência social, em que o cidadão fica na dependência de receber a sua fatia no final do mês.
Senador João Batista Motta, chamou-me a atenção esta semana um fato que me deixou estarrecido. No Estado do Piauí, segundo prestação de contas do Governo, há 1,5 milhão de beneficiados do Bolsa-Família, em uma população de menos de 4 milhões de habitantes. Creio que - e o caminho não poderá ser outro - seremos obrigados a solicitar uma auditagem nacional para que não haja com o Bolsa-Família o que já está se vendo no Brasil inteiro com relação às ONGs.
Mas estou fazendo este pronunciamento não só em homenagem a esse homem público que nos deixa ao final deste mandato e assume uma cadeira na Câmara dos Deputados, uma vez que, por decisão própria, desistiu de concorrer ao Senado e continuará defendendo suas teses e convicções naquela Casa. Com certeza, por mais boa vontade e otimismo que tenha com o Governo, não se calará e irá alertar, com os conhecimentos técnicos que tem, sobre erros dessa natureza.
Se o Governo não fizesse ouvidos moucos para o alerta de seus aliados, talvez não caísse em esparrelas como essa. Imaginem, Srªs e Srs. Senadores, se o Governo desse ouvidos para os que o alertam todo dia contra os que malversam o dinheiro público, contra os que praticam desvio por meio dos sanguessugas, dos mensalões da vida ou de qualquer outro tipo de corrupção, não teria passado pelo que passou.
O alerta de agora é com relação às ONGs. A intenção da Oposição não é acabar nem punir ONGs, é separá-las como quem separa, no Sul do Brasil, o joio do trigo. E enquanto é tempo, porque, se providências não forem tomadas com urgência, será tarde, porque nós encontraremos somente o joio em um processo social tão bem-intencionado, porque o trigo será sufocado pelos gatunos que assolam o País. Daí por que eu quero pedir à Ministra Dilma Rousseff que reflita, de maneira tranqüila e sensata, sobre dois fatos graves que rondam o Palácio responsável pelos destinos do País: ONGs e crise no setor aéreo, dois fatos de proporções graves, que envolvem recursos públicos e vidas humanas. É preciso que haja decisão, determinação e coragem. Uma vez tomadas essas providências, o Presidente Lula pode ficar tranqüilo que a Oposição não será tão implacável como tem sido até agora. Mas a Oposição não pode, e não deve, dormir tranqüila, até sob o perigo de drama de consciência. Oposição que cala não é Oposição. A Oposição que cala, ou concorda, por comodismo ou porque está no bolso, de maneira inconfessável, de quem malversa o dinheiro público, não quer a contestação; quer apenas o amém. E não é o nosso papel, Sr. Presidente.
Obrigado.