Discurso durante a 194ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A importância da reunião das Cortes Supremas Constitucionais e Tribunais de Recursos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, realizada em 22 de novembro último, convocada pela Ministra Ellen Graccie, Presidente do Supremo Tribunal Federal, para um intercâmbio de informações e também para a proposta de criação de um banco de dados para armazenar jurisprudência de todos os tribunais dos paises de língua portuguesa.

Autor
José Sarney (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AP)
Nome completo: José Sarney
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. JUDICIARIO.:
  • A importância da reunião das Cortes Supremas Constitucionais e Tribunais de Recursos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, realizada em 22 de novembro último, convocada pela Ministra Ellen Graccie, Presidente do Supremo Tribunal Federal, para um intercâmbio de informações e também para a proposta de criação de um banco de dados para armazenar jurisprudência de todos os tribunais dos paises de língua portuguesa.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/2006 - Página 35757
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. JUDICIARIO.
Indexação
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, REUNIÃO, MEMBROS, TRIBUNAIS SUPERIORES, COMUNIDADE, PAIS, LINGUA PORTUGUESA, ESPECIFICAÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ANGOLA, MOÇAMBIQUE, CABO VERDE, GUINE-BISSAU, SÃO TOME E PRINCIPE, TIMOR LESTE, DEBATE, INTERCAMBIO, INFORMAÇÕES, PROPOSTA, CRIAÇÃO, BANCO DE DADOS, ARMAZENAGEM, JURISPRUDENCIA, TRIBUNAIS, CONTRIBUIÇÃO, COOPERAÇÃO ECONOMICA, COOPERAÇÃO SOCIAL, COOPERAÇÃO, NATUREZA POLITICA, NATUREZA JURIDICA, ESTADOS MEMBROS.
  • ELOGIO, HISTORIA, LINGUA PORTUGUESA, REFORÇO, UNIDADE FEDERAL, CONTRIBUIÇÃO, UNIÃO, PAIS ESTRANGEIRO.
  • SOLIDARIEDADE, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), APROVAÇÃO, REMUNERAÇÃO, MEMBROS, CONSELHO NACIONAL, JUSTIÇA.

O SR. JOSÉ SARNEY (PMDB - AP. Para uma comunicação inadiável. Com revisão do orador.) - Agradeço a V. Exª a gentileza.

A comunicação que desejo fazer ao Senado será breve. Peço que conste dos Anais da Casa que, no dia 22 do corrente, a Ministra Ellen Grace convocou uma reunião das Cortes Supremas Constitucionais e Tribunais de Recursos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a CPLP, para um intercâmbio de informações e a proposta de criação de um banco de dados para armazenar jurisprudência de todos os tribunais dos países de Língua Portuguesa.

A CPLP, desde sua constituição, tem dois objetivos fixados: um, justamente, a cooperação de natureza política, econômica, de natureza social; o outro, de natureza jurídica.

Essa cooperação de natureza jurídica está se iniciando nesse momento. A essa reunião compareceram os Ministros Presidentes das Cortes Constitucionais de Angola, o Sr. Ministro Cristiano Augusto André; da Corte Constitucional de Moçambique, Dr. Rui Baltazar dos Santos Alves; Dr. Benfeito Mosso Ramos, do Supremo Tribunal de Justiça de Cabo Verde; a Juíza Maria do Céu Monteiro, do Tribunal de Justiça de Guiné-Bissau; a Drª Maria Alice Rodrigues Vera de Carvalho, de São Tomé e Príncipe; o Dr. Cláudio de Jesus Ximenes, Presidente do Tribunal de Recursos do Timor Leste.

Ainda estiveram presentes a esta reunião os Ministros Carlos Ayres de Brito, o Ministro Levandowsky, o Ministro Gilmar Mendes e o Ministro Joaquim Barbosa.

Eu acredito que esta providência da Ministra Ellen Gracie, que tem presidido o Supremo Tribunal Federal com extraordinária competência, marca a sua presença e eleva bastante aquela Corte, imprimindo sua personalidade em seu trabalho na sua Presidência.

Compareci àquela reunião e achei que era um momento em que podíamos abrir uma nova janela para a cooperação com os países de língua portuguesa.

O País sabe que, em 1989, quando era Presidente da República, procurei, pela primeira vez, instituir uma organização capaz de unir os países de língua portuguesa. Como àquele tempo ainda tínhamos cicatrizes da guerra colonial, foi impossível fazer uma organização de natureza política. Então, valemo-nos do instrumento da língua para realizarmos aquela primeira reunião, em São Luís do Maranhão, denominando-a de fundação para divulgação e, ao mesmo tempo, defesa da língua portuguesa, reunindo todos os povos que falavam o Português. Foi a semente da CPLP - Comunidade de Língua Portuguesa, fundada, depois, em 1996.

Tive a oportunidade de, naquele momento, dizer à Ministra e a todos os presentes que não desejava abordar nenhum assunto de caráter jurídico, eminentemente do domínio daquelas eminentes figuras que participavam do encontro, mas queria ressaltar o quanto era importante a língua sob o ponto de vista político no mundo moderno. A primeira pergunta que fiz foi justamente essa: o que nos reúne aqui, povos de diferentes latitudes e diferentes histórias, senão uma coisa que é a Língua Portuguesa? Portanto, a base daquela reunião, a base que nos fazia a todos presente era realmente a língua. E esse era um comprometimento muito maior que devíamos louvar, porque era nessa língua que nós formulávamos a nossa jurisprudência jurídica, que os poetas sonhavam, que os escritores criavam histórias, romances, ficção, poesia. Ao mesmo tempo, é nessa língua que realmente podemos sonhar juntos e pensar juntos em Português, ao mesmo tempo ressaltando que a Língua Portuguesa é a terceira língua mais falada no mundo.

A Língua Portuguesa é um milagre, porque, como nós sabemos, ela saiu de uma pequena faixa de terra. Ela era quase um dialeto do espanhol, como era o galego. E ela, não tendo terras para ser falada, foi a primeira língua universal, porque foi a língua dos navegantes, a dos conquistadores, a língua que atravessava os mares; ela foi a língua do comércio daquele tempo, em fins do século XV e no século XVI.

A Língua Portuguesa foi esse milagre. Qual é o milagre, então? É de essa pequena língua, saída de um pedaço de terra, expandir-se pelo mundo inteiro. Ela foi falada, então, nos dois lados das Costas da África, e deixou palavras. Ao mesmo tempo recolheu palavras, enriqueceu-se e tornou-se uma língua de cultura, como é hoje.

Para essa aventura da Língua Portuguesa, certamente, tivemos a contribuição do grande poeta que participou dessa aventura dos mares, o poeta Camões, que estabeleceu, quando escreveu Os Lusíadas, as regras que fixaram definitivamente a sintaxe e as regras fundamentais da Língua Portuguesa.

Foi tão importante essa Língua que não foi só falada, mas também transformou-se numa língua que gerou outras línguas como, por exemplo, o creoulo de Cabo Verde, em que 90% das palavras são portuguesas, ou o papiamento de Guiné-Bissau, e outras línguas que geraram línguas locais, faladas popularmente.

Ela atravessou o Estreito de Málaga, foi pela costa da China e chegou a Nagasaki, onde deixou e levou palavras. Basta dizer que cinqüenta e quatro palavras ainda hoje dicionarizadas têm origem de palavras japonesas. Até onde chegou a Língua Portuguesa!

Portanto, essa idéia de se reunir povos de Língua Portuguesa também tem um efeito grandemente político. Recordo-me de que estava com o Presidente José Eduardo dos Santos, Presidente de Angola, há alguns anos, e ele me dizia, logo depois da Guerra da Independência, que ele estava fazendo um esforço muito grande para ver se renascia e fortificava os dialetos locais. Eu tive a oportunidade de dizer-lhe que não perdesse de vista a importância que tinha a língua para a unidade nacional, porque hoje se sabe que língua tem uma grande força política e essa Língua havia determinado a unidade nacional, como no Brasil, onde é quase um dogma que se repete sempre. Essa unidade seria impossível, com essa extensão territorial que tem o Brasil, se não tivéssemos a Língua Portuguesa. Ela aqui chegou, matou os dialetos que aqui existiam e se tornou uma língua geral que dominou todo o nosso País. Por uma ironia da História, ela parou justamente no contraforte dos Andes, onde encontrou uma outra língua, o castelhano, de onde ela tinha saído, na Península Ibérica, depois de ter tido essa grande aventura dos mares. Aqui, no Brasil, ela teve a mesma destinação que teve nos mares. Foi uma língua também de andarilhos, de bandeirantes, de desbravadores. Ela foi levando, foi andando, foi abrindo caminhos, foi abrindo o território onde não tinha mares. Então, de uma língua falada nos mares, transformou-se também numa língua continental. Hoje, 230 milhões de pessoas no mundo inteiro falam o português, uma pequena língua, de um pequeno espaço de território onde era Portugal, que se transformou numa língua universal.

Portanto, essa reunião feita pela Ministra Ellen Gracie é mais uma maneira de demonstrarmos a força da união causada pela língua. Se, por exemplo, temos hoje Timor Leste, que ressuscitou, marchou para a independência exclusivamente porque se falava português, pois nem os anos de dominação da Indonésia foram capazes de esmagar o idioma português falado em Timor Leste. Foi ele, o idioma, que fez com que nos uníssemos, todos os países de Língua Portuguesa, e levássemos às Nações Unidas, ressuscitássemos uma questão que já era quase morta pela Guerra Fria e déssemos ao Timor Leste a possibilidade de se tornar um país independente. Esteve presente a essa reunião a Presidente da Corte Suprema do Timor Leste.

Assim, Sr. Presidente, eu queria ressaltar a importância desse gesto da Ministra Ellen Gracie e, ao mesmo tempo, dizer, neste momento em que a Ministra Ellen Gracie está sendo de certo modo injustiçada, que ela tem a nossa solidariedade. Como Presidente do Conselho Nacional de Justiça, a Ministra resolveu estabelecer dois jetons mensais, que serão dados àqueles que comparecerem às sessões. Trata-se de remuneração de natureza indenizatória. Ela está indenizando aqueles que têm de viajar e hospedar-se aqui. De nenhuma maneira os jetons podem ser considerados um aumento de vencimento. Portanto, ela está sendo injustiçada.

Uma mulher que se comporta como ela tem se comportado, e é uma expressão jurídica de projeção no mundo inteiro, tem a nossa solidariedade como Presidente do Conselho Nacional de Justiça, em que tem deixado a marca da força da sua personalidade, do seu talento e da sua inteligência.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/2006 - Página 35757