Discurso durante a 196ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários aos artigos: "O avanço do terrorismo", do professor Ives Gandra da Silva Martins; e "A Renda Básica na previsão de Keynes", de Antonio Maria da Silveira.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.:
  • Comentários aos artigos: "O avanço do terrorismo", do professor Ives Gandra da Silva Martins; e "A Renda Básica na previsão de Keynes", de Antonio Maria da Silveira.
Publicação
Publicação no DSF de 30/11/2006 - Página 36256
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, ADVOGADO, PROFESSOR, QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), INVASÃO, PAIS, ORIENTE MEDIO, AUMENTO, TERRORISMO, MUNDO.
  • COMENTARIO, LIVRO, AUTORIA, ORADOR, ADVERTENCIA, NOCIVIDADE, EFEITO, ABUSO DE PODER, PAIS, PRIMEIRO MUNDO, OBJETIVO, SUBORDINAÇÃO, PAIS SUBDESENVOLVIDO, NECESSIDADE, DIALOGO, SOLUÇÃO, CONFLITO, OBTENÇÃO, PAZ.
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, ANALISE, PROGRAMA, RENDA MINIMA, CONTEXTO, CONCEITO, JOHN MAYNARD KEYNES, ECONOMISTA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PREVISÃO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, FUTURO.
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, HOMENAGEM POSTUMA, ECONOMISTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INICIATIVA, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, CURSO DE POS-GRADUAÇÃO, ECONOMIA.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Eduardo Azeredo, Srªs e Srs. Senadores, na semana passada, no dia 15 de novembro, quarta-feira, o Dr. Ives Gandra da Silva Martins, advogado tributarista, professor emérito da Universidade Mackenzie, da FMU, da Escola do Comando do Estado Maior do Exército e Presidente da Academia Paulista de Letras, do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária, publicou um artigo na Folha de S.Paulo intitulado “O avanço do terrorismo”.

Há pouco liguei para o Dr. Ives Gandra da Silva Martins, que conheço há, talvez, 35 anos, desde a minha adolescência. Sempre mantive com ele um diálogo muito construtivo e respeitoso. Muitas vezes, convergimos com propósitos, idéias; outras vezes, diferimos. Quero aqui registrar que considerei muito importante esse artigo e estou de pleno acordo com o mesmo. Por essa razão, resolvi lê-lo e comentá-lo porque guarda muita relação com pronunciamentos que fiz aqui em dezembro de 2002, quando procurei mostrar ao Governo dos Estados Unidos que seria muito inadequado utilizar-se do poder bélico para derrubar o Governo do Presidente Sadam Hussein.

Em artigo publicado nesta Folha, em 9/4/2003 ("O terrorismo oficial de Bush", pág. A3), manifestei entendimento no sentido de que a ação desmesurada, desnecessária e desinformada de Bush no Iraque abria campo para reações cuja magnitude era impossível vislumbrar, mas que poderiam redundar no incentivo ao terrorismo.

Passados três anos, tal invasão, criticada pela comunidade internacional, encetada como contraponto à tragédia das torres gêmeas, conseguiu destruir um país organizado, prender e condenar um ditador idoso em fim de "carreira", incrementar o terrorismo, acelerar a corrida nuclear e tornar o terror a arma das nações fracas contra as fortes, que se arvoram em senhoras da paz e da guerra.

O caos no Iraque e no Afeganistão, o morticínio diário nos dois países, inclusive de americanos, o fortalecimento nuclear de duas outras nações que se consideraram ameaçadas por Bush por terem sido denunciadas como participantes do "eixo do mal" (Irã e Coréia do Norte), assim como as dificuldades crescentes de Israel em conviver com seus vizinhos islâmicos, com aumento de incursões, destruições e mortes de inocentes, demonstram que as técnicas de luta contra o terrorismo que utilizam a força, e não a inteligência, a violência, e não o diálogo, são como lançar gasolina na fogueira quando se quer apagá-la, na crença de que, por ser líquido o combustível, o fogo desapareceria.

Bush não percebe, apesar da imensa rejeição até do povo americano (no mundo inteiro, americanos, ingleses e canadenses, enfim, a maioria da população lamenta a continuação da guerra no Iraque), que fracassou. 

Repito: fracassou em transformar o Iraque numa democracia, tendo destruído, em contrapartida, Bagdá, a mais bela cidade oriental antes da invasão, após aniquilar o frágil regime de Saddam, em duas ou três semanas.

É que o limitado líder americano não percebeu que os povos são diferentes, e as culturas, diversas; e que o terrorismo de "mártires" só pode ser vencido com base no diálogo, por se alimentar da repressão, gerando tanto mais mortes quanto mais forte o poder de fogo das nações poderosas.

Em meu livro, Uma Visão do Mundo Contemporâneo, de 1996, traduzido para o russo e o romeno, previ o aumento do terrorismo caso o combate fosse feito à luz do fogo contra fogo. E que atentados como o das torres americanas poderiam ocorrer - o que, infelizmente, aconteceu. Lamentavelmente, estava certo, e não o presidente Bush e seus assessores, com o que colhe, agora, os resultados da desastrada intervenção promovida por ele e seus aliados, alguns deles já tendo tido o bom senso de se retirar do destruído Iraque.

Muitas vezes, coloco-me o problema: por que, em pleno século XXI, as nações desenvolvidas se arvoram no papel de defender os destinos das nações menos desenvolvidas mediante o controle da utilização da energia nuclear, que não admitem em seu próprio território? Por que a insistência em se colocar a salvo do alcance de tribunais penais internacionais? Por que a aplicação de sanções aos povos emergentes considerados inimigos sempre tanto mais severas quanto mais rebeldes forem as reações de seus líderes?

Não é nunca tarde lembrar que, na Corte Internacional de Haia - cuja vaga brasileira foi perdida pelo governo Lula -, Rui Barbosa defendeu a tese de que a "força do direito" deveria prevalecer sobre o "direito da força".

Em outras palavras, contestava, à época, o direito de qualquer potência, inclusive os Estados Unidos, se outorgar o poder de dizer o que é certo e o que é errado para todo o mundo.

Creio que, se não revertermos essa visão "calicliana" (em referência ao personagem de "Górgias", de Platão) de que "ao mais forte cabe o direito a sua força, e, ao mais fraco, o direito a sua fraqueza", o terrorismo continuará sendo a arma do fraco contra o forte, impondo à humanidade um preço descomunal.

Somente o diálogo, muito diálogo e espírito desarmado podem provocar a reversão desse quadro. Caso contrário, o terrorismo continuará em crescimento, e a humanidade - em pleno século 21 - viverá a insegurança máxima em todos os países e em todos os povos.

Sr. Presidente, Senador Eduardo Azeredo, quero enfatizar essas palavras de Ives Gandra da Silva Martins, que tem tanto a ver com aquilo que, por vezes, ressaltei quando, inclusive no discurso que mencionei, havia dito quão importante seria que o Presidente George Walker Bush estivesse ouvindo melhor as recomendações daquele norte-americano, que, tantas vezes, ele próprio gosta de homenagear, Martin Luther King Junior, que ressaltou que não deveríamos jamais aceitar, quando há situações que exigem transformações urgentes, as recomendações de gradualismo porque, se elas não forem realizadas de pronto, a sociedade acaba vivendo momentos abrasadores. Naquele caso, dizia que a América iria viver um verão abrasador. E que não deveríamos, também, aceitar tomar o cálice do veneno, do ódio, da vingança e da guerra. Deveríamos sempre confrontar a força física com a força da alma.

Isso vale para o que acontece, muitas vezes, em nosso País, em grandes cidades como São Paulo. Falo de situações como as que vivemos no primeiro semestre deste ano, especialmente em maio, quando centenas de mortes ocorreram em função do uso da força, da violência. Muitas vezes com exagero até das forças policiais repressoras.

É muito importante que estejamos sempre seguindo os ensinamentos, os exemplos do diálogo. Quero ressaltar, Sr. Presidente, que ainda hoje, na Turquia, o Papa Bento XVI realiza um diálogo com o mundo islâmico exatamente com o sentido construtivo de promover a paz, o entendimento, o diálogo, transmitindo aos turcos, ao seu Primeiro-Ministro, que a Turquia pode ser vista como a ponte entre o mundo islâmico e o mundo cristão, entre a Europa Ocidental e a Europa Oriental, inclusive a Ásia. Isso porque a Turquia está muito mais próxima da porta da Ásia.

Quero também lembrar as observações de um dos artigos mais brilhantes que Antonio Maria da Silveira, que nos deixou no último dia 21 de novembro, A Renda Básica na previsão de Keynes, quando ele relembrou as previsões de John Maynard Keynes escritas em 1930, em Possibilidades para Nossos Netos, quando ele “predisse que, com a acumulação de capital, os bens e serviços que atendem nossas necessidades absolutas seriam gratuitos. Ao contrário das necessidades relativas, que satisfazem nosso desejo de superioridade, as absolutas são saciáveis ‘no sentido de que preferimos devotar nossas energias adicionais a propósitos não-econômicos’”.

Então, Keynes observou que, desde a sua criação, o homem está próximo a se defrontar com seu problema real e permanente de como usar sua liberdade em relação a preocupações econômicas urgentes e como ocupar seu lazer - para ele, conquistados pela ciência e pelos juros compostos - para viver bem, sábia e agradavelmente.

Nesta ocasião, John Maynard Keynes, aqui lembrado por Antonio Maria da Silveira, lembrou que, se puderem os homens e as mulheres evitar as guerras, as revoluções, o uso da violência; se puderem utilizar melhor o conhecimento da ciência e os cientistas melhor planejar o número de crianças que cada família desejar ter, então, estaremos, até o ano de 2030, em condições de prover a toda e qualquer pessoa o equivalente a uma renda básica como direito à cidadania.

Assim, Sr. Presidente, requeiro sejam transcritos na íntegra tanto o artigo do Dr. Ives Gandra da Silva Martins quanto o do saudoso Antonio Maria da Silveira, “A Renda Básica na previsão de Keynes”.

Quero transmitir, Sr. Presidente, que me senti muito honrado e feliz porque a Anpec - Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia, que anualmente realiza a principal reunião de economistas no Brasil, convidou-me para prestar uma homenagem na próxima terça-feira no Encontro Nacional dos Economistas, que será realizado em Salvador, na Bahia. E é com felicidade, ainda que com tristeza, que estarei ali presente prestando a homenagem ao querido professor Antonio Maria da Silveira, nascido no Estado de V. Exª.

Ele era formado em engenharia pela Universidade Federal de Minas Gerais, onde foi professor. Lecionou também na Universidade Federal do Rio de Janeiro, na Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, no ITA e na Universidade de Uberlândia, na qual ficou por um longo tempo e me convidou para fazer palestras.

Muito obrigado.

 

*********************************************************************************

DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.)

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

*********************************************************************************

Matérias referidas:

“O avanço do terrorismo, Ives Gandra da Silva Martins”;

“A Renda Básica na previsão de Keynes, Antonio Maria da Silveira”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/11/2006 - Página 36256