Discurso durante a 204ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de documento encaminhado à Ministra Dilma Rousseff, por conta de preocupação com relação à questão das concessões de rodovias, e da decisão do Tribunal de Contas da União sobre a matéria.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Registro de documento encaminhado à Ministra Dilma Rousseff, por conta de preocupação com relação à questão das concessões de rodovias, e da decisão do Tribunal de Contas da União sobre a matéria.
Aparteantes
Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 13/12/2006 - Página 38350
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • REGISTRO, REMESSA, DOCUMENTO, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, QUESTIONAMENTO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), LICITAÇÃO, ABERTURA, PEDAGIO, RODOVIA, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC), AUSENCIA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, INICIATIVA PRIVADA, MELHORIA, TRECHO, ACESSO RODOVIARIO.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, solicitei minha inscrição no dia de hoje para dar ciência de um documento que encaminhei à Ministra Dilma Rousseff na manhã desta terça-feira, por conta de uma preocupação e de um debate sobre as concessões de rodovias, que acompanhamos no último período.

Temos uma deliberação do Tribunal de Contas da União, que vem, há um bom tempo, fazendo a avaliação dos editais de licitação para abertura das concessões rodoviárias no Brasil. São sete lotes de concessões rodoviárias que estão em tramitação. O Tribunal de Contas da União já avalia isso há um bom tempo, pois o edital é de 1997, arrastando-se, portanto, há nada mais, nada menos do que nove anos.

Há poucas semanas, o Tribunal de Contas da União, depois de uma série de mudanças no edital, de acertos, de repactuação, inclusive nos valores aceitáveis de pedágio, chegando a valores que oscilam na faixa de R$3,50 até R$ 5,00, e uma série de modificações em diversas cláusulas do edital, o Tribunal de Contas da União sinalizou no sentido de que as licitações poderiam ter andamento.

Santa Catarina tem uma situação um pouco peculiar, porque o nosso Estado, diferentemente de todos os outros da região Sul e da região Sudeste, não tem nenhum pedágio nas suas rodovias estaduais ou federais.

O fato de não termos nenhum pedágio é fruto de uma série de situações que confluíram ao longo dos últimos anos, que nos permitiram, inclusive com a participação da sociedade civil organizada, por meio da atuação do Parlamento catarinense e de ações judiciais, derrubar, tanto na Justiça quanto no Tribunal de Contas do Estado e no Tribunal de Contas da União, as iniciativas que tinham como objetivo a instalação de pedágios no nosso Estado.

Isso aconteceu na SC-401. Inclusive, eu fui uma das autoras da ação que impediu o funcionamento das cabines, pois lá as cabines de pedágio estão instaladas há vários anos e nunca entraram em funcionamento, tendo em vista que foi vitoriosa a ação judicial que movemos. Depois, o próprio Tribunal de Contas do Estado também invalidou a concessão, porque a licitação acabava sendo lesiva aos interesses públicos já que se tratava de rodovia estadual dentro do perímetro urbano da ilha de Florianópolis. Nesse caso, a cobrança de pedágio traria prejuízos incomensuráveis para a população que reside no norte da ilha e que, no seu deslocamento para o trabalho ou para o estudo, teria que arcar com pedágios diários, o que seria absolutamente insustentável para o orçamento das famílias. Portanto, por conta de uma série de circunstâncias, conseguimos derrubar essa cobrança na Justiça.

Outra situação que vivenciamos aconteceu quando, no período de 1997 e 1998, foram feitas concessões em estradas federais que foram estadualizadas. O Governo do Estado, na época, abriu processos licitatórios em três conjuntos:

a BR-470, a BR-280 e um conjunto de rodovias estaduais em torno do Município de Brusque. Tanto no entorno de Brusque quanto na BR-280, a reação ao processo licitatório reverteu o quadro e o contrato não foi assinado, com exceção da BR-470, em que houve a assinatura de concessão, objeto de ações judiciais junto ao Tribunal de Contas da União. Terminamos de resolver essa situação, que começou em 1998, no início deste ano, quando o Tribunal de Contas da União anulou, definitivamente, o contrato de concessão da BR-470.

Portanto, Santa Catarina tem uma tradição de articulação com a sociedade e com lideranças com relação a pedágios. É claro que se amadureceu ao longo desse tempo e temos a clareza de que, em determinadas situações, é necessário, sim, até pela falta de condição dos cofres federal e estadual de arcar com obras necessárias para o desenvolvimento de infra-estrutura no Brasil e no Estado de Santa Catarina. Assim, não havendo outra alternativa, trabalhar-se-ia em uma parceria público-privada e numa perspectiva de, realizada a obra, podermos cobrar o pedágio.

Contudo, houve uma reação, e esse foi o principal motivo que me levou a encaminhar à Ministra Dilma Rousseff, depois de longas conversas, um documento ao qual anexei todos os estudos que o próprio DNIT de Santa Catarina fez ao longo desses quatro anos de investimentos realizados nas estradas federais em nosso Estado. Esse documento foi produzido pela Federação dos Transportadores de Cargas do Estado de Santa Catarina - Fetrancesc, e também houve manifestação da Assembléia Legislativa e de várias Câmaras de Vereadores.

No documento em que encaminho todos esses estudos à Ministra Dilma Rousseff, exponho uma posição, Senadora Serys Slhessarenko, absolutamente defensável. Precisaremos, em determinadas situações, executar processos de concessão com cobrança de pedágio. Parece-nos, porém, nessa avaliação que comungamos com inúmeras outras entidades, que não é justo “concessionar” e estabelecer pedágios onde a obra está concluída, pronta, restaurada e duplicada e a iniciativa privada não investiu nenhum tostão. No mínimo, não é justo.

O trecho norte da BR-101 foi duplicado. Ao longo desses quatro anos, houve investimentos em restauração, sinalização, manutenção e obras complementares. Foram investidos nada mais nada menos que R$58 milhões, entre o executado e o que está em execução ainda para o orçamento deste ano. Agora, vamos colocar quatro praças de pedágio em uma obra que já está duplicada, concluída, restaurada, mantida e sinalizada? É uma rodovia que tem, em um dia manso, um dia calmo, um fluxo de 20 mil veículos.

A BR-116, que também contou com manutenção, restauração e sinalização, recebeu quase R$12 milhões de investimentos ao longo desses quatro anos. Portanto, colocar pedágio nessa rodovia é algo contraditório e incoerente. Existem outras obras absolutamente necessárias e prementes em Santa Catarina, como é o caso da duplicação da BR-280 e da BR-470 e do término da BR-282. A sociedade catarinense está aberta à discussão de concessões nessas rodovias, em que a iniciativa privada entraria com recursos, e, obviamente, por entrar com recursos, teria condições de cobrar pedágio. Mas fazer isso onde já está pronto, e foi financiado, mantido, executado, restaurado e sinalizado exclusivamente com recursos sofridos? Não foi fácil, ao longo desse período, alocar recursos e executar as obras. Santa Catarina teve aproximadamente R$600 milhões aplicados em rodovias federais. E, agora, sem a entrada de nenhum tostão da iniciativa privada, vamos entregar o filé mignon - exatamente a BR-101 e a BR-116 - à iniciativa privada para que cobre pedágio?

Ouço, com muito prazer, a Senadora Serys Slhessarenko.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senadora Ideli Salvatti, V. Exª está 100% correta. Eu sempre me debati, ao longo dos tempos, contra essa “estória” - porque se trata de uma “estória” - em que os Governos consertam as estradas, deixando-as nas mais perfeitas condições, e, depois, entregam à iniciativa privada o filé, como V. Exª disse muito bem, para que a iniciativa privada fique somente com o lucro - o lucro, mais o lucro, mais o lucro. Na hora de consertar, é dinheiro público; na hora de ganhar, é para os cofres privados, o que está totalmente equivocado. V. Exª está totalmente correta. Entregar as que estão em grande situação de dificuldade para que a iniciativa privada restaure, aí sim, existe a possibilidade de fazer a concessão. Fiz este aparte para dizer que é o que sempre defendi e vou continuar defendendo. V. Exª está coberta de razão. O caminho é não entregar à iniciativa privada o que foi feito com dinheiro público, mas, havendo necessidade de restauração e de muito recurso, nesse caso é possível fazer os tais contratos de concessão.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço, Senadora Serys Slhessarenko.

Inicio o documento que encaminho à Ministra Dilma Rousseff fazendo a pergunta: por que entregar à iniciativa privada e fazer a concessão com cobrança de pedágio em obra já realizada? Por que fazer concessão tão-somente para a manutenção?

E termino o documento colocando a convicção que tenho de que a concessão e sua remuneração são legítimas - nada contra, são legítimas, fazem parte do processo que estamos debatendo - quando significam beneficiar, agilizar e, principalmente, ampliar os serviços prestados à população. Efetivar concessões após o financiamento integral com recursos públicos não me parece coerente, nem adequado a um governo que, no primeiro mandato, com todo o esforço, investiu de forma significativa em infra-estrutura, sem a implantação de uma única praça de pedágio, além das que herdamos dos governos que nos antecederam.

Deixo aqui o registro do documento e da minha posição, e espero que, quando o Tribunal de Contas da União der o start para as concessões, depois de nove anos de tratativas, de ajustes e de mudanças, que o Presidente leve em consideração essas ponderações legítimas que fiz em nome do interesse não apenas do Brasil, mas da comunidade que represento, que é a comunidade catarinense, aqui, no Senado da República.

Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/12/2006 - Página 38350