Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Requerimento de aplauso ao Sr. Joaquim Pereira, por ação corajosa ao salvar o neto de ataque de uma sucuri. Críticas ao ex-Embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdenur, por entrevista concedida à Revista Veja, a respeito de promoções na carreira diplomática. (como Líder)

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. HOMENAGEM.:
  • Requerimento de aplauso ao Sr. Joaquim Pereira, por ação corajosa ao salvar o neto de ataque de uma sucuri. Críticas ao ex-Embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdenur, por entrevista concedida à Revista Veja, a respeito de promoções na carreira diplomática. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 09/02/2007 - Página 1371
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, EMBAIXADOR, ACUSAÇÃO, ITAMARATI (MRE), CONTROLE, DOUTRINA, NATUREZA POLITICA, IDEOLOGIA, DIPLOMATA.
  • REGISTRO, DECLARAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), ESCLARECIMENTOS, INEXISTENCIA, TENTATIVA, CONTROLE, OPINIÃO, DIPLOMATA.
  • DETALHAMENTO, ASSUNTO, LIVRO, ITAMARATI (MRE), INDICAÇÃO, LEITURA, DIPLOMATA.
  • HOMENAGEM, CIDADÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), LUTA, ANIMAL, SALVAMENTO, NETO, AMEAÇA, MORTE.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pela Liderança da Maioria. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Valter Pereira, seja muito bem-vindo à Presidência do Senado Federal. Sinto-me honrado por V. Exª estar presidindo a sessão, ao lado do Senador Mão Santa.

Eu gostaria de informar que vou tratar de dois assuntos. Um refere-se à questão do Itamaraty, que foi objeto de grande polêmica, nestes últimos dias, diante da entrevista do Embaixador Roberto Abdenur dada à revista Veja.

Mas também falarei para propor um requerimento de aplausos e congratulações ao Sr. Joaquim Pereira, que, ontem, num episódio de extraordinária coragem, depois de lutar meia hora contra uma sucuri, salvou o seu neto querido de um bote dessa cobra, que tinha cinco metros de comprimento e pesava de 50 a 60 quilos. Trata-se de um exemplo muito significativo e positivo, principalmente se levarmos em conta os fatos negativos que aqui, hoje, foram citados, pois, diante de quase uma tragédia, viu-se algo tão bonito acontecer.

Antes, no entanto, Sr. Presidente, quero aqui registrar o meu respeito e o meu agradecimento ao Embaixador Roberto Abdenur, que, nas diversas ocasiões em que estive em Washington, durante o período em que ele lá exerceu o cargo de Embaixador, recebeu-me com a maior atenção, inclusive na sua residência, e tivemos inúmeros diálogos muito positivos. É uma pessoa por quem tenho muito respeito.

Mas, no que tange ao conteúdo da sua entrevista dada à revista Veja, na qual ele observa que haveria uma situação em que os diplomatas seriam promovidos de acordo com a sua afinidade político-ideológica, e não por competência, quero dizer que concordo com a resposta dada pelo Ministro Celso Amorim de que são muitos os exemplos de pessoas que foram promovidas no Itamaraty, ao longo destes anos, cujas indicações, de maneira alguma, poderiam ser caracterizadas como tendo razões ideológicas, em detrimento dos valores que poderiam ser considerados.

O Ministro Celso Amorim cita uma lista grande de diplomatas que ocuparam funções no Governo Fernando Henrique Cardoso e que foram promovidos em sua gestão ou ganharam postos relevantes, tais como o Chefe do Gabinete do Embaixador ex-Ministro Celso Lafer, Fernando de Melo Barreto, que acaba de ser indicado para ser Embaixador na Austrália; o Embaixador Otto Agripino Maia, irmão do Líder do PFL no Senado, José Agripino Maia, que acaba de ser chamado para o gabinete do próprio Ministro Celso Amorim; dois embaixadores que apareciam em 90% das imagens durante visitas de Fernando Henrique Cardoso ao exterior por serem chefes do cerimonial, Valter Pecly e Frederico César de Araújo, que hoje estão, respectivamente, em Assunção e La Paz, em postos que a ênfase das relações na América Latina torna relevantes.

Mas, como o Embaixador Roberto Abdenur fez críticas ao fato de o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Secretário-Geral do Ministério, ter feito recomendações de algumas leituras, considerando-as de viés ideológico, quero ressaltar que o Ministro Celso Amorim fez questão de informar ontem que não há qualquer sentido em manter essas leituras como obrigatórias às pessoas de carreira do Itamaraty.

É claro que todos ficamos curiosos para conhecer os quatro livros qualificados, considerados pelo Embaixador Roberto Abdenur como de leitura de natureza ideológica e quase que considerados parte de uma “lavagem cerebral”, o que nem mesmo na ditadura militar ocorreria.

Quais os quatro livros recomendados aos diplomatas de carreira do Itamaraty? Um deles é a biografia pessoal e a história política do Barão do Rio Branco, considerado, sem dúvida, uma das pessoas mais importantes da história da diplomacia brasileira. A biografia feita pelo Embaixador Álvaro Lins, que foi, inclusive Embaixador do Brasil em Portugal antes mesmo da gestão do Presidente Jânio Quadros, foi editada, em 1966, pela Editora Alfa-Omega.

Vejam que esse livro de Alvaro Lins, co-editado pela Alfa-Omega e Fundação Alexandre de Gusmão, entidade vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, é considerado uma obra imprescindível. Nesse sentido, vejam as palavras de Gilberto Freyre:

O livro do Sr. Alvaro Lins sobre o Barão do Rio Branco (ou sobre os dois Rio Branco?) é um desses livros que, desde as primeiras páginas, nos dão um gosto raro de contato com uma obra monumental. Sua solidez, suas proporções, seu espírito são a solidez, as proporções e o espírito dos monumentos que se levantam em memória dos grandes homens ou das grandes épocas.

Ora, estou com vontade de ler e vou lê-lo até antes da chegada do Embaixador Roberto Abdenur, que foi convidado pela Comissão de Relações Exteriores para melhor esclarecer o seu ponto de vista.

O outro livro considerado como algo que pudesse significar uma ideologização por parte do Itamaraty é o Pensamento Econômico Brasileiro: O Ciclo Ideológico do Desenvolvimentismo, que aborda o período de 1930 a 1964, de autoria do economista Ricardo Bielschowsky. Editado pela Contraponto, tem a apresentação de nada menos do que dois dos maiores economistas da História brasileira. O primeiro é Celso Furtado, que diz sobre este livro:

Considero o Pensamento Econômico Brasileiro o mais importante trabalho já realizado para caracterizar e apreciar o considerável esforço produzido entre nós a fim de resgatar o Brasil das armadilhas do pensamento ortodoxo, que nos impedia de ver a realidade.

O outro é Roberto de Oliveira Campos, que diz:

Erudito, objetivo e correto, Pensamento Econômico Brasileiro é referência indispensável, por sua análise balanceada e percuciente das controvérsias ideológicas da época. Excelente ensaio de historiografia econômica.

Roberto de Oliveira Campos!

Desculpe-me, Senadora Lúcia Vânia, mas vou pedir mais um tempo. Inclusive, quero ouvi-la em seguida, diante do que estou observando.

Voltando ao tema, como considerar isso algo inadequado como leitura recomendada?

Outro livro é de Ha-Joon Chang, Chutando a Escada - A estratégia do desenvolvimento em perspectiva histórica. Ha-Joo Chang é Diretor-Assistente de Estudos sobre o Desenvolvimento na University of Cambridge. Ele mostra, neste livro, como os diversos países, ao longo da história, utilizaram-se de medidas protecionistas para se tornarem desenvolvidos e desejam, muitas vezes, impedir que os países em desenvolvimento utilizem de práticas semelhantes.

O Professor Charles Kindleberger, professor emérito de economia do MIT, diz que se trata de “uma crítica estimulante dos sermões dos economistas da corrente dominante dirigidos aos países em desenvolvimento... Merece atenção”.

Há também o livro de Luiz Alberto Moniz Bandeira, Conflito e integração na América do Sul - Brasil, Argentina e Estados Unidos, que tem uma apreciação, por exemplo, de Rubens Ricupero, publicado na Opinião Econômica da Folha de S.Paulo em 1º de junho de 2003, em que ele diz que o livro “é obra original, uma autêntica história conjunta das relações diplomáticas do Brasil e da Argentina durante 133 anos” e diz que o historiador americano Frank McCann o apresenta como “leitura indispensável”. Ele tem também a recomendação fortíssima de Roberto de Oliveira Campos para que todas as pessoas leiam esse livro. Mais do que isso, o próprio ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso diz: “Luiz Alberto Moniz Bandeira: trata-se de um intelectual imaginativo e competente, com experiência diversificada...”

O SR. PRESIDENTE (Valter Pereira. PMDB - MS) - Senador, o tempo de V. Exª está esgotado, mas vamos conceder mais dois minutos para que V. Exª possa concluir.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Enfim, Sr. Presidente, permita-me discordar aqui do Embaixador Roberto Abdenur, mas teremos a oportunidade de com ele ponderar, dialogar, quando da sua visita.

Permita-me somente, Sr. Presidente, falar brevemente desta homenagem ao Sr. Joaquim Pereira:

Requeiro, nos temos do art. 222 do Regimento Interno do Senado Federal, a inserção em Ata de voto de aplausos e congratulações para o Sr. Joaquim Pereira, de 66 anos, que, num ato de coragem, salvou seu neto, Mateus, um garoto de oito anos, que sofreu um bote e ameaça de estrangulamento de uma sucuri de cinco metros que havia saído do córrego Barro Preto, em Cosmorama, São Paulo. Chamado pelos amigos de Mateus, que gritou por socorro, o Sr. Joaquim lutou por meia hora com a sucuri, conseguiu dominá-la e salvar o seu neto.

Senadora Lúcia Vânia, veja que história incrível que ocorreu ontem. Diante de tantas notícias de tragédias, cabe registrar os atos positivos e exemplares de brasileiros. O avô Joaquim Pereira, de 66 anos, tomado certamente de um forte sentimento de amor por seu neto, conseguiu reunir extraordinária força para dominar a cobra conhecida por sua poderosa capacidade de estrangular pessoas e animais.

Há pouco o Senador Augusto Botelho, de Roraima, contou-me inúmeros casos de cobra sucuri que estrangularam pessoas, inclusive adolescentes que ele conheceu pessoalmente. Ele disse-me que, certa vez, tentou matar uma cobra que estrangulava um porco, que não conseguiu ser salvo.

O neto do Sr. Joaquim foi atacado por uma sucuri de cerca de cinco metros na tarde da última quarta-feira, numa propriedade rural em Cosmorama.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Valter Pereira. PMDB - MS) - Está encerrado o seu tempo, mas V. Exª terá mais um minuto para concluir o seu pronunciamento.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - O fato ocorreu em Cosmorama, a 500 quilômetros de São Paulo. Não fosse a coragem, o menino teria sido asfixiado e morto.

O Sr. Gilvam Borges (PMDB - AP) - Concede-me V. Exª um aparte, nobre Senador Eduardo Suplicy?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Foi necessário que ele chegasse ao local, avisado pelos amigos do neto. Brigou por cerca de meia hora com a cobra, usando as mãos, os pés, pedras e pedaços de madeira que encontrou pela área, para evitar a morte da criança, que levou 21 pontos, e para salvar-se, porque foi mordido no peito. Disse o menino: “Ela me derrubou, me mordeu. Foi-se enrolando e começou a me enforcar”.

Parabéns ao Sr. Joaquim Pereira, que, com seu ato, inspira boas ações a todos os pais e avós, a todos nós brasileiros.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/02/2007 - Página 1371