Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a preocupante situação financeira da maioria absoluta dos municípios brasileiros.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
  • Considerações sobre a preocupante situação financeira da maioria absoluta dos municípios brasileiros.
Aparteantes
Augusto Botelho, Flexa Ribeiro, Garibaldi Alves Filho, Heráclito Fortes, Jayme Campos, José Maranhão, Mozarildo Cavalcanti, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 16/02/2007 - Página 2291
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Indexação
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO FINANCEIRA, MUNICIPIOS, BRASIL, EVOLUÇÃO, DIFICULDADE, ADMINISTRAÇÃO FEDERAL, CENTRALIZAÇÃO, RECURSOS, UNIÃO FEDERAL, DESRESPEITO, FEDERAÇÃO, REGISTRO, HISTORIA, REPUBLICA.
  • ANALISE, CONCENTRAÇÃO, RESPONSABILIDADE, ESTADOS, MUNICIPIOS, AREA, EDUCAÇÃO, POLITICA SOCIAL, INFRAESTRUTURA, GRAVIDADE, CRISE, PERDA, RECEITA, REDUÇÃO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), RESTRIÇÃO, POLITICA MONETARIA, PROGRAMA, AJUSTE FISCAL, CONCLAMAÇÃO, CONGRESSISTA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS, TRIBUTAÇÃO, INCLUSÃO, CONTRIBUIÇÃO, RENOVAÇÃO, PACTO, FEDERAÇÃO, EXPECTATIVA, RETOMADA, TRAMITAÇÃO, MATERIA.
  • DEFESA, URGENCIA, REAJUSTE, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM).

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, torna-se repetitivo, embora necessário, que mais uma vez se lance o clamor de que é preocupante a situação financeira da maioria absoluta dos Municípios brasileiros. Em muitos casos, mais do que preocupante, o cenário é caótico.

É claro que existem as mais variadas razões para que se chegasse ao ponto em que nos encontramos hoje. Não tenho a ilusão de achar que apenas fatores externos estariam contribuindo para o dramático quadro de agora. Admito que, em algumas situações pontuais, podem estar entrelaçados nesse processo o descuido, a irresponsabilidade e o despreparo. Todavia, algo muito mais grave paira sobre o País, aprofundando as enormes dificuldades operacionais das unidades da Federação.

Refiro-me ao modo pelo qual se dá a distribuição do poder no Brasil. Com efeito, nesta mais que centenária República, duas características conferiram ao regime implantado em 1889 sua fisionomia essencial: o presidencialismo e o federalismo. O primeiro nunca deixou de existir, salvo no brevíssimo espaço de tempo entre a crise da renúncia extemporânea de Jânio Quadros e o plebiscito de janeiro de 1963. Assim mesmo, como bem o sabemos, adotou-se naquela conjuntura de grave crise institucional, quando o País esteve à beira da guerra civil, um parlamentarismo de fachada, fadado, desde o início, ao insucesso. Para alguns, não foi mais que um golpe branco, com o indisfarçável objetivo de retirar espaços de poder ao contestado Presidente João Goulart.

Em relação ao federalismo, contudo, a situação se modifica. Conquanto presente até mesmo na denominação oficial do Brasil, a trajetória de nossa República foi marcada pelo crescente esvaziamento do conceito de Federação. A rigor, federalismo pleno tivemos apenas na Primeira República, sob a tutela da mais federalista de nossas Constituições, a de 1891, fortemente influenciada pelo modelo norte-americano. A crise econômica de 1929, com a Grande Depressão dela decorrente, somou-se ao esgotamento político do regime, visível nas sucessivas crises dos anos 20. Abriu-se espaço para o advento da Era Vargas, a partir da qual o federalismo brasileiro nunca mais foi o mesmo.

Chegou-se até a sua supressão pura e simples, tal como verificado no Estado Novo, o qual, entre 1937 e 1945, mergulhou a Nação na mais incontrastável ditadura. A cerimônia de queima das bandeiras estaduais foi o toque simbólico do centralismo absoluto que recaía sobre o Brasil.

O regime democrático-liberal, que vigorou de 1946 a 1964, esforçou-se por reverter esse quadro, conseguindo-o em larga medida. Todavia, em razão do próprio modelo de desenvolvimento adotado pelo regime militar, uma vez mais a experiência federalista é golpeada com vigor. Quanto mais evidente se torna o papel de centralidade da União, no processo de modernização da economia nacional, maior sua volúpia arrecadadora e maior seu poder de mando no manejo dos recursos públicos. É nessa época que se inicia a total prevalência da denominada “área econômica” sobre o conjunto do Estado brasileiro. O grande centro do debate nacional transferia-se do plenário do Congresso Nacional para alguns gabinetes da Esplanada dos Ministérios.

A redemocratização, Sr. Presidente, não logrou alterar essa realidade. Recuperadas as liberdades políticas, fortalecido o conceito de cidadania e robustecidas todas as concepções de direitos civis e sociais, permanece o Brasil encarcerado a um projeto de desenvolvimento que faz do Governo Federal o ponto de partida e de chegada das decisões estratégicas e do controle dos recursos públicos. Em decorrência, vivemos um simulacro de federalismo no qual direitos e deveres são repartidos de maneira intrinsecamente injusta. Talvez o exemplo mais ostensivo disso seja oferecido pela educação.

A Carta de 1988, provavelmente refletindo o extraordinário poder de pressão da área acadêmica, conferiu à União a responsabilidade de atuar no campo da educação superior. Todavia, sobre os ombros dos Estados e dos Municípios, recai toda a educação básica. Assim, enquanto mais de 70% dos recursos do Tesouro que compõem o orçamento do Ministério da Educação voltam-se para o financiamento das universidades federais - com o seu reduzido número de alunos -, mais de 30 milhões de crianças, adolescentes, jovens e adultos matriculados na educação básica são mantidos pelos Governos estaduais e municipais! Alguma coisa está errada nesse federalismo que concentra na União o esmagador volume do que se arrecada no País e transfere às unidades federadas migalhas desses recursos e o grosso das responsabilidades da execução.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso dar um basta a essa situação. Nem de longe imagino combater a Lei de Responsabilidade Fiscal. Vejo nela um extraordinário avanço em termos da boa utilização do dinheiro público.

Entretanto, não é justo assistir passivamente ao esgotamento total e absoluto dos Municípios brasileiros quanto à capacidade de investir, sobretudo em infra-estrutura e na área social. Existem motivos suficientes para que se reverta esse quadro moralmente insustentável e socialmente explosivo.

Alguns números dão a exata dimensão da crise econômico-financeira instalada há alguns anos nos Estados e Municípios brasileiros, inescapavelmente vinculada à questão da dívida pública. Entre os aspectos estruturais que, segundo os especialistas, ocasionam o aprofundamento da crise, destaco alguns:

1º - a redução da participação de Estados e Municípios na partilha tributária;

2º - a perda de receitas, em decorrência dos pífios índices de crescimento econômico do País;

3º - a adoção de indexadores discutíveis para a correção do valor nominal dos débitos e o uso de conceito de receita corrente líquida, inapropriado para a fixação do comprometimento de receitas destinadas ao serviço da dívida.

Que ninguém se esqueça de que os Estados e Municípios foram vítimas de restritiva política monetária dos anos 80 e 90. Ainda que necessário e positivo sob diversos aspectos, o Programa de Ajuste Fiscal revelou-se draconiano, especialmente por comprometer de maneira bastante elevada as receitas líquidas dos Estados. Ademais, o conceito receita corrente líquida, utilizado para servir os débitos renegociados com o Governo Federal, não excluiu as receitas sobre as quais os Estados não podem dispor livremente para servir dívidas como as despesas constitucionalmente vinculadas, a exemplo do que ocorre nas áreas da saúde e educação.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Edison Lobão, V. Exª me permite um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Ouço V. Exª com todo o prazer.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Edison Lobão, quero me congratular com V. Exª, que faz uma análise minuciosa da crise por que os Municípios atravessam no nosso País, uma crise que se agrava dia a dia, haja vista que não há o cuidado de preservar a situação dos Municípios. O próprio Fundeb, que deveria ser um instrumento de incentivo aos Municípios no que toca à educação, segundo levantamento da Confederação Nacional dos Municípios, vai trazer prejuízo aos mesmos. Os Municípios estão aí há quanto tempo solicitando apenas 1% de aumento do Fundo de Participação, e ainda não conseguiram, a despeito das várias promessas feitas pelo Governo Federal? Então, a nossa crise federativa tem um componente forte com relação aos Municípios, à situação dos entes municipais e, por isso mesmo, quero aplaudir essa preocupação de V. Exª e dizer que aqui no Senado existe uma Subcomissão vinculada à Comissão de Assuntos Econômicos, uma subcomissão voltada para os Municípios. Acredito que teremos muito trabalho para frente neste ano de 2007. Muito obrigado, nobre Senador.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Senador Garibaldi Alves Filho este é o objetivo do meu aparte de hoje: tentar convencer ou contribuir para o convencimento da União Federal no sentido de destinar esse magro 1% aos Estados e Municípios, que merecem de sobra. Até pouco tempo, 75% das receitas dos Municípios provinham do fundo de participação; hoje, há apenas 45%.

Isso dá a demonstração do quanto eles estão sendo subtraídos da suas receitas e quão larga é a dificuldade que eles hoje enfrentam em relação aos recursos que entram nos seus cofres.

Ouço o eminente Senador Mozarildo Cavalcanti e, em seguida, o Senador Jaime Câmara.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador Edison Lobão, com a serenidade e a competência que tem V. Exª, faz uma reflexão crítica sobre o nosso modelo federativo. Na verdade, a federação que “faz de conta”. Nós temos de fato um modelo unitário de Governo, porque a União centraliza tudo, centraliza o principal que é o dinheiro, e depois reparte de maneira desigual, e pior - como V. Exª diz - os Municípios ficam vítimas de iluminados, que estão encastelados em ministérios, que definem inclusive que tipo de política pública devem ser adotadas nas regiões e os prefeitos têm que fazer peregrinações em Brasília para poder aprovar os seus projetos e, depois, para liberar os recursos e, finalmente, terem esses recursos cronológica e adequadamente aprovados. Depois, Senador Edison Lobão, ainda sofrem uma exagerada fiscalização pela CGU que não faz a mesma coisa, aí, com certas entidades que vemos a toda hora. Inclusive, agora, o Presidente vetou a necessidade de licitação para dar dinheiro para ONGs que têm dinheiro a torto e a direito. Então, nós, que aqui somos a Casa da Federação, precisamos realmente tomar consciência e não nos submetermos, independente de sermos ou não da base aliada. Nós, aqui, somos é da base municipalista. Nós temos compromisso é com os nossos homens e mulheres que se estão lá nos Municípios. Nós temos que buscar não é só esse 1%, mas a questão, por exemplo, é que se passa aos Municípios a responsabilidade sobre a saúde e sobre a educação, mas não se dá os mecanismos para que os prefeitos possam atender a saúde e a educação. Então, é um faz-de-conta. O que é pior depois: aí, vai, prende o prefeito e se faz um escarcéu e pronto: “Olhem aí porque nós não fazemos. Porque os prefeitos são incompetentes”. Nós, então, precisamos, sim, e quero aplaudir a coragem de V. Exª em trazer esse tema num momento em que nós estamos começando uma nova Legislatura. Precisamos inverter essa pirâmide, quer dizer, o município tem que estar em cima e não o Governo Central e que possamos realmente trabalhar para invertermos positivamente, a favor do homem e da mulher porque já disseram que ninguém vive na União. Vive-se é no Município - nas ruas e nos bairros do município. Portanto, quero louvar e me aliar a V. Exª nesta luta.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Sr. Presidente, quero fazer um apelo a V. Exª no sentido de estender um pouco mais o meu tempo, até em razão do tema que se está abordando hoje, pelo qual tanto se interessa o plenário.

Senador Mozarildo Cavalcanti, o constituinte de 1988 decidiu elevar o Fundo de Participação que cabia aos Municípios e um pouquinho também aos Estados. Com que objetivo? Exatamente para evitar que os prefeitos vivessem de pires na mão, nos ministérios, em Brasília, quando deveriam estar governando seus Municípios lá no interior. Aumentamos, então, essa participação para cerca de 23% do bolo dos tributos nacionais. O que ocorre hoje? Em razão das manobras da União Federal, com a criação de CPMF, Cide e outras taxas e tributos, dos quais apenas ela, a União, se beneficia, os Municípios tiveram as suas receitas reduzidas de 23% para menos de 16% nos dias atuais. Isto é uma situação insuportável. Ao lado disto, a União, como diz muito bem V. Exª, transferiu deveres aos Municípios e aos Estados.

Temos de ter hoje a coragem, se necessário, de alterar a Constituição novamente, Senador, para repor a situação dos Municípios e dos Estados. Não podemos assistir de braços cruzados a essa redução drástica dos recursos municipais em nome de dificuldades da União Federal, que vão acabar refletindo nos Estados federados e nos Municípios.

Os Municípios e os Estados não podem responder sozinhos pelas dificuldades da União Federal. E V. Exª tem toda razão, a Nação começa no Município e não aqui em Brasília. Portanto, é o Município que haverá de ter a nossa atenção imediata e especial.

Ouço o eminente Governador e Senador Jayme Campos.

O Sr. Jayme Campos (PFL - MT) - Senador Edison Lobão, eu quero cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento no dia de hoje em defesa dos Estados e, sobretudo, dos Municípios brasileiros. Eu tive a oportunidade ímpar de ser Prefeito por três mandatos da minha querida terra natal, que é Várzea Grande, no meu Estado de Mato Grosso e fui Governador desse Estado. Lamentavelmente, o que o senhor está dizendo é a pura realidade. Houve um empobrecimento dos Municípios e dos próprios Estados. Parece-me, dá a entender que o Governo Federal quer que os Prefeitos e os próprios Governadores continuem de pires na mão, sempre aqui mendigando, fazendo deles uns verdadeiros mendigos. Acho que chegou o momento de nós discutirmos um novo pacto federativo, sobretudo, fazendo com que haja uma melhor distribuição da receita nacional. Hoje, dos 100% arrecadados, 58% ficam para o Governo Federal, 26% para os Estados e apenas minguados 16% para os Municípios. Entretanto, nos últimos anos, as responsabilidades quase totalmente foram transferidas para os Municípios.

Posso afiançar, com muita certeza, que praticamente 90% dos Municípios brasileiros estão literalmente falidos. O que me dá muita pena é que, muitas vezes, o Ministério Público dos Municípios, onde estão instaladas as comarcas, está exigindo dos prefeitos aquilo que é impossível realizar. Tenho conhecimento disso e já travei discussões com alguns promotores que exigem aquilo que o Município não tem capacidade de atender. Por isso, ilustres Senadores, é fundamental, neste momento em que vamos discutir assuntos palpitantes para o País, inserirmos também na pauta desta Casa a questão da Cide. Apenas 29% dessa contribuição são transferidos para os Estados. Se possível, deveríamos fazer com que, pelo menos, 45% da Cide sejam transferidos para os Estados e, conseqüentemente, para os Municípios. Deveríamos agir da mesma forma em relação à CPMF. Todos nós devemos lutar com o objetivo maior de fazer com que 30%, pelo menos, dessa receita sejam transferidos, distribuindo-se 20% para os Estados e 10% para os Municípios. Com certeza, isso vai melhorar, sobremaneira, a questão da saúde. Lamentavelmente, hoje, os Municípios não podem contrair qualquer tipo de financiamento, até porque, com a Lei de Responsabilidade Fiscal, os Municípios e os próprios Estados estão impossibilitados de fazê-lo. Portanto, quero cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento, na certeza de que bandeiras como essa serão levantadas. V. Exª já foi Governador do seu querido Estado do Maranhão e, certamente, está vivenciando a crise por que passam os Municípios daquele Estado. Cumprimento-o por esse momento histórico em que V. Exª fala em defesa dos Estados e dos Municípios brasileiros. Muito obrigado.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Senador Jayme Campos, no curso do seu aparte, que tanto ilustra o meu discurso, V. Exª usou uma expressão correta: um novo pacto.

O que se fez na Constituinte foi um pacto para tentar resolver o problema grave dos Estados e Municípios, Senador Mão Santa, que é o financeiro. O que temos que fazer agora é renovar esse pacto. O próprio Constituinte de 88 estabeleceu que cinco anos depois, a Carta Constitucional deveria ser recomposta, alterada, revisada, retemperada, para que ela se ajustasse ao momento moderno. Devemos fazê-lo agora, uma vez mais, para que ela retome o curso estabelecido inicialmente pelo Constituinte brasileiro.

Eminente Senador Mão Santa, que foi um notável Prefeito de um dos mais belos Municípios brasileiros e, também, Governador do Estado do Piauí, quero ouvi-lo, com toda alegria.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Edison Lobão, já os que me antecederam disseram que, enfim, desobedeceu-se a Constituição, ela que destinava 36% para a União, 22,5% para os Estados, 21,5% para os Municípios e 2% para os fundos constitucionais. O Governo foi garfando e a situação está muito séria, além de desrespeitar a Constituição, o que Ulysses dizia que é como rasgar a bandeira. Senador Edison Lobão, quero dar um testemunho. Aqui tem muito ex-prefeito, porque isso era obedecido. Justamente quando saiu a Constituição comecei a ser Prefeito de Parnaíba, em 1989; Heráclito, de Teresina; Jayme Campos; Garibaldi... Todos nós estamos aqui porque havia recursos e pudemos galgar outras posições. E agora a realidade é esta: de calamidade. E agora a preocupação. V. Exª começou, mas vamos à realidade. Está muito difícil, porque o Governo Federal inchou muito! Edison Lobão, o Presidente Lula criou 25 mil cargos. Bush, o poderoso Bush, tem 3.000 cargos de confiança; a França tem 1.000 cargos; Tony Blair, com aquela galhardia toda, dispõe de 100 cargos de confiança. As estruturas obedecem à hierarquia, aos funcionários de carreira. Aqui, desmanchou-se todinho, a máquina administrativa, desde o Dasp, de Getúlio Vargas, ordenada, preparada, e colocaram esses do PT aí comandando. São 25 mil cargos. De 106 sociedades de economia mista, ele criou 26 novas; de 16 ministérios, passou para 36 ministérios. Então a máquina está enorme, e estão garfando. O Governo da União, o Presidente Lula da Silva está garfando dos prefeitos. E aquele mísero 1% que nós votamos, que nós aprovamos, nunca chegou aos prefeitos, para que fiquem na dependência do poderoso Governo Federal.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Essa, Senador Mão Santa, é uma luta que haverá de ser de todos nós. Ou nos juntamos para recompor essa situação dos Municípios e dos Estados, inclusive com a distribuição feita dos recursos da Cide e da CPMF, ou não ajudaremos as Unidades Federadas e também os Municípios da República.

Ouço o Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Edison Lobão, V. Exª tem sido nesta Casa um verdadeiro pioneiro de temas de momento. Essa questão do massacre que o Poder Central impõe aos Municípios - quero até lhe fazer justiça - não vem sendo uma luta nova sua. Municipalista como eu, V. Exª tem tido, ao longo dos mandatos que desempenhou no Congresso, parte deles dedicados exatamente a essa causa. Não sei o que pensam os tecnocratas que lutam em concentrar, meu caro Mão Santa, o poder do dinheiro no cofre federal. Aliás, o excesso de poder federal é que tem sido o grande estimulador de escândalos, de burocracia e de emperramento da máquina administrativa neste País. V. Exª, que passou pela administração de um governo - e o fez com muito brilho -, sabe melhor do que ninguém o que é isso. Senador Lobão, não só os Municípios estão vivendo esse drama. O Senador Mão Santa, piauiense como eu, testemunha o que estou dizendo. Os jornais do nosso Estado, o Piauí - Estado que lhe acolhe como se de lá também fosse -, tem noticiado nos últimos dias a situação de descontrole e de desequilíbrio financeiro por que passa o Governo do Estado. O Governador Wellington Dias, Senador Mão Santa, é do PT e começa já a se justificar, dando o calote em empreiteiros, atrasando pagamentos, apenas com a justificativa de que priorizou o pessoal. Não é uma justificativa convincente; é apenas uma justificativa de momento. Mas é vítima também desse centralismo exagerado que o Governo ao qual ele pertence pratica. Dessa forma, os Municípios estão assim já historicamente e os Estados começam também a entrar nessa situação.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. PFL - PB) - Conclua, Senador.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - O discurso de V. Exª é um discurso de alerta, preciso, e espero que o Governo acorde. Se quer desenvolvimento e se quer PAC, não se faz PAC centralizando, faz-se PAC distribuindo. Para que a distribuição seja eficaz ela tem que ser feita pelos Estados e pelos Municípios, exatamente onde se concentram os problemas. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Agradeço a V. Exª também a contribuição valiosa.

Devo dizer que sou, de fato, municipalista desde a época em que era Deputado Federal. Mas essa luta não há de ser apenas de um ou de uns, e sim de todos. Sei que V. Exª, tanto quanto os demais Senadores que aqui se encontram, está pronto para encetá-la em benefício de todos os Municípios brasileiros e também dos seus Estados.

Ouço o Senador Augusto Botelho e, em seguida, os Senadores Flexa Ribeiro e José Maranhão.

O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senador Edison Lobão, quero parabenizar V. Exª pelo discurso. Também concordo - aliás, todos concordamos - que essa concentração dos impostos aqui no Governo Central viola a Federação. Mas gostei também quando V. Exª falou dessa injustiça com gastos na Educação deste País. Temos de tomar providências - V. Exªs têm mais experiência - e encontrar meios para inverter esta equação de 30% para os ensinos fundamental e médio e 70% para o ensino superior, as universidades. Sabemos que a minoria dos brasileiros chega às universidades. Chega à universidade federal uma minoria privilegiada, os que têm mais recursos. Então, não é justo que a maioria do dinheiro da Educação seja gasto com pessoas que não têm necessidade, que têm condições de financiar seus cursos. É lógico que a universidade pública tem de continuar existindo porque é ela que alavanca a tecnologia e a ciência. As universidades privadas não investem em pesquisas. Infelizmente, no Brasil, nem nossas empresas investem muito em pesquisas. Gostaria de contar com V. Exª nessa luta pelo resgate da força dos Municípios e também - apesar de ter citado rapidamente em seu discurso o gasto injusto na Educação - pela inversão. Use sua inteligência e seu poder para invertermos essa forma de gastar nosso dinheiro na Educação. Muito obrigado.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - De fato, o que se dá é a completa inversão na aplicação dos recursos da Educação. A universidade federal consome cerca de 70% de todos os gastos que se realizam com a Educação. E os recursos não são escassos, eles são bastante volumosos.

(Interrupção do som.)

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Ouço o aparte do Senador Flexa Ribeiro.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. PFL - PB) - Senador Edison Lobão, peço a V. Exª que conclua. O assunto é palpitante, mas V. Exª já usou vinte minutos, além dos dez a que tem direito.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Peço perdão a V. Exª por tê-lo excedido. Vou concluir, realmente, após o aparte do Senador Flexa Ribeiro.

O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB - PA) - Senador Edison Lobão, V. Exª traz à tribuna talvez um dos temas de maior importância que nesta Legislatura o Congresso Nacional tem de abraçar e para o qual tem de encontrar uma solução, que é a revisão do pacto federativo. Eu mesmo fiz um requerimento que tramita na CAE, criando uma subcomissão permanente para tratar da questão da revisão do pacto federativo e da regulamentação da Lei Kandir. Espero ter o apoio de V. Exª naquela comissão para que possamos, no âmbito de uma subcomissão, aprofundar esse debate e encontrar uma equação que atenda à União, aos Estados e aos Municípios. Isso porque, da forma como V. Exª tão bem colocou, é impossível a manutenção do status quo atual. V. Exª lembra e todos nós aqui lembramos que os Municípios brasileiros - e todos nós somos municipalistas - clamam ao Governo Federal a promessa de há três anos aumentar em 1% a distribuição do FPM. Esse projeto foi aprovado aqui no Senado Federal e está dormindo na Câmara dos Deputados, porque não há vontade política do Governo em aprová-lo. Em todos os anos em que há marcha de prefeitos a Brasília, o Presidente Lula assume o compromisso de que fará aprovar na Câmara Federal esse aumento de 1%, e lamentavelmente isso não acontece. Vamos trabalhar, Senador Edison Lobão, no sentido de o Congresso Nacional provocar o reestudo, a revisão do pacto federativo. E sejamos justos com os Estados e os Municípios na repartição do bolo da arrecadação da União.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Muito obrigado a V. Exª.

Concedo o último aparte ao Senador José Maranhão.

O Sr. José Maranhão (PMDB - PB) - Senador Edison Lobão, não vou me estender muito para não roubar mais tempo do seu brilhante discurso. Eu queria dizer apenas que concordo em gênero, número e grau com todas as afirmações que fez a respeito da questão municipal na Federação brasileira. Na verdade, os Municípios no Brasil passam por uma situação de verdadeira calamidade. Essa é a situação dos pequenos Municípios, sobretudo no interior do meu Estado, não industrializados, que sobrevivem graças às cotas do Fundo de Participação dos Municípios. Como V. Exª frisou muito bem, o Governo Federal, não apenas o atual, mas todos os governos federais, eu diria, desde a Constituição de 1946 até hoje, têm sido verdadeiros padrastos, e padrastos ruins dos Municípios brasileiros. Sem dúvida nenhuma, há uma injustiça muito grande na partição da receita nacional, porque é no Município que o cidadão vive, é no Município que o cidadão produz, é no Município onde mais se contribui para o crescimento nacional. A União é uma abstração de direito e uma abstração política também, é evidente; é a construção que os nossos legisladores constituintes sempre impuseram à Nação. Uma União que açambarca quase a totalidade do bolo da receita tributária do País, esquecida de que, sem os Municípios, não existiria a União. Portanto, o discurso de V. Exª contribui para que todos avancemos no sentido de aguçar esse entendimento, porque a solução está aqui, no Congresso Nacional. Essa matéria é genuinamente constitucional. Se o legislador ordinário entender por modificar a Constituição, dando aos Municípios um tratamento mais justo e mais equânime, certamente esta situação mudará. Não vamos esperar que, por um ato de generosidade do Executivo Federal, possa haver grandes mudanças. Sem a iniciativa do Congresso, não há salvação para os Municípios. É assim que entendo a questão, nobre Senador.

O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Agradeço a V. Exª também, Senador José Maranhão.

Sr. Presidente, fico no convencimento de que nós todos haveremos de nos dar as mãos para cuidar deste que é considerado por mim, pelo menos, um dos problemas mais graves da Federação brasileira, neste momento.

Por fim, mas não menos importante, é a incrível e substantiva redução da fatia de Estados e de Municípios no bolo tributário, não obstante a reconhecida elevação da carga de tributos que recai sobre a Nação. O problema concentra-se no fato de que as receitas de contribuições cobradas exclusivamente pela União não compõem os Fundos de Participação dos Estados e Municípios, que têm como base parcelas do IR e do IPI. Ora, acontece que, nos últimos anos, a União sistematicamente vem ampliando a cobrança de contribuições, como a CPMF, a Cide, a Cofins e outras, todas receitas não compartilhadas com Estados e Municípios.

Recolho, do Relatório da Subcomissão Temporária da Dívida Pública, publicado há exatos três anos, uma informação que, por si só, diz tudo a respeito da gravidade do problema. Diz o documento: “Quando a Assembléia Nacional Constituinte fixou a partilha, as receitas compartilhadas representavam 75% da arrecadação federal e as demais receitas, inclusive as contribuições, os restantes 25%. Em 2002, as receitas compartilhadas representaram apenas 45% das receitas federais, enquanto as não-compartilhadas atingiram 55%”. Essa situação perdura, quando não se agrava.

E o que dizer quando o Governo Federal promove concessão de benefícios fiscais via redução do IPI? Uma vez mais, Estados e Municípios perdem receitas, agravando a intensidade da crise de suas finanças. Em alguns Estados e em vastíssimo número de Municípios, as receitas do Fundo de Participação são bem maiores do que as do ICMS. Isso é particularmente visível no Norte e no Nordeste, mas também muito presente em centenas ou milhares de pequenos Municípios das demais regiões brasileiras.

Por tudo isso, Sr. Presidente, expresso minha firme posição acerca da imperiosa necessidade de se ampliar, pelo menos em 1%, a cota municipal do Fundo de Participação dos Municípios. Eis o caminho mais sensato para que as Unidades da Federação possam cumprir suas obrigações e, acima de tudo, recuperar um mínimo de capacidade para realizar os investimentos que se fazem necessários. Educação, saúde, transporte coletivo, moradia, segurança, saneamento básico e infra-estrutura são setores vitais para a vida das comunidades e precisam ser atendidos. Tal como se encontram hoje, as Unidades da Federação não têm como responder às justas demandas da sociedade.

Essa é uma questão política, sim, mas, antes de tudo, de elementar justiça! É preciso inverter a corrente perversa que leva as Unidades Federativas a perdas relativas e absolutas de receitas. Perdem-nas pela estagnação econômica, pela centralização das receitas na União e pela política de concessão de benefícios à custa de impostos partilhados. Com o objetivo de superar essa situação insustentável, propostas interessantes já foram apresentadas no Congresso Nacional.

Reporto-me, por exemplo, à PEC de autoria do Senador Osmar Dias, que acrescenta inciso ao art. 159 da Constituição Federal, para o fim de destinar ao Fundo de Participação dos Estados e dos Municípios 10% do produto da arrecadação das contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico. Infelizmente, matéria de tamanha relevância ainda aguarda inclusão em Ordem do Dia. No mesmo sentido, PEC apresentada pelo Senador Pedro Simon, que altera os percentuais dos tributos arrecadados destinados ao Fundo de Participação, ainda aguarda designação do relator.

Faço um veemente apelo às Lideranças no Congresso Nacional para que matérias fundamentais como essas tenham sua tramitação retomada. É questão de sobrevivência da Federação brasileira uma distribuição mais justa e equânime do que se arrecada no País. Somente assim o cidadão brasileiro, que vive e produz no Município, poderá ver respondidas suas demandas essenciais, cujo atendimento é a própria razão de ser do Estado. A Nação não conseguirá ser próspera se não houver uma relação adequada entre o que o Estado arrecada e aquilo que retorna ao cidadão.

Daí o motivo de meu apelo. Aliás, muito oportuno, quando os debates se concentram na busca de soluções para a aceleração do crescimento de nosso País.

A verdade é que não se pode omitir ante uma situação de tamanha gravidade, que tentei detalhar neste meu pronunciamento. Que cada um de nós reflita sobre o tema, apresente suas idéias e, com isso, aprofunde um debate que, não mais podendo ser postergado, nos leve a um desfecho otimista tão aguardado pelos que se preocupam com o Brasil.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/02/2007 - Página 2291