Discurso durante a 13ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Encaminhamento de projeto que coíbe a lavagem de dinheiro por meio da loteria da Caixa Econômica Federal.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • Encaminhamento de projeto que coíbe a lavagem de dinheiro por meio da loteria da Caixa Econômica Federal.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2007 - Página 2912
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • DENUNCIA, CRIME, UTILIZAÇÃO, LOTERIA, LAVAGEM DE DINHEIRO, COINCIDENCIA, AGENCIA, REDE BANCARIA, PARTICIPAÇÃO, GERENTE, SERVIDOR, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), REGISTRO, ORADOR, RECEBIMENTO, INFORMAÇÃO SIGILOSA, CONSELHO, CONTROLE, FINANÇAS, COMPROVAÇÃO, EXISTENCIA, FATO CRIMINOSO.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, DESTINAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), REALIZAÇÃO, AUDITORIA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), SOLICITAÇÃO, INFORMAÇÕES, PAGAMENTO, PREMIO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, PROCEDIMENTO, IDENTIFICAÇÃO, GANHADOR, COMPROVAÇÃO, ORIGEM, RECURSOS, APOSTA, INVESTIGAÇÃO, ANTECEDENTES, POLICIA FEDERAL, CRIAÇÃO, BANCO DE DADOS, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, LAVAGEM DE DINHEIRO, IMPOSSIBILIDADE, MANIPULAÇÃO, RESULTADO, LOTERIA.
  • DEFESA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), REALIZAÇÃO, AUDITORIA INTERNA, PUNIÇÃO, FUNCIONARIOS, VINCULAÇÃO, LAVAGEM DE DINHEIRO, OBJETIVO, RECUPERAÇÃO, INTEGRIDADE.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há algum tempo, venho tentando contribuir para que a população receba as necessárias respostas as suas dúvidas sobre a exploração da loteria em nosso País. Dúvidas persistem; as respostas são insuficientes; e permanece a suspeita de manipulação de resultados.

Hoje, venho à tribuna para falar da lavagem de dinheiro por meio das loterias, com a conivência, lamentavelmente, de servidores da Caixa Econômica Federal.

Lembro-me - aliás, todos nós nos lembramos - do fenômeno João Alves. Não me recordo mais quantas vezes ganhou ele na loteria. Quando apanhado, na CPI do Orçamento, com uma fortuna não justificada em suas contas bancárias, declarou que ganhara inúmeras vezes na loteria. Pois ele fez escola! Os alunos o superaram, porque há aqueles que ganham muito mais do que ganhou João Alves nos áureos tempos.

Recebi, por intermédio de solicitação feita oficialmente ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), 29 relatórios de caráter sigiloso, do período compreendido entre 2002 e 2006. Embora sigilosos, creio ser do meu dever revelar alguns dados e números desse relatório, para justificar as providências que estamos tomando na tarde de hoje, com a apresentação de um projeto de lei e de dois requerimentos - um deles, dirigido ao Ministro da Fazenda, solicitando informações a respeito do assunto; o outro, ao Tribunal de Contas da União, solicitando mais uma auditoria.

No período de 2002 a 2006, o valor da lavagem de dinheiro supera R$32 milhões, num processo em que estão envolvidas 75 pessoas.

Sr. Presidente, vou revelar o nome de alguns ganhadores. O Sr. Alécio Gouveia ganhou 525 prêmios, no valor de R$3,8 milhões. Colocou no bolso o João Alves. Ganhou 525 prêmios! O Sr. Marco Trofo ganhou 327 prêmios, no valor de R$1,6 milhão. O Sr. Manuel dos Santos Sá ganhou 206 prêmios, em sete modalidades de loteria, num valor superior a R$1,257 milhão.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Alvaro Dias?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Ouço V. Exª antes de continuar revelando esses “sortudos”, que causam inveja a milhões de brasileiros, que gostariam também de ganhar na loteria.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Penso, Senador Alvaro Dias, que deveríamos investigar que pessoas são essas, porque das duas, uma: ou estão envolvidas nessas grossas negociatas dos últimos tempos - e quem sabe até de tempos não tão novos -, ou são as versões, no Brasil, daquela figura que certamente embalou a nossa infância e não deixou de existir. Refiro-me ao primo do Pato Donald: o Gastão, que ganhava todos os sorteios. Todas as demonstrações de sorte ele as dava, inclusive tomando a Margarida do Pato Donald. Ele suplantava a Margarida do amor do Pato Donald, toda vez que realizava uma proeza dessas. Ou essas pessoas são o primo Gastão do Pato Donald, ou podem ser lavadores de dinheiro eméritos, envolvidos em crimes, como narcotráfico, mensalões, sanguessugas e coisa parecida.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - É crime organizado mesmo, Senador Arthur Virgílio. É uma quadrilha organizada promovendo a lavagem criminosa do dinheiro, com a complacência de representantes do setor público instalados na Caixa Econômica Federal.

Não vou citar todos os ganhadores. Citarei mais um apenas para ilustrar: o Vitório Bastos ganhou, em 17 vezes, aproximadamente R$4 milhões, sendo vários prêmios em loterias diferentes, no mesmo dia. A sorte lhe sorriu no mesmo dia, em várias loterias.

O que se constata é a coincidência das agências onde ocorre o fato, e as pessoas que realizam essa operação criminosa são pessoas já envolvidas numa verdadeira seleção de crimes, como receptação, estelionato, homicídio, sonegação fiscal, contrabando, porte de armas, evasão de divisas, loterias clandestinas, crimes contra o sistema financeiro, declaração falsa, lesão corporal. Portanto, uma seleção de crimes.

E o que faz a Caixa Econômica Federal diante dessa constatação? A Caixa simplesmente comunica ao Coaf e não toma providência interna para evitar o crime continuado. Portanto, a razão deste pronunciamento não é apenas a denúncia. É a apresentação de propostas que têm por objetivo dificultar a ação criminosa junto à Caixa Econômica Federal.

Não estamos contra a Caixa Econômica Federal. Estamos nos colocando a favor dessa instituição centenária, um banco social da maior importância para o nosso País, que não pode sofrer prejuízos, desgastando a sua imagem, perdendo credibilidade diante da população brasileira.

Há transparência alguma e muitos indícios de conluio para a prática de crimes no universo das loterias da Caixa Econômica Federal. Nesse sentido, estamos apresentando projeto de lei que estabelece instrumentos para evitar que as loterias da Caixa Econômica Federal possam vir a serem utilizadas para ações de lavagem de dinheiro.

O nosso projeto, em síntese, estabelece que, ao sacar o prêmio, o vencedor deve comprovar inicialmente a origem dos recursos de suas apostas. O gerente somente poderá pagar o prêmio após a comunicação prévia à Central de Loterias, bem como ao Coaf, ficando o saque bloqueado até informações dos referidos órgãos. O saque fica condicionado à identificação completa do sacador e à verificação se o mesmo tem antecedentes criminais, com a comunicação à Polícia Civil de cada Estado onde se localiza a agência. As agências da Caixa deverão manter banco de dados sobre os sacadores de prêmios durante um ano.

O disposto se aplica somente aos sacadores de prêmios que registram mais de dez premiações a serem resgatadas simultaneamente. A Caixa deverá verificar a reincidência de saques nas agências onde há suspeita de lavagem de dinheiro para apurar o fato mediante auditoria interna.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - V. Exª permite um aparte?

O SR. ALVARO DIAS (PSDB-PR) - Concederei com prazer, Senador Heráclito Fortes, não sem antes dizer que estamos apresentando um requerimento dirigido ao Ministro da Fazenda, para que, no prazo regimental, responda algumas questões, como por exemplo: quais as agências da Caixa em que foram descontados os prêmios suspeitos de lavagem de dinheiro (29 casos), conforme comunicação da própria Caixa ao Coaf, bem como os gerentes das respectivas agências à época de cada prêmio descontado desde 2002.

Como não sabemos quais os gerentes e quais as agências da Caixa Econômica, palco para os marginais da lavagem do dinheiro, estamos, portanto, requerendo a contribuição do Ministro da Fazenda, para obtermos esses esclarecimentos.

O outro requerimento é endereçado ao Tribunal de Contas, para a realização de auditoria no sistema de pagamento da loteria daquela instituição, ou seja, da Caixa Econômica Federal, visando a verificar a lavagem de dinheiro, bem como a possibilidade de manipulação de resultados. Mais uma vez, estamos nos referindo também à manipulação dos resultados.

Antes de dissertarmos sobre a forma utilizada para a lavagem do dinheiro, vamos conceder o aparte ao Senador Heráclito Fortes, que o solicitou.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Alvaro Dias, V. Exª traz corajosamente o tema a esta Casa. É preciso que realmente alguns cuidados sejam tomados. Já tivemos aqui momentos menos nobres do Congresso, inclusive com parlamentares que se notabilizaram por rotineiros ganhos em certames lotéricos. Senador Alvaro Dias, também estive analisando e pedi à Assessoria do meu Gabinete que trabalhasse num projeto de lei para regulamentar o pagamento desses prêmios. Se examinarmos a vida dos felizardos de loteria, os que ganharam grandes prêmios - não são esses casos citados por V. Exª -, veremos que a grande maioria passou por infortúnios. Há, recentemente, o caso desse senhor do Estado do Rio de Janeiro, que foi assassinado, e o mistério sobre a sua morte continua, embora haja pelo menos indícios sobre os mandantes. Alguns países adotam o pagamento progressivo do prêmio. Estou exatamente preparando um projeto de lei nesse sentido e vou pedir permissão para mandar uma cópia ao Gabinete de V. Exª, para estudo, análise e as sugestões valiosas de V. Exª. O que geralmente se vê é que a pessoa, sem nenhum preparo psicológico e emocional, com milhões na mão, desbarata fortunas e passa a viver pesadelos. Há o caso de uma brasileira que, nos Estados Unidos, ganhou numa máquina caça-níqueis, na década de 80, um prêmio de US$1 milhão. Recebeu inicialmente 20% desse valor e o restante em parcelas. Agora mesmo, um casal americano recebeu um prêmio vultoso - e o marido, inclusive, é um ex-combatente - e também está passando por esse mesmo processo. O órgão lotérico é obrigado a acompanhar psicologicamente, por meio de assistência social, os ganhadores, só permitindo retiradas maiores no caso de aquisição de imóvel ou de algum outro investimento. Vejam bem: isso tudo aprovado por uma comissão criada. Essa é uma medida para resolver o problema dos grandes acertadores. Mas penso que V. Exª acerta em cheio e complementa a idéia desse projeto quando passa a ter preocupação com esses sorteios pulverizados, que são sorteios de segunda, de terceira grandeza, em que, muitas vezes, ocorre o que V. Exª denuncia, de maneira séria e grave, nesta Casa. Parabenizo V. Exª e coloco desde já esse meu projeto para que V. Exª, se assim achar conveniente, não só dê sugestões como também, com seu brilhantismo e sua experiência, o aperfeiçoe. Muito obrigado.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Heráclito Fortes. V. Exª contribui muito. É claro que nós temos aqui razões de sobra para requerer a instalação de uma CPI. No entanto, tivemos recentemente, Senador Cristovam, a CPI dos Bingos, que tratou também desse assunto. Então, parece ser, neste momento, mais adequado adotar providências do que propriamente investigar politicamente, ou seja, por meio do Congresso Nacional, por meio de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, uma vez que já tivemos a oportunidade de realizar essa investigação e não tivemos sucesso. Todas as tentativas para esclarecer a suposta manipulação de resultados existentes têm-se frustrado. É um assunto eminentemente técnico, guardado com muito cuidado pela Caixa Econômica Federal, e não conseguimos respostas a todas as questões que foram suscitadas em razão do descontentamento principalmente de apostadores que tentam a sorte de forma reiterada.

Uma das formas pela qual pode estar ocorrendo o processo da lavagem do dinheiro de origem criminosa na Caixa Econômica é a seguinte: o interessado na ação criminosa deposita o dinheiro na agência em que existe o esquema - porque, evidentemente, há um conluio, com participação de servidores da Caixa Econômica Federal - ou é avisado por alguém da Caixa sobre a presença de um vencedor, a fim de comprar-lhe o bilhete. Essa seria uma modalidade possível do itinerário delituoso.

O itinerário prosseguiria com o comparecimento do verdadeiro ganhador do prêmio à agência, para sacar o dinheiro. Com a conivência de alguém da agência da Caixa, o prêmio é pago com o dinheiro que se pretende lavar, já depositado anteriormente. Como o prêmio pode ser descontado até noventa dias após o sorteio, o agente da Caixa, ou o interessado em lavar o dinheiro, segura os bilhetes vencedores até que atinja o valor de interesse do beneficiário da lavagem. Quando isso acontece, o bandido vai até a agência da Caixa e saca os bilhetes premiados como se fosse o ganhador.

Nesse momento, a operação se completa: a agência informa o ganhador do prêmio à central de loterias da Caixa, o qual evidentemente não é o verdadeiro ganhador. O que a Caixa informa é o nome do criminoso, autor do crime de lavagem de dinheiro.

Existem casos realmente inadmissíveis e extremamente suspeitos de que agentes da Caixa participem da operação, como o caso em que determinada pessoa descontou 107 prêmios em um mesmo dia, sendo que os prêmios apresentavam datas com diferença de até um mês e em sete modalidades de loteria.

Repito: num mesmo dia, 107 prêmios são recebidos na Caixa Econômica Federal, prêmios de datas diferentes, com até um mês de diferença, e ganhos em sete modalidades de loteria. Portanto, há um esquema organizado.

É por isso que apresentamos o projeto a que já nos referimos. Destaco, mais uma vez, que o nosso objetivo não é arranhar, da tribuna do Senado Federal, a credibilidade da Caixa Econômica Federal. Ao contrário, estamos pronunciando-nos a favor dessa instituição da maior importância para a vida do País, em função de exercitar, na sua plenitude, a função social que lhe é atribuída de forma secular. Portanto, é preciso preservar o prestígio dessa instituição e sua credibilidade, impedindo que essa ação criminosa tenha continuidade - impedindo com as providências administrativas que requeremos.

Da tribuna do Senado Federal, estamos, pois, formulando um apelo ao Presidente da Caixa Econômica Federal, ao Ministro da Fazenda e ao Presidente da República para que tomem providências contra esse abuso, contra essa ação organizada do crime na lavagem de dinheiro, que é público - e são R$32 milhões aqui referidos em 29 relatórios solicitados ao Coaf.

Esclareço, portanto, que não se trata de ação nossa contra servidores da Caixa Econômica. Tenho razões para fazer referência a esse fato, porque, quando denunciei aqui uma ação desonesta ocorrida na Caixa Econômica Federal, tentaram desvirtuar nossos objetivos, pretendendo jogar-nos contra os servidores públicos que prestam serviços à Caixa Econômica Federal.

Estamos posicionando-nos contra os maus servidores, aqueles que, em conluio com esses marginais, participam dessa operação criminosa de lavagem de dinheiro. Estamos tentando defender a integridade da Caixa Econômica Federal como instituição secular, da maior respeitabilidade em nosso País. Esse é o nosso desejo, razão do projeto e dos requerimentos aqui apresentados no dia de hoje.

E justifico, mais uma vez, aquilo que não é uma quebra de sigilo. Na verdade, ao receber essa documentação do Coaf, subscrevi documento, assumindo inteira responsabilidade pelo sigilo. Mas há momentos em que o dever suplanta a necessidade da preservação do sigilo em relação a marginais, que já estão sendo denunciados por vários crimes.

Há pessoas que se organizam em quadrilhas, para assaltar o dinheiro público e para afrontar o interesse da sociedade brasileira. Esse tipo de sigilo é danoso, é nocivo aos interesses do País, e não podemos sustentá-lo.

Por essa razão, revelamos aqui alguns números e alguns nomes, certamente com a responsabilidade de quem tem o dever, na tribuna do Senado Federal, de responder às aspirações e de corresponder às expectativas da população brasileira.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2007 - Página 2912