Discurso durante a 13ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Proposta de uma agenda para o Senado Federal e de medidas para melhoria da educação. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Proposta de uma agenda para o Senado Federal e de medidas para melhoria da educação. (como Líder)
Aparteantes
César Borges, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 27/02/2007 - Página 2934
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • NECESSIDADE, UNIÃO, GOVERNO FEDERAL, OPOSIÇÃO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, EDUCAÇÃO, VIOLENCIA.
  • APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, CRIAÇÃO, MINISTERIO, EDUCAÇÃO BASICA, SEPARAÇÃO, ENSINO SUPERIOR, IMPLEMENTAÇÃO, SECRETARIA, PROTEÇÃO, CRIANÇA.
  • NECESSIDADE, AUMENTO, CARGA HORARIA, REDUÇÃO, IDADE, CRIANÇA, INGRESSO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, UNIFICAÇÃO, AMBITO NACIONAL, SALARIO, PROFESSOR, PADRONIZAÇÃO, CONSTRUÇÃO, ESCOLA PUBLICA, REGULAMENTAÇÃO, ENSINO, CONTEUDO, PROPOSTA, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DEFINIÇÃO, RESPONSABILIDADE, EDUCAÇÃO.
  • NECESSIDADE, MODERNIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, VINCULAÇÃO, SALARIO, PROFESSOR, FORMAÇÃO PROFISSIONAL.
  • NECESSIDADE, VINCULAÇÃO, UNIVERSIDADE, EDUCAÇÃO BASICA, IDENTIFICAÇÃO, CRIANÇA, AUSENCIA, MATRICULA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, INCENTIVO, ESTUDANTE, CONCLUSÃO, ENSINO MEDIO, DEFINIÇÃO, OBRIGATORIEDADE, INCLUSÃO, ENSINO PROFISSIONALIZANTE.
  • NECESSIDADE, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, FISCALIZAÇÃO, FREQUENCIA, ESTUDANTE, AMPLIAÇÃO, NUMERO, ESCOLA TECNICA, BRASIL, MELHORIA, FORMA, ACESSO, ENSINO SUPERIOR.
  • PROPOSIÇÃO, CRIAÇÃO, ENTIDADE, LEGISLATIVO, FISCALIZAÇÃO, QUALIDADE, ENSINO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com todo o respeito que tenho a V. Exª, que ora preside a sessão, gostaria imensamente que o Presidente Renan Calheiros aqui estivesse. O que vou falar tem a ver com uma proposta direcionada a S. Exª, levando-se em conta o que S. Exª disse neste Plenário quando de sua posse, ou seja, que queria trabalhar a agenda do Senado para o Brasil. Mas, mesmo assim, peço a V. Exª, Presidente César Borges, que leve ao Presidente da Casa o que aqui vou colocar.

O SR. PRESIDENTE (César Borges. PFL - BA) - Atenderemos o pedido de V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado.

Lembro, Sr. Presidente, que há meses, Senador Mão Santa, Senador Arthur Virgílio, a política brasileira parece resumir-se na disputa interna entre os Partidos que apóiam o Governo na discussão de quem vai ou não ocupar esse ou aquele cargo, como se política fosse apenas discutir isso: ter ou não cargos. Concomitantemente, ao lado dessa disputa interna, existe uma outra disputa entre Governo e Oposição, como se nesse momento não estivesse a sociedade inteira buscando a nossa união em relação a diversos problemas brasileiros, especialmente a dois, que se relacionam, mas não são a mesma coisa: a luta pela violência e a luta pela educação. Nesse momento, não deveria haver nem Governo, nem Oposição e, sim, o Estado brasileiro. O Presidente da República, pelas notícias veiculadas nos jornais, está preparando um PAC para a educação. 

Sr. Presidente, lamento que comece desse jeito. Ou seja, trazendo a educação como conseqüência de um PAC. Aliás, sequer sabemos qual o impacto que o PAC terá na economia.

Por tudo isso, trouxe um roteiro, para ser submetido ao Presidente Renan Calheiros, Senador Arthur Virgílio, a respeito de passos que está Casa poderia dar, para, juntos, discutirmos o nosso projeto no sentido de uma revolução na educação brasileira. Trata-se de uma revolução! Repito a palavra “revolução”, mas que seja pacífica, doce, na educação. Levaríamos isso ao Presidente, porque, nos próximos quatro anos, ele será o condutor do Executivo.

Não estou a dizer que essas propostas sejam certas, mas podem ser o ponto de partida para a nossa discussão. Portanto, vou entregar uma carta ao Presidente Renan Calheiros.

O primeiro ponto, Senador Arthur Virgílio, é o Governo Federal dizer que a educação é uma questão nacional e não municipal ou estadual. Para isso, tem que se tomar duas atitudes: a primeira, transformar o Ministério da Educação em Ministério de educação de base. Não haverá prioridade na educação, a nível nacional, enquanto o MEC cuidar da educação de base e das universidades, porque as universidades são poderosas, têm sindicatos, associações, usam gravata, são amigos do Ministro. Professorinha, lá debaixo, não é. Não existe sindicato de analfabetos nem de crianças. Não é preciso se criar mais Ministérios. Pega-se o Ensino Superior e o coloca no Ministério de Ciência e Tecnologia, como é em diversos países do mundo, aliás, como é no Estado de São Paulo. Nas universidades paulistas, o chefe delas não é o Secretário de Educação, mas sim o Secretário de Ciência e Tecnologia. A segunda, criar uma agência de proteção da criança. Uma das boas coisas do Governo Fernando Henrique Cardoso foi a criação das agências para cuidar da água, da energia. Mas não se criou uma agência para proteção da criança. Se criarmos a agência de proteção à criança e o Ministério de Educação de Base, começaremos a ter as condições para, de fato, fazer o que o Presidente Lula está chamando de PAC da educação, e que, penso, deveria ser a “revolução da educação”. Com esses dois órgãos, o Governo Federal começaria a intervir.

O passo seguinte é definir que teremos, sim, todas as escolas do Brasil funcionando em horário integral, mas sem mágica - são 164 mil escolas - em dez, quinze anos. Em menos tempo que isso, é impossível! Se todo o dinheiro do mundo existisse para a educação, não conseguiríamos fazer isso em menos de dez, quinze anos. Há uma lógica, uma mecânica, como fazer Itaipu levou doze anos.

Agora, como fazer? Como se começou em 2003. Escolhem-se cidades, e começamos pelas cidades. Aquilo que Brizola fez por escolas, com os CIEPs, faríamos por cidades inteiras. Um governo que queira, em quatro anos, terá mil cidades brasileiras com todas as escolas funcionando em horário integral. Comecemos pelas pequenas e, ao mesmo tempo, vamos fazer com que, nas outras cidades que não terão essa escola ideal, 10% das escolas sejam transformadas em horário integral ao ano. Isso significa professores bem remunerados nessas cidades, escolas que precisam ser derrubadas para se fazer outras, porque as de hoje não são escolas, e ser equipadas. É preciso fazer com que elas, de fato, sejam escolas, porque as de hoje são quase escolas, semi-escolas, mas não são escolas.

Hoje, está no Correio Braziliense uma criança dizendo que vai para a escola até a hora da merenda. Na verdade, Senador Arthur Virgílio, nossas escolas hoje são restaurantes mirins populares. Não são escolas.

Terceiro, definir padrões nacionais. Não é possível que o padrão de uma escola seja municipalizado. As 164 mil escolas deste País têm de ter o mesmo padrão, volto a insistir, sem mágica, sem querer fazer, em um ano, dois, três, quatro, cinco, dez, quinze que seja, mas começando já.

O primeiro padrão é de salário e formação do professor. Como o Banco do Brasil possui. O salário do funcionário do Banco do Brasil não depende da cidade, sua formação foi escolhida por um concurso público nacional, não municipal. Vamos fazer com que o professor tenha uma carreira nacional, com um salário nacional.

O segundo padrão é de edificações e equipamentos. Vinte mil escolas no Brasil não têm luz; vinte e duas mil não têm água. Quase nenhuma tem computadores. Nas que possuem, os professores não sabem usar. Se colocarem computadores nas que não têm, os computadores serão roubados em breve porque os prédios não têm condições de segurança para mantê-los. Vamos definir um padrão nacional. Vamos criar uma lei de habite-se federal para que, quando o prefeito quiser inaugurar uma escola, haverá um padrão nacional, e não conforme ele quiser.

O terceiro padrão é de conteúdo. Não podemos continuar com 44% das crianças sem saber ler, na quarta série. Não estou falando das crianças que saíram da escola antes. Criança tem de aprender até os sete anos. Criança tem de saber o seguinte de aritmética até os doze anos. É preciso definir padrões nacionais. Agora, será pura conversa mole se não fizermos duas coisas: definir metas para serem cumpridas, cidade por cidade - metas federais -, e uma lei de responsabilidade educacional. Tem gente que diz que isso fere a federação. Mas e a Lei de Responsabilidade Fiscal, que foi uma das grandes conquistas deste País, da qual V. Exª, Governador, foi um grande cumpridor? Deu exemplos disso na Bahia. É uma lei federal. V. Exª não disse que na Bahia não se cumpriria a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ao contrário, V. Exª tem um exemplo cumprido. Por que a Lei de Responsabilidade Educacional não pode ser federal? Se definirmos metas e, ao mesmo tempo, definirmos uma Lei de Responsabilidade Fiscal, começaremos a cumpri-las.

Agora, isso não pode ser feito sem recursos federais - e vou falar no final.

Outro ponto é recuperar os equipamentos, tanto os da obra civil quanto os equipamentos pedagógicos. Não é a escola um prédio que não tem o número de salas correto. Não é escola a que não tem o número de computadores. Volto a insistir: não se pode fazer isso rapidamente, tem de ter quase a mesma velocidade das crianças crescendo pela biologia. Mas tem de começar já e definir.

Outro ponto é abrir as escolas à população. Já repararam que, quando vamos a uma escola, nós a encontramos depredada, ao lado de um posto de saúde inteiro, de um Banco do Brasil inteiro, de uma Caixa Econômica inteira, do prédio dos Correios inteiro. Mas a escola, depredada! Por quê? Porque as pessoas não sentem relação com a escola: a maior parte dos jovens, porque já foi expulsa, então não gosta da escola; os pais, porque não vêem resultado na escola; e as crianças porque não gostam de ir estudar. É preciso que haja uma melhoria da edificação, uma melhoria dos equipamentos, formação do professor, salário do professor e abrir as escolas para atrair as famílias, para que sintam que a escola é parte da comunidade. Eu estava até brincando, nesses dias: a única coisa para a qual a escola se abre é para o dia das eleições e, como hoje o cidadão tem raiva de político, termina ficando com mais raiva ainda da escola, porque é lá que eles escolhem os Senadores, os Deputados e Governadores. É preciso abrir para as boas coisas, abrir inclusive sabendo que escola de horário integral não cabe em quatro paredes, exige quadras, auditórios para música. E isso pode ser aberto à sociedade.

Além disso, é preciso modernizar o conteúdo. Nosso conteúdo está atrasado. É preciso que as crianças aprendam, desde o começo, noções de cidadania - o que é um orçamento público; noções de ética - o que é a honestidade; pelo menos um idioma a mais, de preferência inglês ou espanhol, mas, se quiserem outro, que seja outro. Como hoje as classes médias aprendem em horário extra, é preciso que todos aprendam no horário da própria aula, na escola integral. 

Depois, é preciso valorizar, formar e motivar o professor. Não adianta aumentar salários se não melhorarem nem a formação, nem a motivação, nem o resultado. Aumentar o salário pura e simplesmente é jogar dinheiro fora, salvo o ponto de vista de dinamizar a demanda local. É preciso vincular salário e formação, salário e dedicação, salário e resultado. É preciso criar uma carreira nacional do magistério.

Além disso, é preciso criar uma rede nacional de formação de professores. Não dá para fazer essa rede sem as universidades, mas não dá para fazê-la somente nas universidades. A carreira de diplomata neste País tem o Instituto Rio Branco, para onde vão muitos que saem das universidades e dos cursos de Relações Internacionais. Vamos fazer algo desse tipo para o magistério. Escolas que formam os professores, como as escolas normais que existiam, mas de uma maneira ainda melhor, permitindo que contratemos universidades para fazer isso também.

Aí, Senador César Borges, está a importância de haver dois Ministérios. Estando o Ministério da educação de base separado do Ministério do ensino superior, há a possibilidade de convênios entre eles. Se não houver convênios, a universidade não vai ligar para a educação de base. Contudo, se o Ministério de Educação de Base diz para o Ministério do Ensino Superior: “Eu vou lhe passar R$500 milhões, mas você vai formar 100 mil professores”, começam a mudar as coisas. Além disso, é mister retomar projetos que já existem de dar privilégios, no sentido positivo, aos professores. Deveria haver um programa de casa própria, distribuição de computadores e doação de livros aos professores. Enquanto professores não forem figuras vip neste País, não teremos a educação que esperamos. Certa vez, uma criança perguntou minha opinião sobre um país bom. Eu disse-lhe que seremos um país bom no dia em que, ao nascer uma criança, o pai a ponha no colo e diga que, quando crescer, será professora. Então, vamos começar a ter uma boa escola. Mas não vai ocorrer isso se não houver salário, apoio e, ao mesmo tempo, cobrança, exigência para que o professor dê aula. Não há como existir uma boa escola, se professores ficam em greve. Não é possível! Deve-se descobrir uma maneira de tornar a greve desnecessária mediante uma instituição que faça a mediação entre o Estado e o Magistério, para que a criança, Senador Flávio Arns, não seja quem pague o preço da greve. É falso dizer que, depois da greve, se recupera o tempo perdido. Não se recupera integralmente, jamais o tempo perdido em uma greve de 100 dias, primeiro porque alguns adolescentes não voltam mais à escola; segundo, os que voltam não têm o mesmo interesse; terceiro, os que voltam com interesse perderam a parte que não vão mais recuperar.

Além disso, é preciso que o Presidente da República assuma o papel de tratar os professores com o respeito e o carinho de que precisam; receber, de vez em quando, os representantes deles, tratando-os com intimidade, como faz com jogadores de futebol e atletas. Isso é fundamental.

O outro é envolver a universidade na educação de base. Hoje, a universidade está alienada da educação de base. Ela tem de envolver-se. Para isso, tem que haver recursos e compromisso.

Outro ponto, Senador Arthur Virgílio, é o compromisso com a universalização da freqüência às aulas até à conclusão do ensino médio. Nós nos acostumamos a dizer que o Brasil universalizou a educação de base. Não é verdade. O Brasil chegou a 95% de matrícula, mas matrícula não significa freqüência; freqüência não significa assistência; assistência não significa aprendizado; e aprendizado não significa conclusão. Tem gente que freqüenta, mas não assiste às aulas. Tem gente que assiste, mas não aprende. Tem gente que aprende, mas não conclui o ensino médio.

Como fazer com que as crianças concluam o ensino médio? Primeiro, é ter um programa de acompanhamento desde a pré-escola. E aí a Senadora Heloísa Helena, que não está mais nesta Casa, deu sua contribuição, colocando na Constituição uma emenda que obriga o Estado a garantir creche para todas as crianças em idade pré-escolar. Não dá para fazer isso rápido, mas dá para começar já.

Enquanto não há creche para todos, dá para instituir-se um programa de assistência que garanta comida e brinquedos pedagógicos e que use o Bolsa Família, do qual o Governo tanto se orgulha, vinculando-o ao bom atendimento das crianças em idade pré-escolar.

Outro ponto, para universalizar, é colocar a criança desde os quatro anos na escola.

Hoje, fala-se o tempo todo em reduzir a maioridade penal, e ninguém fala em reduzir a idade de se entrar na escola. Nem discuto, Senador Arthur Virgílio, se se deve, ou não, reduzir a idade penal. Acho que isso não vai reduzir a criminalidade, mas prefiro não debater se é ou não necessário neste momento. Agora, reduzindo-se ou não a maioridade penal, é preciso reduzir a idade de ingresso na escola para quatro anos.

Trata-se de uma simples lei, garantindo-se a toda criança uma vaga, no dia em que fizer quatro anos, na escola mais perto de sua casa. Uma lei simples que vai criar a demanda, que não passa hoje de uma necessidade!

Outro ponto é identificar onde estão 1,5 milhão de crianças que não vão à escola ainda e que nem se matricularam e trazê-las para dentro da escola. O Governo Federal já dispõe do mapa da exclusão social feito em 2003; treinou presencialmente cinco mil agentes e 30 mil por ensino a distância, para que soubessem como ir às famílias, identificar as crianças e trazê-las para a escola.

Outro é criar esse programa, cujo exemplo foi o Distrito Federal, que complementava a Bolsa-Escola. Havia um programa chamado Poupança-Escola, pelo qual a criança, quando passava de ano e se matriculava no ano seguinte, recebia R$100,00 em uma caderneta de poupança, da qual não podia retirar o dinheiro, se não concluísse o ensino médio.

Esse, sim, é um incentivo que ajuda a criança, primeiro, a estudar, para passar de ano, porque vai receber o depósito; segundo, a ficar até o fim do ensino médio, senão perde o dinheiro. Esse programa deu provas de que funciona. O Governo de Minas Gerais - de Aécio Neves - o está criando. Por que não fazer isso nacionalmente? Custa pouquíssimo! Primeiro, é uma vez por ano; segundo, o dinheiro é escritural - basta o Banco Central dizer que ele está depositado, porque só se vai precisar dele alguns anos depois -; terceiro, muito mais barato do que o custo da repetência. Por que não faz isso?

O outro é retomar o compromisso da Bolsa-Escola. Mantido o atual sistema do Bolsa Família, não se vai garantir a permanência até o final do ensino médio.

O Senador Osmar Dias me antecedeu, falou sobre isso - não deu para fazer um aparte. Queria lembrar que o conceito inicial de Bolsa-Escola é o de remuneração por um trabalho: o da mãe, de ser fiscal da freqüência da criança às aulas. Quando eu era menino, existiam - o Senador Mão Santa se lembra disso - os fiscais pagos pela União, funcionários do Ministério da Educação que iam aos colégios, para ver se as crianças iam à aula. Em vez de contratar funcionário, paga-se à própria mãe da criança, que assim estuda. É um projeto que tem a saída por intermédio da criança, quando ela conclui o ensino médio.

Outro é determinar a obrigatoriedade do ensino médio. Não é possível que, em pleno século XXI, só seja obrigatório no Brasil o ensino fundamental. Nenhum Governador está deixando de cumprir suas obrigações, se não oferecer vagas para meninos de 15 anos que já tenham concluído o ensino fundamental. Tem que ser obrigatório.

Outro é ampliar a duração do ensino médio e fazer com que o jovem adquira um ofício. Amplia-se para quatro anos, e ensina-se o ofício. Mas não só ofícios técnicos, mas também artísticos - música, pintura -, para que ele aprenda e, ao sair do ensino médio, se não entrar na universidade - não vão entrar todos, nem há necessidade disso -, possa ter seu ofício.

Outro, para não dizerem que não estou falando bem das coisas do Governo, é ampliar o ProJovem, que é um programa que o Governo Lula fez - mas deste tamanhinho. Ele não está dando a dimensão que deveria a um programa que é fundamental para trazer de volta os jovens que já saíram da escola.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Professor Cristovam Buarque, V. Exª me permite um aparte?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Cedo um aparte ao Senador Mão Santa, pedindo ao Presidente que me conceda a gentileza...

Sr. Presidente, cedo o aparte ao Senador Mão Santa, pedindo a V. Exª que me conceda a gentileza de dar-me, numa segunda-feira, algum tempo mais, para concluir esta fala.

Senador Mão Santa, ouço V. Exª.

Perdão, Senador César Borges.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - V. Exª pode conceder-me após... 

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Cristovam Buarque, um quadro vale por 10 mil palavras. Bem ali no Chile, um ex-Ministro da Educação, como V. Exª, o ex-Presidente Ricardo Lagos, assinou uma lei que obriga o chileno a ter 12 anos de educação - tinha oito. A grande vitória dele foi esta: 12 anos de educação e falar dois idiomas. Bem ali no Chile. Então, V. Exª está trazendo o que já deveríamos ter conseguido no Brasil.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador César Borges, ouço V. Exª.

O Sr. César Borges (PFL - BA) - Senador Cristovam, eu queria, em primeiro lugar, parabenizar V. Exª por seu pronunciamento, que é uma verdadeira aula e - diria - o roteiro que deve ser adotado por alguém que tenha compromisso real...

(Interrupção do som.)

O Sr. César Borges (PFL - BA) - ... com este País, com o futuro do Brasil. Não podemos conviver com esta dualidade, em que a violência campeia, em que se fala que o problema é social, com uma gravidade que assusta todo o País, enquanto a educação é tratada da forma como está sendo tratada. O Governo, na verdade, está trapaceando com a opinião pública nacional, porque não haverá solução para nossos problemas sem educação. Todos sabem disso. V. Exª está falando com muita clareza e dando um roteiro que pode ser seguido. Mas não há compromisso verdadeiro do Governo com isso. Veja as recentes avaliações da qualidade do nosso ensino, do Enem... Há exemplos, no Piauí, de escolas privadas que estão seguindo, realmente, o seu roteiro de qualificação do professor e de prestígio da relação entre pais e alunos. E o ensino público sem nada disso. Hoje, os jornais estão noticiando os dez anos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, e o que temos a comemorar, se só 33% dos que freqüentam o ensino fundamental vão para o ensino médio, que V. Exª está pregando que seja obrigatório? Onde estão esses jovens que não estão sendo educados? Agora, em lugar disso, dá-se a Bolsa Família, programa assistencialista para manter a mesma situação. Então, estamos como avestruzes, expostos a essa situação que V. Exª chama, inclusive, de guerra civil não-declarada da violência. Enquanto isso, a educação, base do desenvolvimento de qualquer país em qualquer parte do mundo... Aqui não se segue o roteiro. V. Exª esteve como Ministro da Educação, mas preferiram fazer esse loteamento de cargos a manter uma pessoa com a qualificação de V. Exª no Ministério da Educação. Muito obrigado. Parabéns pelo pronunciamento.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.

Quero mostrar por que o Governo não dá importância à educação de base.

O Ministério da Educação cuida, ao mesmo tempo, das universidades e da educação de base. Portanto, como nas universidades estão repassando o dinheiro, como nas universidades tem o ProUni, como nas universidades tem mais vagas, eles não se preocupam, porque têm o que mostrar. Entenderam Senadores Mão Santa e Flávio Arns? Enquanto não separarmos o ensino superior do ensino de base não haverá uma cobrança sobre o Governo Federal do que acontece na educação de base. É por isso que todos os resultados negativos da educação de base, nas últimas semanas, não tocam no Governo Federal, não tocam no Ministério da Educação. O Ministério da Educação não se sente responsável pelo fato de estarmos atrás do Haiti na repetência, pelo fato de que o Enem mostrou que piorou o aproveitamento das crianças, porque isso é dos Estados e Municípios. Tem que trazer para a responsabilidade do Governo Federal a questão da educação de base.

Mas continuando aquilo que precisamos fazer.

Outro ponto - e que vai dizer bem ao Senador que agora preside, Paim - é ampliar o número de escolas técnicas no Brasil. Temos que dobrar o número de escolas técnicas e, ao mesmo tempo, fazer programas de formação ad hoc para jovens, porque não adianta, Senador Mão Santa, criar uma escola para a eletrotécnica, porque formamos técnicos para isso e daqui a alguns meses os professores e os equipamentos vão ficar ociosos, porque não haverá mais necessidade até cinco anos depois. Uma série de cursos não exige escola especial para isso. É contratar professores ad hoc, momentaneamente.

O Governador Blairo Maggi, do Mato Grosso, tem dado um exemplo de como isso é possível. Ele identifica o que é preciso para o próximo ano e dá cursos específicos para aquele ano. Aqueles professores ficam, depois, dispensados, até anos depois.

Outro, é acabar com o vestibular. Não, contudo, para zerar. Tem de haver um sistema de seleção. O sistema que defendo, o qual Brasília deu o exemplo, a UnB já utiliza há dez anos, é uma seleção dentro do ensino médio.

Aqui, Senador César Borges, a UnB escolhe os seus alunos fazendo uma prova no final da 1ª série do 2º grau; outra, no final da 2ª série e uma última, no final da 3ª série do 2º grau. A média é que escolhe os alunos. Com isso desaparece aquela tragédia do vestibular único e se obriga o jovem a estudar durante todo o ensino médio.

Agora querem substituir o vestibular pelo Enem. É a mesma coisa, só que o exame é feito pelo MEC, e não pela universidade, porque é feito no final do 3º ano. A seleção tem de ser feita ao longo da formação do aluno, para que ele estude.

Outro ponto: é preciso envolver as famílias e os meios de comunicação na educação. Educação é escola, família e mídia. Não existe escola que seja capaz de dar educação sozinha. Sobre esse envolvimento, lembro-me de que em 2003 pedi ao Presidente Lula que o seu primeiro pronunciamento à Nação fosse no dia da volta às aulas. Ele falaria, como Presidente da República, um mês depois da posse, às crianças: “Hoje é o dia mais importante da vida de vocês, crianças brasileiras!” Isso seria para dar importância a esse envolvimento da família e da mídia.

Nesse sentido, há um projeto, Senador Pedro Simon, que é perfeito! Que cada televisão seja capaz, livremente, sem o Estado - nada de horário na Voz do Brasil -, com intervalo comercial para que ganhe dinheiro, de fazer programas educacionais durante o horário nobre, programas sobre história, como algumas novelas conseguem ser, como o Globo Repórter consegue ser, mas, que haja horário de formação educacional durante o período do horário nobre.

O outro ponto é criar um sistema nacional de avaliação. É preciso ter um TCU da educação no Brasil. Agora, não dentro do MEC, tem que ser fora do MEC, tem que ser vinculado ao Congresso e não ao Poder Executivo. Imagine se o TCU fosse um órgão do Poder Executivo? Não é menos importante avaliar a educação do que fiscalizar os gastos públicos. É preciso, sim, que tenhamos o TCU da educação, e é preciso criar canais de televisão vinculados a complementar a escola da criança. A criança assiste à aula pela manhã, chega no começo da noite e liga o canal do 1º Grau e terá a complementação do que aprendeu; liga o canal do ensino médio e terá a complementação; liga o canal da escola técnica e terá a complementação. Ao mesmo tempo em que é preciso trazer para valer a Universidade Aberta Darcy Ribeiro.

Defendo também, Sr. Presidente - e terminarei em poucos minutos -, algo que quero chamar a atenção: descentralização gerencial. Quando falo em federalizar, Senador Arthur Virgílio, são os critérios, não a gerência. Gerência até radicalizo.

Acho que podemos considerar como sendo uma escola pública aquela gerenciada pelos pais e pelos mestres, sem a intervenção do Estado. Agora, o Estado define, avalia a qualidade.

Para concluir, três pontos: quanto custa não fazer isso? Porque se pergunta muito quanto custa fazer; e quanto custa não fazer? A Coréia tinha a metade da renda per capita brasileira quarenta anos atrás; hoje tem duas vezes a renda per capita brasileira, é como se fosse quatro vezes. Pelas contas que faço, o nosso PIB, hoje de R$2 trilhões, poderia ser de R$6 trilhões se tivéssemos feito há quarenta anos o que a Coréia fez. Mas é preciso ver quanto custa fazer.

Fazer isso, hoje, custa R$7 bilhões por ano, além dos R$55 bilhões que se gasta hoje, 15% a mais. R$7 bilhões é menos de 1% da renda do setor público, é 0,3% da renda nacional. É muito pouco, Senador Paim, para darmos o salto e muito menos do que custaria não fazer.

Finalmente, peço a sua paciência, Senador Paulo Paim, nada disso vai ser feito se não fizermos uma grande...

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Cristovam Buarque, vou-lhe dar mais um minuto para concluir, pois já lhe concedi oito minutos além do tempo regimental.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Espero que não seja creditado a mim, mas à educação.

O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Com certeza.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Arthur Virgílio, para V. Exª, como Líder da Oposição, é importante o que vou dizer aqui. Creio que nada disso será feito se não fizermos uma grande coalizão neste País, mas não uma coalizão para sabermos quem vai ter cargo e nem a coalizão só dos partidos que estão apoiando o Governo; tem que ser uma coalizão do Estado brasileiro. O Presidente da República que quiser fazer isso tem que chamar a Oposição, porque isso vai levar 15 anos para ser feito, e em 15 anos o governo não será mais do mesmo partido porque a democracia exige renovação.

Por isso, concluo, sem entrar nos detalhes, defendendo que o Presidente Lula substitua essa idéia de coalizão governamental dos partidos que o apóiam por uma coalizão de Estado, das lideranças brasileiras, para fazer a revolução de que o Brasil precisa. Em vez do PAC, o PRE - Programa de Revolução na Educação brasileira! 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/02/2007 - Página 2934