Discurso durante a 23ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise da renúncia do Ministro Nelson Jobim à disputa pela presidência do PMDB. Questões econômicas envolvidas na visita do Presidente dos Estados Unidos ao Brasil.

Autor
José Maranhão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: José Targino Maranhão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.:
  • Análise da renúncia do Ministro Nelson Jobim à disputa pela presidência do PMDB. Questões econômicas envolvidas na visita do Presidente dos Estados Unidos ao Brasil.
Aparteantes
Garibaldi Alves Filho, Leomar Quintanilha, Valter Pereira.
Publicação
Publicação no DSF de 10/03/2007 - Página 4838
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. POLITICA EXTERNA. POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, MOTIVO, APOIO, NELSON JOBIM, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CANDIDATURA, PRESIDENCIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), AUSENCIA, RESTRIÇÃO, MICHEL TEMER, DEPUTADO FEDERAL, DEFESA, REVEZAMENTO, FUNÇÃO.
  • ANALISE, HISTORIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), EXPECTATIVA, RECUPERAÇÃO, CRISE, DISPUTA, PRESIDENCIA, ESCLARECIMENTOS, MOTIVO, RECUSA, CONVITE, PARTICIPAÇÃO, CHAPA, DEFESA, UNIÃO, PRESERVAÇÃO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA.
  • COMENTARIO, INTERESSE, VISITA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AUSENCIA, ACORDO, VANTAGENS, ECONOMIA, BRASIL, NEGOCIAÇÃO, SOBRETAXA, ESPECIFICAÇÃO, PRODUÇÃO, CANA DE AÇUCAR, COMBUSTIVEL ALTERNATIVO, ALCOOL.
  • ANALISE, PREJUIZO, BRASIL, DESENVOLVIMENTO, TECNOLOGIA, METALURGIA, AGRICULTURA, AUSENCIA, FAVORECIMENTO, NEGOCIAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MANIPULAÇÃO, PRODUTO PRIMARIO.
  • DEFESA, AUTONOMIA, ECONOMIA NACIONAL, INVESTIMENTO, PRODUTO, DERIVADOS, CANA DE AÇUCAR, PREPARAÇÃO, SUBSTITUIÇÃO, COMBUSTIVEL, POLUIÇÃO, MEIO AMBIENTE.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, esta sessão se alongou naturalmente pelo privilégio da manifestação de V. Exª, que faz discursos longos, mas substanciosos. Senador Mão Santa, agradeço a advertência prévia. Prometo que não vou ultrapassar o limite de sua expectativa.

Farei dois breves comentários. Trouxe discurso escrito relativo ao tema abordado pelo Senador Marcelo Crivella, mas, por amor ao tempo, vou deixá-lo para outra oportunidade. Farei breves comentários sobre dois fatos da atualidade. O primeiro deles diz respeito aos incidentes que resultaram na renúncia à candidatura do Ministro Nelson Jobim ao cargo de Presidente do PMDB.

Desde o primeiro momento, dei meu apoio à candidatura do Ministro Jobim por acreditar que se fazia necessária uma renovação nos quadros dirigentes do nosso Partido até como uma regra de prática democrática interna que o PMDB sempre adotou com competência e habilidade.

Sou amigo pessoal, companheiro de longas datas do Presidente Michel Temer e, evidentemente, não tenho nenhuma restrição a lhe fazer. Apenas o exercício democrático da alternância de poder me inspirou a uma candidatura que realmente poderia inovar as práticas gerenciais dentro do PMDB.

O PMDB - vou ser mais otimista do que alguns colegas que já se pronunciaram aqui e companheiros de Partido - sempre teve, historicamente, o instinto da preservação, por isso resistiu às agruras do tempo da ditadura militar. E tenho memória viva disso, porque estou no PMDB desde a sua fundação e, após o regime ditatorial de 64, não conheci outro partido, outra legenda partidária. Mesmo tendo sido cassado, em 1969, pelo AI-5, nunca deixei de exercer a prática político-partidária. Apesar das ameaças e da efetivação dessas pelos órgãos de informação, que não permitiam que um cassado tivesse qualquer tipo de atuação política, nunca deixei de exercer minha atividade política. Por isso, várias vezes fui intimado, tive que responder a outros inquéritos, além do que me levou à cassação; segundo eles, eu estava ilegalmente participando de movimentos políticos, dentro ou fora do meu Estado.

Então, tenho amor profundo a esse Partido. Minha história política foi praticamente toda dentro do PMDB. Antes de 1964, era membro do PTB, quando ele era uma proposta socialdemocrática - muito jovem, deixei-me envolver por essas propostas. Só deixei o PTB quando, em 1966, os partidos foram extintos e abriu-se a perspectiva de filiação a novos partidos. Filiei-me, então, ao MDB.

De maneira que minha visão sobre o momento que estamos vivendo agora é a de que o PMDB encontrará inspiração na sua própria história, para superar essa crise.

A história do PMDB é a de um partido que tem o próprio instinto de preservação; que nasceu na dificuldade, no ostracismo, na perseguição do regime militar, em que muitos dos seus companheiros tombaram por atos discricionários de cassação de mandatos e de suspensão de direitos políticos.

Por que, então, o PMDB, em plena vivência da democracia restaurada no País, hoje, neste ano de 2007 da graça do Senhor, não saberá superar essas crises?

Tenho certeza de que o PMDB saberá superar essas crises pela ação de todos os nossos companheiros, mas, sobretudo, pela ação inteligente e competente de suas lideranças, como o Presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros, como o Presidente José Sarney e o próprio Presidente Michel Temer.

Acho que chegou a hora - já que estamos, pelas imprevisões do acontecimento, submetidos a uma única candidatura - de o PMDB encontrar o caminho da sua própria história. O PMDB não pode, nem deve dividir-se por questões menores, de poder, como a que envolve a determinação do grupo que vai predominar, se o grupo A ou o B. Essas são questões secundárias. O PMDB tem um papel importante, e, hoje, como um partido da base de sustentação, tem um papel fundamental na própria governabilidade. Essa é a minha posição, esse é o meu pensamento.

Ontem, tive a honra de receber, no meu gabinete, a visita do Deputado Michel Temer, do Deputado Geddel Vieira e do Deputado do meu Estado, meu companheiro da Paraíba, Wilson Santiago, e os três me fizeram um convite para que eu integrasse a chapa, que será vitoriosa, fatalmente, na convenção que se realizará no domingo. Agradecendo o honroso convite e a visita também, disse-lhes que não podia aceitar integrá-la, porque era uma chapa única. Não queria ser visto por ninguém, dentro e fora do Partido, como um oportunista; isso era algo que fugia à minha visão ética da política. Estava honrado com o convite, mas não podia aceitá-lo.

Conversando com o Presidente Renan Calheiros, ontem, pela manhã, já tinha ouvido de S. Exª a orientação de que os nossos companheiros estavam liberados para assumirem a posição que quisessem. Essa era a minha posição, porque costumo ser coerente e, sobretudo, costumo honrar os compromissos políticos que faço.

Já estou telefonando a todos os companheiros da Paraíba - são 27 votos no Estado - para dizer-lhes, como já disse a muitos, que a nossa orientação é no sentido de que fica a critério de cada delegado votar, comparecer, ou não votar, não comparecer. Fica a juízo de cada um essa decisão, até porque penso que não seria democrático, nem seria um gesto de zelo com o Partido, no momento das dificuldades que estamos enfrentando, acrescentar mais esta ação: a de deixar marcada numa convenção, num gesto de intolerância, a posição de divisão dentro do Partido.

Continuo, Srªs e Srs. Senadores, companheiros que estão me ouvindo, acreditando na força do instinto de preservação do nosso Partido. Já passamos por dificuldades muito maiores, quando do regime autoritário de 1964, e aqueles que escreveram a história da democracia, a história mais recente da redemocratização no País registraram todos esses episódios. De forma que acredito que o PMDB, mais uma vez, vai restaurar sua unidade e certamente vai voltar aos tempos de glória, aos tempos de prestígio - algo que sempre teve na opinião pública do País.

Aqui foi ressaltado por todos os companheiros - e o faço também - a realidade de que o PMDB é o maior Partido do Brasil, é o Partido que tem maior capilaridade com a sociedade, alastrando-se em todos os seus segmentos, em todas as classes sociais. Isso, porque o PMDB tem a marca da tolerância, que é um dos fundamentos da nossa origem. Quando se instaurou no Brasil, por força de um ato institucional, o regime do bipartidarismo, o MDB era uma frente de oposição...

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Ali estavam os homens das mais diferentes tendências ideológicas, programáticas, integrados no PMDB porque existia um compromisso comum entre todos eles: lutar pela restauração da democracia no Brasil. Então, é da própria essência do PMDB esse pluralismo político. Por isso mesmo, não há por que se pensar que uma eventual divergência possa levar o Partido a sofrer maiores abalos. Creio firmemente que, na sua sabedoria, sobretudo no resgate da sua história, o PMDB haverá de sair-se galhardamente dessas dificuldades.

Com muita honra, concedo o aparte ao Senador Garibaldi Alves Filho.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador José Maranhão, quero ficar ao lado de V. Exª no otimismo, na crença de que o PMDB vai superar mais esse episódio, que não é até um episódio de dimensões tão catastróficas como se imagina, ou como se diz, ou como se propala. É um episódio que será superado. Creio apenas que devemos ser coerentes. Já que adotamos uma posição com relação ao episódio, vamos permanecer com ela. Mas se, amanhã, for dada a oportunidade de unir o Partido, quero estar ao lado de V. Exª - aliás, V. Exª estará à frente; quero ficar atrás, conduzido por V. Exª, no sentido de unir o Partido.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - E eu reivindico ficar ao lado de V. Exª; nem à frente, nem atrás.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Muito obrigado, Senador José Maranhão. Vamos ouvir agora o Senador Valter Pereira, com a licença do orador.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Que fez hoje um brilhante e forte discurso. Não estava no plenário ainda, mas acompanhei da minha residência. Estava com o televisor ligado e, quando vi o Senador Valter na tribuna, imediatamente me desdobrei em atenção para acompanhar o seu discurso.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Muito obrigado, Senador José Maranhão. De fato, eu já havia me pronunciado nessa mesma direção que V. Exª está pontilhando, que é a direção da maioria esmagadora dos Senadores. V. Exª fala com muita responsabilidade, como o fez, em aparte, o Senador Garibaldi Alves. Todos nós temos muita responsabilidade com esse Partido. Por uma questão de coerência, V. Exª, o Senador Garibaldi, eu, o Senador Leomar e tantos outros estamos fora dessa chapa que vai empalmar o Diretório Nacional do PMDB a partir de amanhã. Indiscutivelmente, assistiremos a um empobrecimento na representatividade dessa nossa composição. Não pela minha ausência, mas pela ausência até de figuras históricas do Partido, como o Senador Pedro Simon, como o Senador Jarbas Vasconcelos. O Senador Pedro Simon, nos anos 60, quando a filiação de um militante era uma obra demorada e difícil - você tinha que ir a casa dele, esconder o carro e usar de muita argumentação para convencê-lo a assinar uma ficha de filiação; aliás não havia nem ficha, V. Exª deve se lembrar, era um livro de inscrição.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - É verdade.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Quando pegávamos o livro de inscrição e tínhamos que pegar a assinatura, ele tremia de medo de assinar o livro de filiação do MDB, porque sabia que, a partir daquele momento, estava na alça de mira dos militares e poderia ser preso a qualquer hora. Como aconteceu comigo, que fui preso três vezes na época da ditadura, uma das quais tive que ficar 12 dias instalado em unidades militares. Digo unidades porque a gente andava também, passeava de uma unidade para outra. Pois bem, naquela ocasião, Senador José Maranhão, em Campo Grande, preparávamos uma grande recepção - várias recepções, não foi uma só -, para quem? Para recepcionar uma caravana que tinha Pedro Simon, que tinha Paulo Brossard, que tinha, mais tarde, Odacir Klein, que tinha João Gilberto, que tinha Freitas Nobre, que foi nosso líder em 1979. Enfim, essa é a história.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Foi em 1983. Freitas Nobre foi líder do PMDB em 1983.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Em 1979 e em 1983.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Foi exatamente quando eu voltei, depois do exílio político.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - É verdade.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Fui candidato a Deputado Federal e assumi em 1983. O nosso Líder de Bancada era Freitas Nobre.

O Sr. Valter Pereira (PMDB - MS) - Era Freitas Nobre, grande Líder! Então, o que aconteceu? Hoje, temos o coração partido. Sei que V. Exª fala com serenidade e com muita responsabilidade, mas sei que seu coração está partido não por não participar do Diretório, mas por ver o Partido em uma situação deplorável com essa defecção que ocorreu. Concordo com V. Exª: a ausência de figuras tão históricas e tão importantes, como essas que estamos lembrando aqui, não haverá de afrouxar a nossa determinação para que o Partido tenha um encontro, amanhã, com seu grande destino novamente. Isso aqui haverá de ser apenas uma variante, mas amanhã vamos encontrar a unidade novamente. Concordo com V. Exª que esse é um episódio passageiro, e não é pelo fato de estarmos fora da chapa que vamos nos abster de lutar para que se estabeleça a unidade. Lá estarão outras figuras importantes que estiveram nesse processo, como o Senador Mão Santa, que vai ser, certamente, nosso porta-voz no Diretório Nacional nessa missão de resgatar a unidade partidária, que foi trincada agora, mas que, certamente, será restabelecida amanhã. Parabéns a V. Exª por deixar consignado nos Anais desta Casa essa sua preocupação e pela forma com que se conduz, com responsabilidade, com a serenidade de quem realmente tem esse Partido arraigado no coração. Muito obrigado.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Agradeço o generoso aparte de V. Exª.

Um grande paraibano, José Américo de Almeida, tinha uma frase: “Voltar é uma forma de renascer, e, na volta, ninguém se perde”. Certamente, todos nós que amamos esse Partido, que o temos no coração, na alma e no nosso dia-a-dia, vamos poder voltar para contribuir com a sua unidade e, sobretudo, com o seu papel decisivo, como sempre foi em toda a História recente do Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu queria fazer apenas esse breve comentário sobre o nosso Partido, até porque fica difícil nos omitirmos dos fatos que ocorreram. E nunca fui homem de me omitir. Digo sempre que a pior decisão é a que não se toma. E eu tenho posições. Quero repetir mais uma vez que o fato de não ter aceitado o convite dos companheiros Michel Temer, Wilson Santiago e Geddel Vieira não significa nenhum desapreço a qualquer dos três, mas, sobretudo, uma posição coerente com os princípios éticos que sempre adotei.

Se o meu candidato renunciou, aceitar agora uma posição na outra chapa poderia parecer a muitos uma atitude de oportunismo. E, se há algo que eu abomino na vida pública, é o oportunismo, porque eu vejo no oportunismo o vírus de todas as mazelas da política nacional, infelizmente.

O segundo comentário que faço é a respeito da visita do Presidente dos Estados Unidos, a maior potência econômica e bélica do mundo, ao Brasil. Naturalmente, interessa à comunicação oficial do governo americano e, de uma certa forma, ao próprio Governo brasileiro, a inversão dos propósitos dessa viagem. Muitas pessoas - e eu me situo entre elas - acham que essa visita tem muito mais a ver com o fato político da influência que vêm ganhando na política, sobretudo na América do Sul - eu não diria de toda América Latina, mas da América do Sul -, as posições políticas do Presidente Hugo Chávez.

Não há dúvida de que os Estados Unidos, de repente, agora, já na segunda metade do segundo mandato do Presidente Bush, nunca levaram muito a sério os interesses econômicos da América do Sul, e do Brasil em particular. O maior exemplo disso é a posição imperial que os Estados Unidos, aliados aos países da Comunidade Européia, sempre adotaram em relação à questão dos subsídios à agricultura. Diga-se, de passagem, subsídios à agricultura porque é o que está incitando os segmentos da produção e da economia nacional, já que a soja se tornou o carro-chefe das nossas exportações. Diria subsídios também em outros segmentos, como o industrial.

Durante muitos anos, a aciaria brasileira foi uma das mais modernas do mundo. Não era a americana, que apresentava o mesmo índice tecnológico que apresentava a aciaria brasileira. Evidentemente, conseguíamos, como conseguimos ainda, produzir o aço, o ferro e outros metais importantes para a indústria metalúrgica do mundo a custos muito mais baixos, por conta de a matéria-prima - ferro - ser abundante no Brasil e porque a nossa indústria instalou-se em parâmetros que lhe permitiam produzir a custo mais baixo. Isso acontecia, e acontece ainda, com o aço brasileiro, sobretaxado na América. Então, não é apenas o produto agrícola.

O Brasil vem, há mais de quatro anos, choramingando, reclamando, propondo inutilmente a extinção dos subsídios à agricultura. Tanto Europa quanto Estados Unidos fazem ouvido de mercador a esses interesses, porque o que está em jogo, na realidade, é a manutenção de uma agricultura que, pela diversidade dos climas desses países, não pode ser competitiva com a agricultura do Brasil, que tem um clima, graças a Deus, muito favorável à prática agronômica e hoje utiliza tecnologias modernas graças ao trabalho extraordinário exercido pela Embrapa.

E o Brasil vem batendo nessa tecla, insistentemente, sem nenhum resultado. Por quê? Trata-se de proteger o emprego, a mão-de-obra e os interesses econômicos. Seria muito difícil a Europa concorrer, por exemplo, com o açúcar brasileiro se o açúcar deles é produzido a partir da beterraba. Será muito difícil para os Estados Unidos concorrerem com o etanol produzido no Brasil, fazendo-o a partir do milho, que, todos sabemos, tem uma produtividade industrial bem mais baixa do que a da cana-de-açúcar - sobretudo sem ter as benesses de um clima, de uma ecologia privilegiada para a agricultura, como é a brasileira.

Então, é ilusório esperar-se que o Presidente dos Estados Unidos, nessa visita que não teve exatamente o propósito de negociar nenhum acordo vantajoso para o Brasil, abra mão das sobretaxas que vão impor ao produto brasileiro quando for exportado para lá. Até porque essas sobretaxas são o instrumento de que dispõem para se compensarem do prejuízo que o clima e a diversidade climatológica propiciam às práticas agronômicas.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - Senador José Maranhão, V. Exª me permite um aparte?

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Com muita honra, Senador.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - Tenho acompanhado com muito interesse os comentários que V. Exª faz. Primeiro, com relação ao PMDB, o nosso Partido. V. Exª o fez com muita propriedade, tanto que eu gostaria de fazer das suas as minhas palavras.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Obrigado, isso me honra muito.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - Nós estamos realmente convictos de que esse episódio é menor do que o Partido e de que o Partido buscará, se não a unidade, a maioria do pensamento e do sentimento dos seus membros. Eu tenho certeza disso. Mas, atendo-me à segunda parte do comentário de V. Exª, que diz respeito à visita do Presidente Bush ao Brasil, seria ingenuidade nossa imaginar que ele ou o chefe de qualquer outro Estado viesse ao Brasil para nos trazer vantagens. Ele está defendendo os interesses americanos.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - E políticos.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - E políticos.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Não é intercâmbio econômico ou tecnológico, de produção agrícola ou industrial que move a sua vinda.

O Sr. Leomar Quintanilha (PMDB - TO) - Claro! Nós é que precisamos aprender a negociar, aprender a acertar as transações, tanto com os americanos quanto com outros países. Se a agricultura não fosse uma atividade econômica vital e importante, os americanos, um povo muito rico, que já domina a tecnologia e, aliás, faz dos recursos artificiais um dos maiores sustentáculos da sua economia - não fazem uso apenas dos recursos naturais -, se a agricultura não fosse efetivamente importante, eles não cuidariam com a atenção que cuidam, protegendo sua mão-de-obra e seu produtor, exatamente com o subsídio. Vamos cansar de gemer, de chorar e de pedir que eles não subsidiem. Ela é estratégica para o País, e vão continuar subsidiando. O nosso agricultor, com as nossas adversidades climáticas, estruturais e creditícias, é muito competente para ainda estar conseguindo superar essas dificuldades e ser competitivo. Agora, diante desse apelo ambiental forte, o mundo inteiro busca uma energia renovável e limpa. E a natureza foi muito generosa com o Brasil. Essa generosidade pode fazer com que, negociando de forma correta, sejamos uma das mais importantes províncias geradoras dessa energia nova, renovável e limpa. É saber negociar! Esta é a hora de o Brasil, negociando bem, alavancar sua economia e dar uma condição melhor à sua agricultura, que, ao longo da história do Brasil, foi o sustentáculo da nossa economia, deu muitas alegrias, manteve superávit comercial, elasteceu sobremodo as nossas exportações. Esse setor agrícola, o agronegócio, deu força à economia brasileira. Precisamos fazer uma reflexão, uma inflexão, e aprender a negociar.

O SR. JOSÉ MARANHÃO (PMDB - PB) - Concordo com V. Exª em gênero, número e grau, no que respeita às relações comerciais, às relações de negócio do Brasil com nossos potenciais importadores, e até nos intercâmbios. Todavia, o Governo brasileiro precisa ter uma política agrícola definida e não políticas eventuais - e isso já nos deu grandes prejuízos.

Houve um tempo em que o Brasil tinha o Instituto do Café, que era um grande cartório para proteger a cultura cafeeira do Brasil. Café era sinônimo de divisas, de dólar, de grandes exportações. Contudo, o Brasil não se preparou devidamente para o futuro. Sua política era puramente protecionista; visava proteger uma lavoura que, inegavelmente, foi um sustentáculo da economia nacional durante muito tempo.

Depois houve a política do açúcar, com a criação do Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool, incidindo nos mesmos erros, porque faltava uma política agrícola global que protegesse não apenas a produção agrícola em si mesma, mas que cuidasse dos desdobramentos, dos aspectos comerciais, estes, sim, fundamentais.

O Brasil inteiro é dominado pelas economias de mercado. E as economias de mercado historicamente têm tratado muito mal a produção primária. Os países ricos, que são industrializados, sempre primaram por uma política de sabotagem aos produtos agrícolas. Quando o Brasil ia bem com a produção de café, os países ricos se empenhavam em estimular, em apoiar a produção de café em países mais pobres da África ou da Ásia, onde o trabalho era quase escravo, criando uma concorrência desleal para com o produtor brasileiro.

O que se fez com o Plano Nacional do Álcool foi algo muito parecido. O Brasil é pioneiro nas tecnologias do álcool carburante, na produção industrial de motores para esses usos, para esses fins. E, agora, há o motor flex, que é já um desdobramento mais tecnológico que permite a utilização simultânea ou alternativa de vários combustíveis diferentes, tanto os combustíveis fósseis, como os combustíveis renováveis. Então, o Brasil dominou essa tecnologia, e isso foi importantíssimo para o País.

De repente, o Governo brasileiro resolveu puxar o tapete da produção de álcool, e muitos estabelecimentos industriais e agrícolas foram à falência. Isto se deu em razão de o Brasil não ter, em sua globalidade, em sua integralidade, uma política agrícola; não ter a visão de que uma política agrícola é dever do governo brasileiro para com sua própria economia. Faltou isso ao País. Sempre vivemos de improvisação.

Agora, em vez de estarmos tão deslumbrados com essa visita estratégica e política do Presidente Bush, o Brasil teria que pensar em novas tecnologias. Deveríamos aproveitar, por exemplo, os subprodutos da cana-de-açúcar que são jogados no lixo ou queimados como combustível para caldeiras. A indústria petrolífera mundial continua sobrevivendo, mesmo com a carência e os preços altos, porque há toda uma diversidade de produtos que entraram na vida das civilizações em todo o mundo - plásticos e outros derivados, assim como gasolina, óleo diesel, querosene, uma infinidade de produtos que fazem parte do nosso cotidiano como as fibras sintéticas.

O Brasil deveria, pois, dedicar recursos públicos à pesquisa para o desenvolvimento dos produtos derivados da química fina da cana-de-açúcar. Ninguém pode ter certeza de que esta situação que hoje se esboça alvissareira para a cana-de-açúcar será eterna Então, é preciso tratar do futuro dessa produção, desenvolvendo outros produtos; não somente o álcool carburante, não somente o álcool puro, o álcool anidro e o etanol, é verdade, mas desenvolvendo outros produtos industriais do que hoje é subproduto das indústrias e que são amontoados no lixo ou simplesmente queimados nas caldeiras das usinas.

É essa a minha modesta visão sobre esse momento que é celebrado com tantas loas: a visita do Presidente dos Estados Unidos ao Brasil. O Brasil precisa olhar para dentro e construir o seu próprio futuro.

Não há dúvida nenhuma, Senador Quintanilha, que V. Exª tem razão quando hoje não somente a proximidade da exaustão da energia fóssil, mas também e sobretudo, as questões sociais, humanas e até econômicas e ambientais estão a limitar cada vez mais o uso dos combustíveis fósseis nas finalidades industriais e automotivas do mundo inteiro. O álcool se abre como uma perspectiva extraordinária agora não apenas para o Brasil, que inventou o uso do álcool como combustível, mas para o mundo inteiro, inclusive os Estados Unidos, que já há mais de um ano vem se dedicando ao tema, estudando e investindo.

Em apenas dois anos, os Estados Unidos já se transformaram hoje num produtor respeitável de álcool carburante. Veja bem que os Estados Unidos estão sendo dirigidos, presididos por um homem que é um dos maiores magnatas do setor petrolífero. Ele próprio tem interesses pessoais no outro lado, no outro pólo, que são os combustíveis fósseis. Mas, como estadista, reconhece - pressionado pela opinião pública do seu país - que é necessário mudar um pouco essa matriz energética, gerando combustíveis menos poluentes. Não se pode aqui dizer que o álcool não seja poluente, mas muito menos poluente dos que os combustíveis fósseis. Essa é a nossa visão.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/03/2007 - Página 4838