Discurso durante a 22ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a viagem do Presidente Bush ao Brasil.

Autor
Heráclito Fortes (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Considerações sobre a viagem do Presidente Bush ao Brasil.
Aparteantes
José Nery.
Publicação
Publicação no DSF de 09/03/2007 - Página 4772
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO BRASILEIRO, ACEITAÇÃO, INTERVENÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, REFERENCIA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), TENTATIVA, APROXIMAÇÃO, AMERICA LATINA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, BRASIL, RECEBIMENTO, INVESTIMENTO, INICIATIVA PRIVADA.
  • ANALISE, CRISE, SEGURANÇA, TRANSPORTE AEREO, POSSIBILIDADE, ABERTURA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Se V. Exª me ouvir, vai ficar no Brasil mesmo.

Srªs e Srs. Senadores, o meu discurso hoje seria sobre apagão aéreo, mas o Senador José Nery acendeu uma discussão, que é exatamente a que envolve os gorilas, os ianques. E aí voltei, meu caro Nery, ao meu tempo de estudante, voltei ao meu tempo do iê-iê-iê. Voltei às minhas passeatas, em que via a marcha da insensatez contra uma realidade.

Felizmente, vivemos hoje num mundo globalizado, num mundo sem fronteiras, num mundo onde quem comanda é o câmbio, é a moeda. Concordo em gênero, número e grau com V. Exª: não podemos aceitar, em hipótese alguma, nenhuma interferência do Sr. Bush na economia interna brasileira, mas só temos autoridade para qualquer questionamento se pudermos questionar o que o Sr. Presidente da Bolívia fez recentemente no Brasil.

Já que estamos falando da América Latina em seu contexto, só teríamos autoridade para criticar o que Bush faz se tivéssemos também a coragem de assumir a crítica ao papel do Sr. Chávez, que sai da Venezuela para fazer manifestações contra os Estados Unidos em território argentino. Uma conivência inaceitável entre países soberanos.

Não podemos ter dois pesos e duas medidas. Não podemos abrir mão de críticas a ditaduras com que simpatizamos e condenar ditaduras com que não simpatizamos. Temos de ser, pelo bem da humanidade, contra qualquer tipo de regime ditatorial e, fundamentalmente, contra aqueles que se movimentam principalmente nas nossas vizinhanças na tentativa de reinstalar republiquetas ditatoriais.

O que vimos foi a tentativa de perpetuidade de poder, com cerceamento de liberdades democráticas, fechando inclusive órgão de comunicação. Vimos o que foi feito com brasileiros na Bolívia - quebra de contrato, expropriação, expulsão de brasileiros! É inaceitável!

Em nossa época do romantismo - imagino o Senador Nery de cabelo grande, cabeludo, naquela nossa fase, cantando por aí tudo aquilo em que acreditávamos. Era o nosso período romântico. Não temos mais idade para o romantismo.

Sinceramente, se eu fosse do Estado do Pará, estaria fazendo uma campanha para que esse dinheiro dos Estados Unidos que sobra para o mundo afora viesse socorrer Tucuruí nas suas eclusas.

Tive o prazer de visitar o Pará três vezes durante a campanha eleitoral, no interior. E vi a pujança daquele Estado. E lhe digo, Mão Santa: se eu fosse bem mais jovem e tivesse nascido sem vocação política - coisa que acho difícil -, queria ser investidor no Pará...

O Sr. José Nery (P-SOL - PA) - Senador Heráclito Fortes, V. Exª me concede um aparte?

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - ...porque o considero o Estado mais promissor deste País.

Lamentavelmente, a insensibilidade de diversos governos que se sucederam impediu a continuação da construção das eclusas de Tucuruí, que seriam o alicerce básico para o seu Estado se tornar um oásis e uma redenção em termos de produção para o Norte e para o Nordeste do País.

Com o maior prazer, Senador, concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. José Nery (P-SOL - PA) - Senador Heráclito Fortes, digno Presidente da Comissão de Relações Exteriores desta Casa, tenho a satisfação de aparteá-lo. Queria fazer, então, algumas considerações. Nós, brasileiros - e tenho certeza de que V. Exª concorda com esta tese -, não aceitamos nenhum tipo de interferência que venha a alterar as regras na política, na economia do nosso País. Quando países vizinhos, países irmãos se rebelam, fazem-no na defesa de seus povos, de sua gente. Isso é notório, inclusive pelas próprias disputas que têm ocorrido no âmbito regional - as eleições internas em alguns países. Cito, particularmente, a Venezuela. Os setores conservadores tentaram, de todas as formas, depor, aplicar golpe, pediram o referendo revogatório para tirar Chávez da Presidência. Houve as eleições, e Chávez foi reeleito com mais de 60% dos votos. Então, hoje o Presidente Chávez lidera a América Latina - em algum aspecto juntamente com o Brasil - no que diz respeito a políticas integradoras que podem fortalecer um bloco regional do ponto de vista econômico e político aqui na região. Quando o Presidente Chávez se associa às manifestações de rua para protestar contra qualquer tipo de intervencionismo que signifique agressão à soberania do nosso País, faz isso na defesa dos povos do nosso continente. Jamais me oporia, Senador Heráclito Fortes, a que os governos dos Estados Unidos, por meio de seus bancos, apoiassem e financiassem empreendimentos de infra-estrutura no Brasil. Refiro-me particularmente ao que V. Exª citou: as eclusas de Tucuruí, no Estado do Pará. Jamais recusaríamos recursos de qualquer natureza, desde que feito sob o espírito da solidariedade internacional, de cooperação entre os países. E ficaria muito feliz - como sou um combatente da paz, da luta pela não violência, da luta pela justiça no mundo - se os Estados Unidos, Senador Mão Santa, Senador Gilvam Borges, Senador Mozarildo, utilizassem 50% do que eles gastam para promover a guerra e a violência para eliminar o analfabetismo no mundo, para diminuir as desigualdades regionais entre nações ricas e nações muito pobres, como é no nosso continente. Portanto, queria dizer a V. Exª, Senador Heráclito, que, na nossa manifestação anterior, não estou aqui negando nenhuma possibilidade de cooperação, mas que ela seja feita respeitando-se nossa autonomia como país, como continente. Que usassem todo recurso que puderem destinar para diminuir as diferenças entre o norte e o sul, para diminuir a desigualdade na região, para diminuir a pobreza e a miséria, em vez de usarem para matar milhões de seres humanos no Iraque, no Afeganistão, na África, onde eles entenderem intervir. Quero dizer a V. Exª minha opinião e agradecer a gentileza do seu gesto democrático de me permitir o debate com V. Exª de questões tão importantes. Essa questão de hoje amanhã estará na agenda do País: o debate entre o Governo brasileiro e o Governo norte-americano. E esperamos, sem dúvida, que acordos possam haver, preservados direitos, autonomia, soberania e os interesses do povo brasileiro.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Eu respeito a posição de V. Exª, Senador José Nery, em achar que o comportamento do Presidente da Bolívia com relação aos brasileiros não tem nenhuma importância, que eles estão lutando pela soberania deles, e a integridade e a soberania do povo brasileiro que vá às favas. É opinião de cada um. Eu lamento.

Acho que V. Exª está perdendo uma oportunidade fantástica! V. Exª deveria se integrar à comitiva que está indo a São Paulo para a reunião com o Presidente George Bush, pedir uma audiência a ele e mostrar seu ponto de vista. Aliás, como faz o Senador Suplicy com a relação à Renda Básica. V. Exª prestaria muito mais um serviço ao País e ao mundo se dissesse: “Sr. Bush, estou aqui como Senador da República, como brasileiro para lhe dizer que o senhor está errado. Tem que usar esses recursos para o bem da humanidade e não para a guerra”. Concordo com V. Exª, subscreveria qualquer documento.

Agora, não vamos esperar que o mundo - e aí vale para qualquer um - venha com ações generosas para socorrer quem necessita. O pragmatismo das relações comerciais não permite isso. Ninguém o faz! Essa questão é tratada econômica e comercialmente. Fica muito difícil dizer que o dinheiro do governo americano, do povo americano é bem-vindo, mas que o seu Presidente não é. Eu acho uma chatice o Bush vir ao Brasil! Eu imagino os paulistanos agora, Senador Mão Santa, naquele engarrafamento, as ruas paralisadas. Eu acho uma chatice, mas evidentemente trata-se do Presidente da maior nação do mundo - eivado de erros, mas em seu final de mandato. Vamos torcer para que o povo americano tenha clareza e escolha quem melhor governe, quem melhor dirija os destinos do povo americano.

Não podemos, de maneira nenhuma, aplaudir o que o Chávez faz no Estado da Venezuela e criticar o que os outros fazem, porque é uma invasão. É uma invasão à economia interna, é uma invasão à soberania. E isso é inaceitável.

O Brasil, aliás, tem tido um dos poucos acertos dos últimos quatro anos do Presidente Lula: é na questão exatamente relacionada aos Estados Unidos. Impôs agenda, impôs posições, e não se dobrou. Não podemos fazer nenhuma queixa com relação à política que o Governo brasileiro adotou nesse tempo. Seríamos injustos. E olha que eu, para fazer um elogio a este Governo, conto dez vezes. Mas temos que ver que isso é verdade.

A prova do que lhe digo é que o Sr. Bush está vindo ao Brasil exatamente para tentar reabrir um diálogo com o continente, procurando exatamente a porta de entrada. Quem? O Brasil, pela importância.

O Sr. Chávez que cumpra o seu compromisso com o povo da Venezuela, e que o cumpra bem. Temos que protestar é quando maltratam os brasileiros que trabalham. E ali há piauienses, paraenses - deve haver mais paraenses do que piauienses, porque a distância, a geografia do Brasil aproxima mais o Pará do que nós. V. Exª imagina a frustração dos brasileiros expulsos, os do campo e os que trabalharam nas atividades petrolíferas e nelas se especializaram.

Em um momento como esse, na época da globalização, temos que ser pragmáticos. Discordo de V. Exª: V. Exª quer o dinheiro de Bush, mas não quer o Bush. Quero os dois, mas que ele não se meta na vida da gente.

O Brasil precisa de recursos, mas não de empréstimos, de dívidas. Precisamos do recurso do investidor privado. O Estado de V. Exª é um dos que mais vem recebendo visitas e expectativas de investimento. Aliás, há cerca de dois meses, eu estava no aeroporto de São Paulo. Havia um grupo de alemães que, ao chegar, viu o caos aéreo. Ao ver o caos aéreo, não sabendo o momento de voltar, determinou aos seus subordinados que tirassem passagens naquela mesma tarde de volta para a Alemanha. Iam para o Estado do Pará.

Aliás, é outra coisa sobre a qual quero falar, Senador Paulo Paim. O Senador Mão Santa vai me permitir mais dois minutos. Quero falar da segurança aérea. Se não tivermos no Brasil segurança jurídica - e ontem demos um grande passo, votando aqui a regulamentação das agências, o que é um princípio -, se não tivermos segurança aérea, meu caro Senador Nery, não vamos ter jamais investidores. Estamos vivendo um momento grave neste País. O Brasil corre o risco de ser rebaixado para país de segunda categoria em termos de aeroportos. O que isso representa? Prejuízo imediato para a Embraer, aumento de seguro para as aeronaves. O Brasil perde um status que conquistou ao longo de muito tempo e com muito sacrifício.

Daí por que, meu caro Senador Paim, não saber, não conseguir entender por que esse movimento truculento do Governo, da Base do Governo de querer abortar uma CPI legítima que nasce na Câmara para tratar do apagão aéreo. Parece até que o Governo, antecipadamente, assume culpa por tudo, como se os erros fossem só do Governo atual e não uma seqüência conjuntural de erros.

O Governo atual pecou por quê? Por omissão, por não ter feito investimentos durante quatro anos, por o Governo passado ter criticado o projeto Sivam. Mas criticou a corrupção? Não. Criticou o projeto. Quanto à corrupção - até me parece -, naquela época, já se navegava de maneira mais discreta nesse campo. Nós é que éramos inocentes e não sabíamos. Interrompeu o projeto Sivam e a interligação com o Cindacta, que é da década de setenta.

Na época em que éramos hippies, cabeludos - eu não fui hippie; V. Exª tem cara de que foi cabeludo, que andava por aí adorando os Beatles e os Rolling Stones -, naquela época, esses equipamentos foram comprados. De 1970 para cá, quantos anos? Nós envelhecemos. Imaginem esses equipamentos. A aviação modernizou-se. O homem aperfeiçoou o seu caminho à Lua. O homem foi à Lua em 1968, e esses equipamentos foram comprados em 1970. Toda tecnologia aeroespacial e aeronáutica evoluiu muito depois desse ciclo de viagem que a Rússia e os Estados Unidos promoveram em nome da ciência. E continuamos nisso, e o Governo não tem coragem e audácia de decretar estado de emergência para aquisição dos equipamentos necessários. Estamos sendo desmoralizados internacionalmente.

Nós temos, Senador Nery, de fazer uma campanha em defesa do nosso território, do nosso solo, da soberania do nosso ar, do nosso espaço. Temos que fazer essa campanha. Imagine V. Exª esse espaço aéreo sem vigilância, e o Bush - maldoso, como V. Exª disse - querendo invadir nosso território, cheio de bombas e maldades. Sequer temos condições de detectar um avanço ou entrada no País.

Senador Mão Santa, temos de ter um cuidado especial com isso. V. Exª tem razão. Se os equipamentos não são do Bush, porque os do Bush são do eixo do mal, como ele diz com relação à Coréia, que compre de quem tenha para vender, mas o Brasil não pode esperar.

Finalizando, Sr. Presidente, a postura do Senador José Nery é clara. Não podemos aceitar é a postura do Governo. Lula decola - hoje deve estar voando para São Paulo para se banquetear com Bush -, e o Pomar faz manifestação contra Bush.

Temos, afinal de contas, de saber o que é que esse PT quer. Acho que o PT e o Sr. Pomar deveriam exigir do Lula reunir o Partido, como naqueles tempos bonitos de antigamente, para tirar uma posição e não permitir, em nome de tudo isso que V. Exª disse, que o Presidente Lula passe um final de semana em Camp David, que é uma área de lazer do Presidente desse país que massacra o mundo. Camp David simboliza o quê? Simboliza exatamente uma homenagem. O maior gesto que o Presidente americano faz com um visitante é hospedá-lo. Convidar para golfe não vai convidar, porque Lula não joga golfe. Poderá convidar para outros esportes. Mas, se Lula aceitar, contrariando o que o Pomar e setores do PT pregam, eu não acredito mais em nada.

Ainda bem que o Lula, Senador “Néry”, saiu dessa.

O Sr. José Nery (P-SOL - PA) - Senador, é Nery.

O SR. HERÁCLITO FORTES (PFL - PI) - Senhoras taquígrafas, por perdão, não quero divergir do Senador por um simples acento agudo. Vamos botar o Nery nele. Ele merece.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/03/2007 - Página 4772