Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a situação catastrófica da segurança pública no país. Defesa da redução da maioridade penal.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Considerações sobre a situação catastrófica da segurança pública no país. Defesa da redução da maioridade penal.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2007 - Página 6477
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, SEGURANÇA PUBLICA, BRASIL, OMISSÃO, PODER PUBLICO, CONTROLE, VIOLENCIA, CRIME, IMPUNIDADE, CRIMINOSO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, A GAZETA, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), DIVULGAÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, AUMENTO, QUANTIDADE, ADOLESCENTE, PARTICIPAÇÃO, CRIME HEDIONDO, ESPECIFICAÇÃO, HOMICIDIO, ESTUPRO, TRAFICO, DROGA, SEQUESTRO, LATROCINIO.
  • JUSTIFICAÇÃO, NECESSIDADE, AGILIZAÇÃO, PROPOSIÇÃO, REDUÇÃO, LIMITE DE IDADE, IMPUTABILIDADE PENAL.

O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, afirmei aqui, várias vezes, nos últimos dias, desde o brutal assassinato do menino João Hélio, que a sociedade brasileira está pedindo providências imediatas para que se contenha a onda de violência que o País está vivendo. E vou continuar avisando, apesar de ter percebido que, na última semana, três proposições foram aprovadas na Câmara e que duas proposições importantes foram aprovadas aqui no Senado.

Mas não podemos ignorar que há problemas urgentes. Não podemos fechar os olhos diante dessas situações catastróficas. Não há uma palavra mais adequada do que “catastrófica” para qualificar a situação da segurança pública no Brasil. E chegamos a esse ponto porque muito pouco, quase nada, foi feito até agora para reprimir a criminalidade, para desencorajar a formação de organizações de bandidos mais bem aparelhadas, mais ágeis e mais eficientes que a estrutura mantida pelo Estado para combatê-las.

Como resultado da lentidão e da omissão, criou-se um descompasso, um abismo entre a realidade e os instrumentos de que dispomos para deter a violência. O poder público tornou-se incapaz de prender os criminosos, de puni-los com penas proporcionais aos delitos que cometeram e de mantê-los na prisão.

Vou tomar como exemplo a questão da maioridade penal. O tema voltou a ser discutido diariamente no noticiário dos jornais, é debatido nos programas de televisão, e, aqui, no Senado, há seis proposições tramitando na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, embora freqüentemente seja adiada sua discussão.

Não é preciso ser um sociólogo ou um especialista em violência urbana para constatar o envolvimento cada vez maior de adolescentes em crimes - não pequenos delitos, mas crimes hediondos, como homicídio, estupro, tráfico de drogas, seqüestro e latrocínio, entre outros.

O jornal A Gazeta, de Vitória, noticia, em sua edição de terça-feira, que, só em Vitória, há cerca de dois mil - preciso frisar este número: dois mil - mandados de busca e de apreensão de menores em aberto, só na região metropolitana da capital capixaba. Segundo a Delegacia do Adolescente, a maioria está envolvida em crimes contra o patrimônio e em tráfico de entorpecentes. Dois mil menores infratores estão presos.

Há poucos dias, Sr. Presidente, em Vitória, em um prédio em que reside um médico meu amigo, um menor de 17 anos entrou no prédio, assaltou dois apartamentos e foi preso por moradores que o agarraram ali. Chamaram uma viatura da Patamo, que é uma viatura policial. O sargento que comandava a viatura disse: “Não vou prendê-lo, porque nesta semana já o prendi três vezes em prédios da redondeza. Prendo-o, e o Juiz o solta; prendo-o, e o Juiz o solta. Vou prendê-lo, mas, toda vez que o prendo, ele diz que vai me matar no dia em que sair. Uma hora, ele sai e me mata”. Aí, um dos moradores, já revoltado, perguntou para o sargento: “Quanto o senhor quer para matá-lo?”. Veja a que ponto está chegando a justiça feita com as próprias mãos, diante da impossibilidade da lei de punir!

Pois bem, muita coisa mudou desde que o Código Penal brasileiro foi aprovado, em 1940. Mudaram os padrões de comportamento, mudou o acesso à informação, aumentou a violência urbana, que se tornou uma força aparentemente incontrolável. Ocorreram transformações políticas, científicas, sociais e econômicas. No Brasil, os maiores de 16 anos e os menores de 18 anos ganharam capacidade eleitoral ativa e, hoje, podem votar em candidatos para qualquer cargo público eletivo, de Vereador a Presidente da República. O novo Código Civil rebaixou a maioridade civil de 21 anos para 18 anos e permitiu a emancipação aos 16 anos de idade.

Pois bem, um jovem emancipado pode constituir uma família, pode formar uma empresa e gerenciá-la. Emancipado ou não, está apto para participar de um processo complexo como o eleitoral, mas é considerado incapaz de distinguir entre o bem e o mal, entre o certo e o errado. Veja que lei cruel contra os menores no Brasil! Ele pode ser emancipado, pode gerir uma empresa, pode ser um pai de família, mas não pode discernir entre o que é certo e o que é errado. Diante da lei, o menor de 18 anos que seqüestra e tortura alguém, que participa de um crime horrível como o do assassinato de João Hélio, é inimputável por não possuir capacidade de entendimento do caráter ilícito de seus atos.

Quem é contrário à antecipação da maioridade penal costuma dizer que a questão não pode ser debatida em clima emocional. Ou seja, vamos esperar que a situação volte à normalidade para, então, decidir o que fazer. Não chega sequer a ser um argumento, por uma simples razão: não vivemos uma situação de normalidade e jamais voltaremos a vivê-la se não tomarmos providências para reprimir a violência.

Ontem, nesta Casa, vimos o jogador Romário, que se está aproximando do milésimo gol, Sr. Presidente. Lembro-me de que Pelé, quando fez seu milésimo gol, pegou a bola, levou-a ao centro do campo e disse: “Vamos pensar nas criancinhas do Brasil”. Isso ocorreu há 30 anos ou 40 anos. Não pensamos nelas, e o resultado está aí.

No Senado, o Senador João Calmon lançou a década da educação há 40 anos. Durante dez anos, ele dizia que devíamos pensar na educação, que a educação era essencial, que só se conseguiria nivelar renda e fazer justiça social com educação. Isso se deu há 40 anos! O Brasil não ouviu João Calmon, que estava ali profetizando. Agora, estamos pagando, porque fomos surdos na hora em que um profeta falava da tribuna deste Senado.

Por isso, Sr. Presidente, temos de começar a analisar a questão, pensando no Brasil e nos brasileiros, nos que estão sendo mortos, assassinados e judiados por aí, para que apressemos a proposição sobre a maioridade penal, a redução de 18 anos para 16 anos.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2007 - Página 6477