Discurso durante a 46ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão acerca do impacto do efeito estufa e do aquecimento global sobre a agricultura do Nordeste.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA AGRICOLA.:
  • Reflexão acerca do impacto do efeito estufa e do aquecimento global sobre a agricultura do Nordeste.
Publicação
Publicação no DSF de 13/04/2007 - Página 9628
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), GRAVIDADE, POLUIÇÃO, IMPACTO AMBIENTAL, VIDA, PRODUTOR RURAL, QUALIDADE, PRODUÇÃO AGRICOLA, PREJUIZO, PLANTIO.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, GLOBO RURAL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ANALISE, AUMENTO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, DESMATAMENTO, ALTERAÇÃO, CLIMA, EFEITO, GRAVIDADE, IMPACTO AMBIENTAL, PRODUÇÃO AGRICOLA.
  • REGISTRO, IMPACTO AMBIENTAL, REGIÃO NORDESTE, AGRAVAÇÃO, CLIMA, REGIÃO SEMI ARIDA, EFEITO, FALENCIA, PEQUENA PROPRIEDADE, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, AUMENTO, INDICE, FOME, EXODO RURAL, AMPLIAÇÃO, PROBLEMA, NUCLEO URBANO.
  • NECESSIDADE, GOVERNO, PROVIDENCIA, COMBATE, CALAMIDADE PUBLICA, IMPEDIMENTO, FALENCIA, POLITICA AGRICOLA, CONTENÇÃO, DESMATAMENTO, URGENCIA, INVESTIMENTO, POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, PRODUÇÃO, Biodiesel, ENERGIA RENOVAVEL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, agradeço a V. Exª. Tenha a certeza, Senador Mão Santa, de que vou cumprir o breve tempo que me é destinado, de dez minutos, mas sei que, pela liberalidade com que V. Exª tem agido na Presidência desta Casa, se precisar de mais alguns minutos, eu os terei, com certeza.

Faço hoje um pronunciamento sobre o chamado efeito estufa e também sobre o aquecimento global, temas da mais alta importância e que estão na boca de todos aqueles que procuram preservar a existência da humanidade.

Quero tratar aqui desse problema e, ao mesmo tempo, examinar o impacto do aquecimento global sobre a nossa agricultura, em particular a do Nordeste.

Tenho consciência de que existe uma grande polêmica cercando este assunto. Há os que negam, há os que minimizam o aquecimento global e seus efeitos. Porém, nós, aqui no Congresso Nacional, assim como os homens de governo, responsáveis pelas políticas públicas, responsáveis por tomar medidas para que determinadas catástrofes não ocorram, para que determinados impactos sociais negativos não aconteçam, precisamos ter toda clareza sobre o que é fato, sobre o que é verdadeiro, quando se trata de ciência e quando não se trata de ciência. Somente assim poderemos lidar com o problema.

No caso do efeito estufa, há fatos relativamente incontestáveis e existem relatórios profundamente convincentes, dentre os quais vários têm sido divulgados recentemente, como todos sabem.

Todo o mundo percebe que o clima já não é o mesmo de 20 ou de 30 anos atrás. Há evidentes mudanças climáticas. Nossos invernos e verões têm sido mais agudos. Já se constatou que os vinte anos mais quentes da história aconteceram nos últimos 25 anos. Quem não se lembra do ano de 2003, quando 11 mil idosos vieram a morrer, somente na França, por conta do calor aumentado? Mas não apenas por conta do calor, sobretudo pela falta de infra-estrutura de refrigeração, de proteção sanitária, para que não houvesse tanta mortandade. E justamente essa vem a ser a minha preocupação.

Temos que pensar políticas públicas para que tais impactos, que sempre ocorrem mais violentamente sobre as populações mais pobres, não cheguem até nós de forma tão cruel e com semelhante número de vítimas. E nem sobre a agricultura, da qual depende nossa alimentação e a própria sobrevivência do homem do campo.

Minha primeira consideração, portanto, é a de que é preciso levar a sério o efeito estufa, já que, para além da controvérsia sobre o número de graus que vai esquentar ou sobre quanto de calota polar vai derreter, a verdade é que o aquecimento global já pode ser percebido na prática. O relatório do IPCC, Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, órgão da ONU, recém-divulgado, só veio confirmar o que as pessoas comuns já observam faz tempo. Tufões, furacões em alguns países estão mais freqüentes e mais violentos. No Brasil, o homem do campo, o nosso agricultor já observa coisas bem simples e graves em seu efeito sobre as plantações: por exemplo, a temperatura tem crescido muito, o calor da região do café de São Paulo só ocorria entre dezembro e fevereiro, mas agora pode ocorrer ao longo de todo o ano. A exceção virou regra. O povo comum da roça diz que o tempo nunca esteve tão louco.

Aliás, há uma reportagem sobre os impactos possíveis do aquecimento global sobre a agricultura na revista Globo Rural que eu recomendo aos Srs. Senadores que leiam. Ali há dados irrefutáveis que demonstram essa preocupação a que estou me referindo.

E a lógica global desse processo todo é ao mesmo tempo muito simples. Por exemplo, toda geladeira, todo computador, o próprio automóvel, enfim, toda máquina que gera energia, quando está funcionando, possui um mecanismo de refrigeração que dissipa aquele calor, que, se for sendo armazenado na máquina, acaba com ela, impedindo seu funcionamento. A geladeira tem uma peça chamada termostato, que a desliga quando ela fica aquecida pelo calor gerado no seu funcionamento.

Ora, o nosso Planeta gera energia o tempo todo e emite de volta o calor que recebe do Sol, energia que tem que sair para não superaquecer a Terra. Só que a Terra não possui aquele termostato da geladeira. Com certeza, sempre teve seu próprio sistema de dissipação, de expulsão do calor. Uma atmosfera com pouco gás carbônico, que permitia a saída do calor, fazia com que o calor se dissipasse mais facilmente. Hoje já não é assim. O sistema de refrigeração natural da Terra começou a falhar. O que vem acontecendo, sobretudo nos últimos duzentos anos, é a emissão maciça de gases, toneladas e toneladas de gás carbônico, pela queima de combustíveis fósseis como carvão e petróleo.

Diante desse processo, temos dois problemas. O primeiro, é claro, as toneladas de gás carbônico lançadas no ar todos os anos e que dificultam a dissipação do calor. O segundo, a diminuição das florestas, que absorviam tradicionalmente o gás carbônico da atmosfera, mantendo o clima mais ou menos estável. O resultado dessa degradação do ar que respiramos tem sido o efeito estufa, o acúmulo de gases na atmosfera, uma atmosfera que fica mais espessa e pesada por conta desses gases, de partículas que dificultam a saída do calor, trazendo como um de seus resultados o aquecimento global.

Segundo o relatório divulgado dias atrás pelo citado IPCC, até o final do século, haverá um aumento de temperatura de 1,4 a 5,8 graus centígrados. Isto é, a temperatura vai crescer, vem crescendo.

Tudo isso vai impactar a nossa agricultura. Algumas simulações de clima divulgadas pelo Globo Rural deste mês mostram esse fato claramente. Áreas que atualmente cultivam soja, café, frutas temperadas e tropicais virão a sofrer mudanças profundas, a produção será comprometida.

Há cultivos adaptados ao calor, cultivos adaptados à seca. Tudo isso vai ser embaralhado com o aquecimento global. As perdas poderão ser catastróficas. O Sul do Brasil, que hoje é frio, amanhã poderá ser quente. Regiões que hoje são boas produtoras de frutas de clima temperado deixarão de sê-lo. A produção de leite e ovos também será comprometida.

Não estou falando sobre uma catástrofe possível de acontecer. Acontecerá se providências urgentes e inadiáveis não forem tomadas pelas nações civilizadas, porque os mais pobres irão pagar a conta da falta de cuidados com o nosso meio ambiente.

No caso do meu Nordeste, a situação será dramática se isso perdurar, principalmente entre os mais pobres e os pequenos agricultores. Uma tendência segundo os cientistas será a aridização ou desertificação do semi-árido. Isto é, grandes regiões do sertão vão ser vitimadas por secas insuportáveis, haverá estiagens muito mais prolongadas que as atuais e desertificação. O resultado disso tudo é previsível: falência das pequenas lavouras de subsistência, fome e êxodo rural, processos sociais que nenhum bolsa família vai conseguir segurar.

A maior vítima do calor e da desertificação será o Nordeste, por conta da pobreza e da exclusão...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Prorroguei por mais cinco minutos para que o País ouça o pronunciamento de V. Exª.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE) - Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.

A maior vítima do calor e da desertificação, como eu disse, será o Nordeste por conta da pobreza e da exclusão, mas também por conta de ser a região brasileira que já possui, hoje, o mais alto potencial de evaporação da água, devido à alta incidência dos raios solares.

Seremos o elo mais fraco do aquecimento global.

Estas são as conclusões de um pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, José Marengo, divulgada há pouco tempo. Ele fala em “refugiados ambientais”, massas humanas que vão fugir da liquidação da caatinga, superaquecida, agravando problemas sociais urbanos até o limite do insuportável. O pesquisador fala em secas de dez anos ou mais no Nordeste e localiza a região a ser mais afetada como sendo o quadrilátero que abarca o oeste do Piauí, o sul do Ceará, o norte da Bahia e o oeste de Pernambuco, Governador Jarbas Vasconcelos, justamente onde se encontram as cidades com menor desenvolvimento humano.

Diante desse quadro, proponho que passemos a considerar o problema do aquecimento global como essencial dentro do nosso debate nesta Casa. A questão deve ser examinada o número de vezes que for necessário para que possamos encontrar políticas públicas que impeçam ou atenuem a calamidade social que se aproxima. O aquecimento global tem de ser combatido com todas as forças de que cada país dispuser. Tem de haver alguma política que atue sobre os países mais ricos, como os Estados Unidos e a China, não somente por serem os maiores poluidores do Planeta, os maiores responsáveis pelo efeito estufa, como também sobre os que demandam mais carvão e petróleo, sustentando um modo de vida que não é, em absoluto, auto-sustentável nem no médio prazo e jamais pela maioria dos habitantes da Terra.

Enquanto isso, Sr. Presidente, temos de aprofundar o debate. Temos de impedir o impacto sobre a nossa agricultura. Precisamos considerar que não se trata de um problema que esteja no futuro. O futuro bate à nossa porta hoje. Precisamos deter o desmatamento irresponsável. Precisamos deter as queimadas desnecessárias; precisamos investir na produção de combustível baseado na biomassa; daí esse programa do biodiesel, que está sendo efetivado no Brasil. É bem-vindo no preparo do Brasil para os dias de amanhã. Precisamos utilizar energia que polua menos, energia renovável, com os devidos cuidados ambientais na sua produção. Precisamos do plantio continuado, solos ocupados mais tempo com lavouras. Precisamos investir na pesquisa para conseguirmos cultivos e variedades mais adaptadas ao calor e à seca. Precisamos questionar o atual modelo econômico, fundado no desperdício, no consumo individualista de energia, na mercantilização de todas as forças de vida e de natureza. Precisamos incluir em nossa agenda permanente a questão da degradação do clima e do meio ambiente, sem o qual não sobreviveremos no médio ou longo prazo como espécie.

Não vai haver termostato para desligar o Planeta Terra quando ele estiver superaquecido.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/04/2007 - Página 9628