Discurso durante a 50ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Cobrança de providências do governo no sentido de proteger a biodiversidade da Região Amazônica, desestimulando a ação da biopirataria internacional.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Cobrança de providências do governo no sentido de proteger a biodiversidade da Região Amazônica, desestimulando a ação da biopirataria internacional.
Aparteantes
Gerson Camata.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2007 - Página 10161
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • DENUNCIA, AUMENTO, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, REGIÃO AMAZONICA, ESPECIFICAÇÃO, FAIXA DE FRONTEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, PERU, AUTORIA, EMPRESA, PAIS, PRIMEIRO MUNDO, INEFICACIA, FISCALIZAÇÃO, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), COMENTARIO, DADOS, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, RISCOS, TRAFICO, FAUNA, FLORA, ECONOMIA NACIONAL, PREJUIZO, SOBERANIA NACIONAL, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, COMBATE, TRANSAÇÃO ILICITA, IMPORTANCIA, REFORÇO, LEGISLAÇÃO, IMPEDIMENTO, CRESCIMENTO, ILEGALIDADE.
  • APOIO, PROJETO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), PARCERIA, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), CONEXÃO, UNIDADE, PROTEÇÃO, RECURSOS NATURAIS, COMBATE, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, TURISMO, MANEJO ECOLOGICO.
  • NECESSIDADE, CATALOGAÇÃO, ESPECIE, FAUNA, FLORA, COMENTARIO, DIFICULDADE, GOVERNO BRASILEIRO, REVERSÃO, PATENTE DE REGISTRO, PAIS ESTRANGEIRO, REFERENCIA, MATERIA-PRIMA, PROCEDENCIA, FLORESTA, BRASIL.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as riquezas pertencentes aos povos da Amazônia continuam sendo alvo de ações ilícitas praticadas por diversas empresas inescrupulosas sediadas em países do chamado Primeiro Mundo.

Essas entidades costumam registrar, nos principais escritórios de patentes internacionais, marcas e nomes de produtos da flora e da fauna brasileiras. Por trás dessa trama, estão grupos americanos, japoneses e europeus, que agem sem o menor escrúpulo e sem temer qualquer tipo de contestação, apesar de serem constantemente denunciados por ambientalistas, pelo Congresso Nacional e por inúmeros cientistas brasileiros engajados na luta pela exploração racional do nosso imenso patrimônio natural.

Sempre preocupado com essa questão, em um dos meus pronunciamentos nesta Casa, em meados de 2005, aplaudi, de imediato, a iniciativa do Ministério do Meio Ambiente, que, em parceria com o Governo do meu Estado, tomou a decisão de implementar um Corredor da Biodiversidade no Amapá. Pela proposta, o corredor interligaria doze unidades de preservação ambiental, como o Parque Nacional do Tumucumaque e seu entorno, e envolveria terás indígenas, mangues, cerrados, florestas e terras alagadas, totalizando cerca de 65% do território estadual. Sem dúvida, como afirmei na ocasião, a idéia significava uma grande oportunidade para impulsionar o desenvolvimento econômico local de maneira sustentável, proteger as suas riquezas contra a ação dos traficantes e das empresas piratas, fornecer matéria-prima à bioindústria, impulsionar o ecoturismo e fortalecer o capital social de toda a região.

Em outras intervenções neste plenário, tive igual preocupação em denunciar a existência de um forte comércio clandestino na Região Amazônia, a ineficiência da fiscalização sobre os produtos retirados da floresta e casos constantes de recebimento de propinas envolvendo alguns funcionários do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que sempre aparecem como facilitadores dessas práticas criminosas. Aliás, Sr. Presidente, convém lembrar que esses assuntos estão detalhados no relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados, que investigou as ações nefastas da biopirataria em nosso País.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a biopirataria causa um déficit anual de cerca de US$2,500 bilhões em nossas contas públicas. A estimativa é do Tribunal de Contas da União, que, em uma auditoria realizada sobre problemas ligados à biodiversidade do País, isso constatou. Apenas o tráfico de animais silvestres representa cerca de US$1 bilhão de prejuízo a cada ano.

Segundo o TCU, a fiscalização brasileira funciona de maneira bastante precária nos portos e nos aeroportos e nos cerca de 17 mil quilômetros de fronteiras com países vizinhos. Portanto, tal situação abre largas portas à ação delinqüente dos biopiratas; à atuação clandestina de empresas e de laboratórios estrangeiros; ao aumento do contrabando e até ao tráfico de material genético na própria roupa.

O Tribunal de Contas da União assinala que a fronteira do Brasil com a Bolívia e com o Peru, onde estão situados os Estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Mato Grosso, contém os pontos mais vulneráveis para a prática de biopirataria internacional, que está levando para o exterior parte significativa da riqueza natural do nosso País.

Vale destacar que o mercado mundial de medicamentos, por exemplo, movimenta, por ano, mais de US$ 300 bilhões.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permite-me um aparte, Senador?

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Com muita honra, Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Ilustre Senador Papaléo Paes, V. Exª tem dedicado muito do seu mandato a esta região, que V. Exª conhece tanto, estuda tanto e por ela se interessa tanto. Na verdade, quando V. Exª traz problemas como este, percebe-se que eles são de interesse do País inteiro - e que interesse! V. Exª, quando demonstra sua preocupação com a biopirataria, preocupa-se com aquilo que sai do Brasil pela fronteira da Bolívia e pela fronteira do Peru. Entretanto, vou acrescentar mais uma preocupação: sobre o que entra por essas fronteiras. O Peru, hoje, é considerado o segundo maior produtor de cocaína do mundo, e V. Exª sabe que rotas de tráfico estão entrando por ali. Em relação à Bolívia, ocorre o mesmo. Outro dia, houve aquela apreensão, em São Paulo, de toneladas de cocaína que vieram da fronteira com a Bolívia. O armamento que os bandidos estão utilizando no Rio de Janeiro - e é necessário admitirmos que estamos em guerra; há uma guerra de guerrilhas no Brasil, como no Iraque, que ninguém está percebendo; quando vamos perceber que está havendo uma guerra de guerrilhas urbanas no Brasil? - entra por ali. Ouvimos comentários de que

O Exército deve tomar conta da fronteira, para por ela não entrar arma e droga. Deixem a polícia exercer sua função. O Exército não pode fazer esses quartéis todos no Rio de Janeiro e em São Paulo. O problema do Brasil, hoje, é a vizinhança e vizinho não se escolhe. Estão aí, são nossos vizinhos, não é? Como o Brasil não toma uma providência com relação a isso, alio-me à preocupação de V. Exª com relação à biopirataria. Preocupo-me não somente com o que sai, mas, muito, com aquilo que entra pela divisa com esses nossos vizinhos. O Brasil é muito leniente com relação a isso. Veja o exemplo do péssimo negócio que o País fez com a Bolívia para construir esse gasoduto caríssimo. Na época, eu disse aqui, num discurso: “O Brasil está arranjando um outro canal de Panamá, uma outra Itaipu, fazendo uma associação muito cara com um vizinho não muito confiável.”. Está aí o resultado. Não se apura quem fez o negócio e quem o autorizou, para punir quem pegou o dinheiro da Petrobras e o jogou na lata de lixo da Bolívia. Não se apura coisa alguma. São bilhões jogados fora, refinarias desapropriadas, tomadas por esses governos, e nada acontece. Agora, já estão querendo fazer mais negócios na Venezuela e em outros países igualmente não confiáveis, como o Equador. Mas o que somos? Que País é este, que está desse jeito, sem que ninguém se interesse por coisas tão graves como essas que V. Exª denuncia há mais de quatro anos? Vemos apenas a leniência do País diante da perda do patrimônio biológico existente na Região que V. Exª tão bem representa, e com tanta autoridade, neste Congresso. Parabéns a V. Exª pela fala.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Senador Gerson Camata. Agradeço o aparte, exatamente porque enriquece meu discurso, direcionado para a biodiversidade e os graves problemas que as fronteiras nos causam. São problemas gravíssimos, pois 17 mil quilômetros do nosso território ficam ao Deus dará, por conta do que vier e do que der.

V. Exª também chama a atenção para a presença das Forças Armadas no Rio de Janeiro, a fim de garantir a segurança. Não é papel das Forças Armadas lidar com bandido, de forma nenhuma. As Forças Armadas são necessárias nas nossas fronteiras. Em tempo de paz, devem trabalhar na fronteira, protegendo o nosso País dessas graves situações, que estão acontecendo justamente pela falta da presença do brasileiro defendendo a sua própria terra.

Sr. Presidente, cerca de 40% dos remédios derivam da biodiversidade e estima-se que um quinto deles seria extraído da Floresta Amazônica, que detém mais de 20% das plantas que dão origem às fórmulas medicinais processadas lá fora.

Sr. Presidente, antecipo o meu pedido de tolerância para com o tempo, pois precisarei de mais três ou quatro minutos para concluir meu pronunciamento, que V. Exª sabe ser importante.

O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Não serei com V. Exª como o prefeito de Nova Iorque: tolerância zero. Dar-lhe-ei o tempo necessário.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Como podemos verificar, trata-se de uma verdadeira destruição do nosso patrimônio genético, de nossa flora e de nossa fauna.

Inegavelmente, a biopirataria deve ser vista como uma das maiores ameaças à soberania nacional e necessita, urgentemente, de uma legislação rígida para impedir o seu crescimento. Não podemos deixar de pensar que o Brasil é detentor de 23% de toda a biodiversidade do Planeta e alvo constante da cobiça internacional. Mais ainda, não podemos ignorar que, segundo inúmeros especialistas em questões ambientais, o nosso potencial genético pode ser estimado em cerca de US$2 trilhões. Temos cerca de 200 mil espécies da fauna, da flora e de microorganismos já classificados, além de uma estimativa de 2 milhões de espécies no total. Precisamos, portanto, identificar cerca de 1,8 milhão de animais e plantas ainda não conhecidos pela ciência.

Entre as espécies mais visadas da Amazônia, podemos citar o cupuaçu, o açaí, a andiroba, a copaíba, o sapo kambô, cuja secreção tem efeito analgésico e antibiótico, a chromobacterium, usada na cura da leishmaniose, e o veneno de centenas de cobras, aranhas e escorpiões, riquezas que ainda estão sendo estudadas nos laboratórios, mas que já alcançam cotações importantes no mercado internacional.

Pois bem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no que se refere ao cupuaçu, entre 1998 e 2002, podemos contar pelo menos sete registros de patentes realizados por empresas estrangeiras.

Só para citar dois exemplos, no final de 2001, uma empresa japonesa, com sede em Kyoto, no Japão, registrou patente com o título: “Gordura do Cupuaçu - método para produzir e uso”. No final de 2002, a mesma empresa protocolou outra patente, com o seguinte nome: “Óleo e Gordura Derivados da Semente de Cupuaçu - método para produzi-los”. Finalmente, em outubro de 2002, uma empresa americana registrou patente em nível mundial para garantir os seus supostos direitos sobre a utilização do fruto.

Nos últimos anos, o Brasil tem travado uma acirrada batalha para reverter patentes concedidas sobre princípios ativos extraídos do cupuaçu, do açaí, da graviola, do murumuru, da copaíba e do jaborandi, só para citar alguns exemplos.

No caso do cupuaçu, Sr. Presidente, recentemente, depois de uma grande disputa, a Divisão de Propriedade Intelectual do Ministério das Relações Exteriores conseguiu impedir que o domínio sobre a fruta continuasse em poder de empresas sediadas nos Estados Unidos, na Europa e no Japão. Os japoneses precisaram abrir mão da apropriação do nome em 2004. Todavia, ainda estamos contestando o uso indevido do veneno da cobra jararaca e da árvore amazônica pau-rosa. De acordo com o Departamento de Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente, o Captopril, remédio anti-hipertensivo, foi elaborado, à nossa revelia, a partir do princípio ativo do veneno da serpente.

Nobres Senadoras e Senadores, nossa mais nova conquista foi a anulação da patente do açaí, que, desde 2003, havia sido registrada no Japão por uma firma daquele país. A decisão do cancelamento da marca foi tomada ao final de 2006. A exemplo do cupuaçu, o açaí é cobiçado no exterior e apresenta grandes possibilidades comerciais.

Sr. Presidente, ao terminar este pronunciamento, não poderia deixar de alertar, mais uma vez, o Governo Federal para a precariedade da fiscalização nos portos e nos aeroportos brasileiros, notadamente na Região Norte. Essas são as portas de saída para todos os ladrões de nossa biodiversidade - e elas estão escancaradas e totalmente desprotegidas.

Sem mais tardar, o Presidente Lula precisa seguir as recomendações constantes do relatório do TCU e adequar a máquina de fiscalização da Infraero, do Ibama, da Polícia Federal e da Receita Federal para que elas possam, realmente, impedir o saque que está sendo praticado contra a nossa valiosa biodiversidade.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2007 - Página 10161