Discurso durante a 54ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Advertência sobre os riscos que corre a preservação do Planeta e afirmação de que ainda há tempo de reverter o desastre com a Terra.

Autor
João Durval (PDT - Partido Democrático Trabalhista/BA)
Nome completo: João Durval Carneiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Advertência sobre os riscos que corre a preservação do Planeta e afirmação de que ainda há tempo de reverter o desastre com a Terra.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2007 - Página 11255
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • GRAVIDADE, PROBLEMA, MEIO AMBIENTE, PLANETA TERRA, CRESCIMENTO, POPULAÇÃO, DESEQUILIBRIO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, DESTRUIÇÃO, ECOSSISTEMA, ALTERAÇÃO, CLIMA, ESPECIFICAÇÃO, AUMENTO, COBERTURA, ASFALTO, IMPORTANCIA, DEBATE, MANUTENÇÃO, DESENVOLVIMENTO, REGISTRO, DADOS, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).
  • COMENTARIO, PREVISÃO, CALAMIDADE PUBLICA, MUNDO, CONFLITO, FALTA, RECURSOS NATURAIS, ADVERTENCIA, NECESSIDADE, REVERSÃO, PROCESSO.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, o crescimento da população mundial, cada vez mais acelerado desde o início do século XX, tem colocado para a humanidade problemas nunca antes imaginados. E não são questões superficiais, pois de sua discussão e das respostas que lhes forem dadas depende, em muito, o futuro da vida humana sobre a superfície terrestre.

Pode aparecer alarmismo para determinados ouvidos de hoje, mas o fato é que nos defrontamos, desde há algum tempo, com crescentes problemas para gerir, em nosso próprio favor, a preservação do Planeta.

Ora, Sr. Presidente, nos tempos em que a humanidade era pequena para a grande superfície habitável do globo terrestre, era muito fácil resolver os desgastes ambientais provocados pela exploração dos recursos naturais. Bastava ao grupo deslocar-se para outro sítio e esperar que o anterior se recuperasse pelas leis próprias da natureza. Assim, durante milênios os homens puderam usar e desfrutar da terra sem que houvesse maiores dificuldades de preservação.

São problemas graves, cujas soluções não estão ainda, necessariamente, ao alcance de nossas mãos. A natureza tem forças e mecanismos que os humanos ainda não dominam completamente.

Srªs e Srs. Senadores, as alterações que temos produzido no ecossistema em que vivemos não permitem postergar o enfrentamento das conseqüências delas advindas. Aquecimento global, perda da camada de ozônio, destruição da cobertura vegetal, degelo dos pólos, extermínio de espécies animais e vegetais, exaustão de terras agrícolas, poluição de fontes aqüíferas e uma longa série de outros problemas que nós mesmos causamos sãos espécies de bomba de efeito retardado, cuja potência e momento de explosão ainda é difícil aferir.

Se os habitantes de qualquer cidade sentem o aquecimento atmosférico apenas porque a urbe se torna mais asfaltada, o que dizer do Planeta todo, quando são emitidas incontáveis toneladas de gases-estufa em toda parte? O que a natureza sempre fez, que foi trocar calor com o espaço sideral, utilizando sua enorme massa para absorver calor e sua atmosfera para filtrar o calor solar, torna-se cada vez mais instável, pela ação desequilibradora do homem. As cidades, em primeiro lugar, o campo, depois, tornam-se mais quentes com o decorrer dos anos.

O exemplo, quase pueril, do efeito do asfalto no microclima da superfície urbana é bem elucidativo dos reflexos negativos do que fazemos, piorando, em certa medida, nossas condições de vida, mas imaginando que estamos melhorando, sem causar danos, nossa vida e nosso conforto. Como lidar com tais questões e suas conseqüências, eis nosso grande desafio!

Ao mesmo tempo, Srªs e Srs. Senadores, não podemos paralisar o mundo, a pretexto de preservá-lo. Uma população crescente, demandante de mais e mais bens e serviços, impõe uma exploração maior dos recursos que temos no Planeta. Eis uma contradição para qual teremos de dar resposta! Como explorar o espaço que temos sem esgotar os recursos que ele nos coloca à disposição?

Está soando o alarme do clima terrestre? Creio que sim! O relatório do Painel de Mudanças Climáticas nos diz que sim! E está na hora de ouvirmos o sinal!

Já temos um bilhão de pessoas expostas à severa escassez de água, 600 milhões de pessoas sujeitas à fome em razão de secas. Até 2050, são grandes as chances de que o acesso à água potável e aos alimentos diminua para grande parte da humanidade; extensas regiões terão a capacidade produtiva de seu solo reduzida a zero; os oceanos tendem à acidificação progressiva, com impacto na flora e fauna marinhas. E assim, qual monótona e triste ladainha, uma série nefasta de males poder-nos-á assolar em futuro muito breve.

Os desequilíbrios térmicos provocados pela elevação de temperatura nas gigantescas massas de água que recobrem o Planeta poderão ter conseqüências gravíssimas para incontáveis países ao redor do mundo. O regime dos rios pode ficar seriamente afetado, provocando importantes elevações de nível e vazão em alguns continentes, e redução em outros. Os mares deverão ter seu nível médio elevado por conta do degelo das placas polares e dos picos hoje gelados.

Sr. Presidente, a capa do número 463 da revista semanal Época, de 2 de abril passado, é exemplar ao mostrar o Rio de Janeiro submerso e apenas o Corcovado e o topo de alguns edifícios emergindo do enorme oceano em que se transformaria a Cidade Maravilhosa. A reportagem que ela encabeça resume de modo bastante claro os principais cenários caso os dirigentes que hoje estão no poder não ajam em prol do futuro.

No fundo, Srªs e Srs. Senadores, a pergunta que se coloca é: temos o direito de deixar isso acontecer com nossos descendentes? Ou agimos agora, para evitar que o pior sobrevenha?

Esperar que a Amazônia, sob efeito do aumento da temperatura, torne-se savana?

Esperar que o semi-árido brasileiro se torne deserto até 2050 e provoque a conseqüente migração de cerca de 32 milhões de nordestinos para o litoral da Região e para o Sudeste?

Esperar para ver nosso litoral, com a acidificação das águas, perder sua diversidade marinha e as culturas de crustáceos, que geram renda para inúmeras comunidades brasileiras, serem dizimadas?

Esperar que a escassez de chuvas reduza em 60% a área de cultivo de soja e outros grãos no Centro-Oeste, enquanto as pragas proliferam no cerrado?

Assistir à produtividade da lavoura na África ser reduzida em mais de 50% pela esterilização das terras, até 2020?

Assistir às geleiras do Himalaia serem reduzidas de 500 mil quilômetros quadrados para 100 mil, até 2030?

Assistir à redução da descarga dos rios colocar em colapso o sistema de geração hídrica de energia, principalmente na Europa, até 2070?

O fato anunciado é que as conseqüências de nossa eventual imprudência serão mais sérias na África, América Latina e em parte da Ásia.

Em outras partes do mundo, haverá mesmo quem se beneficie, pelo menos hipoteticamente, como o Canadá, que veria suas terras agricultáveis aumentarem e suas disponibilidades de extração de madeira multiplicadas. O aumento da temperatura também traria seus benefícios para alguns. Mas será que eles teriam como desfrutá-los?

Ou será, Srªs e Srs. Senadores, que a materialização dos cenários previstos pelos estudiosos do clima desencadeará uma nova onda de guerras por comida, água potável ou condições de habitabilidade satisfatórias? Todos nós conhecemos os incontáveis exemplos de conflitos desencadeados pela ganância do poder, mas também pela necessidade de...

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador João Durval, V. Exª me permite um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - O Senador Mozarildo Cavalcanti pede um aparte, Senador João Durval.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Quando V. Exª julgar conveniente, gostaria de aparteá-lo.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Pois não, estou perto de terminar.

... subtrair ao vizinho aquilo que falta para si. Quando a questão se tornar vital, uma escolha entre a pilhagem e a miséria ou morte em larga escala não será difícil de ser feita pelos que com ela se defrontarem. Esse sim, seria o pior dos mundos que poderíamos imaginar.

Sr. Presidente, a Terra, graças a Deus, ainda não se encontra em estado crítico de deterioração, nem o processo a que a estamos submetendo é irreversível. Por isso mesmo, é bom que evitemos chegar lá.

Podemos e devemos fazer escolhas e implementar políticas públicas que permitam ao Brasil servir de modelo de progresso, de atendimento às demandas sociais e, simultaneamente, de preservação do meio ambiente para as gerações futuras. Há custos certamente elevados, mas haverá ainda maiores, e em vidas humanas, se não nos decidirmos logo.

Temos enormes reservas hídricas que, se bem gerenciadas, poderão nos fornecer energia elétrica e água potável por incontáveis anos. Temos espaço para agricultura que, se bem cultivado, pode nos abastecer de alimento e biocombustível por muito tempo. Temos riquíssimas reservas minerais; temos crescente domínio da tecnologia moderna. Enfim, temos recursos materiais e humanos suficientes para agirmos com sensatez em nosso próprio benefício e, assim, beneficiar toda a humanidade.

O que não podemos, Sr. Presidente, é deixar passar os anos e nada fazer, ou fazer apenas o mínimo para evitar a catástrofe imediata.

Srªs e Srs Senadores, o livro sagrado dos cristãos, a Bíblia Sagrada, no livro do Gênesis, narra que Deus, ao criar o homem e a mulher, disse-lhes: “Frutificai e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra. Eis que Eu vos dou toda a erva que dá semente sobre a terra, e todas as árvores frutíferas que contêm em si mesmas a sua semente, para que vos sirvam de alimento”.

Eis, numa linguagem de mais de dois milênios, o que o homem deve fazer com este nosso Planeta. Dominá-lo, não destruí-lo! Uma tarefa quase óbvia, mas que demanda espírito público e solidariedade universal.

Construir barragens para gerar energia; modernizar nossa infra-estrutura viária; disciplinar a exploração da Amazônia; regular o mercado de biocombustível; reduzir nossa poluição atmosférica e das bacias hidrográficas; revitalizar o rio São Francisco. Eis um caderno de encargos dos mais alentados e que demandará alguns governos para ser cumprido. Mas, sem dúvida alguma, terá de ser cumprido.

Não bastassem essas tarefas, a elevação do patamar educacional da população, a solução da questão da saúde pública, o resgate do déficit habitacional formam agenda social que não poderá ser, nem de longe, negligenciada ou postergada, para que o Brasil possa tornar-se um modelo de desenvolvimento e preservação ambiental.

Concedo ao Senador Mozarildo Cavalcanti o aparte que me foi pedido.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador João Durval, V. Exª utilizou um termo que, como médico, me atinge de maneira atávica, que é a prevenção. A verdade é que todo esse quadro que se coloca, com algumas controvérsias, inclusive na área científica, não pode ser levado nem ao ponto extremo do anúncio de um apocalipse, nem pode ser desconsiderado de maneira leviana. O que me preocupa é que os países desenvolvidos adotaram uma posição cômoda. Por exemplo, a Europa propõe reduzir, no prazo de 20 anos, algo em torno de 20% da emissão de carbono. E os Estados Unidos nem estão preocupados com a questão; ao contrário, nem assinaram o Protocolo de Kyoto. E nós nos auto-impingimos a pecha de poluidores; pelo contrário, nós sofremos a conseqüência da poluição mundial.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Perfeito.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - A floresta amazônica, por exemplo, ao invés de contribuir para o aquecimento global, está sendo vítima dele. Precisamos nos preocupar, é verdade. O Brasil é, dos países emergentes, o que mais cuida da questão, pois mede o aquecimento, a emissão de carbono, e tem tomado precauções que nenhum outro país toma, inclusive no que diz respeito ao desmatamento da Amazônia. Na Amazônia, quando um índio derruba a mata para plantar roça, parece que é uma coisa do outro mundo. Mas o índio faz isso secularmente, em toda a Amazônia. E não vou dizer que é só o índio. Há gente ruim fazendo coisas muito erradas na Amazônia. Mas, como país independente, temos de cobrar, primeiro, que os mais poderosos façam a sua parte. Vamos fazer a nossa, porque somos muito mais conscientes do que eles. Em 507 anos de Brasil, poluímos menos e desmatamos muito menos do que qualquer país da Europa ou do que os Estados Unidos. Esta é a minha posição. V. Exª faz muito bem em trazer esse tema novamente ao debate. Ele tem que ser debatido, mas temos de evitar de nos auto-impingirmos o complexo de que somos culpados por esse aquecimento. Nós somos vítimas dele.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Agradeço o aparte de V. Exª.

Gostaria de dizer que isto aqui é parte de um trabalho realizado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, da ONU.

Tentaram evitar que os resultados desse trabalho fossem divulgados. Quem tentou evitar? Os Estados Unidos - George Bush já disse que não fará nada para diminuir a poluição atmosférica -, a Rússia, a China e o Irã. Os quatro pediram que esse relatório não fosse divulgado.

Concordo com V. Exª. Meu discurso é de advertência. Estou advertindo aqueles que estão poluindo o nosso planeta para que voltem atrás e ajudem na recuperação dele.

Muito obrigado a V. Exª pelo aparte.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2007 - Página 11255