Discurso durante a 58ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários a respeito de decisão que o Supremo Tribunal Federal irá tomar sobre as pesquisas realizadas com células-tronco.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. :
  • Comentários a respeito de decisão que o Supremo Tribunal Federal irá tomar sobre as pesquisas realizadas com células-tronco.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2007 - Página 11800
Assunto
Outros > JUDICIARIO. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • REGISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, DEBATE, POSIÇÃO, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, IMPETRAÇÃO, AÇÃO DIRETA, INCONSTITUCIONALIDADE, LEGISLAÇÃO, SEGURANÇA, BIODIVERSIDADE.
  • IMPORTANCIA, BRASIL, REGULAMENTAÇÃO, POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, UTILIZAÇÃO, EMBRIÃO, EFICACIA, TRATAMENTO, DOENÇA INCURAVEL, MODERNIZAÇÃO, MEDICINA.
  • EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), AUTORIZAÇÃO, MEDICINA, UTILIZAÇÃO, EMBRIÃO, VALOR TERAPEUTICO, MELHORIA, SAUDE, DOENTE.

O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senado Federal já teve ocasião de se posicionar quando da votação da Lei da Biossegurança sobre as pesquisas realizadas com células-tronco.

O Supremo Tribunal Federal, em função de Adin impetrada pelo Ministério Público pelo Procurador-Geral da República, está em vias de tomar uma decisão que vai confirmar ou não o pronunciamento do Legislativo sobre o assunto.

Nesse instante, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, abre-se o debate sobre um tema tão relevante que significa, sem dúvida alguma, não só a salvação de muitas vidas, mas também o progresso científico do nosso País. Quero ressaltar a histórica audiência pública conduzida pelo Ministro Ayres Brito no dia 22 de abril no STF, uma audiência muito louvável em termos de nos aproximar de uma providência positiva sobre o tema.

Quando foi aprovada a Lei de Biossegurança (nº 11.105), em 2005, foi também liberada a pesquisa com células-tronco embrionárias congeladas há três ou mais anos (artigo 5º). Como já disse, essa lei foi contestada pelo Procurador-Geral da República, que entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin nº 3.510), que está sendo julgada nesses dias.

A maioria dos pesquisadores e legisladores concorda que as células-tronco abrem uma nova fronteira na pesquisa médica, trazendo promessas de tratamento de doenças incuráveis. Na opinião do Dr. Dráuzio Varela, “a possibilidade de fazer com que células funcionem como ‘fábricas de tecidos’ poderá representar para o século XXI uma revolução na medicina equivalente à descoberta dos antibióticos no século XX”. Portanto, as células-tronco não podem ser ignoradas.

Discuto este assunto, Sr. Presidente, porque o Senado Federal participou de muitos debates relacionados a esta matéria. O mundo inteiro se lançou na pesquisa de células-tronco e há uma enorme quantidade de vidas cuja única esperança se resume nesta medicina regenerativa das células-tronco. Tomara que o Supremo tome uma decisão que vá ao encontro do que aqui foi apreciado.

A célula-tronco pode ser encontrada em embriões e também em organismos adultos. Todo organismo adulto já foi constituído, nos seus primeiros dias, apenas de células-tronco. Com o passar dos dias, meses e anos, aquelas células-tronco primordiais vão se multiplicando e ao mesmo tempo se especializando, se diferenciando. Transformam-se em neurônios, células musculares, do fígado, dos rins, cabelos, ossos, da pele, enfim, perdem aquela condição original de terem sido células pluripotenciais, coringas capazes de se transformarem em qualquer outra célula e de constituírem o organismo adulto por inteiro. No organismo crescido, só restarão alguns grupos de células-tronco adultas, na medula óssea, por exemplo, e as precursoras de alguns tipos de tecido.

Em resumo: as células embrionárias são dotadas dessa capacidade de regenerarem qualquer tecido onde elas venham a ser implantadas. É daqui que deriva seu ilimitado e revolucionário potencial terapêutico. Se a célula-tronco for injetada na região de um tecido cardíaco infartado, por exemplo, ela se multiplica e recria tecido normal, regenera o coração.

É preciso ainda que se esclareça que existem as células-tronco embrionárias, as células-tronco adultas e aquelas que são retiradas do sangue do cordão umbilical. Até onde se sabe, é válido dizer que todas elas possuem potencial terapêutico. No entanto, no estágio atual e inicial da pesquisa, tem-se verificado que as células-tronco embrionárias são as de maior potencial, maior capacidade de transformar-se em qualquer outra; por serem menos envelhecidas, seu prazo de validade obviamente é maior, os tecidos por ela gerados durarão mais tempo. Portanto, nada mais lógico do que permitir que se abra o leque de pesquisa para que se possa determinar, cientificamente, o potencial terapêutico de todas essas células-tronco. É isto o que está no Supremo Tribunal Federal para ser decidido: se podemos ou não fazer pesquisas com as células-tronco como fazem muitos países que evoluíram na pesquisa científica.

A polêmica atual gira em torno justamente dessas células embrionárias. Não acredito que haja qualquer polêmica quando o cientista ou médico vai buscar uma célula-tronco adulta no tecido adulto ou quando ele a recolhe no cordão umbilical. Quanto a isso, não existe nenhuma polêmica. Já existem bancos de células-tronco retiradas do cordão umbilical, seja no Brasil seja no exterior. Acho que estamos de acordo em relação à célula-tronco adulta. O que precisamos entender é que as células-tronco adultas não resolvem o problema médico e terapêutico e abrem-se novas perspectivas mais revolucionárias com as células-tronco embrionárias. É por essa razão que até países de tradição católica, como é o caso da Espanha, já liberaram o estudo das células-tronco embrionárias - o Brasil, em decorrência dessa ação do Ministério Público, ainda não abriu essa questão. Aqui reside o maior potencial para a cura de Alzheimer, a doença de Parkinson e outros males.

As clínicas de reprodução assistida dispõem de milhares de pré-embriões inviáveis, que não podem ser implantados, que não podem gerar seres humanos, que estão sendo doados e armazenados e ficam congelados por anos e cujo número parece chegar, no Brasil, às dezenas de milhares. Se forem usados na pesquisa em vez de serem descartados, podem abrir perspectivas para o tratamento de doenças incuráveis como aquelas a que me referi.

Aqui é preciso esclarecer um ponto: estamos tratando de pré-embriões e não de embriões, porque não possuem sistema nervoso, não foram implantados e não são implantáveis em útero algum. No entanto, se esse pré-embrião for implantado em um coração adulto, ele tem chance de converter-se em coração adulto (e não em um novo ser humano). Em outras palavras: aquele pré-embrião que pode salvar vidas preciosas na condição de células-tronco jamais poderia transformar-se em ser humano, em vida. Seu destino é o descarte. Nada mais lógico do que tais pré-embriões contribuírem para a pesquisa e, conseqüentemente, ajudarem a salvar vidas.

Qual foi o argumento, Sr. Presidente, dos legisladores com relação aos transplantes de órgãos? Todos nós lembramos qual foi: o coração saudável de uma pessoa que morreu de acidente não deve ir para o lixo e, sim, para o peito de alguém que morrerá se não receber um coração novo. Foi dentro desse espírito que legislamos em relação aos transplantes. Acredito que, da mesma forma, deveremos legislar para as células-tronco dos pré-embriões.

O mundo está caminhando nessa direção. Esta tem de ser a nossa direção: temos bons cientistas, temos alguma infra-estrutura, nos falta a lei. No futuro próximo, não queremos que cada brasileiro que necessite dessa medicina tenha de ir para o exterior para obter a cura porque aqui a pesquisa foi proibida.

Evidentemente, Sr. Presidente, o uso das células-tronco em pesquisa deve ser bem regulamentado, a exemplo de outras áreas da medicina. Deve haver a devida cautela - como em relação aos transplantes - para que a mercantilização e a elitização da saúde não prevaleçam. Mas não vamos confundir medidas cautelares contra abusos e mercantilização com a defesa da pesquisa científica, defesa que vale para a célula-tronco, assim como vale para qualquer outro campo médico que possa significar a chance de diminuir a dor daquele que sofre.

Nós legisladores somos completamente sensíveis e abertos à dor das pessoas que sofrem de doenças incuráveis cuja única esperança é a célula-tronco, seja a adulta ou a embrionária, e confiamos na justa decisão do Supremo Tribunal Federal, a maior Corte do País, a nossa Corte Constitucional, em relação a essa matéria da mais alta importância.

Qualquer que seja ela, respeitando a decisão do Supremo Tribunal Federal, falo neste instante em nome de milhares e milhares de pessoas que estão torcendo para que a nossa lei seja viabilizada e para que nós não entremos na era da escuridão em termos de pesquisa, dependendo tão-somente da evolução acontecida em outros países do mundo inteiro.

Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2007 - Página 11800