Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao jornalista Octavio Frias de Oliveira, recentemente falecido.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao jornalista Octavio Frias de Oliveira, recentemente falecido.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2007 - Página 12253
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JORNALISTA, PROPRIETARIO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPORTANCIA, BIOGRAFIA, REFERENCIA, JORNALISMO, DESVINCULAÇÃO, GRUPO, POLITICA, RESPEITO, LIBERDADE DE PENSAMENTO, POPULAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, REDEMOCRATIZAÇÃO, BRASIL.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tanto já foi dito aqui - e se não me engano também na segunda-feira - que se perguntaria o que mais se pode dizer.

            Venho a esta tribuna pelo que mais se pode dizer, Sr. Presidente. O pronunciamento feito pelo Senador José Sarney é excepcional. O Senador Sarney observa a figura de Octavio Frias juntamente com sua figura, Presidente José Sarney, e analisa uma longa amizade.

            Eu tenho salientado muito alguns pronunciamentos que se referem a pessoas que nos deixam e deixam um vazio no lugar delas. Tenho dito que o Brasil vem vivendo uma época em que as referências estão desaparecendo pouco a pouco.

            Vivi uma época magnífica quando jovem e quando cheguei a este Congresso, há vinte e cinco anos. Época em que se olhava para a vida política e viam-se nomes espetaculares; olhava-se para o Supremo Tribunal Federal e via-se Aliomar Baleeiro, gente de primeiríssima grandeza; olhava-se para a igreja e viam-se D. Evaristo, D. Helder, D. Ivo.

            Mas eu não sei. Com todo o carinho que eu tenho pelo Congresso Nacional - e tenho muito -, vejo que vivemos em um Congresso Nacional, em tese e em perspectiva, embaixo de uma tempestade - eu diria quase uma tempestade de punhais -, pagando o preço por acontecimentos pelos quais este Parlamento não tem culpa nenhuma; mas onde as referências são tão poucas, as biografias são tão pequenas que não dá para dizer que orientam o povo brasileiro.

            O Executivo?

            Eu viajei seis dias com minha mulher e meu filho; fui fazer uma conferência para universitários em Cuiabá e fui visitar o Pantanal. Seis dias sem televisão, rádio, jornal, telefone. Seis dias longe do mundo. Voltando, a notícia que tive foi a morte do Frias. E aí eu consegui entender o que um homem como o Frias pode representar.

            É claro que a gente não fala! A gente não fala que o Frias era dono do maior jornal do Brasil, mas nunca quis entrar na televisão, nem na rádio, nem na revista. A tese dele era que jornalista é jornalista; jornalismo é jornalismo; televisão é televisão, e rádio é radialismo. Não sei até quanto tempo a lei na Inglaterra, nos Estados Unidos era assim: dono de jornal não podia ser dono de televisão; dono de televisão não podia ser dono de jornal. Ele foi procurado várias vezes para compor o grupo de televisão, aproveitando a fantástica circulação do seu jornal. Não aceitou.

            Hoje, no Brasil, rádio, jornal e televisão, em tese, pertencem a grupos políticos. Se não é a grupos políticos, apóiam, em determinados lugares, determinado grupo político. Isso, o Frias nunca fez. Ele não só não pertenceu a nenhum grupo político como nunca, nem antes, nem durante, nem depois da ditadura nem hoje, a Folha se identificou com nenhum candidato ou nenhum grupo político. Essa era a personalidade do Sr. Octavio Frias. Esse é o exemplo que caracteriza um País que não tem tradição. A imprensa que está aí merece respeito, merece admiração, mas nada se assemelha ao que era Octavio Frias.

            Gostaria de ver quantos jornais se abriria, durante um mês, para ver uma fotografia de Octavio Frias. Nos almoços semanais com as pessoas mais ilustres, com toda a redação e as pessoas importantes de seu jornal, de nenhuma dessas ocasiões saía uma fotografia de Frias.

            Creio que V. Exª, Presidente Renan Calheiros, durante os últimos anos, deve ter aparecido na Folha de S.Paulo umas cinqüenta vezes mais do que o Frias. Era o estilo dele.

            Eu lia o ombudsman da Folha todos os domingos. Achava fantástico o dono do jornal ver as pessoas esculhambarem, anarquizarem, demolirem com seu jornal e depois responder em outra parte. Ele publicava. Não havia ninguém que não dissesse o que quisesse do jornal dele. Às vezes, os próprios jornalistas criticavam a fórmula como a Folha de S.Paulo tinha conduzido determinado assunto. Existe isso em outro jornal? O máximo que os outros jornais têm é uma coluna de leitores; mesmo assim só aparece o pensamento do leitor, quando não é muito contra o jornal. Esse era o Frias.

            Às vezes, a gente ficava a perguntar: que jornal é esse? Às vezes, havia uma tese e três propostas diferentes. O jornal, em três páginas diferentes, apresentava os defensores de cada tese. Vai ver é até sua tradição: sim e não na terceira página.

            Quando havia um assunto importante, reuniam duas pessoas importantes - uma do lado de lá e outra do lado de cá - e cada uma dizia o que pensava.

            O Octavio Frias nasceu humilde, nasceu simples, cresceu e chegou a ser um homem poderosíssimo nos meios de comunicação e no Estado de São Paulo, a pessoa de mais condições de se pronunciar, de tirar vantagens se quisesse. Nunca ouvi falar, Sr. Presidente, que algum funcionário de alto escalão, alguém do seu grupo ou Frias tivessem pedido algo ao Governo ou a alguma empresa, seja que empresa fosse. Não. Era o jornalismo quase purificado. As poucas vezes que falei com ele vi que era uma pessoa um pouco debochada às vezes quando queria. Não sei se isso aconteceu só comigo, quando cobrou de mim essa maneira de eu ser, mas fiquei impressionado. O mais importante é que ele era; importava-lhe ser, não parecer. Ele era, mas ninguém no jornal, e muito menos ele dizia o que ele era. 

            Seria muito importante se ele publicasse, se ele falasse, se ele explicasse, se ele justificasse, se ele mostrasse a importância de o seu exemplo ser seguido, mas não. Se não notássemos, se não falássemos, se não destacássemos, ele seria quase um anônimo. Podia até parecer uma figura sem maior importância, tanto que o jornal raramente publicava o nome dele. Era impressionante!

            Em nenhuma outra instituição - tenho andado pelo mundo e pelo Brasil -, as pessoas tinham um respeito tão profundo pelo seu chefe como o que os funcionários da Folha tinham pelo Sr. Frias. Era uma espécie de veneração, de carinho, porque sabiam que ele tratava todos do mesmo modo, porque sabiam que ele tinha orgulho de o seu jornal ser como era. Ele tinha orgulho dos seus funcionários.

            Acho difícil encontrar tantas características, tanta capacidade, tanta competência em apenas um homem como o Sr. Frias. Como dono do jornal de maior circulação do Brasil, poderia publicar manchetes brincando com a vida e a dignidade desse ou daquele, poderia endeusar um político, levando-o à eleição, ou à derrota.

            Nada disso lhe subia à cabeça. Nada, nada disso se passava pela sua cabeça. Em nenhum momento o Sr. Frias... Fui Líder do Governo de Itamar Franco durante dois anos e meio e tive oportunidade, naquela ocasião, de ver as referências. O máximo que se dizia era: “Pergunte ao Frias o que ele está achando”. Porque pedir... Ninguém tinha coragem de oferecer nada a ele porque sabia que ele não aceitaria.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª me permite interrompê-lo? Eu queria pedir permissão para ler um telegrama de um iluminado, cuja sabedoria ímpar traduziu o sentimento de todos os brasileiros em relação à vida e morte de Octavio Frias: “O Brasil perdeu um grande homem. Numa época em que rareiam as referências em todas as áreas, a democracia e o jornalismo tinham Octavio Frias de Oliveira”. Pedro Simon, Senador do PMDB.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Agradeço a V. Exª. Esse telegrama, que fiz questão de enviar, ainda lá longe, no Pantanal, por meio de alguém que estava vindo embora, diz exatamente o que penso, Senador, e eu lhe agradeço muito. O Brasil perdeu um grande nome, um nome dos que são referência. Há grandes nomes como grande empresário, como grande intelectual, como grande isso ou aquilo.

            Ele era um condutor, um orientador, um exemplo, por meio do qual se via o que as coisas eram.

            Quando se fala mal da imprensa, das novelas, quando se fala mal de tantas coisas erradas que acontecem neste País, que se aponte um erro desses na Folha de S.Paulo - que se aponte. Com relação a Maluf, o jornal dele sempre agiu da mesma forma: sempre contava e apontava os erros do Sr. Maluf, mas não foi diferente quando Maluf era Governo e quando era Oposição. Não tirou vantagem quando o Sr. Maluf era Governo para depois criticá-lo quando era Oposição. A linha foi sempre a mesma.

            Na ditadura foi fantástico: era o jornal que estava ali, que publicava, que não escondia. O próprio regime militar tinha certa tolerância para com a Folha de S.Paulo. Pensavam que ali era melhor não mexer.

            Mas ele manteve a sua cabeça de pé. Na hora em que as portas começaram a se abrir para a democracia, a Folha de S.Paulo foi o grande condutor da sociedade brasileira.

            Penso que Octavio Frias deixa um grande vazio. Claro que seus filhos têm a sua convivência, têm a sua história, têm a sua biografia. Viveram com ele esse tempo todo, sabem o que pensava o pai. Mas, Octavio Frias, esse é um homem que deixará saudades.

            Muito obrigado, Sr. Presidente. 

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2007 - Página 12253