Discurso durante a 69ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise da dinâmica populacional do País durante as últimas décadas, destacando a questão do planejamento familiar.

Autor
João Durval (PDT - Partido Democrático Trabalhista/BA)
Nome completo: João Durval Carneiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Análise da dinâmica populacional do País durante as últimas décadas, destacando a questão do planejamento familiar.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2007 - Página 14294
Assunto
Outros > SAUDE. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROJETO, PLANEJAMENTO FAMILIAR, AUSENCIA, OBJETIVO, CONTROLE DA NATALIDADE, ANALISE, CONTENÇÃO, CRESCIMENTO DEMOGRAFICO, BRASIL, ESCLARECIMENTOS, PROGRAMA, PREVENÇÃO, ABORTO, NECESSIDADE, CAMPANHA, INFORMAÇÃO, CONSCIENTIZAÇÃO, ASSISTENCIA, MULHER.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, MOTIVO, AUMENTO, EXPECTATIVA, VIDA, POPULAÇÃO, BRASIL.

O Sr. JOÃO DURVAL (PDT - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de entrar, propriamente, no assunto que vou abordar hoje, eu gostaria de dizer que endosso integralmente as palavras do meu colega Romeu Tuma.

Sr. Presidente, neste meu pronunciamento de hoje, pretendo discorrer sobre a questão do planejamento familiar no Brasil. Iniciarei, contudo, fazendo uma análise resumida da dinâmica populacional em nosso País durante as últimas décadas, visto que a questão populacional serve como pano de fundo para algumas observações que farei a seguir.

Inicio este retrospecto lembrando que, semelhantemente ao ocorrido em outras partes do mundo - em especial nos Estados Unidos -, o Brasil experimentou uma espécie de explosão populacional a partir da década de cinqüenta do século passado. Internacionalmente, o fenômeno ficou conhecido como baby boom e marcou o período que se estendeu do pós-Segunda Grande Guerra até o final da década de 1960, ou início da década seguinte.

As razões para o baby boom são diversas e estendem-se desde o sentimento de euforia - especialmente no caso norte-americano - até os avanços nas técnicas médicas, nas condições sanitárias - com a conseqüente redução das taxas de mortalidade infantil - e na melhoria da base alimentar. Nesse mesmo período e pelas razões parecidas, a expectativa de vida aumentou e, como conseqüência da diminuição dos óbitos e do aumento dos nascimentos, houve taxas de crescimento populacional realmente altas, da ordem de 6% ao ano.

Antes de prosseguir acerca do que ocorreu nas décadas seguintes, eu gostaria de chamar a atenção para o fato de que esses baby boomers, como ficaram conhecidas as crianças que nasceram nas décadas de 1950 e 1960, estão, agora, prestes a entrar na idade avançada, ou seja, estão prestes a começar a completar 60 anos. É muito importante que tenhamos isso em vista porque as conseqüências desse fenômeno são vastas para o nosso País, em especial, no que tange aos gastos previdenciários.

Mas voltemos à dinâmica demográfica de nosso passado recente.

A partir da década de 1970, no Brasil, houve um despertar da consciência civil para o fenômeno de explosão populacional. Em conseqüência, toda uma indústria de controle de natalidade foi montada. Paralelamente aos novos mecanismos contraceptivos que surgiam, mudanças comportamentais e culturais contribuíram muito para a redução da taxa média de fecundidade feminina e, conseqüentemente, das taxas de crescimento populacional. As mulheres aumentaram seus índices de escolarização e passaram a entrar em massa no mercado de trabalho; e as famílias começaram a sentir o peso da sociedade do consumo e do conhecimento (em que criar um filho não se resume apenas em dar-lhe alimento). Tudo isso contribuiu para uma redução acentuada no número médio de filhos por mulher.

Como decorrência desse processo, que brevemente descrevi, a média brasileira de filhos por mulher, que, na década de 1950, era de 6, passou, no início do século XXI, para 2,1.

Eu gostaria de reforçar esse dado: são 2,1 filhos, em média, por mulher. Considerando o fato óbvio de que uma porcentagem das crianças não chega à idade reprodutiva, estejam certos as Senadoras e os Senadores de que, hoje, no Brasil, atingimos a taxa de reposição, o que vale dizer que esses 2,1 filhos por mulher representam a estagnação do crescimento populacional. E mais: a continuar nas tendências atuais, a população brasileira começará a decrescer a partir de 2020!

Paralelamente a tudo isso, temos de ressaltar que, nas duas últimas décadas, a expectativa de vida ao nascer aumentou 8 anos para os homens e 9,3 anos para as mulheres. Mais uma vez, chamo a atenção das Senhoras e dos Senhores para a pressão que se impõe ao sistema previdenciário. A população está cada vez mais velha, e as taxas de reposição estão extremamente baixas. Além disso, os estudiosos prevêem que o aumento da expectativa de vida no Brasil deve continuar a ocorrer e pode chegar a valores semelhantes aos vistos no Japão, onde os homens vivem, em média, 80,2 anos e as mulheres, 87.

Sr. Presidente, o tema deste meu pronunciamento é, como anunciei no início, o planejamento familiar. Contudo, julgo que este breve relato de alguns aspectos da dinâmica populacional é necessário para que possamos debater a questão do planejamento familiar. Digo isso porque, quando se fala em questões populacionais ou em planejamento familiar, há que se considerar que o assunto não é simples. Como estudioso das ciências da saúde, tenho a convicção de que não há complexidade maior do que a encontrada no ser humano, salvo para aquela que se verifica num conjunto de seres humanos, ou seja, numa população.

É preciso, portanto, que se enxergue a questão do planejamento familiar como algo bem além do simples mecanismo de controle da natalidade. Na verdade, como já demonstrei, não há razão alguma para, no Brasil, promover-se uma redução na taxa de fecundidade, visto que já atingimos a taxa de reposição e que, daqui a duas décadas, a população brasileira poderá começar a diminuir.

Onde residem, então, os problemas brasileiros e a necessidade de uma política pública de saúde que contemple adequadamente soluções para essa questão? Passo a discorrer sobre alguns aspectos que julgo serem pertinentes para responder essas questões. Não falamos aqui apenas dos rincões mais afastados e isolados do nosso imenso território, como as cidades ribeirinhas da Região Norte; falamos, sim, de grandes centros urbanos, cujo gigantismo e cuja complexidade abriga contrastes tão absurdos que ao passo que uma parte de sua população goza de níveis elevados de educação, de acesso à saúde e tem pouquíssimos filhos, outra parte, nas favelas, por exemplo, experimenta o contrário.

Apesar dessa complexidade, cabem, sim, ao Estado ações práticas e incisivas que tratem do problema sob a ótica da saúde pública. O próprio Presidente Lula nos dá um belo exemplo do tratamento a ser dado à questão. Por ocasião da recente visita do Papa, nosso Presidente afirmou que, apesar de ser pessoalmente contra o aborto, sua postura seria de tratar o tema como item de saúde pública, não como um assunto pessoal. Essa é a verdadeira postura de um homem de Estado. O Presidente da República nos dá o exemplo a ser seguido, Srªs e Srs. Senadores.

Cabe ao Estado uma ação efetiva que torne aquilo que já foi materializado no mundo jurídico - em especial por meio da Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996 - em algo concreto e acessível a todos no mundo material.

Cumprem ao Estado as ações concretas de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde, como pretende a lei.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador João Durval, eu gostaria de participar do discurso de V. Exª.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Tem o aparte V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Quero, primeiro, cumprimentá-lo. V. Exª tem todo o direito, muito além do direito de Senador, de falar sobre planejamento familiar. V. Exª construiu uma das mais honradas e dignas famílias deste País, na Bahia, na nossa Feira de Santana, com amor, ao lado de D. Iêda. Então, V. Exª é autoridade para falar. Agora, quero dar a minha experiência de médico. Tião, atentai bem! Em 1980 - acho que V. Exª já tinha nascido porque é muito novo - fui designado pelo Governo brasileiro, Senador Romeu Tuma, para participar de um evento sobre planejamento familiar, do qual também participaram vários Deputados do Nordeste. Fui indicado pelo Piauí - na época, Lucídio Portela era o Governador. Colômbia, México e os Estados Unidos participaram. Atentai bem! Esse problema a Constituição do México já aborda. O México é cristão, é católico como o Brasil, possui iglesias enormes. Está escrito na Constituição mexicana, ó Tião, aquilo que não tivemos a coragem de enfrentar. Os mexicanos têm o direito de se acasalar, de formar el matrimonio e escolher sua pareja e ter o número de hijos que desejam. O Estado tem a obrigação de dar os instrumentos para ele construir a família, ter o número de filhos que deseja. Então, vi no México postos periféricos, Tião Viana. Em 1980, vi, pela primeira vez, a laparoscopia para ligadura de trompa. Atentai bem para o que temos de aprender. Lá, o casal - namorados, noivos - se apresenta em um posto periférico. Com uma assistente social, eles planejam, na condição ainda de noivos, a família que terão: “Em 2008 tem eleição, não dá certo, em 2010, também”. Sei que o Estado, cientificamente, dá todos os instrumentos que a medicina que oferece. Aliás, queria acrescentar: o definitivo na mulher é a ligadura de trompa, no homem, é a vasectomia. No México, a proporção é de três mulheres esterilizadas para um homem. Aqui nós temos este tabu de o homem não se deixar esterilizar. Temos de enfrentar isso. Somos pelo planejamento familiar - e V. Exª é um exemplo -, somos pela paternidade e maternidade responsáveis. Isto é o que o Brasil precisa: construir famílias bem formadas, bem consolidadas como a de V. Exª. Aí, sim, avançaremos para uma civilização com a qual todos sonhamos.

O SR. JOÃO DURVAL (PDT - BA) - Agradeço a V. Exª pela referência a minha família. Gostaria que acontecesse aquilo que V. Exª acaba de falar, razão pela qual ocupo hoje esta tribuna defendendo a mesma coisa.

Cumpre ao Estado as ações concretas de atenção à mulher, ao homem ou ao casal dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde, como pretende a lei. Cabe ao Estado, efetivamente, instituir o planejamento familiar orientado por eventos preventivos e educativos e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade.

É necessária e urgente a transposição da teoria jurídica para a realidade do cidadão e da cidadã.

Não se pode mais ficar esperando enquanto centenas de milhares de mulheres morrem, no Brasil, por ano em decorrência da prática clandestina de abortos. Urge tomar medidas, fazer campanhas de conscientização, distribuir material educativo e dispositivos preventivos, e todas as demais ações estatais que visem a sanar esse mal que assola a saúde pública brasileira.

É com essa esperança e com esse anelo que me dirijo hoje às senhoras, aos senhores e a toda a Nação.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2007 - Página 14294