Discurso durante a 75ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a "Operação Navalha", e apelo em favor da instalação de uma CPI Mista para apurar os fatos. (como Líder)

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. :
  • Considerações sobre a "Operação Navalha", e apelo em favor da instalação de uma CPI Mista para apurar os fatos. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 23/05/2007 - Página 15774
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, INVESTIGAÇÃO, POLICIA FEDERAL, DESATIVAÇÃO, QUADRILHA, AUTORIA, FRAUDE, LICITAÇÃO, OBRA PUBLICA, ESTADO DE ALAGOAS (AL), ESTADO DA BAHIA (BA), ESTADO DE GOIAS (GO), ESTADO DE MATO GROSSO (MT), ESTADO DE SERGIPE (SE), ESTADO DO PIAUI (PI), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DO MARANHÃO (MA), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DESVIO, RECURSOS, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), MINISTERIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, MINISTERIO DAS CIDADES, MINISTERIO DO ORÇAMENTO E GESTÃO (MOG), DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DOS TRANSPORTES (DNIT), FAVORECIMENTO, EMPRESA PRIVADA.
  • REGISTRO, DECISÃO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), AUTORIZAÇÃO, POLICIA FEDERAL, DETENÇÃO, EMPREITEIRO, POLITICO, AUTOR, CORRUPÇÃO, PROPOSIÇÃO, ABERTURA, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, APURAÇÃO, ORIGEM, CRIME.
  • DEFESA, DEMISSÃO, SILAS RONDEAU, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), PARTICIPAÇÃO, CORRUPÇÃO, FRAUDE, LICITAÇÃO, OBRA PUBLICA, FAVORECIMENTO, EMPRESA PRIVADA.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Pela Liderança do PSOL. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Renan Calheiros, Srªs e Srs. Senadores, no último dia 17 de maio, a Polícia Federal prendeu 47 pessoas durante a Operação Navalha, que desarticulou uma suposta quadrilha que fraudava licitações públicas para a realização de obras públicas. Essa suposta quadrilha atuava no Distrito Federal e em nove Estados - Alagoas, Bahia, Goiás, Mato Grosso, Sergipe, Piauí, Pernambuco, Maranhão e São Paulo -, infiltrada nos órgãos dos Governos Federal, Estadual e Municipal.

            Na Operação Navalha, foram presas figuras proeminentes da política nacional e regional, assessores parlamentares, Parlamentares, ex-Governadores, Prefeitos, parentes de Governadores, além de assessores de Ministros.

            Segundo a Polícia Federal, a quadrilha desviou recursos dos Ministérios de Minas e Energia, da Integração Nacional, das Cidades, do Planejamento, Orçamento e Gestão, e do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (Dnit). Para obter vantagens nas licitações para obras públicas, a empresa pagava propina e dava presente para as autoridades envolvidas. O ex-Governador do Maranhão, Sr. José Reinaldo Tavares, é acusado de receber um carro no valor de R$110 mil, pelo suposto direcionamento da licitação na BR-402.

            Já o atual Governador do Maranhão, Sr. Jackson Lago, foi apontado pela Polícia Federal como beneficiário de vantagem indevida. Por intermédio de seus sobrinhos, Alexandre de Maia Lago e Francisco de Paula Lima Júnior, presos durante a operação, o Governador teria recebido R$240 mil para permitir o pagamento, pela Secretaria de Infra-Estrutura do Estado, de R$2,9 milhões de uma obra da empresa Gautama.

            Esses fatos, Srªs e Srs. Senadores, envolvem um conjunto de autoridades dos Poderes Legislativo e Executivo, nas suas diversas esferas.

            A Ministra do Superior Tribunal de Justiça Eliana Calmon informa, em seu despacho, que autorizou as prisões, que a estrutura da quadrilha dividia-se em três níveis. No primeiro nível, estariam funcionários da Gautama, criada a partir de uma dissidência da OAS, grande empreiteira conhecida em nível nacional.

            O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Conhecida pelo PT.

            O SR. JOSÉ NERY (P-SOL - PA) - O chefe do esquema seria Zuleido Soares Veras, sócio-diretor da Gautama, também preso pela Polícia Federal.

            O segundo nível seria composto por onze pessoas, a maioria servidores que atuavam como intermediários perante políticos e funcionários públicos, exercendo influência sobre eles para a liberação de recursos. No terceiro nível, estariam os agentes públicos municipais, estaduais e federais que, “praticando diversos delitos, viabilizam a atividade da organização na obtenção de liberação de verbas, no direcionamento dos resultados das licitações”, entre outras fraudes.

            No último domingo, a Rede Globo levou ao ar imagens que comprometem diretamente o Ministro das Minas e Energia, Sr. Silas Rondeau, pelo recebimento de propina da quadrilha que foi desbaratada.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil precisa passar a limpo e pôr fim nos esquemas de corrupção, os quais se encontram entranhados nas nossas instituições, presentes nos três Poderes da República. Os recentes escândalos envolvendo magistrados mostraram que nem o Judiciário escapou dos tentáculos desse polvo gigantesco que absorve enormes recursos públicos, que são desviados por meio do superfaturamento de obras, do pagamento de propinas e de toda sorte de malversação de suados impostos pagos pelo povo trabalhador brasileiro.

            O que mais nos surpreende nesses acontecimentos não é a aparição de mais um esquema de corrupção, de desvio de recursos públicos, esquema esse bem maior que o denunciado no ano passado, nesta Casa, e que envolvia emendas parlamentares para a compra de ambulâncias. O que nos surpreende é o fato de não haver a urgência para definirmos, aqui, a investigação desses fatos delituosos que envolvem, especialmente no caso presente, o Executivo e suas esferas estadual e municipal. E há ainda a denúncia de que podem envolver determinado número de Parlamentares.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, viemos à tribuna, nesta tarde, para propor, concretamente, Senador Antonio Carlos, a abertura de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, composta de Senadores e de Deputados, para apurar os fatos denunciados amplamente, que são de conhecimento desta Casa e da sociedade brasileira, que, mais uma vez, se manifesta indignada ao perceber que um escândalo sucede a outro, numa série interminável e inaceitável para quem tem compromisso e zelo com o trato da coisa pública.

            Por isso, trago à consideração do Senado Federal, das Srªs e dos Srs. Senadores, um requerimento de autoria dos Deputados Augusto Carvalho, Júlio Delgado e outros, e nos incluímos como autores desse pedido de instalação de CPMI. Esse fato, essa ação, essa iniciativa só se tornará realidade se tivermos o apoio de todos os Partidos da Casa e se nos dispusermos a apurar e a esclarecer, com veemência, com urgência, com clareza e com compromisso, os fatos denunciados.

            Digo a V. Exªs que, aqui, não podemos fazer prejulgamentos, pois, só com a investigação no âmbito da Polícia Federal e das duas Casas do Congresso Nacional reunidas em uma CPMI, teremos a possibilidade de apurar e de, ao final, definir quem realmente tem culpa nos fatos ora denunciados.

            Sr. Presidente, nosso compromisso é grande, é grave, é urgente, porque ou bem apuramos os fatos denunciados ou teremos de nos declarar, de alguma forma, coniventes com os fatos e com as práticas delituosas inaceitáveis aqui denunciadas.

            Portanto, está posto para cada um de nós, representantes dos nossos Estados, do povo brasileiro, que devemos oferecer mais essa contribuição para o esclarecimento de fato tão grave, que merece a atenção e o compromisso de todos nós.

            Sr. Presidente, é verdade que não podemos pensar que o combate à corrupção seja feito apenas por intermédio de instauração de CPMIs. É preciso muito mais! É preciso um conjunto de medidas que ajudem a ordenar as ações e a punir com mais rigor todo e qualquer agente público e privado quando do cometimento de atos delituosos que impliquem malversação de dinheiro público.

            Nesse sentido, chamo a atenção para a necessidade da reforma política, tema debatido desta tribuna por todos os representantes partidários quando da campanha eleitoral de 2006, reforma anunciada por muitos como a mãe de todas as reformas. É muito provável que, se não avançarmos na apreciação das medidas que estão em tramitação nesta Casa e na Câmara dos Deputados, talvez, tenhamos a realização das eleições em 2008 ainda sob o arcabouço jurídico que permite o financiamento privado das campanhas.

            Portanto, aqui, queremos declarar nossa mais absoluta convicção de que um dos elementos mais importantes, além de outros que efetivamente pretendo comentar em outro momento, é a reforma política. Entre outras medidas também importantes, destacamos o financiamento público de campanhas. São medidas essenciais para mudar esse quadro, que, sinceramente, envergonha cada um de nós e cada brasileiro e brasileira que nos assiste.

            O cidadão se dirige ao posto de saúde e não encontra remédio. Há os que estão acampados à beira das estradas porque não existem recursos, segundo alegam, para promover a verdadeira reforma agrária. As escolas públicas estão caindo aos pedaços no interior do País, quando se alega não haver dinheiro para promover a educação e a inclusão social de milhares de deserdados.

            Portanto, há o dinheiro sujo da corrupção, entranhada no Estado brasileiro, e é preciso agir no sentido de coibi-la, não só investigando esse fato, mas criando um conjunto de mecanismos que dificulte essa prática e que puna, especialmente, os que cometem crimes aos se apropriarem de recursos públicos a qualquer título.

            Sr. Presidente, queria encerrar dizendo que estou de acordo com as ações promovidas pela Polícia Federal, por tratarem de fatos importantes. A Polícia Federal só prende alguém ou apreende algum equipamento nessas investigações, Sr. Presidente, se for autorizada pelo Poder Judiciário. Então, chamo a atenção para o fato de, nos últimos quatro anos, ter sido promovida a prisão de mais de cinco mil pessoas, a realização de 284 operações policiais. Mas esta é a pergunta que fazemos: quantos, efetivamente, foram julgados? Quantos, efetivamente, foram presos e punidos?

            O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Permita-me V. Exª um aparte?

            O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Senador Almeida Lima, estamos na Ordem do Dia. O Senador Tião Viana, que estava presidindo a sessão, abriu exceção e concedeu a palavra ao Senador José Nery, mas retomaremos a Ordem do Dia tão logo S. Exª encerre. É o apelo que faço a V. Exª.

            O SR. JOSÉ NERY (P-SOL - PA) - Obrigado, Sr. Presidente. Já estou encerrando. Conclamo o que é mais importante neste momento, sem deixar de ter a consciência da investigação desse fato, feita a partir da Operação Navalha, que envolve empresas e diversos órgãos do Poder Público, do Executivo estadual e municipal: estou aqui com o requerimento propondo a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para apurar, em 180 dias, fatos que já são do conhecimento de toda a Nação brasileira. Convido os Partidos e cada Parlamentar, em particular, para se somarem a esse esforço de investigação dos fatos aqui denunciados.

            O mais grave, Sr. Presidente, é que o curso da investigação e da operação realizada aponta para o envolvimento de um Ministro de Estado.

            Eu creio que a medida mais efetiva e necessária neste momento, pelos indícios apresentados - sem aqui apresentar de nossa parte qualquer prejulgamento, porque só a Justiça poderá assim decretar e julgar um cidadão, e o Congresso também poderá identificar, nas suas apurações, as responsabilidades -, diante dos fatos aqui demonstrados de conhecimento, a medida imediata que o Senhor Presidente da República haveria de tomar seria a demissão imediata do Ministro Silas Rondeau, para as devidas averiguações e apurações. Se, ao final do processo, ficar provada a sua inocência, que ele então seja reabilitado ao cargo. Enquanto isso, a Nação espera medida mais convincente e mais afirmativa, porque o Brasil, a consciência democrática de nosso povo exige providências, pelo que já conseguimos acumular em termos de luta, de experiência e de combate à corrupção. Com certeza, enquanto aqui estamos falando, alguém, em algum lugar do País, está tramando alguma forma de se apropriar do que é público para servir a interesses pouco confessáveis.

            Por último, Sr. Presidente, não concordo com a visão de que essa é uma questão do Executivo. É uma responsabilidade que está posta para o Parlamento, para cada um de nós: a tarefa de esclarecer fatos tão graves para a Nação.

            Agradeço a V. Exª o tempo concedido, e espero, ao descer da tribuna, o convite para que assinemos nesta tarde, aqui no Senado Federal, o pedido de instalação da CPI mista para apurar todos os fatos relacionados à Operação Navalha.

            Muito obrigado.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/05/2007 - Página 15774