Discurso durante a 85ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem pelo transcurso do Dia Mundial do Meio Ambiente. Defesa de um plano de desenvolvimento para a Amazônia, que inclua a população local e respeite o meio ambiente.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Homenagem pelo transcurso do Dia Mundial do Meio Ambiente. Defesa de um plano de desenvolvimento para a Amazônia, que inclua a população local e respeite o meio ambiente.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2007 - Página 18042
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MEIO AMBIENTE, ANALISE, IMPORTANCIA, BIODIVERSIDADE, BRASIL, MUNDO.
  • ANALISE, EFEITO, CAPITALISMO, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE, REGISTRO, RISCOS, AGRICULTURA, EXPORTAÇÃO, DESMATAMENTO, FLORESTA AMAZONICA, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REGIÃO AMAZONICA.
  • DEFESA, VALORIZAÇÃO, CULTURA, REGIÃO AMAZONICA, SUGESTÃO, INVESTIMENTO, PESCA ARTESANAL, AGRICULTURA, ECONOMIA FAMILIAR, CRITICA, CONCENTRAÇÃO, APROPRIAÇÃO, PRODUTO, RESULTADO, ATIVIDADE ECONOMICA, REGIÃO.
  • ANALISE, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, AMEAÇA, RIO XINGU, RIO MADEIRA, REIVINDICAÇÃO, GARANTIA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, VITIMA, EFEITO, OBRAS, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE.
  • REGISTRO, HISTORIA, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, ESTADO DO PARA (PA), AUSENCIA, PAGAMENTO, COMPENSAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE, MARGEM, RIO TOCANTINS.
  • NECESSIDADE, REVISÃO, FORMA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, ELOGIO, INICIATIVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESMATAMENTO, DEFESA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Papaléo, que ora preside a Mesa, quero, antes de tudo, agradecer a gentileza ao Senador Gilvam, nobre amigo e exemplar Parlamentar, que representa, com muito brio, o Estado do Amapá neste Senado Federal.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estive ausente na sessão especial que o Senado Federal realizou na semana passada em homenagem ao Dia Mundial do Meio Ambiente, que se comemora amanhã. Por essa razão, eu não poderia ficar ausente desse debate tão próximo dos sentimentos e dos interesses do povo amazônico, do Amapá do Senador Gilvam, do meu Acre querido. Enfim, quero fazer algumas considerações acerca do tema que acho de fundamental importância.

Lembro, Senador Papaléo, que, primeiro, foram feitos alertas ambientais no Clube de Roma em 1971 ainda e que, depois, foi realizada a Conferência da ONU em Estocolmo, em 1972, e, assim, foi estabelecido o dia 05 de junho como o Dia Mundial do Meio Ambiente.

Na semana passada, como já fiz disse, esta Casa realizou sessão especial como parte das comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente no Brasil. É uma iniciativa do Poder Legislativo brasileiro, que busca se somar aos alertas internacionais que vêm sendo feitos, alertas estes que aumentaram e se tornaram ainda mais dramáticos para o planeta Terra este ano, pelas últimas conclusões do Painel Intragovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU).

O dia 5 de junho - o dia de amanhã - deveria ser um dia de festa e de comemoração, pelo brilhantismo e pela riqueza do meio ambiente e de seus ecossistemas interdependentes, como os seres humanos. Deveríamos comemorá-lo ainda mais no Brasil, maior país tropical do planeta, possuidor de regiões belas e diferentes, como o magnífico Pantanal e o cerrado no Planalto Central; a bela Região Sul, a nossa Europa brasileira; o lindo litoral atlântico, que vai do Amapá ao Rio Grande do Sul, passando pelo extraordinário Nordeste do País; ou ainda a Amazônia, minha querida Amazônia, que, sozinha, detém a maior e mais característica biodiversidade sócio-cultural-ecológica do globo terrestre.

O Brasil é privilegiado, sem dúvida, mas não nos esqueçamos de que estamos no planeta do Monte Everest, entre o Nepal e a China; de que temos maravilhas como as ilhas Galápagos no Pacífico Equatoriano, principal laboratório vivo de biologia marinha do mundo; os corais da Austrália e do Caribe; os Alpes Suíços; as cordilheiras do Himalaia; e também a maior floresta tropical e maior bacia hidrográfica do mundo, a Amazônia, com seus rios, frutas, peixes e pessoas absolutamente afáveis.

Apesar de toda essa exuberância natural no Brasil e no mundo, infelizmente, o dia 5 de junho tem se transformado em dia de alerta e de luta em defesa do planeta Terra. A lógica predominante de racionalidade do ser humano, que orienta sua relação com a natureza e que dita o modelo de desenvolvimento das nações, tem agido sistematicamente para esgotar os recursos naturais existentes hoje e para desfigurar o painel climático da Terra. Isso pode ocasionar o fim da espécie humana e acelerar dramaticamente o cruel processo de seleção social e ambiental que sacrifica milhões de vida a cada dia e que recria nossas espécies, com o perdão de Charles Darwin.

Para grande parte das crianças que nascem no mundo diariamente, são destinadas privações alimentares, de saúde e de educação. O mesmo sistema que exclui milhões de famílias de elementos básicos de sobrevivência e de dignidade - a dita cidadania - está levando o meio ambiente global a situações catastróficas. Isso é fruto do mesmo modelo cruel criado pelo homem: o capitalismo.

O homem é, sem dúvida, o componente mais ingrato do meio ambiente. É ingrato com a natureza e ingrato com seus semelhantes. Isso gera, por um lado, uma massa de miseráveis e, por outro, a pequena classe dominante que dita as normas. No final, ficam destruição ambiental e caos social.

Este é o ponto central, Senador Papaléo Paes: as normas estabelecidas pela economia neoliberal e adotadas pela maioria esmagadora dos Estados Nacionais - o Brasil incluído - criam necessariamente uma situação de degradação ao meio ambiente e de exclusão da maioria das pessoas aos supostos benefícios sociais da destruição ambiental.

O capitalismo estabelece imaginários de consumo e de desejos que os recursos existentes na terra não possuem capacidade de oferecer nessa escala a todos os seres humanos, não, ao menos, sem causar danos irreversíveis ao meio ambiente global e pôr em risco a reprodução da vida.

V. Exªs sabem que a Amazônia está seriamente ameaçada. Quero aproveitar este dia para falar isso novamente. O povo da Amazônia sabe muito bem disso. As maiores ameaças à Amazônia vêm do agronegócio, sejam as monoculturas de soja, de eucalipto e de dendê, seja a pecuária extensiva, a indústria madeireira e pesqueira, as grandes mineradoras, os biopiratas estrangeiros, todos financiados pelo grande capital internacional e nacional. Esses são os que ameaçam a Amazônia.

Na Amazônia, sempre fomos meros fornecedores de matéria-prima, seja borracha, castanha, açaí, peixe, ferro, ouro ou energia elétrica. E sempre se ignorou nossa cultura e nossas formas de produção e de vida. Esse é um ataque violento ao meio ambiente e à vida. Contra isso, deve voltar-se o Dia Mundial do Meio Ambiente, contra essa violência e esse planejamento estrangeiro na Amazônia.

Como contribuição ao meio ambiente global, nessa comemoração do Dia Mundial do Meio Ambiente, que ocorrerá a partir de amanhã, mas já ressaltado desde a semana passada neste Senado Federal, o Governo do Brasil poderia fazer uma homenagem à Amazônia. A homenagem seria a seguinte, Senador Papaléo Paes: a partir de agora, o Governo priorizaria investimentos em projetos que tivessem sintonia com o desenvolvimento de atividades econômicas não predatórias da floresta, como a pesca artesanal, a agricultura familiar com assistência técnica adequada, o extrativismo florestal sustentável, a pesquisa pública em fármacos e em cosméticos, a construção naval, enfim, incrementando técnica e tecnologicamente a produção familiar e a sustentabilidade na Amazônia. Para isso, é necessário investir pesadamente em pesquisa na Amazônia.

Mais uma vez, repito o que venho dizendo nesta Casa: há necessidade de o Governo brasileiro investir pesadamente na pesquisa em um amplo levantamento, em um inventário exaustivo da Amazônia, em particular da floresta amazônica, para, a partir daí, sim, projetarmos aquilo que deva ser objeto de exploração naquela grande região, aí, sim, de forma genuinamente sustentável.

O chamado desenvolvimento sustentável que hoje se pratica na região amazônica, quase como um todo, com raras exceções, a meu ver, na prática, significa que a população amazônica trabalha e sustenta o desenvolvimento de poucos. Essa é uma lógica perversa dos projetos que se instalam, que se implantam há muitos anos naquela região. É a lógica perversa de que a apropriação se faz de modo privado e em pequenos grupos. Falo da apropriação das riquezas resultantes da atividade econômica, Senador Mão Santa. O esforço é da população amazônica, mas a apropriação do resultado dessa atividade toda é privada e se dá em pequenos grupos.

O Governo repete a mesma lógica há anos na Amazônia - não só este Governo: o binômio estradas/hidrelétricas. Atrás vem a destruição florestal e o empobrecimento do homem. Que sejam feitas as estradas e se construam as hidrelétricas! Mas é só isso? E o resto? Como ficam o povo amazônida e o meio ambiente? Destruídos e humilhados?

Os milhares de rios, furos, baías e igarapés entrecortando as várzeas da floresta representam uma das mais fortes simbologias da vida cabocla e ribeirinha tradicional da Amazônia, sendo fonte de vida e de conhecimento para comunidades indígenas e agroextrativistas.

Amanhã, dia 5 de junho, comemoraremos o Dia Mundial do Meio Ambiente. Dois grandes rios do meio ambiente amazônico estão sob forte ameaça: o rio Xingu e o rio Madeira. Nesses dois rios, podem ser construídas até seis hidrelétricas, três das quais já constam do chamado PAC: Belo Monte, Santo Antonio e Jirau. As usinas do rio Madeira podem, inclusive, afetar socialmente o Acre - disso já sabemos. O Brasil precisa gerar mais energia? Sim. Então, façamos com que os projetos hidrelétricos de geração contemplem políticas públicas intergovernamentais sérias de desenvolvimento para as populações e para os territórios atingidos pelos empreendimentos.

O que não dá é construir as usinas no rio, mandar a energia para longe, e o povo local perder seu peixe, seu açaí, a terra da várzea para plantar, e ficar por isso mesmo. Ah, não! Isso foi na época da Ditadura Militar, na década de 70. Estamos no século XXI. Agora é diferente! Quer construir? Quer inundar territórios? Então, teremos de garantir a qualidade de vida do povo, seja indígena, quilombola, ribeirinho, população urbana afetada, o que for.

No Dia do Meio Ambiente, clamo por esses dois grandes rios da Amazônia: o rio Madeira e o rio Xingu. Da mesma forma, clamo por outro grande rio do Brasil que está ameaçado, o rio São Francisco, no Nordeste brasileiro. Quero chamar a atenção para nossos rios, pois, no passado, outro grande rio da Amazônia foi atingido: o rio Tocantins. Com a construção da usina, como disse Chico Buarque, “talvez fique ruim pra pescar, meu Amor, no Tocantins...”. E, realmente, ficou ruim, Senador Mão Santa, para pescar no Tocantins e em seus afluentes. A usina de Tucuruí causou o desaparecimento ou a mutação em cerca de 30 espécies de peixes, segundo a própria Eletronorte.

Em mais de 20 anos de funcionamento, a Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, a maior totalmente nacional, ainda carrega complicados passivos judiciais de centenas de famílias atingidas pela barragem. Reivindicam compensação dos impactos sofridos nas décadas de 70, de 80 e de 90. É simplesmente deprimente! Toda a população ribeirinha economicamente ativa da época foi desalojada. Hoje, os sobreviventes são milhares de idosos, morando há anos às margens de estradas inexeqüíveis e em pequenas ilhas improdutivas formadas pelo lago artificial de Tucuruí.

Recentemente, Tucuruí poderia ter sido apagada. E poderia ter sido apagada por quem foi posto no escuro por anos pelo Governo brasileiro e pela Eletronorte, que, há anos, tripudia sobre a miséria e o sofrimento do povo atingido pela usina. O setor elétrico vive um apagão social, um apagão ambiental. Para construir novas usinas na Amazônia, o Governo Federal deve, primeiro, consertar os problemas que gerou com as velhas usinas que construiu, como Tucuruí, no Pará, e Samuel, em Rondônia.

Para concluir, Sr. Presidente, registro, neste momento, um sábio pensamento sobre o dilema ambiental que vivem a humanidade e o planeta Terra. O ambientalista e professor da Universidade de Brasília Marcel Bursztyn alerta a humanidade para as armadilhas do progresso, fruto de uma racionalidade utilitária do ser humano sobre a natureza, que reduz a economia à exploração desmedida dos recursos naturais para a satisfação pessoal, sem pensar coletivamente nas gerações futuras. Essa lógica contínua levaria a humanidade a padrões insustentáveis de sobrevivência e de reprodução. Concordo plenamente com o professor.

O raciocínio capitalista considera a natureza como mero meio de produção de riquezas. A lógica econômica mundial pensa assim. E não é isso, não! A natureza, o meio ambiente é muito mais do que isso, não e só lucro. O ser humano e a natureza são muito mais do que o ter; são principalmente o ser, o bem-estar, o sentimento, a vida coletiva, algo que está muito além do ter, do possuir, do dominar, do mandar.

No passado, o teórico Jonh Mill idealizou o “crescimento zero” como forma de barrar os disparates entre o estilo de desenvolvimento industrial e a capacidade de regeneração da biosfera. Creio que o caminho não é também o “crescimento zero”, tampouco o “desenvolvimento cego” que o Brasil e o mundo vêm praticando. Devemos encontrar a medida certa entre desenvolvimento, qualidade de vida para todos, preservação ambiental e garantia de continuidade de todas as espécies vivas do meio ambiente. Creio que esse seria um bom desafio.

Quero, para concluir, Sr. Presidente, referir-me a uma proposição da qual tomei conhecimento, há pouco, por um repórter da Rádio Senado, defendida pelo Presidente Lula, no sentido de que mundialmente se constitua um fundo contra o desmatamento. Louvo a iniciativa do Presidente Lula, mas, modestamente, atrevo-me a sugerir a Sua Excelência que mude um pouco o foco dessa proposição, porque um fundo contra o desmatamento é algo contemplativo, Senador Papaléo Paes. Penso que o ideal seria que o Presidente Lula se batesse pela constituição de um fundo para financiarmos, internamente, em nosso País, a pesquisa e o desenvolvimento, principalmente na grande região amazônica. Isso permitiria que fossem contratados milhares de técnicos e de cientistas, para que pudéssemos, enfim, fazer, como venho dizendo, um grande inventário daquela região. Assim, com um conhecimento concreto, com uma grande radiografia feita naquela região, poderemos identificar, com precisão, cientificamente, o que temos ali de melhor, o que temos ali para explorar.

Com base em informações consistentes, poderemos elaborar planos de desenvolvimento daquela região. Porém, clamo aos céus para que esses planos, de uma vez por todas, contemplem a participação da população amazônica não só no esforço da produção de riquezas, mas também na apropriação do resultado desse grande esforço, para quebrar aquela lógica perversa que paira sobre nossa região, Senador Papaléo, de que a população participa do esforço, mas não participa da apropriação dos seus resultados. Esses resultados são apropriados, via de regra, por pequenos grupos, sejam mineradores - como se deu na época da exploração da borracha -, sejam madeireiros, seja quem for. Que o governo brasileiro, enfim, compenetre-se da necessidade de induzir o processo de desenvolvimento genuinamente sustentável naquela região, envolvendo toda a população não só no esforço da busca e da exploração de riquezas, mas também na apropriação dos resultados, na apropriação de tais riquezas!

Creio que, nesse caminho, iríamos bem. Nessa estrada, caminharíamos com precisão, para fazer com que a Amazônia deixasse de ser o horizonte da contemplação de muitos de fora e de dentro do Brasil e passasse a integrar, genuína e definitivamente, o processo de desenvolvimento brasileiro.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2007 - Página 18042