Discurso durante a 85ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa no sentido de que o Governo torne públicas as discussões que vem promovendo sobre a regulamentação do mercado de cartões de crédito.

Autor
Adelmir Santana (PFL - Partido da Frente Liberal/DF)
Nome completo: Adelmir Santana
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA POPULAR. BANCOS.:
  • Defesa no sentido de que o Governo torne públicas as discussões que vem promovendo sobre a regulamentação do mercado de cartões de crédito.
Aparteantes
Heráclito Fortes, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2007 - Página 18045
Assunto
Outros > ECONOMIA POPULAR. BANCOS.
Indexação
  • REITERAÇÃO, IMPORTANCIA, REGULAMENTAÇÃO, SERVIÇO, CARTÃO DE CREDITO, REGISTRO, EDITORIAL, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEFESA, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, CONTENÇÃO, ABUSO, PODER ECONOMICO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, CRITICA, AUSENCIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, IMPEDIMENTO, CONCORRENCIA, PREJUIZO, CONSUMIDOR, DESCONHECIMENTO, VALOR, TAXA DE SERVIÇO, IMPOSSIBILIDADE, ANALISE, ESCOLHA, OPERAÇÃO FINANCEIRA.
  • COMPARAÇÃO, TAXA DE SERVIÇO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, CARTÃO DE CREDITO, PAIS ESTRANGEIRO, AMERICA LATINA, DEMONSTRAÇÃO, SUPERIORIDADE, TAXA DE COBRANÇA, BRASIL, COMENTARIO, ALEGAÇÕES, EMPRESA DE CREDITO, PARCELAMENTO, CREDITOS, LONGO PRAZO, RESULTADO, AUMENTO, TARIFAS.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, FIXAÇÃO, REDUÇÃO, PREÇO, FAVORECIMENTO, CONSUMIDOR, INUTILIZAÇÃO, CARTÃO DE CREDITO, SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), ESCLARECIMENTOS, SITUAÇÃO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, ESTUDO, REGULAMENTAÇÃO, OPERAÇÃO FINANCEIRA, DEFESA, INVESTIGAÇÃO, ABUSO, PODER ECONOMICO.

O SR. ADELMIR SANTANA (PFL - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há pouco mais de um mês, subi a esta tribuna para tecer considerações sobre algumas questões relativas ao uso de cartões de crédito e de débito.

Meu pronunciamento tinha o claro propósito de suscitar o debate acerca desse segmento que é tão importante no dia a dia da economia, mas, diria eu, ainda pouco transparente em nosso País.

Passados esses dias, acho que cumpri satisfatoriamente o primeiro objetivo: chamar a atenção da sociedade e das autoridades para a necessidade de avaliação e de regulamentação do setor.

Recebi o apoio de líderes empresariais do setor do comércio.

O assunto mereceu também repercussão na imprensa, inclusive uma grande reportagem no caderno de Finanças do jornal Valor Econômico do último dia 25, sexta-feira, com o título: “Cresce pressão contra empresa de cartão”.

Desde o primeiro momento, salientei que os cartões de crédito e de débito são uma conquista inestimável da nossa sociedade cujos benefícios devem ser louvados e conservados.

No entanto, há aspectos preocupantes no exercício dessa atividade que devem ser avaliados e combatidos.

Por ocasião daquele pronunciamento, procurei trazer aos meus eminentes pares as questões que estão sendo debatidas em todo o mundo, com ênfase para o fato de que autoridades de defesa da concorrência de diversos países enxergam na conduta das bandeiras prática de colusão e exercício abusivo de poder econômico.

Não me parece lógico que, sendo os mesmos agentes econômicos a atuar no mercado brasileiro, possamos partir da presunção quase inocente de que não exercitam aqui os mesmos métodos que vêm sendo condenados no exterior.

Também busquei informar a todos os senadores e à sociedade brasileira que as taxas cobradas em diversos países são consideradas abusivas, porém bem inferiores às praticadas em nosso País.

Há, portanto, imensas falhas de mercado que merecem a atenção de nossas autoridades, seja para uma regulação mais efetiva seja para o combate às práticas anticoncorrenciais.

Aliás, sobre essas falhas, gostaria de destacar a corretíssima opinião contida no editorial do Valor Econômico do último dia 29. Diz o editorial: “Existe farta evidência de falhas de mercado, que devem ser corrigidas pelo poder público”.

No entanto, em resposta a essas assertivas, a Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito) contesta a afirmação de que as taxas médias são de quase 4%, afirmando ainda que parte da responsabilidade pelos elevados valores é do crédito parcelado ao consumidor.

Alega, ainda, que o principal beneficiário do prazo de pagamento elástico, que tantos problemas traz ao lojista, é o próprio consumidor.

Com o devido respeito, as informações prestadas não nos convencem pelos fatos que passamos a detalhar.

Apenas para ficar nos vizinhos mais próximos, do Mercosul, cujo Parlamento tenho a honra de integrar, o prazo de pagamento ao lojista é incomparavelmente menor e as taxas substancialmente mais baixas.

No Uruguai, por exemplo, os prazos médios são de quatro dias e a taxa, de cerca de 1,3%. Na Argentina, os prazos de pagamento são de aproximadamente dezoito dias e as taxas praticadas por Visa e Mastercard estão ao redor de 1,25%.

Não me consta que esses prazos mais restritos e essas taxas mais modestas tenham sido óbice ao crescimento e ao desenvolvimento dessa modalidade de pagamento.

O crédito parcelado é outra desculpa para a elevação das taxas.

Segundo esse argumento, até plausível, o aumento do risco de crédito e do custo financeiro da operação acarreta taxas mais elevadas.

Os defensores dessa posição só se esquecem de mencionar que esse risco financeiro é suportado pelos bancos, e é também a justificativa adotada para a cobrança de encargos financeiros em torno de 10% ao mês, ou 200% ao ano, se computados juros sobre juros.

Será que o risco de crédito e o custo financeiro desse pagamento parcelado podem justificar, simultaneamente, o aumento das taxas de desconto e os spreads mais elevados do mundo?

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, no meu entender, é provável que, como já identificado em outros países, essas taxas absolutamente discrepantes sejam fruto da inépcia de nossas autoridades em combater essas imperfeições do mercado, notadamente as práticas de colusão.

A Abecs contesta ainda os dados apresentados segundo os quais a taxa média brasileira está em redor de 4%. Os dados que citamos estão em substancioso estudo da Fundação Getúlio Vargas publicado em outubro de 2005.

Essa divergência de números, entretanto, chama a atenção para um outro aspecto da questão: a absoluta falta de transparência das empresas do setor. Foi esse o aspecto que buscamos contemplar em nosso primeiro pronunciamento.

Os consumidores não conseguem identificar o real custo da operação feita com o cartão, e por isso não são capazes de rejeitá-lo ainda que haja opções menos dispendiosas de pagamento.

Importante considerar aqui um derradeiro argumento freqüentemente utilizado pelos defensores da cobrança mais elevada: o argumento acadêmico de que se trata de um “mercado de dois lados”, ou seja, um mercado em que a receita das administradoras é composta por uma parcela paga pelos lojistas e outra paga pelos usuários.

Segundo esse argumento, cobrar menos do lojista implicaria a necessidade de cobrar mais do portador do cartão. Também nos parece um falso dilema e, talvez, um grande sofisma.

Quem afirma que parte da receita das administradoras provém dos lojistas convenientemente se esquece de mencionar que o pagamento feito pelo empresário é custo e, como tal, repassado ao mercado por intermédio de aumento de preços. Assim, na verdade, é sempre o consumidor quem paga a conta dos dois lados do mercado.

O problema é que, ao não cobrar diretamente do consumidor, embutido na conta do lojista parte dos custos do uso do cartão, a administradora mascara o custo total da operação. O mercado de dois lados é, pois, uma ferramenta que contribui para a falta de transparência do setor.

Se o consumidor não sabe quanto está pagando pelo serviço, não tem como rejeitar aumento de preços. Em outras palavras, a célebre lei da oferta e da demanda não funciona no segmento de cartões de crédito por conta da ausência de informação ao consumidor.

O segundo problema, talvez mais grave, já foi abordado no pronunciamento anterior: é a diluição desses custos de operação entre todos os consumidores indistintamente, sejam eles portadores ou não desse meio de pagamento.

Como já foi dito naquela oportunidade, e está devidamente demonstrado em estudo da própria SEAE (Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda), essa homogeneidade de tratamento implica em uma política regressiva de distribuição de renda, onde as classes menos favorecidas, que normalmente não usam o cartão, rateiam as despesas com as classes um pouco mais privilegiadas.

Aliás, Sr. Presidente, gostaria de avivar à Mesa desta Casa que, com base neste raciocínio, apresentei recentemente um projeto de lei visando à defesa dos consumidores brasileiros que não usam cartões de crédito, permitindo a fixação de preço diferenciado na venda de bens ou na prestação de serviços pagos com cartão de crédito em relação ao pagamento final.

Protocolei também requerimento de informação no qual solicito à Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda e ao Banco Central informações disponíveis sobre esse mercado e quanto ao estágio dos estudos para a sua regulação.

Solicitei, ainda, informações à Secretaria de Direito Econômico sobre as eventuais investigações de práticas abusivas levadas adiante pelos agentes de mercado.

Neste momento...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Adelmir Santana...

O SR. ADELMIR SANTANA (PFL - DF) - Só um minuto, Senador Mão Santa.

Peço à Mesa a agilização desses pedidos para que o debate se torne mais público.

Concedo o aparte a V. Exª, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Adelmir Santana, estava atentamente ouvindo o pronunciamento de V. Exª e fazendo uma reflexão sobre a preocupação de um empresário, hoje um líder extraordinário do povo desta capital. Ao advertir o povo brasileiro, V. Exª incorpora a inspiração daquele maior estadista da democracia, Abraham Lincoln, que disse: “não baseie sua prosperidade com dinheiro emprestado”. Isso marcou a mentalidade do povo norte-americano, que é o povo mais rico. Quero dizer que a lei assinada pela Princesa Isabel garantiu liberdade aos escravos negros, mas, hoje, os maiores escravos são os que têm dívidas. É uma lástima o Governo brasileiro pensar de forma inversa Olhem esses empréstimos que são concedidos aos nossos pobres idosos e aposentados, que hoje estão todos endividados; os ganhos que recebiam, porque são honrados e honestos, não dão mais para pagar os medicamentos, porque se desequilibraram com os empréstimos e todos estão sofrendo. Então, é a bom tempo a voz de V. Exª, um homem de larga experiência, que traz a este País aquele pensamento que enriqueceu a sociedade norte-americana: não baseie a prosperidade com dinheiro emprestado. A dívida é que aprisiona e escraviza o povo brasileiro.

O SR. ADELMIR SANTANA (PFL - DF) - Muito obrigado, Senador Mão Santa, pelo aparte de V. Exª.

Acho que, como Parlamentares, representantes do povo brasileiro, não podemos concordar com uma regra que drena recursos daqueles que menos têm em direção aos que estão em melhores condições.

Peço desculpas ao Senador Heráclito Fortes, que havia pedido um aparte.

Senador Heráclito Fortes, concedo-lhe um aparte.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Quero louvar V. Exª pelo pronunciamento e dizer que exerce, na tribuna do Senado, com muito brilho, toda a liderança logística que, ao longo dos anos, lhe credenciou na Capital Federal. Esse seu pronunciamento é abalizado, de quem conhece a fundo a extorsão que a população se submete tendo em vista o poderio de organizações como essas, e V. Exª faz um alerta. Na realidade, essas taxas são escorchantes, aliadas aos juros que são pagos nesses cartões. É preciso que o Governo brasileiro, na defesa do consumidor, tome providências urgentes, e penso que V. Exª poderá dar uma contribuição grandiosa, subsidiando esta Casa sobre essa matéria. Louvo V. Exª.

O SR. ADELMIR SANTANA (PFL - DF) - Muito obrigado, Senador Heráclito Fortes, pelo aparte de V. Exª, que enriquece o nosso pronunciamento.

O já citado editorial do prestigioso jornal Valor Econômico, creio eu, que vai ao encontro das nossas preocupações. Nesse editorial, comentando os diversos projetos em tramitação no Congresso Nacional sobre o assunto, o jornal reconhece a necessidade de contenção das chamadas “imperfeições do mercado”, sem embargo de chamar a atenção para o risco de intervenções açodadas no mercado que podem prejudicar o setor.

Essa também, Srªs e Srs. Senadores, é a nossa intenção. Entendemos que o País já teve a sua dose de medidas heterodoxas, tablitas e outros mecanismos atabalhoados de intervenção que, a pretexto de regular, acabavam criando condições artificiais e insustentáveis de mercado. Não é esse, definitivamente, o meu propósito. Não queremos engessar este segmento ou outro qualquer do setor econômico.

A meu juízo, precisamos de mecanismos de mercado para a solução das mazelas do setor. Medidas que dêem transparência e que permitam, por exemplo, ao consumidor, rejeitar os preços que considerar abusivos.

Em todos os ramos do comércio, a mais comezinha regra de conduta, trazida pelo bem-sucedido Código de Defesa do Consumidor, impõe a transparência e a completude das informações, que devem ser claras e ostensivas.

Preços devem ser expostos, bem como também as taxas de juros cobradas. E a indústria de cartões de crédito não deve fugir a essa regra. O consumidor tem o direito de saber quanto está pagando pelo uso do serviço, qual o incremento do preço advindo do uso do crédito parcelado. E o consumidor dever ter a oportunidade de rejeitar o preço mais elevado.

O mercado precisa funcionar, mas, para isso, o consumidor precisa estar informado. Além disso, outras medidas também merecem ser examinadas, como o compartilhamento das estruturas de transação.

É do nosso conhecimento que o Departamento de Operações Bancárias do Banco Central se dedica a avaliar esse segmento. E certamente o faz com muita competência. Mas nada substitui o debate público, na Casa Legislativa, que dá transparência e permite a participação dos diversos setores da sociedade. Discussão, sim; regulamentação, sim; mas não a portas fechadas, em gabinetes.

Como já disse da primeira vez que ocupei esta tribuna para falar sobre cartões de crédito, só com o debate público, com a participação de todos - Governo, empresários, bancos, consumidores e as bandeiras -, poderemos ter uma regulamentação madura, que permita que mantenhamos as conquistas valiosas desse meio de pagamento, freando, no entanto, o exercício abusivo do poder econômico e as práticas anticompetitivas.

Não é possível que este assunto, discutido nos parlamentos de países com taxas extremamente inferiores às nossas, não possa ser discutido com toda clareza no Parlamento brasileiro. Este é um assunto que preocupa o Senado americano e está em discussão no Parlamento europeu.

Portanto, Sr. Presidente, temos de agilizar esse pedido de informações tanto ao Ministério da Fazenda como ao Banco Central, para que possamos discutir esta matéria, com clareza, com todas as partes envolvidas e possamos tirar todas as dúvidas sobre a interpretação da legislação que rege essas questões.

Não é possível convivermos com taxas três vezes superiores às cobradas na Austrália, por exemplo. Não é possível vivermos com taxas superiores às americanas em mais de 70%. Esse assunto tem de ser discutido amplamente por todos nós com toda a força do nosso Parlamento e das classes envolvidas.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2007 - Página 18045