Discurso durante a 85ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repúdio à manifestação do Presidente Chávez, da Venezuela, contra o Congresso Nacional brasileiro.

Autor
César Borges (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: César Augusto Rabello Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Repúdio à manifestação do Presidente Chávez, da Venezuela, contra o Congresso Nacional brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2007 - Página 18070
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, DESRESPEITO, DEMOCRACIA, REGISTRO, IRREGULARIDADE, ELEIÇÃO, PROTESTO, FECHAMENTO, EMISSORA, TELEVISÃO, PREJUIZO, LIBERDADE DE IMPRENSA, MOTIVO, OFENSA, SENADO, BRASIL.
  • CRITICA, OMISSÃO, BANCADA, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, ACEITAÇÃO, OFENSA, ANALISE, SEMELHANÇA, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, APREENSÃO, PREJUIZO, DEMOCRACIA, BRASIL.
  • QUESTIONAMENTO, INTERESSE, GOVERNO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), OBRIGATORIEDADE, PROGRAMA, TELEVISÃO, EXIBIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO, INDICAÇÃO, IDADE, RECOMENDAÇÃO, PROGRAMAÇÃO, AUSENCIA, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • CRITICA, PROJETO, GOVERNO FEDERAL, CRIAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, EXECUTIVO.
  • CRITICA, GOVERNO ESTRANGEIRO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, IMPEDIMENTO, ATUAÇÃO, OPOSIÇÃO, CONTROLE, JUDICIARIO, COMENTARIO, NECESSIDADE, GARANTIA, DEMOCRACIA, AMERICA LATINA.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente. Espero não ter de usar todo o tempo.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Fique à vontade! Use sua inteligência, inspirada pela inteligência do baiano Rui Barbosa, que norteou esta Casa.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Não é minha intenção, nem de longe, igualar-me à figura de Rui Barbosa. Entretanto, fico honrado, como baiano, com a menção feita por V. Exª ao nome de Rui Barbosa, uma referência para todos nós, principalmente para aqueles que amam a democracia. Rui Barbosa foi um democrata e, apesar de não ter tido a oportunidade de ser Presidente da República, disputou a Presidência por várias vezes, dando força ao poder civil no Brasil. Isso marcou a história da nossa democracia.

Sr. Presidente, a democracia é sempre, eu diria, uma flor muito tenra que tem de ser cuidada com muito carinho. Qualquer ameaça deve ser afastada. Por ela ser frágil, a qualquer momento é possível aparecer, na história de qualquer país, alguém que não tenha verdadeiros princípios democráticos e que venha a ameaçar a democracia. O que se passa hoje na Venezuela é exatamente isso. Hoje, o Presidente da República Hugo Chávez utilizou-se da democracia venezuelana para destruir os princípios democráticos daquele país, sempre se escudando no princípio de que o voto popular pode tudo, de que o voto dá respaldo para qualquer atitude, desde a promulgação de uma lei delegada votada no Congresso Nacional - e cem por cento do Congresso apóiam o Presidente Chávez, porque a própria oposição se negou a participar de uma eleição que foi uma farsa -, desde a mudança da Constituição por inteiro, até o domínio completo do Judiciário. Todas as revistas noticiam que, dos seis mil processos julgados contra o governo, seis foram ganhos, e os juízes foram afastados. Essa é a democracia adjetivada bolivariana que hoje existe na Venezuela.

Sr. Presidente, participei da sessão realizada na semana passada, em que este Senado, de modo altivo, votou, após intensa discussão, uma moção de autoria do Senador Eduardo Azeredo. Inclusive, foi solicitado pelo Senador Gerson Camata que essa moção fosse mais dura, que fosse feita uma exigência ao governo da Venezuela. Mas o Senador Eduardo Azeredo, dentro do estilo de S. Exª, disse que deveria ser uma moção conclamando o Presidente da Venezuela a rever aquele ato que vai de encontro à liberdade de imprensa, que é fundamental para a existência da democracia.

O Senado Federal, de forma elegante e correta, simplesmente solicitou ao Presidente da Venezuela que ele refletisse e reconsiderasse sua posição. Lamentavelmente, o Senado foi atacado, vilipendiado. O Presidente Hugo Chávez, em cadeia de rádio e de TV, disse que o Senado brasileiro “age como um papagaio do Congresso americano”. Não sei exatamente onde ele foi tirar essa elucubração referente à relação entre o Senado brasileiro e a posição dos Senadores com o Congresso americano. E terminou dizendo “que é mais fácil o Brasil voltar a ser colônia portuguesa do que seu governo devolver a concessão ao canal oposicionista RCTV”. E ainda disse mais: “O Congresso brasileiro é dominado por movimentos e partidos da direita que estão tentando fazer com que a Venezuela não entre no Mercosul”.

Sr. Presidente, essas declarações, realmente, não fazem o menor sentido. Fico a imaginar se o Presidente Hugo Chávez estaria mandando uma mensagem ao Presidente Lula no sentido de que ele devesse adentrar por esses caminhos antidemocráticos ou a sugestão de que o Congresso brasileiro não teria legitimidade, porque dominado pelas direitas. O Governo do Presidente Lula é dito de centro-esquerda - não sei se é mesmo de centro-esquerda, de centro ou de centro-direita. Ele, talvez, estivesse caracterizando este Governo como de centro-direita. Mas o Governo, que gosta de se intitular como de centro-esquerda, tem a maioria no Parlamento. Onde estava o Partido dos Trabalhadores, que se diz de esquerda ou de centro-esquerda?

Aqui, foi aprovada essa moção, e, Sr. Presidente, todos estamos preocupados com essa situação, porque as notícias são inquietantes. O jornal O Estado de S. Paulo publicou, hoje - e aqui já foi mencionado por outros Senadores que me antecederam, como o Senador Arthur Virgilio e o Senador José Agripino -, declarações do Ministro Marco Aurélio Garcia: “Não julgamos que tenha sido violada nenhuma regra democrática”. Fechar um canal de televisão que tem 40% de audiência, segundo o Ministro Marco Aurélio, não significa que se está violando a democracia.

O Senador Romero Jucá, Líder do Governo, disse que o Presidente Lula se posicionou. Acontece que o Presidente Lula se posiciona hoje de uma maneira e, amanhã, posiciona-se de outra maneira; fica num movimento pendular. Se, num primeiro momento, ele se colocou em oposição às declarações do Presidente Chávez, hoje, como está noticiado, Sua Excelência já declara que o Brasil é parceiro da Venezuela e que esta não representa perigo à América Latina. Essa é a avaliação do Presidente Luiz Inácio Lula, feita em um programa da BBC, na Inglaterra.

Fico a perguntar, Sr. Presidente: que parceiro exatamente somos da Venezuela? De que somos parceiros da Venezuela? Do etanol, com certeza, não, porque o Presidente Chávez, assim como o eterno Presidente de Cuba, o Comandante Fidel, é contra o etanol. Com relação ao petróleo, somos parceiros? Onde há parceria entre Venezuela e Brasil? Fico a recear, Sr. Presidente, que essa parceria seja, lamentavelmente - e imagina o Presidente Chávez -, em torno de ideais totalitários.

Vejo aqui algumas ações do Governo que vão de encontro à democracia e aos princípios democráticos. Fico a temer por essas ações do Governo Lula. E digo, Sr. Presidente, que uma das parcerias mais recentes tem sido feita em relação às normas de classificação indicativa. Foi assim que começou o fechamento da RCTV. Na Venezuela, foi implantada a tal classificação indicativa dos programas de televisão. Esse foi, inclusive, um dos principais motivos alegados para o fechamento da concessão. Após implantar a classificação indicativa, levanta-se o argumento de que a RCTV não a estava cumprindo. E aí vem a farsa da justificativa do fechamento desse canal.

Já fiz um pronunciamento sobre isso, Sr. Presidente, e volto a afirmar que isso é inconstitucional, pois a Constituição Federal brasileira exige que, só por meio de lei, seja estabelecida alguma medida. Isso só pode ser feito por meio de projeto de lei a ser aprovado pelo Congresso Nacional, nunca por decisão do Ministério da Justiça, como deseja o atual Governo.

Receio que o Governo brasileiro queira agir da mesma forma - é claro que sem a desfaçatez a que estamos assistindo na Venezuela -, pois já procurou criar o Conselho Nacional de Justiça. Quer dizer, o Governo, se pudesse, teria sempre uma mídia televisiva ou escrita a seu favor. O Governo gosta de quem fale bem dele. Não falando bem, não é o caso, tanto é que há, agora, um projeto de R$350 milhões - e já se fala em R$450 milhões - para uma TV pública que fale bem do Governo; é o que se pretende. Senador Marconi Perillo, é exatamente isso que quer o Governo. Na França ou na Inglaterra, há democracias consolidadas; nesses países, há uma história de TV pública. Aqui, quer-se criar uma TV pública, para que o Governo tenha uma TV favorável, que lhe possa tecer loas, elogios. É o que se quer por meio da TV pública, para que se possa escolher até, segundo algumas mentes privilegiadas, o que deve ser a preferência do telespectador. Querem desclassificar totalmente a audiência. Não se deve procurar audiência ou Ibope, ninguém deve procurar isso, porque devemos fazer o que é interesse do telespectador. E quem vai interpretar o interesse do telespectador? Essas tais mentes privilegiadas, que - Deus nos salve! - podem ser mentes totalitárias também.

Sr. Presidente, neste momento, venho protestar contra tudo o que foi declarado pelo Presidente Chávez. E quero tratá-lo como Presidente Chávez, não gostaria de descer a outro tipo de consideração, pois é o Presidente de um país soberano. Entretanto, é bom que se diga: ele não está respeitando os princípios democráticos. E sabemos exatamente o que é democracia ou não. Assistimos a Adolf Hitler utilizar-se da democracia para implantar uma ditadura tenebrosa na Alemanha; assistimos a Stalin, da mesma forma, agir na União Soviética; assistimos - eu era jovem, bem jovem - a Fidel Castro ascender ao poder em Cuba, tornando-se o ditador mais antigo de todo o mundo e grande amigo de Chávez. E, hoje, não tenho dúvida de que, se puder, Hugo Chávez será Presidente perpétuo da Venezuela. São oito anos de mando, e ele vai renovar os mandatos, com uma política populista. Em cima dessa política populista, ele se mantém no poder, liquidando a democracia desse país irmão, que é a Venezuela.

Sr. Presidente, este Congresso é livre, felizmente, e que continue dessa forma! Aqui, criticamos a guerra do Iraque, iniciada pelos Estados Unidos da América do Norte, pelo Presidente Bush. Este Congresso é livre para criticar o Presidente da República, é livre para criticar, inclusive, seus próprios membros e, portanto, é livre também para sugerir, como foi feito com a moção aqui aprovada, que o Presidente Chávez reveja a decisão de fechar a RCTV.

A liberdade de expressão é o suporte vital de qualquer democracia, Sr. Presidente. Não há possibilidade de existir uma forma autêntica de liberdade que não esteja baseada na liberdade de expressão. Se o Estado começa a decidir sobre o que deve ou não ser mostrado aos cidadãos, o regime estatal deixa de ser democrático e se torna totalitário, pois a única liberdade que subsiste é a de concordar com o fato de que o Estado manda e o cidadão tem de obedecer.

V. Exª citou Rui Barbosa. Também me valerei de uma citação de Rui Barbosa: “A liberdade não é luxo dos tempos de bonança; é, sobretudo, o maior elemento de estabilidade das instituições”. Na Venezuela, com certeza, lamentavelmente, as instituições democráticas estão sendo, a cada dia, vilipendiadas.

Sr. Presidente, a revista Veja traz reportagem clara sobre o que está acontecendo na Venezuela atualmente. Há ameaças de morte: Chávez ataca nominalmente jornalistas na tevê, chamando-os de “inimigos do povo”; doze jornalistas já foram baleados pelos chamados chavistas. Há chuva de processos: com acusações absurdas, a Promotoria Pública processa jornalistas críticos e até já prendeu alguns. Há estrangulamento econômico - e isso se repete também no Brasil: Chávez cortou a propaganda oficial nos veículos de oposição e pressiona empresas privadas a fazer o mesmo. Veja o caso de Boris Casoy. E a Lei da Mordaça? Vejo aqui alguns defensores do regime Chávez que são contrários à lei da mordaça. Na Venezuela, eles são a favor da lei da mordaça, defendendo o regime Chávez. A Lei de Responsabilidade Social no rádio e na TV, de 2004, usa termos vagos, como “ameaça à segurança nacional”, e, com isso, consegue punir veículos que criticam o governo. Há obstáculos ao trabalho - olhe o caso Boris Casoy: o governo impede a participação de jornalistas críticos em eventos públicos, inclusive proibindo a participação desses jornalistas em entrevistas coletivas. Há também devassa fiscal: a pretexto de punir a sonegação fiscal, o governo já confiscou equipamentos de jornais e de canais de TV.

E, cada vez mais, lá o Presidente vai concentrando poder. Como eu já disse, ampliou, para ter domínio, o Tribunal Supremo de Justiça; nomeou seus amigos aliados para as vagas que ele próprio criou; governa poderes para legislar; alterou a Constituição para se reeleger quantas vezes quiser; interveio abertamente em eleições em outros países latino-americanos, como é o caso muito claro da Bolívia e do Equador. Houve tentativas suas nesse sentido no Peru e na Colômbia. Não obteve sucesso na Colômbia e no Peru, mas, sim, na Bolívia e no Equador.

Assim, lamentavelmente, estamos aqui, Sr. Presidente, a fazer este protesto. Tenho a certeza de que este Senado será altivo o suficiente para se posicionar de forma autêntica e verdadeira em defesa da democracia, seja no Brasil, seja na Venezuela.

A América Latina evoluiu. Hoje, há verdadeiras democracias em funcionamento. Não podemos aceitar um retrocesso como acontece na Venezuela, um retrocesso democrático, um retrocesso, inclusive, no regime do antigo populismo militar que existiu em muitos países da América Latina. É ao que, lamentavelmente, estamos assistindo.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador César Borges, permita-me interrompê-lo. Regimentalmente, preciso prorrogar a sessão por mais vinte minutos, para que V. Exª conclua, para ouvirmos o extraordinário líder de Goiás Marconi Perillo, dos tucanos, e para abrirmos o livro para novas inscrições.

O SR. CÉSAR BORGES (PFL - BA) - Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer. Agradeço a V. Exª. Ouvirei o belíssimo discurso do Senador Marconi Perillo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2007 - Página 18070