Discurso durante a 88ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Os efeitos do câmbio sobre o setor exportador nacional. O desequilíbrio no comércio mundial devido às diferenças das condições trabalhistas nos países.

Autor
Edison Lobão (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Edison Lobão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMERCIO EXTERIOR. POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Os efeitos do câmbio sobre o setor exportador nacional. O desequilíbrio no comércio mundial devido às diferenças das condições trabalhistas nos países.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/2007 - Página 18925
Assunto
Outros > COMERCIO EXTERIOR. POLITICA EXTERNA. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • REGISTRO, GRAVIDADE, DESVALORIZAÇÃO, DOLAR, PREJUIZO, SETOR, EXPORTAÇÃO, PROVOCAÇÃO, BAIXA, TARIFAS, IMPORTAÇÃO, AUMENTO, CONCORRENCIA DESLEAL, PRODUTO IMPORTADO, PRODUTO NACIONAL, INDUSTRIA TEXTIL, CALÇADO, ORIGEM, CONTINENTE, ASIA.
  • CRITICA, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, TRABALHO, TRABALHADOR, PAIS ESTRANGEIRO, VIETNÃ, CHINA, CONTENÇÃO, PREÇO, PRODUTO, NECESSIDADE, BRASIL, REGULAMENTAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, PROMOÇÃO, DEBATE, AMBITO NACIONAL, URGENCIA, ESTABELECIMENTO, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA, TOTAL, PAIS, MUNDO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO.
  • IMPORTANCIA, FUNÇÃO, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT), DEFESA, TRABALHO, TRABALHADOR, NECESSIDADE, GOVERNO, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE), ATENÇÃO, DIREITOS, INTERESSE, LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REALIZAÇÃO, PARCERIA, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, ATIVIDADE COMERCIAL, PROVOCAÇÃO, CONCORRENCIA DESLEAL, PREJUIZO, MERCADO INTERNO, BRASIL.

            O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srs. Senadores, há alguns dias, desde que o dólar finalmente rompeu a barreira dos R$2,00 (dois reais) e assumiu a menor cotação do Governo Lula, muitos têm debatido sobre quais seriam os efeitos nocivos desse câmbio tido como supervalorizado.

            De fato, para o setor exportador, inegavelmente, o cenário cambial não tem sido mais favorável. As quedas sucessivas de cotação do dólar agem como se, a cada semana, as tarifas de importação baixassem. Como conseqüência, cada vez mais, as prateleiras de nossas lojas exibem um número maior de produtos importados em detrimento de similares nacionais. Contudo, nos parece, de forma clara, que um importante diferencial negativo que desequilibra a balança do comércio mundial se revela por trás das condições trabalhistas. Por mais que a apreciação cambial tenha relevância na queda de competitividade em alguns setores de nossa produção, um grande problema na desigualdade de custos de produção reside na diferença considerável de proteção e de valorização ao trabalhador entre os países.

            A constatação é inequívoca. O notório é que dois dos setores nacionais que mais têm encolhido sua participação no mercado são o têxtil e o calçadista. Os dois são intensivos em mão-de-obra, contam com grande contingente de operários e têm na folha salarial um peso robusto para as suas planilhas de custo.

            Nossos calçados e nossas confecções têm sofrido brutalmente com a concorrência dos similares chineses e vietnamitas. Mais baratos e mais fartos, os produtos dessas nações asiáticas vêm desbancando o preço do mercado nacional e promovendo fortes estragos na produção brasileira.

            Mas será que os chineses e vietnamitas trabalham e produzem melhor que os brasileiros? Não, Srª Presidente, definitivamente não. O fato é que, na média, eles trabalham por muito menos e em condições muitas vezes extremamente precárias.

            Enquanto um operário de uma confecção vietnamita em Hanói recebe algo em torno de 28 centavos de dólar por hora, e o chinês do interior recebe não mais que 48 centavos de dólar nas mesmas condições, a hora trabalhada de um operário brasileiro na indústria têxtil é de um dólar e seis centavos. Vejam, Srªs e Srs. Senadores, que o vietnamita chega a ganhar quatro vezes menos que o brasileiro no mesmo setor.

            Como podemos competir com essa brutal disparidade de custos com mão-de-obra? Isso sem falar na jornada de trabalho, que lá é bem maior e no desequilíbrio da legislação laboral, que por aquelas bandas é de uma condescendência franciscana.

            O fato é que o jogo do comércio mundial disputado de forma aguerrida entre as nações exige regras claras e condições isonômicas entre seus participantes. Não se pode permitir que um time disponha de mais jogadores que o outro. ou que seus integrantes atuem dopados.

            Atento a tais condições de desnível competitivo, o Governo já sinalizou que, em caráter emergencial, vai dar um tratamento diferenciado aos setores de mão-de-obra intensiva prejudicados por essa situação.

            Não se trata de protecionismo, mas de responsabilidade e reparação. A Tarifa Externa Comum (TEC) para a importação de calçados e produtos têxteis já foi elevada para 35%, e medidas de desoneração da folha de pagamento para o setor exportador deverão ser anunciadas em breve.

            E não há dúvidas de que tais medidas se mostram absolutamente necessárias. Quem teve a oportunidade de conversar com empresários desses setores sabe as imensas dificuldades por que vêm passando os pólos produtores nacionais. No comércio, basta olharmos as etiquetas e verificarmos a “avalanche” de sapatos e roupas made in China ou made in Vietnam.

            É preciso que fique claro que todos, rigorosamente todos, os países lançam mão, em alguma medida, de estratégias de política industrial para corrigir distorções e promover um maior equilíbrio funcional em seu setor produtivo. Por sinal, essa é mais uma das funções essenciais do Estado: regular sua economia no sentido de torná-la mais eficiente e competitiva.

            Sob hipótese nenhuma estamos aqui pregando o aumento indiscriminado de barreiras alfandegárias ou o fechamento de nossa economia para o comércio mundial. Entendemos, de maneira absolutamente cristalina, que a competição sadia é a mola mestra que impulsiona o mundo, e é por seu meio que almejamos e alcançamos o progresso científico, econômico e social. Mas, como premissa, a competição deve se dar em bases justas, limpas e equilibradas. Infelizmente, não é o que vem acontecendo em determinados segmentos da indústria e do comércio em nosso País.

            Nesse sentido, nunca poderemos aceitar que, sob o pretexto de atingirmos os padrões de produtividade chineses, revoguemos todos os direitos trabalhistas em nosso País e passemos a pagar salários miseráveis aos nossos operários. Não podemos aceitar isso! A nossa luta deve ser inversa: promover o estabelecimento de uma legislação trabalhista justa e humana em todos os países, sem exceção.

            Não quero dizer que não temos problemas nessa área. Entretanto, inegavelmente, temos evoluído muito na garantia e proteção institucional ao trabalhador, assegurando-lhe condições dignas de sobrevivência muito além daquela dos colegas chineses ou vietnamitas e de outras nacionalidades.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, além do combate ao trabalho escravo e infantil, devemos erguer, de maneira firme, a bandeira do trabalho digno e da remuneração decente nos fóruns internacionais. Crescimento econômico e de produtividade que seja baseado no empobrecimento dos trabalhadores não é legítimo. O progresso deve estar, necessariamente, conectado à melhoria das condições de vida de uma nação. Sem tal premissa, a sua busca se torna vazia, despropositada.

            Entendemos que não podemos ficar de mãos atadas nesse tema. A Carta das Nações Unidas, assim como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, garante condições dignas de trabalho para todos. Não dá para aceitar que haja, em escala mundial, subclasse de trabalhadores ou desníveis tão absurdos como os que temos visto por toda parte.

            A ação diplomática brasileira, que historicamente nunca se furtou a defender na arena internacional seus sólidos princípios, deve levar adiante essa luta, marcadamente nos organismos multinacionais.

            No âmbito da Organização Mundial do Comércio, por exemplo, já demonstramos força e prestígio no êxito que obtivemos na ação contra as barreiras alfandegárias impostas ao açúcar brasileiro por parte de nações mais desenvolvidas.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Edison Lobão, permite-me um aparte? Pode ser no final, se V. Exª quiser concluir.

            O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - Com toda alegria, desde logo.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Edison Lobão, quero primeiro cumprimentá-lo pela visão internacional do mundo do trabalho que V. Exª está trazendo à Casa. Às vezes, chego a dizer que, se pelo menos no âmbito da América do Sul, ou mesmo do Mercosul, tivéssemos algumas leis que evitassem o dumping social, já estaríamos avançando. V. Exª vai além e quero cumprimentá-lo por isso. Tanto na OMC, poderíamos caminhar com essa preocupação que V. Exª aqui apresenta, como também na OIT. Confesso-lhe que não vou mais à OIT, só fui duas vezes. Parece-me, com todo respeito, que lá acaba sendo um grande encontro internacional. Muitos fazem daquilo uma forma de encontrar velhos amigos. Então fico por aqui. Acho que a Organização Internacional do Trabalho - que está reunida agora em Genebra e à qual não aceitei ir novamente - deveria estar discutindo isso que V. Exª está colocando. Mas duvido que estejam discutindo, porque senão o dumping não seria tão vergonhoso como é no mundo todo. E V. Exª lembra dados específicos de países onde efetivamente o trabalho é pago de forma vergonhosa. Então, há essa disparidade com a situação, por exemplo, do Brasil, que é um Estado exportador na área do vestuário e do calçado, do setor moveleiro e até do agronegócio. Mas, já que não se faz esse debate em nível internacional, na linha em que V. Exª coloca, tem que haver políticas compensatórias. O dólar despenca, como vou falar hoje. Sempre defendi que o salário mínimo tinha que ultrapassar US$100. Hoje está quase ultrapassando US$200. É muito bom por um aspecto, mas, por outro aspecto, o do desemprego, a preocupação aumenta a cada dia que passa. Por isso, meus cumprimentos a V. Exª. Estou marcando uma audiência com ministros do Governo para discutir exatamente isto: a questão do dólar em relação a nossa política de exportação, com eixo no setor calçadista, no setor têxtil e, naturalmente, também no setor moveleiro. Mas quero dizer a V. Exª que precisamos ter políticas compensatórias. Alguma forma teremos que construir, porque senão esse setor tão importante para a indústria nacional, que sempre foi um setor de ponta na área de exportação, vai entrar numa situação de falência total. E ninguém quer isso. Por isso, meus cumprimentos a V. Exª.

            O SR. EDISON LOBÃO (PFL - MA) - V. Exª, Senador Paulo Paim, apreendeu perfeitamente o meu pensamento e sobre ele se aprofundou. Às vezes eu me pergunto para que serve a OIT. O que ela faz? Será que ela se transformou nisso que diz V. Exª? Será que, ao longo dos tempos, ela ficou viciada e se transformou numa entidade de convescote, de turismo? Não era esse o seu papel. O papel da OIT é a defesa intransigente do trabalho e do trabalhador. Mas ali não se cuida mais com profundidade e com obstinação, que é o que se deve fazer, desse desiderato. E no front interno realmente precisamos de políticas compensatórias. Não se governa um país da nossa dimensão, com os nossos interesses, com os problemas que surgem em todas as latitudes, senão com o senso da compensação aos desníveis que a cada momento têm que surgir normalmente, naturalmente. O Governo precisa estar atento, e os Ministérios - neste particular o do Trabalho e o da Fazenda - precisam estar definitivamente interconectados para uma defesa eficaz dos verdadeiros e profundos interesses dos trabalhadores brasileiros, da Nação brasileira. Muito obrigado pela participação de V. Exª neste pálido discurso que hoje pronuncio.

            Srª Presidente, não me vou alongar. A despeito das intrincadas relações de poder geopolítico que perpassam essa instituição internacional que é a Organização Mundial do Comércio, entendemos que se trata de um foro legítimo para a harmonização dos equilíbrios vigentes e para o estabelecimento das boas práticas de comércio e de produção em escala global. Na medida em que conseguíssemos isso com a OMC, junto com a OIT - lembra bem o Senador Paulo Paim -, nós avançaríamos tanto nessa área que, provavelmente, outras medidas se tornariam desnecessárias.

            A China e o Vietnã são nações amigas e mantêm laços históricos com o Brasil. Nossas relações diplomáticas são amistosas com ambos os países, e desejamos que cada vez mais o espírito cooperativo esteja presente em seu bojo.

            Em 2004, durante encontro que manteve com o Presidente da China, Hu Jintao, aqui em Brasília, Presidente Lula “concedeu” aos chineses o status de economia de mercado como parceiro comercial. Um gesto que nos custou muito. Muito! Tal medida não somente serviu como sinalização de que acreditamos no estreitamento de nossa cooperação econômica e política, mas sobretudo nos deu respaldo para expor aos asiáticos as assimetrias existentes nos custos de produção de ambos os países e buscar acordos para contorná-las.

            O mais importante, Srª Presidente, é que o País tome consciência de que as negociações comerciais internacionais exigem uma atitude firme, transparente e pragmática por parte de nossa diplomacia.

            Sem tergiversar ou confrontar, são muitas as situações em que os desequilíbrios se revelam e que merecem ser enfrentados com objetividade.

            A salvaguarda competitiva de nossa indústria têxtil e de calçados é, claramente, uma dessas situações. A forma como lidaremos com ela revelará, em grande medida, a maneira austera e altiva que deveremos sustentar no complexo mundo do comércio global.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/2007 - Página 18925