Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Justificativa a requerimento, de autoria de S.Exa. e outros Senhores Senadores, solicitando voto de aplauso pelo transcurso do octogésimo aniversário de Francisco Brennand, pintor, escultor, desenhista e escritor pernambucano.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Justificativa a requerimento, de autoria de S.Exa. e outros Senhores Senadores, solicitando voto de aplauso pelo transcurso do octogésimo aniversário de Francisco Brennand, pintor, escultor, desenhista e escritor pernambucano.
Publicação
Publicação no DSF de 13/06/2007 - Página 19308
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, FRANCISCO BRENNAND, PINTOR, ESCULTOR, DESENHISTA, ESCRITOR, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), DIVULGAÇÃO, CULTURA, REGIÃO NORDESTE.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Gerson Camata, representante do Espírito Santo no Senado Federal; Srªs e Srs. Senadores, “sou tão velho quanto o mundo”, sentenciou, com verve e descontração, o pintor, o humanista, o escultor, o desenhista e também o mestre da cerâmica Francisco Brennand, ao interar ontem, no Recife, seus 80 anos de vida.

            Infenso a homenagens, a passagem da data não alterou sua conduta de vida. Permaneceu na sua monumental oficina da Várzea, que, por si só, é um templo, onde se pode deleitar com a teluricidade e a universalidade do seu “engenho e arte”.

            Seu primeiro mestre, Abelardo da Hora, também pernambucano e escultor, como Brennand, ao ver seu pai estranhar não ver o filho enveredar para a Faculdade de Direito, declarou: “A família perdeu um advogado. Mas lhe dei um artista”.

Com o tempo - confessa Brennand, em Testamento I, o Oráculo Contrariado -pela dimensão da minha obra cerâmica, sobretudo das esculturas, estou sendo reconhecido mais propriamente como escultor do que como pintor, o que não deixa de causar espanto. Talvez por um motivo subjetivo, não me reconheço como escultor.

            Realmente, Francisco Brennand é, antes de tudo, como se extrai ao contemplar sua vasta e diversificada obra ao longo de sua densa, extensa e intensa existência, um ser plural. Aliás, outra não é a percepção de Júlio Cavani, em texto publicado no Diário de Pernambuco, domingo passado:

                   “A obra de Brennand tem tantas referências literárias e mitológicas, que se torna impossível definir a lógica que ela usa para reunir todas em uma mesma poética corrente. Apenas o próprio artista é capaz de enxergar plenamente os sentidos que as integram em conjunto”.

            E acrescenta mais adiante:

Na obra de Brennand, podem ser enxergadas citações espontâneas a autores da literatura à arquitetura, de Homero e Dostoiévski a Picasso e Miro, de Gauguin e Gaudi a Balthus e Goya, dos surrealistas europeus aos artesãos brasileiros, pois, por mais que sua obra não tenha afinidades estéticas com a dos escultores populares, a presença mais marcante da cerâmica em ambiente nordestino se torna, inevitavelmente, uma herança, mesmo se for espontânea e inconsciente.

            Nascido às margens do rio Capibaribe por ele ainda hoje, diariamente entrevisto do terraço de sua casa-grande - onde, aliás, não há senzala - com os verdes da mata atlântica, com as infinitas variedades das luzes dos trópicos diante dos olhos.

            João Cabral de Melo Neto, um dos muitos dos seus amigos, fala do ofuscante brilho do sol nordestino, dos sertões às praias; e, nele, aponta a origem da paixão dos nordestinos pela vida. Observe-se, contudo, que, se a pintura/escultura é tropical, ela o é em larga escala ecumênica, porque Brennand estudou e estagiou em Paris, logo após o término da Segunda Grande Guerra, cuja paisagem era marcada por grandes pintores do século XX, inclusive Pablo Picasso, entre tantos de significativa expressão artística.

            Na França daquele tempo ainda repercutiam as derradeiras renovações do Século XX por seus próprios representantes nas formas e cores ao auge em Léger, Matisse, Chagall e Dali. Marc Chagall veio a ter grande influência em Cícero Dias e Fernand Léger em Vicente do Rego Monteiro, dois importantes antecessores pernambucanos de Francisco Brennand em Paris. Seus caminhos se cruzaram, conheceram-se e foram amigos.

            Após longa ausência, Cícero Dias voltou ao Recife para se despedir e Vicente do Rego Monteiro escolheu Pernambuco para ali passar os últimos anos, cercado pelo reconhecimento dos conterrâneos e com seu talento reverenciado alem de toda a região. A admiração por Gilberto Freyre também unia Francisco Brennand, Cícero Dias e Vicente do Rego Monteiro em torno do perpassamento do regionalismo da literatura e sociologia à pintura e às artes plásticas em geral.

            Um dos resultados dessa continuidade está sendo, até hoje, a projeção nacional e internacional de Pernambuco na pintura de João Câmara e na xilogravura de Gilvan Samico, em Olinda, entre outros que prosseguem participando desse movimento. O colecionador e promotor de vários dos maiores pintores e artistas plásticos brasileiros, Marcantônio Vilaça, também muito se dedicou, na sua breve mas fecunda vida, a tornar mais conhecidos os artistas pernambucanos.

            Ao celebrar oito décadas de vida, mais de cinco delas de presença nas artes e também na literatura, continua Brennand como um projeto a antever o futuro, pois, como sabemos, o futuro tem um coração antigo. Ele se renova sem se desfazer do passado, uma vez que, como definiu o mestre Gilberto Freyre, “o tempo é tríbio”, gerado, portanto, da interposição do passado, presente e futuro. Sua pintura, especialmente, passou por diferentes fases, sem se extremar nem no figurativismo, nem no abstracionismo, sempre usando as cores como principal motivação.

            A propósito, diz Ariano Suassuna, parceiro do homenageado em suas visões dessa estranha terra que denominamos mundo, que Brennand “absolutamente não se preocupa em verificar se o que está fazendo no momento corresponde ou não ao mundo que o cerca, se está ou não em conformidade com o seu tempo”. O escritor, por sinal nascido na mesma semana em que ele e que também estudou no mesmo colégio, costumava dizer que descobriu com o colega o significado de ser artista plástico: “Nós, nordestinos, nos preocupamos em ser fiéis à terra, aos mitos, às histórias, às formas e cores da região. E como Brennand, ao mesmo tempo, absorve naturalmente tudo que o rodeia, o resultado é que sua obra é a mais universal e a mais fiel à terra de tantas que já saíram do Nordeste” (Diário de Pernambuco, 10.06.2007 - Júlio Cavani).

            É de se salientar, por oportuno, Sr. Presidente, que Francisco Brennand adensou a vida cultural de Pernambuco e do Nordeste ao criar, em terras que pertenceram o seu pai, Ricardo Lacerda de Almeida Brennand, um excelente, ou melhor, um estupendo museu, do qual somente se afastou, já casado com Deborah de Moura Vasconcelos Brennand, para morar em Paris. O museu é, atualmente, algo que fascina ao ser visitado e se converteu num pólo de atração de turistas nacionais e estrangeiros. Por sinal, o museu se localiza muito próximo ao Instituto Ricardo Brennand, este com apreciáveis coleções de pinturas e gravuras do Século XVII, tempos da ocupação holandesa do Nordeste do Brasil.

            Sr. Presidente, na pintura, cerâmica e escultura de Francisco Brennand confirma-se a definição dada por Picasso: “Pintar é libertar-se e isso é essencial.”. A essencialidade do Brasil nordestino pernambucano está exuberantemente expressa na arte de Francisco Brennand. É que Francisco Brennand, ao projetar-se na multiplicidade de sua obra, completou-se na integralidade de sua expressão humanística.

            Em face do exposto, Sr. Presidente, desejo que esta Casa acolha o requerimento de minha autoria, subscrito por outros Senadores, de voto de aplauso pelo transcurso do 80º aniversário do pintor, escultor, desenhista, escritor e humanista pernambucano - Francisco Brennand.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/06/2007 - Página 19308