Discurso durante a 91ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Alerta para os efeitos da destruição ambiental. Registro do lançamento, esta semana aqui no Congresso Nacional, pelo Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos, do livro "O Jogo das Águas Transfronteiriças no Contexto da Integração Regional". Leitura de trechos da famosa carta do índio Seattle, cacique de uma tribo extinta que habitava as terras onde hoje é o Estado de Washington, nos Estados Unidos.

Autor
Sérgio Zambiasi (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Sérgio Pedro Zambiasi
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Alerta para os efeitos da destruição ambiental. Registro do lançamento, esta semana aqui no Congresso Nacional, pelo Inesc - Instituto de Estudos Socioeconômicos, do livro "O Jogo das Águas Transfronteiriças no Contexto da Integração Regional". Leitura de trechos da famosa carta do índio Seattle, cacique de uma tribo extinta que habitava as terras onde hoje é o Estado de Washington, nos Estados Unidos.
Publicação
Publicação no DSF de 15/06/2007 - Página 19935
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • IMPORTANCIA, CONTINUAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, DEBATE, MEIO AMBIENTE, REVISÃO, ALTERAÇÃO, CLIMA, QUESTIONAMENTO, MODELO, CRESCIMENTO ECONOMICO, BUSCA, PRESERVAÇÃO, NATUREZA, REDUÇÃO, CONSUMO, AGUA, ENERGIA, PRODUÇÃO, LIXO, MELHORIA, TECNOLOGIA, TRANSPORTE, CONTROLE, DESMATAMENTO.
  • DETALHAMENTO, ALTERAÇÃO, ECOSSISTEMA, REGIÃO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, CLIMA, TEMPERATURA, CHUVA, VARIAÇÃO, CURSO D'AGUA, RIO, EXCESSO, POLUIÇÃO, AMEAÇA, AGUAS SUBTERRANEAS, REGISTRO, DADOS.
  • LEITURA, TRECHO, CARTA, LIDER, INDIO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), HISTORIA, DEFESA, TERRAS, NATUREZA.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (Bloco/PTB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Paulo Paim, colega e conterrâneo, Srªs e Srs. Senadores, ainda estamos vivendo sob o impacto das mobilizações, das notícias, dos alertas e das denúncias ocorridas no Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado na semana passada, mas parece que apenas uma data anual não é suficiente para despertar a nossa consciência para a questão ambiental. O tema meio ambiente deve, definitivamente, fazer parte do nosso dia-a-dia.

Inúmeros documentos científicos estão alertando para os riscos que a Humanidade corre, hoje, em função das agressões impingidas à natureza, a partir dos excessos cometidos pelo nosso modelo de crescimento e desenvolvimento.

O degelo dos pólos nunca foi tão violento. O aquecimento global fez diminuir em 20% a calota polar ártica nas últimas três décadas. O solo arde. Os desertos avançam rapidamente, e, nos últimos 30 anos, o total de terras atingidas por secas severas dobrou. Aliás, Senador Paulo Paim, o Rio Grande do Sul, nos últimos quatro anos, teve três anos de secas violentíssimas. Para nós, do Sul, uma seca de 100 dias é absolutamente devastadora. Foi essa experiência que vivemos, lá no Sul, nos anos de 2004, 2005 e 2006. Neste ano, o processo está-se invertendo. O nível dos oceanos ameaça cidades do litoral , e os ciclones já açoitam a costa brasileira.

Mudanças concretas na forma de encarar a questão ecológica dependem de esforços individuais, como atos de reduzir, reciclar e reutilizar, mas, fundamentalmente, de ações governamentais, em nível nacional e internacional, que produzam efeitos com a amplitude que a questão está a exigir. O mundo precisa superar uma cultura marcada pelos abusos cometidos em nome do progresso a qualquer custo.

No Brasil, temos que trabalhar muito para amadurecermos e desenvolvermos nova consciência e novas ações - em Estados e Municípios - com relação ao que podemos fazer e onde queremos chegar, conciliando desenvolvimento com preservação.

Precisamos lutar e encontrar um modelo que concilie os interesses na natureza com os da população, preservando o meio ambiente para as gerações futuras. Os esforços incluem desde a quantidade de água e de energia a serem usadas até uma mudança na forma de encarar o lixo que produzimos, passando por transformações radicais nos projetos de edificações e de veículos, particularmente dos destinados ao transporte coletivo.

É verdade que esbarramos em grandes dificuldades, dificuldades concretas, como a de conter, de forma realmente eficaz, o desmatamento da Amazônia, apesar de todo o esforço, reconhecido esforço, empreendido pela Ministra Marina no Ministério do Meio Ambiente. Com enorme apreensão acompanhamos as notícias, dando conta do nível de degradação de alguns rios, até então perenes naquela região.

Todavia, a questão ambiental no Brasil não se restringe a esse desafio. Quando verificamos que São Paulo, a tão belamente cantada “terra da garoa”, passa a ser a “terra das tempestades”, dos temporais; quando as temperaturas amenas do antes chamado “veranico de maio” do outono gaúcho ou paranaense, Senador Flávio Arns, hoje, estão tão mudadas, nos vemos castigados, como se fosse o famoso veranico de maio o mais rigoroso dos invernos. Fica claro que a gravidade da questão do desequilíbrio ecológico está no nosso dia-a-dia. Aliás, estaríamos em pleno veranico de maio, eis que, hoje, no sul, neste momento, a temperatura é de 17ºC, com previsão para sábado e domingo de 0ºC. São essas diferenças brutais de um dia para outro que nos assustam.

Dentre tantos efeitos nocivos, ressalto a questão das águas, recurso natural tão raro em alguns países e ainda abundante em nosso País. E que, por isso mesmo, merece atenção especial.

No nosso Rio Grande do Sul, Senador Paim, o rio Uruguai, o maior do Estado, que faz fronteira do Brasil com dois outros países, Uruguai e Argentina, e divisa com os nossos irmãos catarinenses, sofre de grave degradação enquanto espera soluções políticas integradas para salvá-lo.

Hoje, o rio Uruguai recebe 841 toneladas por mês de matéria orgânica, uma montanha equivalente ao peso de 17 carretas. As indústrias lançam 528 toneladas por mês de resíduos químicos e 145 toneladas de detritos orgânicos. E pasmem: apenas 5% do esgoto da região do rio Uruguai é tratado.

Esse nível insuportável de poluição ameaça uma das grandes riquezas que a natureza generosamente nos legou: o Aqüífero Guarani, o maior reservatório subterrâneo de água doce do mundo, sob a bacia do rio Uruguai.

O Aqüífero Guarani, Srªs Senadoras, Srs. Senadores e aqueles que nos assistem pelo sistema de comunicação do Senado, ocupa uma área, Senador Botelho, aproximada de 1.2 milhão de quilômetros quadrados, sob os solos dos Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

A reserva permanente de água é de 40 mil quilômetros cúbicos, o que pode abastecer toda a população brasileira por mais de 2.500 anos - vejam como Deus foi generoso com o Brasil. Dizem que Deus é brasileiro, e é verdade -, porém tudo isso acontece se medidas de proteção à sua potabilidade forem implementadas.

Também acompanhamos, recentemente, com grande apreensão, Senador Paim, o desastre ecológico ocorrido no rio dos Sinos, na região de São Leopoldo, região metropolitana de Porto Alegre. Com a mortandade de milhares de peixes, toneladas de peixes, atingindo 32 Municípios na bacia dos Sinos, o que motivou, inclusive, Senador Paim, com a nossa companhia e a do Senador Pedro Simon, um verdadeiro embate no Ministério do Meio Ambiente no sentido de garantir recursos para despoluir este rio vital para a região metropolitana do Vale dos Sinos.

É preciso arregaçar as mangas e trabalhar para evitar futuras catástrofes como aquela que vivemos há pouco tempo no nosso Estado. Investir pesadamente em obras visando à recuperação destes mananciais, melhorando a qualidade de vida das populações ribeirinhas, que tiram o seu sustento das águas.

E por falar em águas, quero registrar o lançamento, esta semana, aqui no Congresso Nacional, pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), do livro O Jogo das Águas Transfronteiriças no Contexto da Integração Regional. O livro aborda um novo e interessante conceito para a água virtual, Senador Suplicy. A publicação destaca que o Brasil é o segundo maior detentor de água doce do mundo (depois do Canadá). E somos o décimo produtor de água virtual do planeta. Mas, afinal, o que é esta tal de água virtual?

Os estudiosos consideram água virtual toda a água usada para se fabricar um bem. Pode ser uma fruta produzida no baixo São Francisco, uma roupa no pólo têxtil de Blumenau, em Santa Catarina, um quilo de carne, produzido no Mato Grosso, em Roraima ou no meu Rio Grande do Sul.

Senador Paim, nessa percepção, um quilo de pão, considerando-se desde o preparo da terra para o plantio do trigo, usa 150 litros de água, enquanto um quilo de batata consome dois mil litros de água, e um quilo de carne, desde o nascimento do boi até o prato do consumidor, gasta de 10 mil a 13 mil litros de água.

Nesse cálculo, entra não só a água consumida diretamente pelo animal, que varia de 50 a 60 litros por dia, como também a água utilizada para produzir a alimentação do gado. Em média, cada quilo de soja exige dois mil litros de água para ser produzido, desde o plantio, preparo da terra até a colheita.

Assim, parte significativa da água usada na irrigação em terras brasileiras acaba, muitas vezes, internacionalizada pelo fato de boa parte da nossa produção agrícola ser exportada. Pode-se dizer que as populações européias e de outros continentes que importam as frutas produzidas no Vale do São Francisco, por exemplo, saciam sua fome e sua sede com água disponível no Brasil, que é incorporada às frutas exportadas.

A matriz energética é outro tema que mobiliza o mundo na busca de iniciativas que amenizem e até revertam os efeitos do aquecimento global. Felizmente, neste quesito estamos obtendo avanços importantes. Com o lançamento da política que contempla a produção de etanol e biodiesel pelo Governo Lula, temos uma alternativa concreta para reduzir os danos do temido efeito estufa.

A verdade é que a situação é tão grave que exige muito mais do que ações isoladas. A ameaça ambiental é de ordem global e precisa ser afastada, urgentemente, por meio de compromissos claros, firmados perante organizações multilaterais, para que cada país possa ser cobrado a fazer realmente o que lhe compete em favor do desenvolvimento sustentável.

Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, encerro o discurso de hoje trazendo para reflexão deste Plenário e da população que nos acompanha pelos meios de comunicação do Senado, alguns trechos da famosa carta do índio Seattle, cacique de uma tribo extinta que habitava as terras onde hoje é o Estado de Washington, nos Estados Unidos.

            De clara visão holística, de teor quase profético, a magnífica mensagem enviada ao então Presidente norte-americano Francis Pierce, que pressionava para comprar as térreas ocupadas pela tribo, diz:

Toda esta terra é sagrada para o meu povo. Mas vamos pensar na sua oferta, pois sabemos que, se não o fizermos, o homem branco virá com armas e a tomará.

Ele rouba da terra tudo quanto necessita. Sua ganância a empobrece e deixa atrás de si os desertos. Mas o que é o homem sem a natureza, sem o ar precioso, a pureza das águas, a companhia dos animais? Se esta riqueza se acabasse, se todos os animais morressem, os homens igualmente morreriam, porque tudo quanto fere a terra, fere também os filhos da terra.

Mais alguns invernos e nenhum dos filhos das grandes tribos que viveram nestas terras sobrará para chorar o passado de um povo tão poderoso e cheio de confiança como foi o nosso.

Quando as colinas escarpadas se encheram de fios que falam, todos os animais terão ido embora. Será o fim da vida e o começo da luta pela sobrevivência. Talvez compreendêssemos com que sonha o homem branco se soubéssemos que esperanças transmite a seus filhos nas longas noites de inverno. Quais visões do futuro oferece para que se formem os desejos do amanhã. Mas nós somos selvagens, e os sonhos do homem branco são ocultos para nós.

Por isso, fica um pedido: se vendermos a nossa terra, protege-a como nós a protegíamos. Nunca esqueça como era a terra quando dela tomaram posse. E com todo o seu poder, e todo o seu coração, conserva-a para os teus filhos.

Era isso, Sr. Presidente Paulo Paim.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/06/2007 - Página 19935