Discurso durante a 95ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários a estudos sobre a violência no Brasil, elaborados por técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -IPEA.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.:
  • Comentários a estudos sobre a violência no Brasil, elaborados por técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -IPEA.
Publicação
Publicação no DSF de 22/06/2007 - Página 20543
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. LEGISLAÇÃO PENAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ESTUDO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), AVALIAÇÃO, CUSTO, NATUREZA SOCIAL, MORTE, AUMENTO, NUMERO, HOMICIDIO, PAIS, ENUMERAÇÃO, MOTIVO, ESPECIFICAÇÃO, FALENCIA, SISTEMA, JUSTIÇA, VARA CRIMINAL.
  • QUESTIONAMENTO, MODELO, POLICIA, COMBATE, CRIME, MANUTENÇÃO, TRADIÇÃO, PADRÃO, POLICIAMENTO, INEFICACIA, GESTÃO, SEGURANÇA PUBLICA.
  • DEFESA, MODERNIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO PENAL, ELABORAÇÃO, EFICACIA, POLITICA, SEGURANÇA PUBLICA, RENOVAÇÃO, EQUIPAMENTOS, QUALIFICAÇÃO, POLICIAL, MELHORIA, DESEMPENHO FUNCIONAL, REDUÇÃO, FALTA, SEGURANÇA, POPULAÇÃO.

O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr Presidente, Srªs e Srs Senadores, desde o início de março, esta Casa já examinou e aprovou dezenas de propostas destinadas a combater a criminalidade no País. A morte brutal do menino João Hélio, no Rio de Janeiro, além de abrir o debate sobre a questão da maioridade penal, mobilizou a sociedade, que passou a exigir medidas capazes de reprimir a onda de violência.

A propósito do tema, que ocupou muitos dos discursos que pronunciei na atual legislatura, gostaria de citar dados que constam de dois estudos sobre a violência no Brasil, elaborados por técnicos do IPEA, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, vinculado ao Ministério do Planejamento.

Um deles, feito em 2007, calcula os custos sociais das mortes violentas no Brasil. Utilizando duas bases de dados - a da renda dos trabalhadores, do IBGE, e a de óbitos, do Ministério da Saúde -, os pesquisadores chegaram à conclusão de que os homicídios ocorridos em 2001 tiveram um custo de 9 bilhões e 100 milhões de reais, em termos de perda de produção, de capital humano.

O segundo estudo mostra que, nos 25 anos decorridos entre 1980 e 2005, ocorreram 794 mil assassinatos no Brasil. A taxa de crescimento anual do número de homicídios no período foi de 5,6 por cento em média, o que coloca nosso país entre os mais violentos do mundo. Foram 28 homicídios para cada 100 mil habitantes.

A quais fatores devemos atribuir esse crescimento? Os autores alinham várias causas, mas cabe destacar a falência do sistema de justiça criminal, organizado, segundo eles, “para fazer frente aos desafios da delinqüência no século 19, mas longe de atender às demandas das complexas sociedades urbanas do século 21”.

Persiste, no Brasil, um modelo de polícia que se baseia em padrões definidos para combater a criminalidade em época distante. Enquanto outros países modernizaram seu aparato policial, adotando experiências inovadoras em matéria de gestão da segurança pública, nós continuamos presos a um ultrapassado modelo de policiamento tradicional.

Ocorre em nosso país um fenômeno interessante: qualquer debate sobre os melhores métodos para o combate ao crime ganha imediatamente contornos ideológicos. Enquanto insistirmos em discutir se a solução é endurecer a ação policial ou culpar as desigualdades sociais pela violência e deixar tudo como está, continuaremos fugindo ao foco da questão - e este, como afirmam os autores do estudo, é a existência de “instituições policiais obsoletas, despreparadas técnica e instrumentalmente, com profissionais desmotivados e desvalorizados, não apenas socialmente, mas ainda economicamente”.

A polícia, em qualquer país do mundo, é o principal instrumento que o Estado tem à sua disposição para assegurar a paz social. Mas como poderemos garanti-la se, na gestão da segurança pública, estamos acorrentados a um padrão ineficiente e antiquado? Os Estados Unidos, os países europeus, a Austrália e a Nova Zelândia dispõem hoje de polícias bem aparelhadas, tanto em termos de pessoal como de equipamento, realizam cursos permanentes de atualização e têm departamentos dedicados à análise de estatísticas da criminalidade e estudo de métodos destinados a prevenir seu crescimento.

Ou seja, são polícias que não se limitam a registrar ocorrências, a reagir diante do fato consumado, que contam com instrumentos para se antecipar à ação dos criminosos e, no mínimo, fazer com que infringir a lei se torne uma atividade muito mais perigosa e, no fim das contas, pouco compensadora.

Acumulamos no mínimo uns 30 anos de atraso na busca de soluções para nossos problemas na área de segurança. Ignoramos a necessidade de modernizar a legislação penal e elaborar uma política eficaz para o setor. Enquanto isso, o crime prosperou.

E continua prosperando: em sua última edição, a revista Veja revela que o bandido Marcos Wilians Camacho, o Marcola -, que nos próximos dias deverá deixar o Regime Disciplinar Diferenciado, que prevê isolamento máximo para presos perigosos -, ordenou a um comparsa o assassinato de agentes penitenciários paulistas.

No Rio de Janeiro, no último fim de semana, dois policiais militares foram mortos com tiros de fuzil, bem em frente à cruz e ao cartaz que assinalam o local em que o menino João Hélio foi levado pelos assaltantes. Em Monte Alegre, no sertão de Sergipe, um bandido de 17 anos invadiu uma farmácia, atirou em duas reféns e deixou que elas agonizassem durante quatro horas, até perderem a vida. Outra refém só escapou porque fingiu estar morta.

São notícias como essas relatos estarrecedores com que nos deparamos todo dia, ao abrir os jornais, ligar o rádio ou assistir ao noticiário da televisão - são notícias como essas que evidenciam a negligência com que encaramos, nos últimos anos, um problema de tamanha gravidade: a banalização da violência e o despreparo dos órgãos policiais para enfrentá-la, por culpa da inexistência de uma política integrada e da falta de recursos.

Tenho a esperança de que, somado às medidas em tramitação no Congresso, o anunciado “PAC da Segurança”, prometido pelo Ministério da Justiça, contribua para dar fim à insegurança generalizada em que vivemos. Mas é bom ressaltar que só teremos sucesso no dia em que resolvermos, finalmente, dotar a polícia - além de salários dignos e de meios de capacitação profissional para seus integrantes - de mecanismos modernos de gestão, de instrumentos que permitam caminhar um passo à frente dos criminosos, atuando também na prevenção dos delitos. Caso contrário, a situação só tende a piorar - e não consigo imaginar nada pior que as circunstâncias em que vive atualmente o povo brasileiro, sem defesa diante do crime organizado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/06/2007 - Página 20543