Discurso durante a 106ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos cem anos da Ferrovia Madeira-Mamoré.

Autor
Expedito Júnior (PR - Partido Liberal/RO)
Nome completo: Expedito Gonçalves Ferreira Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Comemoração dos cem anos da Ferrovia Madeira-Mamoré.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2007 - Página 22602
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, FERROVIA, LIGAÇÃO, MUNICIPIO, GUAJARA-MIRIM (RO), PORTO VELHO (RO), ESTADO DE RONDONIA (RO), REGISTRO, HISTORIA.
  • DEFESA, OPORTUNIDADE, IMPLEMENTAÇÃO, PROJETO, UTILIZAÇÃO, FERROVIA, INTEGRAÇÃO, PAIS.
  • QUESTIONAMENTO, PREDOMINANCIA, UTILIZAÇÃO, RODOVIA, MATRIZ, TRANSPORTE, EXCESSO, CUSTO, MANUTENÇÃO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, MAIORIA, REDE VIARIA, PAIS.

            O SR. EXPEDITO JÚNIOR (PR - RO. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há cem anos, no dia 23 de junho de 1907, era fincada a estaca que deu início às obras da Ferrovia Madeira-Mamoré, que ligaria, cinco anos depois, as cidades de Guajará-Mirim e Porto Velho.

                   As origens da estrada de ferro se encontram, no entanto, em passado bem mais remoto do que naquele calorento 23 de junho. Na verdade, ainda em tempos do Império, surgiram as primeiras propostas de construção de uma ferrovia que tornasse o transporte de mercadorias e pessoas bem mais fácil naquela remota área do território nacional.

                   De certa forma, a história da construção da Madeira-Mamoré é a síntese da maneira como o Estado brasileiro lida com as obras de infra-estrutura. O primeiro estudo visando a construir uma ferrovia é de 1861, quando o General Boliviano Quentin Quevedo, os brasileiros João Martins Silva Coutinho, engenheiro, e Tavares Bastos, publicista, sugeriram a construção de uma ferrovia ligando o Mato Grosso ao Pará.

                   A partir dessa primeira iniciativa, o Brasil e a Bolívia firmaram tratado em 1867, em que o nosso País se comprometia a construir uma ferrovia que fosse alternativa ao trecho de quatrocentos quilômetros de cachoeira dos Rio Madeira e Mamoré.

                   Em outubro do mesmo ano, o governo brasileiro contratou dois engenheiros alemães que procederam a estudo preliminar à construção da obra.

                   Em 1871, foi fundada a Madeira Mamoré Railway, companhia de capital inglês destinada a construir a obra. Em meados desse ano, 25 engenheiros e equipamentos chegaram para dar início aos trabalhos.

                   Dois anos de sofrimento e mortes levaram os ingleses a rescindir o contrato, sob a alegação de que as condições eram inóspitas demais para a construção de qualquer coisa no lugar.

                   O governo brasileiro, disposto a levar adiante a construção da ferrovia, conseguiu a aprovação do Senado para uma suplementação de 400 mil libras, quantia significativa para o período.

                   Em substituição aos ingleses, vieram os americanos, em janeiro de 1878. Formavam, nas palavras dos jornais da época, o mais fino grupo de profissionais jamais reunido nos Estados Unidos.

                   Três km de trilhos e seis meses depois, sem receber as verbas prometidas, o governo americano enviou navio para recolher o que sobrara da mais capacitada expedição de engenheiros que o Brasil já vira.

                   No Brasil, permaneceu apenas um pequeno grupo de engenheiros, que construíram mais quatro quilômetros antes de serem definitivamente derrotados pela selva.

                   Apesar da importância da ferrovia, as dificuldades encontradas levaram ao abandono das obras por tempo indeterminado. Apenas a anexação do território acreano ao Brasil, em 1903, levou à retomada das obras como uma das condições acordadas no Tratado de Petrópolis, que pôs fim à questão fronteiriça.

                   Em 1905, é publicado edital de concorrência e, em 1907, são finalmente iniciadas, mais uma vez, as obras da ferrovia Madeira- Mamoré. O vencedor da licitação vendeu a concessão para o famoso empreendedor Percival Farquar, conhecido pelas empresas que havia fundado no Brasil, no início do século XX.

                   Fundada mais uma empresa com o nome de Madeira Mamoré Railway, é levantado capital para tornar a companhia viável.

                   Em 1908, mais de duas mil pessoas estavam empregadas na construção; e o número aumentou ao longo dos anos porque o tempo que um trabalhador conseguia permanecer em atividade era de, no máximo, três ou quatro meses, quando sucumbia às doenças que assolavam a região.

                   Ao longo dos seis anos de construção da ferrovia, vinte e dois mil trabalhadores passaram pelos canteiros de obra.

                   Em 1912, é inaugurado o último trecho da ferrovia. Um número incontável de pessoas deu a vida pela construção dos trilhos. Não apenas em razão das difíceis condições locais, mas, principalmente, pela falta de planejamento e organização.

                   Em suma, da sua concepção inicial até a sua conclusão, passaram-se mais de cinqüenta anos. Um tempo assustadoramente longo para um País que carecia de infra-estrutura.

                   Apesar do custo em vidas, em dinheiro e em sacrifícios de toda a espécie cobrados pela obra, parece que pouco aprendemos, se é que aprendemos algo, com a epopéia da Madeira-Mamoré.

                   Em primeiro lugar, as obras de infra-estrutura, apesar de sua importância vital para o País, são sempre relegadas ao segundo plano. Toda ordem de obstáculos é imposta para delongar, de maneira irresponsável, as obras. Um exemplo recente é o Rodoanel da cidade de São Paulo, cujas obras, a permanecer o ritmo atual, terminarão 40 anos depois de iniciadas. Outro exemplo é a ferrovia Norte-Sul, uma das mais importantes obras de interligação regional, cujas obras já se prolongam por 20 anos -- e que provavelmente demorarão outros vinte para serem concluídas.

                   Em segundo lugar, apesar do alto custo de manutenção, as rodovias continuam a predominar em nossa matriz de transporte. Um caso exemplar é o da rodovia Cuiabá-Santarém. Indago, aos Senhores Senadores e às Senhoras Senadoras, se não teria sido muito mais produtivo construir uma ferrovia, com maior capacidade para transporte de carga, a um custo menor e com muito menos danos ao meio ambiente.

                   Em terceiro lugar, as estradas brasileiras, salvo exceções em São Paulo e no Paraná, encontram-se em estado lamentável. É assustador que leiamos que os argentinos construirão um trem de alta velocidade entre Buenos Aires e Córdoba, enquanto por aqui continuamos a discutir, infrutiferamente, a construção de um mesmo tipo de transporte entre Rio de Janeiro e São Paulo. Além disso, parece-me que outros eixos, como Brasília, Goiânia, Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre, além das capitais nordestinas, poderiam integrar uma malha de trens de alta velocidade.

                   Ao mesmo tempo, o grande centro dinâmico da economia brasileira tem-se deslocado, ao longo dos últimos trinta anos, para o centro-oeste e alguns estados da região Norte, como Rondônia e Pará. Infelizmente, esse pólo se encontra desassistido no que tange aos meios de transporte de passageiros e mercadorias. O trem, sem sombra de dúvidas, é a solução.

                   Nessa oportunidade em que celebramos os cem anos da Madeira-Mamoré, é a hora de levarmos adiante um projeto de integração nacional por meio de ferrovias. Na história deste País perdemos oportunidades atrás de oportunidades. É chegada a hora de, finalmente, tomarmos os destinos da nação em nossas mãos.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado pela atenção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2007 - Página 22602