Discurso durante a 113ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro da realização do vigésimo segundo Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação, entre os dias 8 e 11 deste mês, que teve como um dos anfitriões a Biblioteca do Senado Federal. Necessidade de que se estimule o acesso aos livros no País.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL. HOMENAGEM.:
  • Registro da realização do vigésimo segundo Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação, entre os dias 8 e 11 deste mês, que teve como um dos anfitriões a Biblioteca do Senado Federal. Necessidade de que se estimule o acesso aos livros no País.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 17/07/2007 - Página 25052
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), CONGRESSO BRASILEIRO, BIBLIOTECONOMIA, DOCUMENTAÇÃO, CIENCIAS, INFORMAÇÃO, ELOGIO, ORGANIZAÇÃO, BIBLIOTECA, SENADO, REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ENTIDADE, FILIAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIENCIA E A CULTURA (UNESCO), IMPORTANCIA, ACOMPANHAMENTO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, NECESSIDADE, DIFUSÃO, LIVRO, TERRITORIO NACIONAL, AMPLIAÇÃO, ACESSO.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, BIBLIOTECA, BRASIL, CORTE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, AQUISIÇÃO, LIVRO, UNIVERSIDADE, SETOR PUBLICO.
  • DEFESA, CRIAÇÃO, BIBLIOTECA, TOTAL, MUNICIPIO, BRASIL, OBJETIVO, DIVULGAÇÃO, CONHECIMENTO, MELHORIA, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, INCENTIVO, LEITURA.
  • HOMENAGEM, PETRONIO PORTELLA, PERSONAGEM ILUSTRE, EX SENADOR, EX GOVERNADOR, ESTADO DO PIAUI (PI).
  • REGISTRO, DADOS, SUPERIORIDADE, CUSTO, LIVRO, BRASIL, FALTA, ACESSO, BRASILEIROS, SUGESTÃO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, DEBATE, PREÇO, BUSCA, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA, INCENTIVO, LEITURA, POSSIBILIDADE, APROVEITAMENTO, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, ELOGIO, UNIÃO EUROPEIA, AUMENTO, TRADUÇÃO, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, EXTERIOR.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente eminente Senador Papaléo Paes, que representa o Estado do Amapá no Senado da República, Srªs e Srs. Senadores, desejo registrar a realização do XXII Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação (CBBD), ocorrido no Centro de Convenções de Brasília, entre os dias oito e onze deste mês.

            O evento, que teve como um de seus anfitriões a Biblioteca do Senado Federal, dirigida pela Drª Simone Bastos Vieira, contou com a participação de mais de 1.200 profissionais, valendo destacar a presença da Presidente da Federação Internacional de Associações de Bibliotecas e Bibliotecários (IFLA), filiada à Unesco, Srª Cláudia Lux, e das Srªs Elizabeth Carvalho e Maria Isabel Franca, Chefes do Comitê da Ifla para a América Latina e Caribe.

            A referida instituição é o corpo internacional que representa os interesses dos serviços de biblioteconomia e de informação e de seus usuários. Ela é, por conseguinte, o órgão global representativo da biblioteca e da documentação, fundada em Edimburgo, na Escócia, em 1927, há 80 anos. Conta a Ifla com 1.700 integrantes, em 150 países. Trata-se, Sr. Presidente, de uma espécie de ONU desse estratégico setor.

            É oportuno registrar que a Biblioteca do Senado Federal se mantém em permanente interação com as suas congêneres, acompanhando as transformações e o desenvolvimento tecnológico que a biblioteconomia e a documentação estão vivendo, em função, como todos nós sabemos, da revolução das informações e do conhecimento, que caracterizam o início deste século - eu diria até deste novo milênio -, conforme observou, a propósito, a Diretora Simone Bastos Vieira, dirigente da biblioteca desta Casa.

            O conclave, Sr. Presidente, nos remete à necessidade de olharmos a questão da difusão do livro e a existência de boas bibliotecas em todo o território nacional.

            Como profetizou John Milton, grande escritor inglês, autor de Paraíso Perdido, talvez a sua obra mais conhecida, em outro livro seu Areopagítica: “Os livros não são coisas absolutamente mortas, contêm uma espécie de vida em potência, tão prolífica quanto a da alma que os engendrou... eles preservam, como no frasco, o mais puro e eficaz extrato do intelecto que os produziu”.

            Apesar dos esforços feitos, Sr. Presidente, e essa foi uma prioridade minha, ao tempo em que exerci o Ministério da Educação, o Brasil ainda precisa avançar e muito numa política para o livro, inclusive estimulando o acesso a ele.

            Como Ministro da Educação, tive a oportunidade inclusive de iniciar o chamado Prodeli - Programa do Livro Didático. Ainda conservo em minhas mãos o texto do referido programa, mas devo dizer que precisamos continuar nesse terreno.

            Em colóquio realizado em abril do ano passado, no Estado de São Paulo, para discutir os desafios de digitilizar e tornar disponíveis pela internet os acervos bibliográficos das bibliotecas, a Diretora da Biblioteca Nacional da Alemanha, Srª Elizabeth Niggemann, divulgou um dado que mostra o abismo que infelizmente separa as boas promessas de tecnologia digital e do ideal de universalização dos acervos bibliográficos. “Somente na Alemanha” - disse a Drª Elizabeth Niggeman --, “o volume de obras impressas entre 1500 e 1900, cerca de dois milhões, quase que triplicou entre 1901 e 2005, aproximadamente, 2 milhões e 500 mil”.

            Em outras palavras a média anual da produção editorial nos quatrocentos primeiros anos depois da invenção da imprensa por Gutemberg, que tanto transformou o mundo, foi de cinco mil, ou seja, 13,69 publicações a cada dia.

            Nos 106 anos seguintes, essa média foi de 86 mil 762 livros escritos ao ano, atingindo um índice de 237,78 a cada dia. Isso explica por que do acervo de 22,2 milhões de itens apenas 1% tinha sido digitalizado nas duas sedes da Deutsche Bibliotheken em Leipzig e em Berlim.

            No outro pólo do abismo, Sr. Presidente, entre o ideal e o real da digitalização irrestrita dos acervos de livros existentes no mundo está o das bibliotecas universitárias brasileiras. Poucos dias antes, do início do colóquio ocorrido ano passado em São Paulo, no Rio de Janeiro, a Coordenadora do Sistema Integrado de Bibliotecas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, detentora do maior entre os acervos universitários daquele Estado, declarava ao suplemento Prosa & Verso, editado aos sábados pelo jornal O Globo, que a Instituição “permaneceu nos oito anos anteriores sem dinheiro para comprar livros”. Na Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a situação não era diferente desde que o MEC extinguiu programa específico para compra de livros destinados a bibliotecas universitárias. Nessa mesma edição do suplemento literário já citado, Prosa & Verso, informava a responsável, “Depois disso houve também um corte extremo no orçamento da universidade. Nos últimos cinco anos, recebemos R$150 mil para a compra de livros, o que é pouquíssimo”. Ela tem razão.

            Um dos problemas da disseminação dos livros é que o conhecimento humano não depende só da criatividade, da inventividade, do amparo e do fomento à pesquisa. Tão importante, Sr. Presidente, a meu ver, quanto qualquer descoberta é a sua disseminação, não só para que seja aproveitada pelos que dela possam se beneficiar mas também para que estimule a geração de novos avanços.

            Nesse sentido, já é bastante generalizado, no mundo civilizado, o conceito de que há muito as bibliotecas deixaram de ser meros depósitos de livros. No Brasil, nosso maior desafio, ainda não vencido, infelizmente, tem sido o de dotar todas as escolas, de qualquer nível, de uma biblioteca, por mais modesta que seja. Ao lado disso, fomentar a existência de bibliotecas em todos os municípios brasileiros.

            Pode parecer estranho que em pleno terceiro milênio da era cristã ainda não tenhamos, no Brasil, bibliotecas em todos os municípios. O mais grave é que, nos municípios mais pobres, sobretudo nos municípios do Norte e Nordeste, raríssimos são os que possuem bibliotecas. Obviamente, não podemos pensar em melhorar a qualidade da educação, enquanto não tivermos, além de boas escolas, boas bibliotecas sobretudo porque a biblioteca pública tem o sentido de assegurar acesso a todos à cultura letrada e à cultura digital. Nem todos podem comprar livros. Livro, no Brasil, ainda é muito caro, então, é por meio da biblioteca que podemos melhorar, também, a qualidade da educação e gerar leitores.

            Ao se estimular a leitura, estimula-se, também, o aparecimento dos escritores. Leitor rima com escritor e sempre penso que não há escritor que não tenha sido, antes, um leitor.

            Daí por que, Sr. Presidente, considero muito importante que invistamos nessa área.

            Por último, Sr. Presidente, precisamos estabelecer, pelo menos em cada Município, um ponto de venda de livros. Incentivar a leitura será sempre útil em qualquer idade. Mas é como o ideal da alfabetização de adultos; ela se tornará desnecessária no dia em que não houver um só aluno, criança ou adolescente, fora da escola. A partir desse dia, não mais haverá adultos analfabetos no País.

            O ideal da alfabetização, por sua vez, é idêntico ao ideal da universalização do acesso à rede mundial. No dia em que o atingirmos, não haverá mais analfabetos num País como o Brasil, em que o Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional de 2002 revelou que apenas 26% dos brasileiros com idade entre 16 e 64 anos são capazes de ler e entender um livro.

            Ouço o nobre Senador Mão Santa.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Marco Maciel, ninguém melhor do que V. Exª para fazer essa advertência. Essa é a função do Senado. Isso é grandioso. No País, há uma campanha muito grande contra o Senado, contra os Senadores, mas nós garantimos a luz da democracia. Com homens como V. Exª, continuo a dizer, este é um dos melhores Senados nesses 180 anos, do qual V. Exª é um dos símbolos. V. Exª revive o senador romano Cícero, que disse que uma casa sem livros é um corpo sem alma. A minha geração foi bem mais preparada do que esta, porque a Igreja se dedicava à educação. Houve uma mudança, mas todos sabemos que a nossa geração foi educada ou por um Colégio Marista, ou por um Colégio Salesiano, ou por um Colégio Diocesano. Ou seja, a Igreja era muito atenta à educação, dava-nos disciplina e tudo o mais. Somos da era de Monteiro Lobato, um didata, um homem de vida, que resumiu tudo numa frase: “Um País se faz com homens e livros.”. Tanto é verdade que, no exato momento em que V. Exª fala, eu estou com um livro de Wilson Nunes Brandão - Mitos e Legendas da Política Piauiense -, cujo pai foi Deputado Estadual e autor do primeiro livro sobre divórcio, no Brasil. Tive o prazer e o privilégio de ser Deputado Estadual ao mesmo tempo em que ele. Até quando eu viajava, eu ficava no hotel junto com ele. Dormir com homem não é bom - eu gosto de dormir com a Adalgisa -, mas o pai desse moço era uma pessoa tão agradável e tão culta, que escreveu o primeiro livro sobre divórcio. Atentai bem! A Carta Magna do Piauí, a Constituinte do Piauí, eu e outros assinamos, mas quem a escreveu foi Wilson Nunes Brandão. Árvore boa dá bons frutos e está aqui o filho dele, formado em Engenharia, Direito e Pedagogia. Neste livro, que estou lendo e com o qual estou aprendendo, V. Exª é citado. A respeito de Petrônio Portella, aquele símbolo, ele diz: “Sabedoria e habilidade. Petrônio, então Ministro da Justiça, recebido na ABI, no Rio de Janeiro, pelo presidente em exercício da instituição, Fernando Segismundo, por Odílio Costa Filho, Barbosa Lima Sobrinho, Pompeu de Souza e Danton Jobim (...)”. Veja o que Petrônio ensina, Senador Papaléo Paes, aprenda com Petrônio. Todos, aqui, curvaram-se a Petrônio. Ele, sem tiro e sem bala, foi um instrumento do governo revolucionário para, com a anistia, nos fazer voltar à democracia. Marco Maciel é testemunha. Veja o que ensina Petrônio neste livro. O livro é um instrumento que nos traz toda a sabedoria da história da Humanidade, é o único instrumento. O computador é um livro eletrônico, moderno, e não deixa de ter a mesma função, entendamos assim. O que diz Petrônio, aprenda Papaléo: “Conversar, para mim, foi uma prática providencial, que me fez superar barreiras intransponíveis. O importante é estar receptivo a ouvir e disposto a dizer as coisas mais difíceis e constrangedoras, em ambiência de mútuo respeito. Acredito no diálogo não apenas para o ajuste de idéias e compromissos, mas para a fixação de desentendimentos irredutíveis. Em qualquer dos casos, ajuda e esclarece. Teme o diálogo quem é ou está inseguro.” Isso foi o que disse Petrônio Portella, Senador Marco Maciel, nosso orador. V. Exª também faz um comentário, Senador Marco Maciel, que torna este um dos melhores Senados da história do País.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - O Senado nunca abriu sua sessão, em sua história de 183 anos, às segundas-feiras. Estão ali o Papaléo, cumprindo o dever, e o Marco Maciel, doutrinando, ensinando e dando o exemplo. Disse Padre Vieira que o exemplo arrasta. E V. Exª, o que diz no livro de Wilson Nunes Brandão, Mitos e Legendas na Política Piauiense? “Marco Maciel, ex-Vice Presidente da República, em referência a Petrônio, afirmou: ‘Petrônio Portella era, na realidade, um raro arquiteto de estruturas políticas. Ele possuía, em igual dose, a intelectualidade e a ação.’” V. Exª foi muito feliz. “Nisso tudo, impressionante era a coerência de sua atuação.”. Para a História, Golbery do Couto e Silva disse, daquele piauiense, que chegaria à Presidência da República. Atentai bem, Senador Papaléo Paes, que estava comemorando uma medalha que ganhou o Amapá. No Piauí, infelizmente, está o Governo do PT e não conseguimos nem um atleta. O PT acaba com tudo. Golbery do Couto e Silva dava medalha de ouro para Petrônio Portella, neste Parlamento: “(...) sobre seu prematuro desaparecimento do nosso meio, verificando ‘... um sentimento generalizado no País de que a morte lhe ceifou, inexorável, a plena marcha ascensional à suprema magistratura da nação’”. Golbery reconhecia que ele seria o primeiro Presidente Civil deste País.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Nobre Senador Mão Santa, antes de mais nada, quero agradecer às referências de V. Exª a respeito da minha atuação política e aproveitar a ocasião para dizer que o Piauí tem oferecido grandes vultos à política nacional, entre os quais eu destacaria, como V. Exª salientou, o de Petrônio Portella, morto, a meu ver, prematuramente, com 54 anos de idade e que teve papel extremamente importante para o processo de abertura política. Foi ele o grande coordenador político para viabilizar a transição do estado autocrático para o estado democrático de direito. Tive a oportunidade de com ele conviver, ao tempo em que ambos presidíamos, ele o Senado Federal e eu a Câmara dos Deputados. Com ele muito aprendi.

            Petrônio Portella deixou um belo testemunho de vida. O prefácio do Ministro Golbery do Couto e Silva no livro de Petrônio Portella chamado Tempo de Congresso, insinua que Petrônio Portella seria um virtual candidato à Presidência da República, fato que não se materializou por haver falecido de enfarte fulminante. O nome de Petrônio Portella não pode ser esquecido, inclusive nesta Casa, onde ele desempenhou mandatos, sempre com muito espírito público, com muita competência e, sobretudo, com muita visão de futuro. Ele tinha visão prospectiva de Brasil, indispensável a qualquer homem público. É forçoso reconhecer o seu trabalho em favor do País e de suas instituições, inclusive como Governador de seu Estado, o Piauí, que V. Exª também o fez de forma muito competente.

            Essa dolorosa carência que nos humilha a todos evidenciada pelo estudo dos economistas Fábio Sá Earp e George Kornis, “a economia da cadeia produtiva do livro”, segundo o qual “o brasileiro gasta uma parcela de sua renda três vezes maior do que o francês para obter um livro”. Para eles, as famílias que recebiam de 15 a 20 salários mínimos em fevereiro de 2006, (entre 4.500 e 6.000 reais) gastam em média 24 reais mensais com jornais, livros e revistas. Essas pessoas fazem parte dos 5% mais ricos e, asseguram os autores citados, até para estas o livro cujo preço médio é de 25 reais é caro. Logo, poucas pessoas nessa faixa de renda compram livros. A maior parte dos que podem se dar a esse “luxo” ganha mais de seis mil por mês, o que nos leva à conclusão de que, em nosso País, o livro continua sendo algo inacessível, o que é lamentável.

            Sr. Presidente, gostaria de, antes de encerrar a minha manifestação, conceder a palavra ao nobre presidente da Comissão de Educação e Esportes, Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Agradeço-lhe, Senador Marco Maciel, o aparte; agradeço mais ainda como brasileiro por estar ouvindo o seu discurso, relacionado a aspectos e problemas da cultura no Brasil, especificamente no que se refere à literatura, à leitura. Estou de acordo com V. Exª quando diz que, com a concentração de renda que temos, fica difícil ter uma população de leitores. O livro é muito caro para a população. Quero agregar algo mais: ainda mais caro ele é porque o número de pessoas capazes de ler é muito pequeno. Além de ter a restrição da concentração da renda - do pequeno número de pessoas capazes de comprar livro - temos uma restrição maior ainda: o pequeno número de brasileiros que terminaram o Ensino Médio e que, durante o Ensino Médio, aprenderam a gostar de ler. Temos uma população de analfabetos adultos muito grande; temos uma população ainda maior dos que não terminaram o Ensino Médio, e temos uma população ainda maior se juntamos analfabetos e, além daqueles que não terminam o Ensino Médio, os que terminam o Ensino Médio deficitariamente, Senador Mão Santa. O resultado, Senador Papaléo, é o pequeno número de leitores, os que podemos chamar verdadeiramente de leitores no Brasil. Assim, gera-se um círculo vicioso: como há poucos leitores, a tiragem do livro é pequena; como a tiragem do livro é pequena, o livro é caro.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - O custo cresce.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - O custo cresce. Acho que temos de quebrar esse ciclo em diversos pontos, como V. Exª disse. Temos de ter política para reduzir o preço do livro; temos de ter política de distribuição da renda; temos de ter política de distribuição de livros diretamente, seja por biblioteca, seja por doações, mas, sobretudo, a grande saída é todos os brasileiros concluindo o Ensino Médio com qualidade, para que induza o jovem a saber e a gostar de ler.

            O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado, nobre Senador Cristovam Buarque. Foi muito oportuno o aparte de V. Exª, porque desejo, neste momento, fazer uma proposta a V. Exª, que preside, com muito tirocínio e muito competência a Comissão de Educação, de realizarmos uma audiência pública para discutir as causas do custo do livro no Brasil, e mais do que isso, formular um conjunto de medidas que possam se converter em uma lei que, efetivamente, venha a ser executada. No Brasil, vivemos momento de grande anomia, de não cumprimento das leis, que se explica até pela impunidade. Ao lado da anomia há, também, outro fenômeno grave, a hiperanomia, o excesso de leis, que, às vezes põe o Magistrado, o Juiz, sem condições de dar uma sentença. Em razão de um grande número de leis, de um grande número de normas legais, ele fica perplexo, sem saber qual, efetivamente, é aplicável ao caso. Eu diria que nós precisamos, na Comissão de Educação, ver essa questão.

            O Congresso Nacional já aprovou projetos sobre o tema. O último deles, se não me engano, foi de autoria do nobre Senador José Sarney. Contudo, em que pese tratar-se de uma boa iniciativa - à época, ainda não me encontrava no Senado, mas no exercício da Vice-Presidência da República -, não tenho ciência de que a lei esteja sendo efetivamente executada.

            A proposta que eu gostaria de levar a V. Exª é que pudéssemos fazer uma audiência pública para que extraíssemos alguns pontos necessários para implementar, de fato, uma política do livro no Brasil que, talvez, não precise necessariamente passar pela elaboração de uma lei.

            De certa feita, um grande jornalista, que escrevia sob o pseudônimo de Pedro Dantas - na realidade o nome dele era Prudente de Morais Neto, descendente do ex-Presidente Prudente de Morais, disse com muita propriedade que o Congresso não era fábrica, que se caracteriza por sua produção. Antes, sua maior virtude está, naquilo que examina, discute, depura etc. Creio que o fato de termos muitas leis não é necessariamente um bom sinal. Pode até, pelo contrário, representar uma dificuldade para o cidadão em saber o que existe em vigor e como cumprir.

            Daí ocorreu-me uma idéia. Eu a retirei de um jornal espanhol que V. Exª conhece muito bem, El Pais, um dos quatro melhores jornais da Europa. Na edição de 2’ de abril - leio eventualmente o El Pais - há uma matéria que diz: "Governo remete ao Congresso o projeto de lei do livro." Vejam como há cuidado com uma política integrada. Na realidade, diz a matéria que o Conselho de Ministros remeteu, no dia anterior, ao Congresso, um projeto de lei que trata da leitura, do livro e das bibliotecas - quer dizer, ele vê toda uma cadeia, da leitura, do livro e das bibliotecas. Então, esse documento talvez pudesse nos servir de ponto inicial para discutir a questão numa audiência pública.

            Observem que na União Européia eles já chegaram a um nível de entendimento entre os vinte e sete países-membros que está permitindo o aumento de tradução, de livros europeus, criando condições para assegurar cada vez mais o acesso à cultura letrada e à cultura digital. Aqui mesmo tenho um exemplar do Prosa & Verso sobre a questão do livro .e também o caderno que discute o preço da criação. Quer dizer, os escritores preocupados com políticas de Governo de incentivo à autoria e apoio financeiro à produção literária.

            Daí porque, Sr. Presidente, encerro minhas considerações certo de que este é um tema que não podemos deixar de dar a necessária e desejada prioridade, para que possamos ter uma Nação verdadeiramente cidadã. Ulysses Guimarães falava muito que a Constituição de 1988 seria a Constituição Cidadã. E cidadania rima com soberania, com soberania pessoal do cidadão, porque o cidadão só goza, só desfruta da sua liberdade de agir quando está em condições de exercitar os códigos básicos de uma sociedade educada. Insisto, portanto, que a questão da cidadania passa, por isso mesmo, sobretudo pela educação, a qual também tem seus desdobramentos no campo da ciência, da tecnologia e da inovação.

            Sr. Presidente, solicito ao encerrar, a publicação do texto da matéria de El Pais já referida, em apenso ao meu pronunciamento.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR MARCO MACIEL EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“El Gobierno remite al Congreso el proyecto de ley del libro”, El País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/07/2007 - Página 25052