Discurso durante a 114ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de visita ao Senador Antonio Carlos Magalhães, no Incor de São Paulo. Comentários sobre a decisão do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul que conduziu um juiz para o cargo de prefeito do município de Cassilândia - MS.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), GOVERNO MUNICIPAL. JUDICIARIO.:
  • Registro de visita ao Senador Antonio Carlos Magalhães, no Incor de São Paulo. Comentários sobre a decisão do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul que conduziu um juiz para o cargo de prefeito do município de Cassilândia - MS.
Aparteantes
Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 18/07/2007 - Página 25231
Assunto
Outros > SENADO. ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), GOVERNO MUNICIPAL. JUDICIARIO.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, HOSPITAL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANUNCIO, RECUPERAÇÃO, SAUDE.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, DISCURSO, ORADOR, DENUNCIA, JUIZ, INFRAÇÃO, ORDEM JURIDICA, MAGISTRADO, AUSENCIA, POSSE, SUCESSOR, PREFEITO, PREJUIZO, AUTONOMIA, MUNICIPIO, CASSILANDIA (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), LEITURA, TRECHO, LIVRO, JURISTA, JUSTIFICAÇÃO, DECISÃO, PROMOTOR DE JUSTIÇA, RECONHECIMENTO, REGIME, EXCEÇÃO, SAUDAÇÃO, NORMALIZAÇÃO, PREFEITURA, PRESIDENTE, CAMARA MUNICIPAL.
  • APREENSÃO, POPULAÇÃO, REPRESALIA, JUIZ, LEITURA, MENSAGEM (MSG), INTERNET, AUTORIA, CIDADÃO, QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, MAGISTRADO, ABUSO DE PODER.

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, farei o possível e o impossível para não prejudicar a vez de nossos companheiros.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, antes de iniciar minha fala, gostaria de registrar a visita que fiz anteontem ao eminente Senador Antonio Carlos Magalhães, que se encontra internado no Incor de São Paulo.

Eu gostaria de fazer este registro para informar que a recuperação do ilustre Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania se dá de forma tranqüilizadora. Acredito que, no segundo semestre, ele estará presente entre nós, para alegria de todos.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Valter Pereira, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Honra-me, Senador Romeu Tuma, conceder-lhe um aparte.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Corroborando o que disse V. Exª, no domingo, estive no hospital e conversei com ele. Ele estava tranqüilo e já havia superado uma crise anterior. Foi necessário que se suspendesse a hemodiálise para que se tratasse um problema intestinal, mas ele estava bem. Conversamos e ele fez-me perguntas a respeito de todos os casos que aqui acontecem. O seu neto informou-me que ele assistiu ao jogo do Brasil, torceu muito e gostou da vitória.

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - É verdade. Indiscutivelmente, a bagagem que tem o Senador Antonio Carlos Magalhães mostra, claramente, que, se ele estivesse aqui, talvez o ambiente já se houvesse desanuviado há muito mais tempo.

Sr. Presidente, ao terminar este semestre, eu não poderia deixar de fazer alguns registros importantes de problemas que abordei desta tribuna, alguns pertinentes ao cenário nacional, outros de interesse do meu Estado.

Aliás, para algumas correntes de pensamento, esta tribuna não deveria protagonizar discussões acerca de assuntos mais paroquiais, aqueles que dizem respeito à vida do Estado e dos Municípios representados por cada um dos Srs. Senadores.

Entendo, porém, que sempre que alguma pilastra da Federação sofre alguma descompensação, justifica-se, plenamente, trazer a discussão para esta Casa. Foi o que aconteceu, por exemplo, na semana passada, quando proferi um discurso denunciando grave lesão ao Estado de direito no pequeno Município de Cassilândia, no meu Estado. O mais grave foi que a transgressão à ordem jurídica partiu daquele que deveria ser o guardião da lei, ou seja, o Poder Judiciário, representado por dois Magistrados.

A Juíza Substituta Jeane de Souza Ximenes e seu colega, Juiz Sílvio César Prado, foram os protagonistas de uma decisão que levou o Promotor Público Ronaldo Vieira Francisco a reconhecer que a cidade encontrava-se em Estado de exceção. Não poderia ser avaliada de forma diferente a situação criada por uma decisão da Juíza Substituta, que nomeou um colega da mesma instância para exercer o mandato de Prefeito, ao arrepio da Constituição e da lei.

Deixar de dar posse ao Presidente da Câmara Municipal ou a quem esteja na linha sucessória prevista na Lei Orgânica do Município, a fim de substituir o Prefeito e o Vice-Prefeito, afastados também por decisão dos mesmos Magistrados, configurou verdadeiro golpe contra a autonomia do Município. Foi exatamente contra isso que me insurgi desta tribuna.

Atentar contra a autonomia do Município, Sr. Presidente, é golpear um dos fundamentos do princípio federativo. Nesse sentido, vale lembrar a lição de um dos mais abalizados juristas de nosso País e dos nossos tempos.

Doutor em Direito do Estado e livre-docente em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo, estou-me referindo a um dos mais festejados constitucionalistas do País, o jurista Alexandre de Morais, que foi um dos mais autênticos representantes do Legislativo, indicado pela Câmara dos Deputados para compor o Conselho Nacional de Justiça.

Na 20ª edição de sua obra, intitulada Direito Constitucional, é que vamos encontrar o alcance da autonomia dos Municípios.

Veja, Sr. Presidente, o que diz o renomado mestre:

A Constituição Federal consagrou o Município como entidade federativa indispensável ao nosso sistema federativo, integrando-o na organização político-administrativa e garantindo-lhe plena autonomia, como se nota da análise dos arts. 1º, 18, 29, 30 e 34, VII-C, da Constituição Federal.

Ressalta Paulo Bonavides que não conhecemos uma única forma de união federativa contemporânea onde o princípio da autonomia municipal tenha alcançado grau de caracterização política e jurídica tão alto e expressivo quanto aquele que consta da definição constitucional do novo modelo implantado no País com a Carta de 1988.

Mais à frente, esse mesmo jurista pondera o seguinte:

         Observe-se que a competência para disciplinar matéria referente à substituição e sucessão na chefia do Executivo municipal é reservada à Lei Orgânica municipal, tendo decidido o Supremo Tribunal Federal que não cabe ao Estado-membro, sob pena de frontal transgressão à autonomia constitucional do Município, disciplinar, ainda que no âmbito da própria carta política estadual [que isso fique muito claro não só para o Prefeito e para o Juiz de Cassilândia, mas para todos os Prefeitos e Magistrados deste País,], a ordem de evocação das autoridades municipais, quando configuradas situações de vacância ou de impedimento cuja ocorrência justifique a sucessão ou a substituição nos cargos de Prefeito e de Vice-Prefeito do Município.

Portanto, Sr. Presidente, aqui está muito caracterizada a preservação necessária da autonomia dos Municípios.

Mais adiante, informa o mesmo jurista, nessa obra que está na sua 20ª edição: “Julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça”. Essa é uma garantia constitucional dos Prefeitos. Os Prefeitos não podem ser julgados por Juízes de Primeira Instância, por infrações penais. É necessário, em nome da autonomia e em respeito à autonomia, que o Tribunal de Justiça os julgue.

Mais na frente, o mesmo grande doutrinador pontifica:

         O inciso X do art. 29 da Constituição Federal inovou a competência para processo e julgamento das infrações penais cometidas por Prefeitos municipais, concedendo-lhes foro privilegiado ao dispor que somente serão julgados pelo Tribunal de Justiça respectivo, seja pelo Plenário ou por órgão fracionário competente.

Aqui está a grande lição que precisa ser passada aos Prefeitos de todo o País, em que houve a grande infração de um juiz e de uma juíza substituta de Cassilândia.

Cotejando o que nos ensina esse grande doutrinador de Direito Constitucional com os acontecimentos aqui narrados anteriormente, não resta dúvida de que a autonomia de Cassilândia foi proscrita pela decisão judicial.

No entanto, Sr. Presidente, a ordem jurídica hoje foi restabelecida. Os jornais já noticiam que o Presidente da Câmara Municipal, Vereador Romão Maiorchini, acaba de tomar posse como Prefeito daquela comuna.

E o sonho de o Juiz Sílvio César Prado tornar-se Prefeito poderá até se concretizar, mas não agora, nem por esse caminho. Ele vai ter de se inscrever num Partido político, depois de deixar a magistratura obviamente, e disputar uma eleição. Vencendo-a, poderá ser o Prefeito. Por meio de manobras, não!

No entanto, Sr. Presidente, resta aqui um receio muito grande de tantos quantos participaram de todos esses eventos no Município de Cassilândia: o receio da retaliação.

Acontece que o eminente juiz, logo que tomou posse, também tomou gosto pelo poder e começou a agir como se fosse um Prefeito devidamente eleito e empossado pelas vias normais. No entanto, Sr. Presidente, depois de promover diversos atos administrativos, como mudança no horário de expediente, como demissão de servidores, e uma série de outros atos administrativos, tudo indica que ele não está conformado com a decisão de retornar à sua condição única e exclusiva de juiz, e espalha-se o boato de que haverá retaliação.

Sr. Presidente, gostaria que V. Exª me desse exatos três minutos para eu concluir o meu pronunciamento.

Sr. Presidente, recebi muitos e-mails sobre o que aconteceu em Cassilândia. E, dentre estes muitos e-mails que recebi, um me chamou a atenção exatamente por versar sobre esses riscos de retaliação. Não vou revelar o nome por razões óbvias, que foram pontificadas pelo próprio missivista, mas vou fazer a leitura de alguns pontos que mostram o estado de espírito que viceja hoje naquele Município, a fim de que o Tribunal de Justiça tome as decisões necessárias para evitar esse tipo de retaliação.

Vejam o que diz o missivista:

[...] não consigo entender o posicionamento arbitrário e abusivo do Poder Judiciário em Cassilândia. Acho que se nada for feito poderá gerar precedentes com danos terríveis à ingerência entre Poderes e à individualidade que deve existir entre os mesmos.

[...]

Ele está atuando como Juiz no período da manhã, Prefeito, à tarde, e à noite, participando da reunião da Câmara, com o único objetivo de intimidar e de mostrar poder.

O fato de ele ter nascido na cidade, ter família lá, deixa um aberto neste julgamento.

No início das investigações, ele estava presente em todos os fatos, de repente a sociedade começou a questionar pelo fato de poder haver alguma coisa particular dele com os acusados.

Acho que se essas coisas estavam erradas, realmente têm que ser apuradas, os culpados punidos, mas não do jeito que o Judiciário está fazendo em Cassilândia [aqui ele está se referindo às denuncias de irregularidades que ocorreram naquele Município].

O juiz alardeia que eles não sairão enquanto não forem julgados, para que não possam recorrer em liberdade da condenação, que já foi, de antemão, impostas a eles pelo Judiciário.

Os promotores, delegado e o juiz, falam a todo o instante nas rádios da cidade, na Internet, que eles são culpados.

[...] em Cassilândia, como em Paranaíba, as pessoas temem represálias. Temem ser vítimas depois da perseguição por parte deste juiz (...). Realmente, não se respeita mais a independência entre o Legislativo (ele vai para a Câmara impor as leis que ele acha que têm que ser criada), o Executivo (ele manda e executa o que ele quer) e o Judiciário (está atuando também como juiz). O que mais falta? Apenas tomar o poder do padre.

            Assim encerra esta mensagem.

Sr. Presidente, não vou tomar mais o tempo reservado a outros Colegas que também desejam falar. No entanto, encerro, esperando que o Tribunal de Justiça, tomando conhecimento dessas denúncias, aja, para que não ocorram perseguições, não ocorram retaliações, já que o que aconteceu agora foi retomar o processo à ordem.

O juiz é para julgar; ele pertence ao Tribunal de Justiça do Estado e não do Município, já que o Município não tem um Poder Judiciário independente. Então, ele tem de voltar para o seu gabinete, examinar os processos e julgá-los, e o Prefeito tem de trabalhar com independência, com lisura, respeitando a legislação e, obviamente, respondendo por suas obrigações.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/07/2007 - Página 25231