Discurso durante a 121ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória do Senador Antonio Carlos Magalhães.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do Senador Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/2007 - Página 26914
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, EX-DEPUTADO, EX GOVERNADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), ELOGIO, VIDA PUBLICA, COLABORAÇÃO, POLITICA NACIONAL, DETALHAMENTO, ATUAÇÃO, LEGISLATIVO, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, COMBATE, POBREZA, VALORIZAÇÃO, SALARIO MINIMO, POLITICA, SEGURANÇA PUBLICA, COMENTARIO, POPULARIDADE.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Renan Calheiros, saúdo V. Exª e todos os Senadores presentes a esta Casa, bem como o Deputado Osmar Serraglio, que representa a Câmara dos Deputados, o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Rider Nogueira de Brito, em especial nosso Vice-Governador, que representa toda a comunidade do Distrito Federal, Paulo Octávio, e, de forma muita especial, os familiares do Senador Antonio Carlos Magalhães, D. Arlete, Antonio Carlos Magalhães Júnior, D. Teresa, ACM Neto e todos os demais parentes que aqui estão.

Preparei um discurso por escrito, mas vou correr os mesmos riscos que o Senador Tasso Jereissati e vou fazer a mesma opção, porque, se por um lado não é fácil falar de Antonio Carlos Magalhães, desnecessário seria repetir - e sei que outros o farão com muito mais detalhe e brilho - a sua biografia, a sua trajetória, a sua história.

Não preciso de outra referência a não ser o fato de que, quando nasci, ele já era Deputado, já estava na vida pública. E não conheço, ao longo de toda a militância política, um único momento relevante da história recente desta República em que o Senador Antonio Carlos Magalhães não estivesse presente, com posição muito clara, nítida e de forma absolutamente determinante.

Eu subo a esta tribuna para falar de alguém com quem convivi nos últimos 20 anos - convivi intensamente e sempre como adversário político. Sempre estivemos em posições distintas; nas campanhas eleitorais, nas principais votações, nas grandes discussões, estávamos em posições distintas. Mas quero falar do testemunho pessoal, das impressões que tive e daquilo que vi e vivi, especialmente no plenário da Câmara dos Deputados e, nos últimos anos, no plenário do Senado Federal.

Uma das maiores qualidades de Antonio Carlos Magalhães era a coragem e a franqueza. E é com coragem e franqueza que quero expressar o que gostaria muito de dizer. Quando ele estava terminando a Presidência do Congresso Nacional - e já se vão mais de oito anos -, eu disse a ele: “Senador Antonio Carlos Magalhães, em V. Exª nada é pequeno, nem os defeitos e nem as qualidades”. Nada era pequeno, tudo nele era grande. A presença dele era absolutamente decisiva.

Num momento como este quero falar das qualidades, que não eram poucas e que eram essenciais ao homem público. Quero repetir uma frase dele que penso expressar como poucas o que ele era como ser humano. Ele disse: “Política, para mim, é paixão. Por isso que a faço sempre com prazer e em tempo integral. Qualquer um que queira fazer política de verdade precisa exercê-la com paixão”. E era paixão.

Quantas vezes, nesta Casa, nós fazíamos reunião da Mesa com as Lideranças, estabelecíamos a pauta que ia ser votada, como seria. E aí, quando eu entrava como Líder do Governo neste Plenário, olhava para o canto ali, pedia ao nosso grande Rodolpho Tourinho que ajudasse, recorria ao César Borges, pois era só eu olhar para o canto e ver aquela cara enfezada que eu dizia: “Não vai ter votação hoje”. Ele já estava com aquele jeito. Ele chegava cedo aqui, e a confusão começava já no primeiro minuto. E a sessão inteira era turbulenta, porque havia alguma coisa incomodando o Senador.

Mas ele fazia isso com paixão. E fazia isso discutindo interesses, posições políticas. A política era a essência da vida dele. E era a política que determinava os seus movimentos fundamentais.

Eu queria também mencionar uma outra passagem. Hoje, o nosso querido Senador Papaléo disse aqui - e é verdade - que ele fez política sempre com independência, com altivez, defendendo o Legislativo perante o Executivo. Mesmo quando era da base do Governo, ele sempre defendeu esta Casa e o papel do Poder Legislativo. E ele disse que essa independência tinha importância sobretudo pelo fato de ele terminar a vida nessa condição de Oposição.

Mas o ACM gostava mesmo era de ser governo. Eu me lembro uma vez em que eu tive um debate com ele aqui, muito intenso. Eu vinha subindo para o plenário e disse: “Senador, V. Exª está como gosta hoje: critica o Governo, esculhamba, fala tudo o que pensa, tudo o que quer”. Ele disse: “Mercadante, é muito melhor apanhar de cima do que bater de baixo”.

O Senador César Borges disse que também ouviu dele algo muito parecido: “é melhor sofrer dentro do Governo que de fora, porque, em política, a gente sempre sofre”. Era muito do que ele pensava.

Ele tinha uma capacidade de exercer o poder, de pensar o poder e uma vivência de responder às questões do poder que faziam com que ele sempre fosse uma referência absolutamente obrigatória em tudo que se referia à política do Parlamento brasileiro.

Quero destacar aqui também o papel determinante que ele teve nos cargos que exerceu nesta Casa. Eu era Líder da Oposição e ele, Presidente do Congresso Nacional, quando pactuou algumas políticas que foram fundamentais, pela capacidade de ter uma visão do Brasil, que não era a minha, mas era uma visão de Brasil de um homem público. Nós conseguimos negociar, Oposição e Governo, questões como o Fundo de Combate à Pobreza, que está aí hoje, sendo uma referência fundamental de combate à pobreza, e a política de valorização do salário mínimo, que já era uma preocupação que vinha de longo tempo, em cujo debate ele sempre esteve envolvido. Recentemente, todos assistiram ao seu papel determinante como Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para estabelecer aquele pacote da segurança pública. Foram 25 projetos de lei que votamos. Se não fossem a determinação, o empenho e a firmeza dele, não conseguiríamos pautar e votar essas matérias com a agilidade e, eu diria, com a competência que era indispensável para que pudéssemos contribuir para o País num momento tão delicado, como é a crise da violência.

Creio que parte da minha tarefa de Oposição e do bom relacionamento que eu tinha com ele vinha do meu relacionamento com Luís Eduardo Magalhães, que era uma figura ímpar - talvez a grande obra pública do Senador Antonio Carlos Magalhães. Acho que Luís Eduardo Magalhães era uma referência na política nacional absolutamente determinante.

E todos sabem - penso que o Tasso Jereissati foi muito feliz em dizer - que todas as vezes que nós, de alguma forma, lembrávamos de Luís Eduardo Magalhães, as lágrimas lhe vinham nos olhos, e aquilo tinha um significado e um sentido muito profundo, muito especial na alma de Antônio Carlos Magalhães.

Eu queria pedir a você, Antonio Carlos Magalhães Júnior, que, o mais breve possível, arrume alguma confusão grande neste plenário e que eu possa ter grandes embates políticos - sei que não é o seu estilo, mas você precisa fazer um esforço veemente - para matarmos um pouco da saudade que vai ficar e que não será pequena.

Quero também dizer a você, Antonio Carlos Magalhães Neto, que algumas conversas que tive com o seu avô mostraram a imensa expectativa dele em sua trajetória. Espero que você aprenda todas as lições. Não precisa ficar com todos os defeitos, fique com as qualidades, que são muito abundantes e vão ajudá-lo de forma decisiva.

Quero dizer que vi duas paixões muito importantes em Antonio Carlos Magalhães - e muito nele era paixão: a paixão pelo Brasil e, sobretudo, a paixão pela Bahia. E os momentos que mais me sensibilizaram no relacionamento de um adversário - e eu sempre fui adversário - foram as vezes que eu o vi no contato com a cultura e o povo baiano. Estive no carnaval e vi, com o Ilê passando e jogando aqueles colares, o significado especial que aquilo tinha, ou quando ele descia para abraçar as baianas, ou quando o Olodum passava com os seus tambores de guerra.

Então, eu escolhi, e quero falar com o meu sotaque paulista - porque parte dos meus embates com ele também era a questão de São Paulo e a relação com a Bahia, que nunca foi tarefa fácil -, quero falar com a paixão de um paulista e com o respeito a um baiano absolutamente marcante na história da Bahia. Quero ler aqui, com o meu sotaque de paulista, um trecho da Ode ao Dois de Julho, de outro grande baiano, Castro Alves:

E um povo de bravos ergueu-se dizendo:

“Já somos nós livres, já somos nação!...”

Co’as águas imensas o imenso Amazonas

Pomposo repete: - “Sou livre em meu chão!...”

E ao grito de livres as fontes correram

E em lindas cascatas os rios saltaram...

Ergueram-se cantos festivos de hosanas,

As flores do seio da terra brotaram...

É hoje, senhores, o dia da pátria.

Que d’alma - os Baianos - conservam no fundo,

Saudemos o dia que ergueu-nos do lodo...

Que marca um progresso na vida do mundo.

Senhores, a glória de um povo é ser livre...

O nome de livres é o nosso brasão.

Seja esta a divisa da nossa existência.

E este epitáfio se escreva no chão...

Creio que o epitáfio de Antonio Carlos Magalhães é o chão da Bahia.

Muito obrigado. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/2007 - Página 26914