Discurso durante a 121ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória do Senador Antonio Carlos Magalhães.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do Senador Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/2007 - Página 26916
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, EX-DEPUTADO, EX GOVERNADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), EX PREFEITO, ELOGIO, VIDA PUBLICA, VALORIZAÇÃO, LEGISLATIVO.
  • LEITURA, DEPOIMENTO, CIDADÃO, DETALHAMENTO, BIOGRAFIA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, ELOGIO, QUALIDADE, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, ESTADO DA BAHIA (BA).

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Renan Calheiros; Sr. Ministro Rider de Brito; Senador Antonio Carlos Magalhães Júnior; Deputado Osmar Serraglio, aqui representando a Câmara dos Deputados; Srª Arlete Magalhães; Srª Teresa Helena Magalhães; senhores familiares; Srªs e Srs. Senadores, Srs. Parlamentares e os que prestam homenagem ao Senador Antonio Carlos Magalhães, para mim, é um gesto de amizade vir à tribuna do Senado, porque conseguimos construir juntos, nesta Casa, uma relação de afeto muito importante - eu julgo - para minha pessoa. Tenho como prática de vida querer fazer amigos, gosto de fazer amigos, valorizo muito isso e acho que o Senador Antonio Carlos Magalhães também teve sempre esse gesto na vida, de querer construir amizades, de querer fazer amigos. E esses quase dez anos de Senado Federal nos permitiram construir uma relação de amizade, uma relação de respeito, uma relação afetuosa, de forma que os ambientes ideológicos a que pertencíamos não prejudicassem a forte relação de respeito e de consideração que nutríamos um pelo outro, Senador Paulo Octávio.

Como o Senador Tasso Jereissati, sinto muito a falta que fará o Senador Antonio Carlos Magalhães. Fará falta pelo orador que foi, corajoso, sobretudo, mas principalmente pelas posições que tinha coragem de tomar sempre na vida pública. Era um homem que, marcadamente, não abria mão das suas posições, e esta Casa nunca será uma instituição respeitável e admirável se as posições não forem claras e se a coragem de tomar posições não for suficiente para os seus membros. Ele me marcará sempre por essa atitude na vida.

Não consigo imaginar quantas vezes encontrei pessoas que não tivessem medo de esconder seus defeitos. E o Senador Antonio Carlos Magalhães abria mão de qualquer receio de expor seus defeitos perante qualquer um e perante qualquer ambiente social em que estivesse. Esse é um gesto muito raro, é um gesto determinante para a admiração que construí em relação à sua pessoa. A coragem de enfrentar os momentos difíceis da vida política, a coragem de enfrentar os momentos que marcaram sua luta no seu Estado, no País, no debate ideológico, cuja travessia de mais de 50 anos ele teve de fazer, sempre foi algo que me trouxe muito à lembrança os sentimentos de respeito e de apreço, que sei que foram mútuos.

Gerou um político como Luís Eduardo Magalhães. Vem-me sempre uma frase ligada a ele: “O jogo está jogado”. Ele a proferia nos momentos de entendimento da Casa. O “jogo jogado” significava que o acordo estava feito e não seria quebrado. Esse é outro gesto especial. Sua família inteira deve se orgulhar sempre dessa conquista que ele conseguiu obter.

Gerou também ACM Neto, que expande a fronteira da Bahia, do Nordeste, como um personagem da política brasileira, e Antonio Carlos Júnior, que foi meu colega no primeiro mandato e que cumpriu com honradez também seu mandato aqui. Isso foi muito importante no exercício do Senador, bem como na vida dessa família.

Outro gesto que não se pode deixar de considerar aqui - o Senador Mercadante também o trouxe à nossa lembrança - era a defesa do Poder Legislativo. Poucas vezes, consegui ver, no Congresso Nacional, observando esta instituição, quando ele estava aqui ou quando ele não estava aqui, quem tivesse coragem de fazer a defesa do Poder Legislativo com tanta clareza e com tanta convicção como o Senador Antonio Carlos Magalhães. Para ele, era algo muito distinto, era algo sempre muito especial a figura do Poder Legislativo dentro da vida pública brasileira. Talvez, por isso, ele tenha tido a coragem, no meio de muitos, de conseguir viabilizar a CPI do Judiciário e de assumir, de frente, essa responsabilidade.

Duvido se outros tantos parlamentares da história do Congresso brasileiro teriam tido coragem de fazer uma solicitação daquelas, sem medo de serem mal interpretados e sem medo de serem confundidos no que queriam. E o que ele queria era uma marca no combate à corrupção, que incomodava e afligia profundamente a vida pública naquele momento, como foi o escândalo do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, que foi depurado, dissecado, viscerado e gerou um ato de justiça, como outros que foram conseqüências daquela CPI, que não era uma afronta ao Poder Judiciário, mas uma necessidade da República, ao expor aquele tipo de ferida naquele momento.

A TV Senado, que o Presidente Sarney criou, mas cuja dimensão para a democracia brasileira o Senador Antonio Carlos Magalhães compreendeu tanto, para a transparência da vida legislativa brasileira e cujos passos consolidou com tanta força, além dos que o Presidente Sarney trouxera.

O Fundo de Combate à Pobreza, como já foi bem lembrado aqui; o Instituto do Coração do Distrito Federal, que, hoje, está-se tornando uma referência no atendimento a 11 Estados brasileiros, que confluem para o Centro-Oeste em busca de tratamento para doenças especializadas do coração, cuja luta e desafio foi ele que incorporou, extrapolando os benefícios da sua fronteira.

Então, creio que seja uma figura que marcará sempre a memória do Poder Legislativo. Lembro-me também de uma atitude recente dele muito elevada, quando foi derrotado na última eleição. De cabeça erguida, entendeu que poderia aceitar o convite de um diálogo, sendo ele de oposição contra o Governo do Presidente Lula. Sentou, relatou para mim que o primeiro ponto a ser tratado naquela conversa seria o que aconteceria com a Bahia a partir daquele momento. Então, a sua preocupação com o seu Estado, com as prefeituras da Bahia, com o desenvolvimento daquela região, outro traço marcante de um homem público, que não podemos esquecer como uma referência em nossas atitudes e em nosso debate.

Procurei, Sr. Presidente, já encerrando, trazer uma lembrança. Digo: Puxa, como vou considerar um olhar de 50 anos se tenho menos do que isso?

No meu aniversário, dia 9 de fevereiro, tocou o telefone e era o Senador Antonio Carlos Magalhães, dando-me os parabéns. Eu disse: O que eu posso ouvir da sua figura para um jovem de 46 anos? Ele respondeu: “Quanta inveja!” Inveja da vida, porque ele queria ter mais vida, ele queria ter mais tempo, ele queria poder fazer, talvez, o que eu possa fazer pela frente, na minha região, no meu Estado, no campo político.

Assim, procurei pegar o testemunho de um cidadão de 85 anos, lá da Bahia, amigo meu também, o Dr. Raymundo Paraná, um cidadão que foi advogado a vida toda e que conheceu bem o Senador Antonio Carlos Magalhães. Peguei o testemunho dele e do filho, que é um dos maiores pesquisadores de fígado do Brasil, o Dr. Raymundo Paraná Filho.

Ouçam o testemunho que dá o Dr. Raymundo Paraná, de 85 anos, insuspeito, que não tem vida partidária, não tem nenhum tipo de debate apaixonado de partidos e de confrontos na Bahia:

Ainda jovem, ACM, que na fase universitária, acadêmico de medicina, já despontava como leader, quando da redemocratização do País, após o término da era getulina, passou a se dedicar à politica. Eleito Deputado Estadual, consolidou o seu trabalho e logrou ser eleito Deputado Federal.

A partir daí, a sua trajetória ascendeu. Após o ano de 1964, foi nomeado Prefeito de Salvador, onde deixou a sua marca de excelente administrador, a ponto de ter sido considerado o Prefeito do Século. Hoje, a cidade de Salvador lhe é devedora de obras fundamentais.

Governador do Estado por três períodos, realizou trabalho marcante.

No seu primeiro período, tive a honra de ser convidado para chefiar o Departamento Jurídico do Centro Industrial de Aratú, resultando na construção do Porto de Aratú, que hoje serve de escapamento para o Pólo Petroquímico de Camaçari e, ainda, para exportação dos veículos fabricados pela Ford, com efeitos significativos para a economia baiana.

O que caracterizou as administrações de ACM foi a sensibilidade na escolha de auxiliares diretos. Teve como colaboradores mais próximos seu Chefe da Casa Civil, o saudoso amigo Rosalvo Barbosa Romeu. Introduziu na vida pública outras figuras importantes, destaques pela competência administrativa, como Waldeck Ornelas, Paulo Souto, Rodolfo Tourinho, César Borges. Estes honraram e honram a Bahia no Senado. Vários jovens competentes foram lançados na vida pública por ACM. Ele tinha uma espécie de faro para detectar competência, principalmente nos jovens. Tinha também um intenso compromisso pela renovação, motivo de orgulho dos seus colaboradores.

Apesar dos naturais ataques oposicionistas, ninguém lhe pode negar liderança carismática, além da grande visão político-administrativa.

A restauração do Pelourinho reativou o fluxo de turismo na Bahia. A industrialização da Bahia nos tirou do marasmo econômico. A projeção da Bahia no cenário político nacional foi outro efeito marcante.

Aí vem Raymundo Paraná Filho, um dos maiores hepatologistas da história do Brasil, amigo meu e contemporâneo de vida médica e acadêmica, dizendo o seguinte:

Da minha parte, destaco que nunca tive qualquer envolvimento com o Senador ACM, mesmo quando ele foi Governador da Bahia. Estive em seu Gabinete duas vezes, ambas para pedir apoio para projetos no serviço público de saúde da Bahia. Mesmo não tendo qualquer envolvimento com o Senador ACM, era impossível renunciar a certa admiração que todo baiano desenvolveu por essa figura única na política brasileira.

Certa fez, encontrava-me no Incor, numa revisão médica, e lá tive problema com o meu seguro saúde. Liguei para o meu amigo e Senador Tião Viana para pedir orientações, mas o Senador ACM soube do fato e interferiu a meu favor, mesmo sem um pedido meu. O Senador Tião Viana está autorizado a relatar esse fato. Nunca fui aliado ou apadrinhado pelo Senador ACM, nunca fui seu colaborador, mas ele teve um gesto generoso para comigo. Sei que não fui o único a me surpreender com atitudes como esta, vindas do Senador ACM. Ele tinha fama de durão, podia ser intransigente, porém só as pessoas sensíveis tomam atitudes como esta.

Então, são testemunhos das mais variadas posições de vida ideológica que vemos, com muito respeito, a uma figura pública.

Haroldo Lima, do PCdoB, em sua idade também de homem maduro, colocava-me candidato a Deputado Federal, foi reunir com artistas da Bahia no Pelourinho e eles disseram: “Olha, Haroldo, está vindo você da esquerda aqui, mas vamos dizer-lhe uma coisa: só não fale mal do ACM”.

Então, essa relação ele conquistou com a maior grandeza porque ele amou a Bahia, ele respeitou a Bahia e digo, com o maior respeito, que é um dos maiores vultos da história política brasileira.

Meu respeito e meu sentimento. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/2007 - Página 26916