Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração aos 180 anos da criação dos Cursos Jurídicos no Brasil.

Autor
Marcelo Crivella (PRB - REPUBLICANOS/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Comemoração aos 180 anos da criação dos Cursos Jurídicos no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2007 - Página 27420
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, CRIAÇÃO, CURSO JURIDICO, BRASIL, IMPORTANCIA, DIREITO, FUNDAMENTAÇÃO, JUSTIÇA, REGISTRO, HISTORIA, ESPECIFICAÇÃO, COLABORAÇÃO, JURISTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • COMENTARIO, DISCURSO, SENADOR, CRITICA, JUIZ, SENTENÇA JUDICIAL, DISCRIMINAÇÃO, HOMOSSEXUAL, REGISTRO, OPOSIÇÃO, ORADOR, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFINIÇÃO, SITUAÇÃO, CRIME, OPINIÃO, OFENSA, LIBERDADE DE CRENÇA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, LIBERDADE DE PENSAMENTO.

            O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente desta sessão, Senador Gerson Camata; ilustre Sr. Presidente do PMDB, Michel Temer, que tão bem representa a classe dos advogados do meu País; ilustres Membros da Mesa, Srªs e Srs. Senadores, senhores e senhoras presentes, senhores telespectadores da TV Senado e senhores ouvintes da Rádio Senado, ao vir a esta tribuna, eu gostaria de somar-me aos demais oradores desta sessão solene para homenagear um ofício que constrói este País antes mesmo dos Tribunais. Santo Antão dizia: “É possível haver cristianismo antes de Cristo?” Outros dizem que o cristianismo sempre existiu, desde os primórdios. E é possível haver Direito antes dos Tribunais e dos advogados? Certamente, sim. O Brasil é um exemplo disso.

            Esta Casa discutia Justiça antes de termos Tribunais, discutia a Nação antes de termos Constituição e território delimitado. Esta Casa, que se reúne há quase 200 anos, sempre teve grandes juristas, sempre se valeu deles em cada passo que tomou para, nas suas contundentes contumélias, encontrar o caminho mais seguro para resolver suas controvérsias.

            Agora mesmo, ouvi a nossa Senadora Serys Slhessarenko falando sobre a sentença desse juiz, a qual tive também, na tribuna, a oportunidade de criticar, porque acredito que não se deve, nesta Nação, atribuir pecha, pestear ou levantar qualquer argumento que se some à discriminação, seja contra quem for. Fiz aqui também o meu pronunciamento contra essa sentença, e todos sabem da minha posição com relação ao projeto da homofobia.

            Aliás, Sr. Deputado Michel Temer, Presidente do PMDB, parece-me que os Srs. Deputados não sabiam a completa extensão dessa lei - que, nesta Casa, tomou o nome de PLS nº 122, a Lei da Homofobia - quando a aprovaram, porque ela muda três Códigos: a CLT, a Lei do Racismo e o Código Penal, criando a figura do crime de opinião. Portanto, vamos seguramente atingir a liberdade de culto e a liberdade de expressão do pensamento.

            Sou contra a sentença do meritíssimo, quando pecha um jogador de futebol, que não sei se é homossexual ou não, e qualquer um que pratique o esporte. Sou absolutamente contra a Lei da Homofobia, Senador Marco Maciel, porque não se concebe nesta Casa, no Congresso Nacional, de grandes e ilustres nomes, como o Senador Rui Barbosa, como o Padre Godinho, com seus discursos extraordinários, que algum dia se pensasse que esta Casa iria rasgar, mesmo que de maneira adjacente, ou talvez, eu diria, sem total consciência, o que nos ensina Cristo, as palavras da Bíblia. Não se deve discriminar, mas não se deve fazer apologia. E o PLS nº 122 é uma apologia. A lei passa a tutelar uma situação que nós devemos discutir mais aprofundadamente.

            Mas eu não quero me perder com assuntos adjacentes ou tangentes, eu quero mesmo é homenagear os advogados. E quero homenagear, como representante do Rio de Janeiro, os brilhantes juristas da minha terra. É justo que eu faça isto.

            No século XIX, por obra da Assembléia Geral, sancionada por D. Pedro I, a Carta de Lei de 11 de agosto de 1827 criava dois cursos jurídicos no Brasil, em São Paulo e em Olinda.

            Anteriormente a essa fundação, no entanto, se cogitou criar uma Academia Jurídica na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, com a cooperação do Marquês de Inhambupe, então Ministro do Império. A idéia assumiu ares de vitória, tanto que o Visconde de Cachoeira tinha organizado os estatutos para aquela projetada Academia, cuja instalação sofreu obstáculos do Conselho de Estado da época. Aproveitando os mesmos estatutos, regeram-se os cursos jurídicos de Olinda e São Paulo até 30 de março de 1832. Vê-se que, no DNA dos cursos de Direito, já encontramos a presença dos juristas fluminenses.

            Além da sua importância histórica, a criação desses cursos teve profundas repercussões na formação da elite intelectual do País. Durante todo o período colonial, os portugueses proibiam a implantação de cursos superiores aqui, de forma que, mesmo os que iam estudar na Europa, incorporavam uma visão alheia à realidade local e descompromissada com a solução dos problemas existentes no Brasil.

            Com a Independência, em 1822, Dom Pedro I percebeu que um fator importante para a consolidação dos seus atos seria o incentivo ao aparecimento de um pensamento nacional. Assim, em 1827, o Imperador assinou o decreto criando duas faculdades de Direito, curso que possibilitava uma formação humanística e ampla.

            No caso de Pernambuco, o curso foi instalado inicialmente no Seminário de Olinda, local onde tradicionalmente já existia um ambiente adequado aos estudos. Embora lá não funcionasse nenhum curso superior, era um local destinado à formação de padres, que, durante a Colônia, constituíam importante segmento, detentor de grande parte da cultura da época. Os núcleos de estudos jurídicos logo se converteram em importantes centros de formação de estadistas.

            Do ponto de vista da formação política do País, a criação dos cursos jurídicos também teve um papel de destaque. No século passado, havia na América Latina um culto ao caudilhismo, que não teve ressonância no Brasil, único País do continente que manteve certa estabilidade política. Exemplo disso é que Dom Pedro II passou 49 anos no poder. Assim há que se reconhecer, e aqui hoje homenagear, que a formação de uma consciência jurídica foi decisiva para manutenção de instituições políticas mais estáveis.

            Sr. Presidente, dos 160 Ministros empossados no Supremo Tribunal Federal, 31 são fluminenses, número apenas recentemente igualado por Minas Gerais. São eles: João José de Andrade Pinto, Joaquim Francisco de Faria, Antonio Joaquim Macedo Soares, Bento Luiz de Oliveira Lisboa, Lucio de Mendonça, Joaquim Antunes de Figueiredo Junior, Antonio Augusto Ribeiro de Almeida, Antônio Gonçalves de Carvalho, Alberto de Seixas Martins Torres, Edmundo Muniz Barreto, Carlos Augusto de Oliveira Figueiredo, Sebastião Eurico Gonçalves de Lacerda, Antonio Bento de Faria, Washington Osório de Oliveira, Octavio Kelly, Ataulpho Napoles de Paiva, José de Castro Nunes, Alvaro Goulart de Oliveira, José Philadelpho de Barros Azevedo, Edgard Costa, Alvaro Moutinho Ribeiro da Costa, Hahnemann Guimarães, Ary de Azevedo Franco, José Eduardo do Prado Kelly, Themistocles Brandão Cavalcanti, João Baptista Cordeiro Guerra, Luiz Octavio Pires e Albuquerque Gallotti, Célio de Oliveira Borja, Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, Ellen Gracie Northfleet.

            Sr. Presidente, ao ler o nome dos Exmºs Srs. Ministros do Supremo Tribunal Federal, presto aqui a homenagem, como Senador, a todos os advogados, juristas do Estado do Rio de Janeiro que, com certeza, fazem do pensamento jurídico nacional um dos maiores patrimônios desta Pátria. Sr. Presidente, esse sentimento profundo que temos contra todas as tiranias, contra o horror aos regimes truculentos que normalmente se extravasam no ódio, no sangue e na intolerância, certamente, devemos aos nossos juristas, ao saber do Direito, aos homens da academia e aos que de lá trilharam os caminhos da política, esse grande patrimônio do nosso povo e da nossa Nação.

            Eu não poderia terminar estas minhas palavras, que já vão ditadas aqui pela minha emoção, sem fazer especial menção ao grande jurista Célio Borja. Há poucos dias, tive o grande prazer de, na sua casa, ouvir histórias do seu tempo de Presidente da Câmara dos Deputados, nos momentos mais difíceis desta Nação, sob um regime duro. Ele me contava, Sr. Presidente, que a sua alma de advogado sempre o guiou nos momentos de decisão. Uma vez, na morte de Juscelino Kubitschek, recebeu ele uma ligação - vou até omitir o nome de quem o chamou para evitar reminiscências que nada acrescentam à nossa alma -, pedindo ao Presidente da Câmara dos Deputados que não fizesse uma sessão solene em homenagem ao nosso Presidente, que, horas antes, a morte, tragicamente, nos arrebatara. Juscelino Kubitschek de Oliveira, conhecido na sua terra como “garimpeiro de Diamantina”, o homem que criou Brasília. Pois bem. Ele me disse: “Crivella, foi difícil aquele momento, mas decretei a mim mesmo que não deixaria que as tradições daquela Casa fossem descumpridas, rasgadas”. E nós, brasileiros, podemos, hoje, toda vez que queremos lembrar da alma do Parlamento e dos nossos grandes políticos, assistir, ouvir - está gravado aqui nos grandes oradores do Congresso, em obra feita pelo saudoso Antonio Carlos Magalhães - o discurso que Tancredo Neves pronunciou, de improviso, por mais de quarenta minutos, em homenagem a Juscelino. Penso que todos que o ouviram devem guardar na memória palavras tão bonitas que remontam à cidadania, à nacionalidade e aos mais elevados valores que um brasileiro carrega na sua alma.

            Sr. Presidente, é assim que esta Casa, inspirada, guiada, muitas vezes, por juristas tão brilhantes, presta, solenemente, o tributo da sua honra a esses nobres brasileiros.

            Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2007 - Página 27420