Discurso durante a 127ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao recém-empossado ministro da Defesa sobre a situação em que vive, hoje, a Marinha do Brasil e o sucateamento das Forças Armadas.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FORÇAS ARMADAS.:
  • Críticas ao recém-empossado ministro da Defesa sobre a situação em que vive, hoje, a Marinha do Brasil e o sucateamento das Forças Armadas.
Publicação
Publicação no DSF de 17/08/2007 - Página 27837
Assunto
Outros > FORÇAS ARMADAS.
Indexação
  • COMENTARIO, DEPOIMENTO, ALMIRANTE, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, MARINHA, RISCOS, EXTINÇÃO, ORGÃO PUBLICO, DETALHAMENTO, DEFICIENCIA, NAVIO, SUBMARINO, NAVIO AERODROMO, HELICOPTERO.
  • QUESTIONAMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA DEFESA, ATUAÇÃO, DIREÇÃO, AVIAÇÃO CIVIL, EXPECTATIVA, GESTÃO, VALORIZAÇÃO, SEGURANÇA NACIONAL, FORÇAS ARMADAS.
  • QUESTIONAMENTO, SENADO, ATUAÇÃO, CRISE, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PRESIDENTE, OMISSÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, ESPECIFICAÇÃO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, MARINHA, RISCOS, SOBERANIA, MAR TERRITORIAL, COMERCIO EXTERIOR, NECESSIDADE, URGENCIA, PROVIDENCIA, LONGO PRAZO, RESULTADO.
  • ANALISE, SUPERIORIDADE, FRONTEIRA, BRASIL, DEMANDA, PROTEÇÃO, AMEAÇA, TRAFICO INTERNACIONAL, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, IRREGULARIDADE, MIGRAÇÃO, DEFESA, REFORÇO, FORÇAS ARMADAS.
  • REITERAÇÃO, SUGESTÃO, TRABALHO, SENADO, RECUPERAÇÃO, REPUTAÇÃO, ANALISE, PERDA, DIMENSÃO, INTERESSE NACIONAL, RESTRIÇÃO, INTERESSE, SETOR.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, ao mesmo tempo em que fico feliz em que V. Exª esteja na Presidência, lamento que não esteja ali para a gente debater um assunto de que hoje V. Exª foi testemunha na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

            Assistimos ao depoimento do Almirante Júlio Soares sobre a situação da Marinha no Brasil. É fácil imaginar quais serão as possíveis manchetes dos jornais amanhã. Provavelmente, serão manchetes sobre a subida do dólar, sobre algum vazamento da Polícia Federal, sobre alguma notícia de corrupção, sobre alguma notícia a respeito da violência urbana, mas creio que a mais importante manchete de amanhã, se refletir aquilo a que assisti hoje, a maior manchete, a de maior repercussão para o futuro do Brasil, será aquela em que se dirá “em 2025, a Marinha do Brasil não existirá mais”. Foi isto que o Almirante, Comandante da Marinha, com muita competência, com muita franqueza, apresentou para nós: um quadro em que mostrava o que vai acontecer, se não houver uma reversão da tendência; o que vai acontecer em 2025, se a tendência continuar. E ele colocou, em letras garrafais, a palavra “fim” da Marinha no Brasil.

            Lamentavelmente, essa não vai ser a manchete, porque, enquanto isso acontece, vemos o Ministro da Defesa, recém-chegado, não passar hoje de gerente do tráfego aéreo brasileiro. Não é um Ministro da Defesa, é um gerente, um diretor, um Presidente da Infraero. Não assumiu! E ainda mais grave: está preocupado, entre outras coisas, com a distância entre as cadeiras, esquecendo-se de que não é só gente alta que enfrenta problemas nos aviões; o gordo e o deficiente físico também enfrentam esse problema, não apenas os altos, como ele.

            Um Ministro da Defesa deve pensar a segurança nacional: onde estarão a Marinha, a Aeronáutica, as Forças Armadas em 2025, em 2050, em 2100? A gente não vê essa preocupação. E não me digam que essa preocupação não é urgente! Ela é urgente! E não me digam que isso não está na cabeça das pessoas, porque, se não está na cabeça das pessoas, nós, como líderes, temos de colocar na cabeça do povo brasileiro o que de fato é importante!

            É claro que o problema do tráfego aéreo é importantíssimo, mas basta um bom gerente cuidando disso na Infraero. Basta chamar o Comandante da Aeronáutica e dizer “ponha ordem nisso, senão eu o demito”. Basta nomear um gerente e dizer: “Ponha ordem nisso, senão você não fica aqui mais de um mês”. E deixe o Ministro cuidar dos problemas fundamentais da defesa nacional! Mas não é só o Ministro.

            Enquanto a Marinha caminha para isso, o que vemos neste Senado? Preocupados estamos nós com os problemas que ameaçam o Presidente do Senado; estamos preocupados com pequenas coisas de um lado para outro, no máximo convidando aqui o Comandante da Marinha para falar para um pequeno grupo de Senadores, reunidos na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, onde estava o Senador Mão Santa.

            Será que cada um de nós não tem por obrigação mostrar ao povo brasileiro o que vai acontecer no momento em que nossa Marinha se transformar em fantasma? Será que não é importante dizer que este País tem 8,5 milhões de km2 de terra, mas tem 4,5 milhões de km2 de mar? É mais da metade do território brasileiro o espaço marítimo que o Brasil tem. Será que não vale a pena lembrar que 90% do comércio chegam e saem do Brasil por vias marítimas, que 80% do petróleo vêm por vias marítimas, que a perda do controle das fronteiras marítimas e a falta de uma Marinha podem, sim, ameaçar isso? É uma tragédia nacional! Será que a gente não tem de alertar para o fato de que grande parte dos recursos nacionais, não só o petróleo, está no mar? É lá que vamos encontrar a fonte de recursos. Lamentavelmente, nem vemos isso no Ministro da Defesa, nem vemos isso entre nós, Senadores.

            Diante de nós, uma tragédia está sendo escrita, e a gente não está lendo. E o ano de 2025 virá depois de amanhã. Mas o mais grave é que se levam cinco anos só para fazer um navio; levam-se dez anos para se trazer uma nova estratégia. Se começarmos hoje, talvez já cheguemos atrasados. E o pior é que a gente sabe que não vai começar hoje, nem no próximo ano. E não sabemos se vamos começar no ano seguinte. A tragédia se anuncia, e a gente está discutindo outras coisas. Eu não disse que são coisas menores, porque as coisas todas são importantes, mas coisas cujas conseqüências não terão a tragédia do que é fundamental.

            Este País tem o quarto ou o quinto maior espaço aéreo do mundo; tem 7,4 mil quilômetros de costa - talvez, seja a terceira ou a quarta maior costa do mundo inteiro, tirando as ilhas, porque o litoral é na totalidade de seus territórios -; tem uma Amazônia cobiçada internacionalmente, cuja defesa, em parte, será feita pela Marinha, ou não será feita. Além disso, temos fronteiras com muitos países - talvez, poucos outros tenham tantas fronteiras terrestres como nós temos. São 14 mil quilômetros de fronteiras a serem preservadas, protegidas, não só de governos estrangeiros. Devem ser protegidas, porque, em algum momento, a migração internacional pode ameaçar a estabilidade brasileira, porque o tráfico penetra por elas, porque a cobiça internacional por recursos entra por elas. E um dos recursos mais escassos futuramente será água, e o Brasil é um portador desse recurso na maior quantidade.

            Hoje, estamos abandonando a Marinha, a Aeronáutica, o Exército, como se fôssemos uma Nação pequena, menor, não um País com a necessidade de se comportar como potência. Fala-se em potência com base no Produto Interno Bruto. É claro que o PIB é um indicador, mas mais importante do que o PIB de hoje é a capacidade de produzir mais amanhã, e isso não estamos tendo.

Não estamos tendo porque, daqui para frente, o Produto Interno Bruto será criado pela ciência e pela tecnologia, e, como sempre, será defendido por Forças Armadas preparadas, competentes e patrióticas. Isso não estamos vendo do ponto de vista de nós, os líderes nacionais, darmos às Forças Armadas.

            Não só a Marinha, como hoje ficou claro no depoimento que o senhor assistiu, Senador Mão Santa, do Almirante Júlio, que, a mim, como brasileiro, me deixou profundamente chocado. Não por ele; ao contrário: a franqueza, a competência, a seriedade como ele trouxe o problema para nós. Eu imaginava que um Almirante pudesse vir aqui - acho que isso ele gostaria - para falar dos cenários do futuro, das estratégias de como vamos nos comportar no Atlântico Sul, de como vamos nos comportar nas vias fluviais que fazem fronteira com outros países. Quais são os cenários para proteger a Amazônia através do rio Amazonas? Quais são os cenários de estratégia para fazer da Marinha um importante centro de formação da consciência nacional e nacionalista brasileira? Lamentavelmente, em vez disso, o Almirante é obrigado a usar de sua competência e firmeza, seu brilhantismo - como ele usou - para dizer: nós estamos pedindo socorro. Ele não disse isso, mas foi a sensação que fiquei.

            Sensação que é óbvia que ficamos quando olhamos os quadros dele em que mostram que: dos 21 navios existentes, 11 estão imobilizados - os outros 10 operam com restrições. Vejam a situação que vive a nossa Marinha!

            Dos 21 navios existentes, 11 imobilizados - 10 operam com restrições. Dos 5 submarinos, dois imobilizados e 2 operando com restrições - então só tem um. Dos 58 helicópteros, 27 estão imobilizados e 31 operando com restrições - todos. Das aeronaves, 23, 21 delas imobilizadas e duas operando com restrições.

            Não é a Marinha que precisamos para o tamanho do Brasil.

            Agora isto explica porque, se analisamos os dados da vida do arsenal: submarinos, há necessidade de 12, só temos cinco. Sabem qual a idade deles? Em média, 10 anos. A idade dos navios-patrulha: 14 anos. A idade dos porta-aviões: 46 anos! Antes da revolução eletrônica; antes da revolução de grande parte da arquitetura naval. Dos navios escoltas, a idade média é de 27 anos; navios de apoio logístico móvel, a idade média é de 31 anos; navios varredores e caça-minas, a idade média é de 34 anos; navios-patrulha fluviais, a idade média é de 33 anos; navios de transporte, a idade média é de 46 anos!

            O Almirante Tiradentes que é o patrono da Marinha está fazendo 200 anos de nascimento.

            Eu acho, Senador Mão Santa, que se ele estivesse vivo e o colocássemos em um desses navios ele seria capaz de comandar ainda hoje...

(Intervenção fora do microfone.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Não porque foram feitos na época dele, 200 anos atrás, mas porque foram feitos no mesmo padrão, no mesmo paradigma, foram feitos dentro de uma concepção que não incorporou toda a revolução que os últimos anos trouxe para as Forças Armadas, para a Aeronáutica especialmente, mas para a Marinha e o Exército também.

            Se olhamos as embarcações de desembarque, 28 anos é a idade média; os navios de assistência hospitalar, 17 anos; os helicópteros têm idade média de 15 anos e os aviões, 30 anos! Aqui não precisamos falar em Tamandaré. Era bem capaz de Santos Dumont saber pilotar um avião desses.

            Como é que podíamos considerar que tem futuro um País do tamanho brasileiro, se não trazemos aqui para dentro a discussão de como resolver esse problema? Porque a Marinha tem competência se dermos os recursos, recursos que, sendo aplicados, vão não só fortalecer a Marinha mas criar emprego, dinamizar o setor de ciência e tecnologia. Os Estados Unidos desenvolveram o seu setor de ciência e tecnologia em grande parte graças à defesa do próprio País. Foi a pesquisa, para levar adiante a defesa, que permitiu fazer as descobertas que transformaram esse país nas últimas décadas.

            E nós estamos jogando fora a chance de sermos um grande País.

            Ontem falei aqui que precisamos sair da falta de credibilidade que hoje tem o Congresso Nacional. E propus pontos para recuperarmos a credibilidade do Senado Federal. Propus que um dos pontos fundamentais é sairmos desse marasmo atual e começarmos a trabalhar, e propus, para esse trabalho, três coisas: primeiro, é preciso fazer o que sugeri ontem - e vou formalizar essa proposta -, diante da opinião pública fazer o “anti-recesso”.

            Nós trabalhamos, aqui dentro, de terça a quinta. Depois cada um trabalha na sua cidade, no seu Estado. O povo acha que não trabalhamos. Está na hora de ficarmos trabalhando seis dias por semana aqui dentro, durante um mês, que seja; durante quinze dias, que seja, para o povo ver que trabalhamos também aqui dentro e não só nos nossos Estados. Mas não só isso. Não adianta ficarmos aqui seis dias por semana, falando e fazendo o que vimos falando e fazendo nos últimos meses. É preciso que aqui, ficando aqui dentro, num mutirão de duas, três, quatro semanas intensas, e as nossas Bases, nos nossos Estados vão poder esperar sem nenhum problema, é preciso que, neste período, orientemos nossos debates em dois sentidos: um é limpar a pauta, mostrar que os problemas que estão aí nós enfrentamos e resolvemos, e o outro é aprofundar a dimensão da análise dos problemas brasileiros. Não ficar apenas na superficialidade. Não ficar apenas na podridão da superfície; analisar a ferrugem da engrenagem social, econômica e cultural brasileira e, aí, definirmos linhas, traçarmos programas, olharmos estrategicamente o futuro. E, nesse olhar em direção ao futuro, não há a menor dúvida de que um dos pontos fundamentais é a análise do que fazer para que o Brasil recupere as suas Forças Armadas.

            Confesso que não sabia que durante a Guerra do Paraguai, há 140 anos, a Marinha de Guerra Brasileira era, naquela época, segundo dizem oficiais da Marinha, a mais potente do mundo inteiro. Ou seja, a Marinha mais potente do mundo, em torno dos anos de 1860 a 1870, no tempo da Guerra do Paraguai, era a nossa.

            E hoje? Um País que se transformou na oitava potência em PIB é uma das últimas em educação, é uma das últimas na proteção à saúde, é uma das últimas em moradia, é a última em concentração de renda e, sem dúvida alguma, é uma das últimas em termos Forças Armadas que correspondam à dimensão do nosso País de hoje, e, sobretudo, à dimensão do que a gente espera para o futuro.

            Lamentavelmente, fica difícil levar esse sonho de Forças Armadas casadas com um País crescendo potente quando vemos ...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Cristovam Buarque, interrompo V. Exª para prorrogar a sessão por 20 minutos, para V. Exª continuar essa bela exposição sobre a segurança nacional com tranqüilidade.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu preciso de poucos minutos, embora meu desejo é que sejam muitas horas de debate sobre isso aqui dentro, com todos os Senadores, e não apenas um falando nisso.

            Como eu dizia, Senador Mão Santa, espero que a gente tente casar nossos sonhos para um País potente com as Forças Armadas que correspondam a essa potência. Lamentavelmente, como eu dizia, no Brasil de hoje, quando se olha o comportamento do Poder Executivo, do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não se tem, das lideranças nacionais, a percepção de que, lá adiante, existe um futuro. A sensação é de que todos estão prisioneiros do imediatismo. Mais grave: não se tem a sensação da perspectiva global de uma Nação. A sensação é de que cada um está olhando para si, para o seu grupo, para a sua corporação. Nós nos especializamos e, ao nos especializarmos, perdemos a dimensão nacional.

            O Congresso brasileiro de hoje é eleito pelos pastores evangélicos ou pelos padres católicos, pelos banqueiros ou pelos latifundiários, ou pelos trabalhadores e pelos sindicatos. Não há, hoje, um Congresso eleito nacionalmente, pensando na Nação e no longo prazo. Estamos prisioneiros do imediatismo e do corporativismo e, por isso, nossas Forças Armadas estão abandonadas, porque, como corporação, não faz sentido elas lutarem. Seria antidemocrático. Não faz sentido fazerem greves, porque seria antidemocrático. Então, não funcionam como corporação; não funcionam como corporação à democracia. Mas os que aproveitam a democracia para funcionar defendendo a sua corporação, obtêm os recursos, e as Forças Armadas ficam sem os recursos.

            Em um desses dias, o senhor disse - e repetiu hoje - que um almirante não quer mais que seu filho seja oficial da Marinha.

            O PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Nem almirante, nem general, nem brigadeiro.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Isso.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Nessas últimas solenidades militares de incorporação de novos aspirantes, nenhum deles entregou a espada ao filho. Pela grandeza do momento, a entrega era uma tradição. Tal atitude significa que eles não querem que os filhos continuem, porque não estão vendo perspectiva.

            Como V. Exª disse, de acordo com informações do Almirante Julio Soares, a Marinha sobreviverá até o ano 2025, se não houver um grande investimento e responsabilidade; se não despertarem o Presidente da República e o Ministro da Defesa para aquela mensagem do Almirante Barroso: “O Brasil espera que cada um cumpra seu dever”. Nem o Ministro da Defesa está cumprindo o dever dele, nem o nosso Presidente.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Mão Santa, isso porque nós perdemos a idéia de cumprir o dever e a substituímos pela idéia de defender interesses específicos, não nacionais. Essa é a contradição que me preocupa e, por isso, vim aqui.

            As Forças Armadas não podem defender-se corporativamente, porque, como têm armas, imporiam isso à Nação, o que se chama ditadura. Mas a democracia brasileira é feita de corporações defendendo interesses de grupos. Aí, elas ficam de fora.

            Não vamos ter uma boa defesa se não tivermos a perspectiva de longo prazo e o sentimento de Nação. Hoje, essas duas coisas estão faltando no Brasil. Não há sentimento de Nação, nem perspectiva de longo prazo e de futuro.

            Por isso, vimos os dados que o Almirante Julio Soares nos trouxe: a tragédia de que, em 2025, talvez tenhamos de decretar o fim da Marinha.

            Não sei se o da Aeronáutica será antes ou depois. Não sei se o do Exército será antes ou depois. No entanto, um país que não é uma nação é um país que não apóia suas Forças Armadas. Lamentavelmente, o Brasil, hoje, não está sendo uma nação, mas uma população andando em cima de um território. A nação é muito mais do que um território e uma população. Uma nação é um território, com uma população e um projeto coletivo para o futuro. Falta esse sentimento coletivo que, quando eu era menino, chamava-se patriotismo. Falta essa perspectiva de destino que antigamente tantos líderes nacionais traziam. Juscelino e Getúlio trouxeram essa dimensão.

            A culpa está aqui entre nós. Por isso, trouxe uma proposta na qual vou insistir. O Brasil espera que recuperemos a credibilidade da nossa instituição, do Congresso. Essa recuperação só virá quando formos capazes de pôr nossas capacidades, nossas competências, para cumprir o dever de defender a Nação brasileira, defendê-la construindo. Para construí-la, precisamos de todos os trabalhadores, de todos os operários, especialmente dos professores, mas para defendê-la precisamos de nossos soldados. Mas isso só fará sentido se os soldados de hoje tiverem acesso às técnicas modernas e aos equipamentos de ponta que os nossos não têm. Só funcionará se tiverem salários dignos, decentes, como outras categorias conquistaram no Brasil, porque fazem funcionar o interesse corporativo por meio de sindicatos, já que os militares não podem, não devem nem é o que quero.

            Então, vamos atendê-los, não por eles, mas pelo País. Vamos atendê-los, não por eles, mas por aqueles que virão depois de nós e que vão precisar, senão no próximo ano, senão na próxima década, senão ainda neste século, em algum momento do futuro, da nossa Marinha, da nossa Aeronáutica, do nosso Exército. E nós, Senadores, não estamos fazendo o dever de casa, para que as próximas gerações tenham a tranqüilidade de contar com as Forças Armadas, que, além de democráticas, devem ser também eficientes e competentes para defender o Brasil.

            Era isso, Senador Mão Santa, que queria abordar nesta tarde, dizendo como fiquei realmente chocado ao assistir à brilhante exposição do Almirante- Comandante da Marinha, expondo a situação que atravessam as nossas Armadas.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Este é o nosso Senado da República, um dos melhores da nossa história. O Senador Cristovam Buarque adverte o Poder Executivo sobre a difícil situação por que passam as nossas Forças Armadas.

            Senador Cristovam Buarque, e o pior é que não era assim. Todos acompanhamos a Aeronáutica do Brigadeiro Eduardo Gomes, o ITA - Instituto Tecnológico Aeronáutico. Foram escolas como essa que possibilitaram a Embraer, o País orgulhar-se da construção de aviões que voam pelos céus do mundo. Destacam-se também a Academia Militar das Agulhas Negras, a Escola de Engenharia que formou os Batalhões Rodoviários, que construiu as melhores estradas e pontes. Ressalte-se, ainda, a Marinha em construção naval de estaleiros.

            Então, há um grande retrocesso nessas que, sem dúvida alguma, foram orgulho de todos nós: as três forças militares. V. Exª, com a autoridade de Senador da República, adverte o Presidente Luiz Inácio e o Ministro da Defesa com aquela mensagem patriótica do Almirante Barroso: “O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever”. Hoje, ele foi cumprido pelo Almirante Júlio Soares, que dirige, com tanta competência, com tanto amor e com tanto estoicismo, a nossa Marinha brasileira.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Sr. Presidente, eu quero concluir apresentando os meus cumprimentos ao Almirante Júlio Soares de Moura Neto pela brilhante exposição que fez. Quero ainda manifestar o meu respeito à Marinha brasileira, que se mantém firme na defesa do Brasil, esperando que nós cumpramos o nosso papel e o nosso dever para que ela seja cada vez mais forte e para que, daqui a pouco, a tendência escrita de “fim em 2025”, possa ser trocada por “crescendo para sempre na defesa do Brasil”.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Eu queria manifestar a satisfação e a grandeza desta Casa. Hoje, estivemos na reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e, no debate, eu falava sobre a influência tanto da Marinha, quanto do Exército e da Aeronáutica. Nesta Pátria, o essencial é invisível aos olhos: era o exemplo que eles irradiavam.

            Eu mesmo, quando prefeitinho, numa crise de criminalidade - crise que envolvia o Capitão Correia Lima, que era o Delegado Especial da minha cidade e que, depois, transformou-se no líder maior do crime organizado do Nordeste -, fui ao Capitão dos Portos - ele já era suspeito quando Capitão na cidade de Parnaíba - me aconselhar com ele. Quer dizer, nós recorríamos às Forças Armadas.

            Eu disse: “Sr. Capitão dos Portos, não pode o Delegado Especial ser suspeito. Eu, prefeito, não posso ser suspeito. V. Exª, Capitão, não pode; o Bispo também não. Autoridade não pode ser suspeita”. E V. Exª disse: “Mão Santa, dentre as frases que ouvi, essa foi uma das frases mais positivas que apareceu nesses debates políticos”.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Anotei a sua frase neste livrinho, porque considero que devíamos colocar essa frase em todos os gabinetes deste Senado: “Autoridade não pode ser suspeita”. Quem é suspeito não pode ser autoridade.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Essa frase nasceu da minha consciência num momento em que buscava forças junto ao Capitão dos Portos da minha cidade para levar a efeito o que está na bandeira, “Ordem e Progresso”, ao nosso Estado.

            Então, eles sempre irradiaram essa capacidade de seguir essa instrução que está escrita bandeira: “Ordem e Progresso”.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Talvez devêssemos escrever isso aqui: “Autoridade não pode ser suspeita”.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Assim eu pensava quando prefeitinho da minha cidade e assim penso ainda.

            Neste Parlamento, neste Senado, devemos nos comportar como pais da pátria, trazendo fatos de nossa experiência para a grandeza deste País.

            Peço permissão para, em minhas últimas palavras, saudar um homem de Teresina, o grande Líder do PMDB Henrique Pires, que, por muito tempo, foi Presidente Nacional do meu partido, o PMDB, grandioso partido do Brasil e do Piauí que, por uma vez, levou, nos braços do povo, Alberto Silva ao Governo - numa vez anterior, chegou pela força da revolução. Eu também, com a força do PMDB e a crença, lá cheguei, e nós, ambos como Governadores do Estado, fomos verdadeiros prefeitos daquela cidade, lá implantando grande desenvolvimento e, junto com os prefeitos competentes que Teresina teve, fizemos com que se tornasse essa cidade maravilhosa que hoje faz 155 anos.

            Quis Deus que eu encerrasse esta sessão. Que minhas palavras cheguem aos céus e a Deus através das ondas sonoras do sistema de comunicação do Senado, do som da televisão e da rádio AM e FM, em forma de súplica, de reza: Oh, meu Deus, abençoe Teresina e sua gente!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/08/2007 - Página 27837