Discurso durante a 131ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre o desenvolvimento científico e a inovação tecnológica, especificamente no campo da biotecnologia. (como Líder)

Autor
Kátia Abreu (DEM - Democratas/TO)
Nome completo: Kátia Regina de Abreu
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Reflexão sobre o desenvolvimento científico e a inovação tecnológica, especificamente no campo da biotecnologia. (como Líder)
Aparteantes
Augusto Botelho.
Publicação
Publicação no DSF de 23/08/2007 - Página 28312
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PREDOMINANCIA, DEBATE, DENUNCIA, RENAN CALHEIROS, PRESIDENTE, SENADO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, IMPORTANCIA, INOVAÇÃO, TECNOLOGIA, APRESENTAÇÃO, DADOS, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, COMPROVAÇÃO, INFERIORIDADE, INVESTIMENTO PUBLICO, BRASIL, INDUÇÃO, DEFASAGEM, BIOTECNOLOGIA.
  • DESAPROVAÇÃO, DESCUMPRIMENTO, LEI FEDERAL, CRIAÇÃO, Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO), REPUDIO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MANIPULAÇÃO, APROVAÇÃO, PRODUTO TRANSGENICO, RESISTENCIA, UTILIZAÇÃO, BIOTECNOLOGIA, INFLUENCIA, SITUAÇÃO, ECONOMIA RURAL, DESENVOLVIMENTO AGRARIO, APERFEIÇOAMENTO, MEDICINA.
  • REGISTRO, DIFICULDADE, ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO), TRAMITAÇÃO, PROCESSO, NECESSIDADE, AUMENTO, QUADRO DE PESSOAL, SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, IMPLEMENTAÇÃO, POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO. Pela Liderança. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

            Confesso, Sr. Presidente, colegas Senadoras e Senadores, que, assim como a Senadora Fátima Cleide, também subo a esta tribuna com um certo constrangimento porque o assunto que trago aqui não é o que predomina na mídia nacional. Eu sei que o episódio do Presidente Renan chama muito a atenção, mas tenho certeza absoluta de que ele também não pode parar o Brasil. Venho aqui falar de um assunto importantíssimo para o nosso País, mas me sinto, como a Senadora Fátima Cleide, como que pedindo desculpas por fazer este pronunciamento, que, embora importante, não ocupa a mídia nacional.

            Quero dizer aos colegas, em respeito a todos, que precisamos adquirir forças para recolocar nossa Casa no rumo, pois não podemos ser dirigidos pela exclusividade de um assunto só. É um assunto de extrema importância, assim como também temos um Brasil com temas importantíssimos paralisados até aqui.

            Sr. Presidente, também peço desculpas ao Plenário por iniciar um assunto de grande magnitude, por convicção própria, porque acredito nele, mas ao falar dele talvez decepcione a imprensa nacional e muitos que estão aqui, pois se trata de um assunto totalmente diferente do que ocupam os jornais brasileiros.

            Srªs e Srs. Senadores, venho falar de uma área que é estratégica para o Brasil: o desenvolvimento científico e a inovação tecnológica. Mais especificamente do desenvolvimento e inovação no campo da biotecnologia moderna ou engenharia genética, setor que, por força de uma conspiração ainda em curso, chegou perto da aniquilação.

            A conquista de uma capacidade científica e tecnológica não é uma tarefa simples, visto que os avanços da ciência e da tecnologia são tão impressionantes que é muito fácil ficar defasado e, conseqüentemente, ser empurrado para a margem do progresso.

            Evidentemente, portanto, se um país pretende trilhar os caminhos que atualmente levam ao que é definido como desenvolvimento, consolidar uma economia moderna e participar ativamente de um mundo cada vez mais globalizado e tecnológico, será necessário superar a grande distância que separa sua ciência e tecnologia daquelas praticadas nos países industrializados mais avançados.

            Considerando que no mundo a competição se dá nesses termos, vale a reflexão sobre o potencial competitivo do Brasil nessa seara.

            No campo da inovação tecnológica, a União Européia pretende atingir, até 2010, 3% de investimento de seu PIB em investigação e desenvolvimento. A Rússia aplica 1,29% do seu PIB nessa área. O Brasil, com um Produto Interno Bruto próximo ao da Rússia, aplica apenas 0,83% de seu PIB em ciência e tecnologia.

            Um reflexo desse baixo investimento aparece nos dados do Ministério da Ciência e Tecnologia, sobre pedidos de registro patentes de invenção, depositados no escritório de marcas e patentes dos Estados Unidos da América em 2004.

            Enquanto o Brasil apresentou apenas 287 pedidos de patente, os norte-americanos apresentaram 189.536. O Japão apresentou 64.812 pedidos de patente. A Coréia apresentou mais de 13 mil e a China, 1.650 pedidos de patente. Estamos muito atrás do BRIC, aliás nem sei mais se fazemos parte do BRIC.

            Esses são alguns dos fatores que contribuem para o fraco desempenho do Brasil no campo da inovação tecnológica.

            Mas o que realmente veio denunciar nesta tribuna é uma conspiração ideológica que tem prejudicado sobremaneira o desenvolvimento da pesquisa e da inovação tecnológica no campo da engenharia genética.

            Esse segmento das ciências da vida e da biotecnologia é, reconhecidamente, ao lado da tecnologia da informação, um novo e promissor campo da economia baseada no conhecimento que deverá abrir novas oportunidades para as nossas sociedades e economias.

            Aprovada por este Parlamento no ano de 2005, a Lei nº 11.105, que é a Lei de Biossegurança, que criou a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio, vem sendo sistematicamente questionada e ignorada por diversos setores do Estado. Inclusive o funcionamento e as decisões da Comissão, colegiado técnico vinculado ao Ministério da Ciência e Tecnologia.

            No que diz respeito às votações em pedido de liberação comercial de transgênicos, o Ministério do Meio Ambiente tem um representante na CTNBio e um especialista em meio ambiente, indicados pela Ministra titular da Pasta, que votam sistematicamente contra qualquer aprovação de qualquer produto transgênico.

            O Ministério do Desenvolvimento Agrário tem também um representante na CTNBio e um especialista em agricultura familiar, indicados pelo Ministro titular da Pasta, que votam sistematicamente contra tudo, contra toda aprovação de qualquer produto transgênico.

            O Ministério da Saúde tem um representante também na CTNBio, indicado pelo Ministro titular da Pasta, que, quando não vota contra o transgênico, tem o seu voto questionado pela Anvisa junto ao Conselho Nacional de Biossegurança - CNBS. Inclusive, cabe ressaltar que a representante do Ministério da Saúde votou pela aprovação da liberação comercial de milho tolerante ao herbicida glufosinato de amônio, no dia 16 de maio deste ano. O parecer técnico da CTNBio foi contestado pela Anvisa no Conselho Nacional de Biossegurança e a representante do Ministério da Saúde, que votou favoravelmente à aprovação do transgênico, será sumariamente substituída.

            A Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República tem um representante também, indicado pelo Secretário titular da Pasta, que vota sistematicamente contra a aprovação de qualquer produto transgênico.

            O Ministério da Justiça indica um especialista em defesa do consumidor, que vota sistematicamente contra qualquer transgênico que seja apresentado na CTNBio.

            O patrulhamento ideológico também é instrumento de pressão utilizado na CTNBio e tem endereço certo: o especialista em saúde do trabalhador, indicado pelo Ministro do Trabalho e Emprego, e uma especialista da área vegetal, indicada pela comunidade científica. Ou seja, são especialistas que gostariam de dar um voto técnico, mas são pressionados a votar contra qualquer aprovação de transgênicos.

            Constata-se, portanto, que vem dos representantes do Governo Federal a maior força de resistência ideológica contrária aos transgênicos, dentro da CTNBio. Volto a lembrar, sem qualquer fundamento científico, apenas com base em opiniões empíricas.

            Cabe ressaltar que o representante da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República já justificou o seu voto contrário em processo de liberação comercial, com a seguinte expressão: “Me mandaram votar contra”. Está registrado na degravação da reunião da CTNBio.

            Efetivamente, Srªs e Srs. Senadores, o Governo Federal precisa verificar a qualidade técnica da atuação de seus representantes na CTNBio. Não se pode admitir atuação ideológica neste Colegiado, que tem compromisso com a excelência científica, até porque os produtos aprovados ou em análise na CTNBio estão defasados em relação às tecnologias aplicadas em outros países, como os Estados Unidos, a Austrália e a China.

            O que estamos comemorando e aprovando hoje já é considerado, no Primeiro Mundo, como um fusca e já estão aprovando um mercedes-benz, e nós aqui comemorando a aprovação de um fusca, no que diz respeito aos produtos transgênicos no País.

            Um exemplo é o algodão RR, Senador Jonas Pinheiro, que é tão importante ao seu Estado do Mato Grosso, resistente ao herbicida glifosato, que foi objeto de audiência pública na CTNBio, no último dia 17. Em vários países, este transgênico vem sendo substituído por outro que já contém tecnologia mais avançada, que incorpora a resistência ao herbicida e a insetos na mesma planta.

            Outro exemplo é o milho. Aqueles aprovados na CTNBio, resistentes a herbicidas e insetos, estão ultrapassados em relação aos utilizados na agricultura norte-americana, pois um único milho apresenta características de resistência a herbicidas, insetos e à lagarta de raiz.

            Mas não são apenas as opiniões de fundo ideológico e o patrulhamento no âmbito da CTNBio os únicos obstáculos ao desenvolvimento da biotecnologia. Barreiras jurídicas e administrativas são rotineiras no processo de pesquisa, análise e liberação comercial de organismos geneticamente modificados.

            Exemplos são as liminares concedidas pela Justiça, em especial a do Paraná, por alguns, exigindo a realização de audiências públicas e protelando as decisões da CTNBio, atrasando o nosso País, ao que a Advocacia-Geral da União respondeu, exercendo seu papel e recorrendo contra as liminares. Cabe também à sociedade fazer a sua parte, levando esclarecimentos à população e buscando na Justiça a reparação de medidas que levam ao atraso tecnológico e conseqüente prejuízo para a economia brasileira.

            Destaco também as dificuldades estruturais encontradas pela CTNBio para dar vazão aos processos que tramitam na comissão. Hoje, são apenas quatro técnicos concursados na Secretaria-Executiva da CTNBio responsáveis pela preparação de todos os pleitos encaminhados à comissão - quatro técnicos apenas na CTNBio. Com a contratação possivelmente, por solicitação da CTNBio, de mais cinco profissionais apenas e a melhoria da remuneração desses quatro especialistas, certamente, agilizariam os trabalhos da CTNBio.

            Portanto, aumentar de quatro para nove o quadro de técnicos na Secretaria-Executiva da CTNBio pouco significa, Srªs e Srs. Senadores, diante dos 153 cargos de função gratificada criados com o Instituto Chico Mendes para fiscalizar unidades de conservação. São nove pela tecnologia e desenvolvimento do País contra 153 do Instituto Chico Mendes, um cabide de empregos criado aqui, nesta Casa.

            A falta de conhecimento sobre a biotecnologia gera confusão e preconceito, sem levar à população os esclarecimentos sobre a influência direta da pesquisa na vida das pessoas. As possibilidades que se abrem com o uso da biotecnologia na medicina, no setor farmacêutico, nas indústrias de saneantes e alimentos são numerosas. Vão desde a criação de vacinas para uso humano e animal até o desenvolvimento de alimentos funcionais, plantas e animais biofábricas, que são desenvolvidos para produzirem, por exemplo, insulina para os diabéticos e hormônios de crescimento humano para as crianças.

            Na produção agropecuária, a engenharia genética tem elevado poder econômico, pois abre as portas para novos mercados. Isto porque a biotecnologia aplicada no campo não apenas melhora a qualidade dos alimentos, como também reduz os custos de produção e facilita o manejo. O entrave na liberação comercial de transgênicos é uma das razões que levam à queda na renda dos produtores rurais e conseqüente perda da competitividade do País, o que torna impossível oferecermos alimentos mais baratos à sociedade.

            Um exemplo do ganho para a sociedade com o uso de transgênicos está no estudo Impactos Globais das Lavouras Geneticamente Modificadas, publicado no início deste ano. No período de 1996 a 2005, os agricultores dos países que cultivaram variedades transgênicas obtiveram um aumento cumulativo na renda num total de 27 bilhões de dólares. No Brasil, com a adoção apenas da soja tolerante a herbicidas, a economia chega a quase 1,4 bilhão de dólares.

            Há ganhos também para o meio ambiente. Segundo o mesmo estudo, o cultivo de transgênicos em diversos países desde 1996 reduziu em 15,3% o volume de utilização de agroquímicos, totalizando 224 mil toneladas a menos na emissão direta de agrotóxicos na atmosfera.

            Deixo registrado um apelo à Ministra Dilma Rousseff, que, na qualidade de Presidente do Conselho Nacional de Biossegurança, tem defendido ações propositivas para o desenvolvimento da biotecnologia brasileira. Solicito à excelentíssima Srª Ministra que atue na formulação e implementação da política nacional de biossegurança, prevista na Lei nº 11.105, e que ainda não foi implementada.

            Não é mais possível...

            O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senadora Kátia Abreu, V. Exª me permite?

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Senador Augusto Botelho, ouço V. Exª com o maior prazer.

            O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senadora, V. Exª traz o assunto para a pauta, falando da morosidade, da dificuldade que há para se cultivar transgênicos no Brasil. Os transgênicos protegem o meio ambiente, porque, com eles, será utilizado menos agrotóxico. O produtor vai economizar mais e, conseqüentemente, o alimento ficará mais barato. Esse aspecto não é visto. Quando economizamos na produção, ocorre redução do custo lá na ponta e aumento na produção de alimentos. Então V. Exª traz um tema de real importância e chama a atenção principalmente para a falta de pessoas que analisem os projetos na CTNBio. Nós não podemos mais ficar assim, como na figura que V. Exª utilizou, aprovando Volkswagen quando, lá na América, estão usando Mercedes. Nós temos que acelerar, nós temos que dar um jeito nisso. A nossa agricultura é competitiva, mas se continuarmos assim acabaremos ficando para trás. Logo, logo vão surgir transgênicos de cana-de-açúcar também, de milho e de outras coisas, e nós vamos ficar patinando. Nós temos que andar. V. Exª está chamando a atenção para esse fato, e espero que sejam tomadas atitudes para que essa deficiência de pessoal na CTNBio seja suprida logo e que os projetos andem mais rápido, porque V. Exª está falando de alimento para os pobres, principalmente. Muito obrigado.

            A SRª KÁTIA ABREU (DEM - TO) - Muito obrigada, Senador. É da maior importância o seu aparte, que demonstra seu conhecimento nessa área. Com certeza, o Senado tem força suficiente para convencer o Governo Federal a, pelo menos, ampliar esse quadro de técnicos de 4 para 5, 9 apenas, 9 técnicos para dar maior vazão às questões da nossa CTNBio.

            Eu quero aqui fazer a minha homenagem a todos os cientistas membros da CTNBio em nome do Dr. Walter Colli, o seu presidente. O Dr. Walter acredita acima de tudo na tecnologia, no desenvolvimento; tem sido um guerreiro, lutando contra tudo e contra todos juntamente com os membros também indicados pelo Governo Federal e que são membros técnicos, que fazem uma análise técnica, racional, membros também do Ministério da Agricultura, do Ministério da Ciência e Tecnologia - nós temos membros nos Ministérios que não são insanos, que não fazem uma análise emocional desse assunto.

            O que nós sentimos, acima de tudo, é o atraso que essa situação está levando ao Brasil, pois, um país que não investe em logística, um país que não investe em pesquisa, desenvolvimento tecnológico, um país que não se preocupa principalmente com a sua defesa, seja vegetal ou animal, está fadado ao insucesso.

            Estamos ficando para trás, e o mundo inteiro aplaude essa situação, porque somos competitivos e podemos concorrer com o Primeiro Mundo se tivermos aprovado os transgênicos, os defensivos genéricos, se tivermos logísticas. E a falta de nossas hidrovias, de nossas eclusas estão paralisando o Brasil.

            Encerro agradecendo ao Presidente pela tolerância. Agradeço também à tolerância dos colegas, Senadores e Senadoras, mas pedindo o apoio de cada um. Sei que o momento é grave no Senado Federal. Tenho passado constrangimentos no meu Estado, pois tenho sido cercada em todos os Municípios por onde passo, da pessoa mais humilde a mais abastada, pedindo o fim, Presidente Renan Calheiros, dessa situação em que nos encontramos no Senado Federal.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/08/2007 - Página 28312