Discurso durante a 133ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Questionamentos sobre a deportação dos atletas cubanos à Havana, que vieram ao Brasil disputar os Jogos Pan-Americanos.

Autor
Heráclito Fortes (DEM - Democratas/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS.:
  • Questionamentos sobre a deportação dos atletas cubanos à Havana, que vieram ao Brasil disputar os Jogos Pan-Americanos.
Aparteantes
João Pedro, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 25/08/2007 - Página 28595
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. DIREITOS HUMANOS.
Indexação
  • CRITICA, CONTRADIÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DEPORTAÇÃO, ATLETA PROFISSIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, VIOLAÇÃO, DIREITOS HUMANOS, QUESTIONAMENTO, INTERVENÇÃO, POLICIA FEDERAL, MANIPULAÇÃO, INICIATIVA, RETORNO, ESTRANGEIRO.
  • ANALISE, EFEITO, FUGA, ATLETA PROFISSIONAL, PREJUIZO, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, DESAPROVAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, RESULTADO, ANTECIPAÇÃO, RETIRADA, DELEGAÇÃO, PRATICA ESPORTIVA, COBRANÇA, SEGURANÇA, CAMPEONATO MUNDIAL, ESCLARECIMENTOS, IMPORTANCIA, ISENÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, NECESSIDADE, PRIORIDADE, DIREITOS HUMANOS.
  • ESCLARECIMENTOS, IMPOSSIBILIDADE, INICIATIVA, ATLETA PROFISSIONAL, NACIONALIDADE ESTRANGEIRA, RETORNO, PAIS, ORIGEM, MOTIVO, DECLARAÇÃO, AUTORIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, ANUNCIO, PUNIÇÃO.
  • COMPARAÇÃO, DEPORTAÇÃO, ATLETA PROFISSIONAL, SEMELHANÇA, PERIODO, DITADURA.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero tratar de um assunto que vem fazendo o Governo cair em contradição, dar explicações pela metade, sem convencer a opinião pública: a devolução dos dois atletas cubanos para Havana.

            Ontem, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, contamos com a presença do Ministro Tarso Genro, acompanhado do Diretor-Geral da Polícia Federal e do Secretário Executivo do Ministério da Justiça.

            Na vida, tudo o que é preciso ser explicado é ruim, e, quando é preciso ser explicado demais, piora o quadro. Nenhum fato novo foi acrescentado pelo Governo, a não ser apegar-se a pequenas filigranas legais, deixando de lado o que sempre defendeu quando era Oposição, que era a proteção ao cidadão, o respeito aos direitos humanos.

            As contradições nesse episódio são gritantes, senão vejamos: a primeira, Senador Mozarildo Cavalcanti, é a de tentar comparar o caso da fuga dos dois boxeadores com o dos atletas anteriormente foragidos, que eram atletas de equipe coletiva e que poderiam ser substituídos facilmente por reservas. Os dois atletas em tela participavam de disputas individuais, na modalidade de boxe, na qual a Ilha, tradicionalmente, é campeã. Os outros atletas fugiram após participar das competições; estes desertaram à véspera, inclusive fugindo da pesagem, trazendo um desgaste terrível para os cubanos que, da Ilha, acompanhavam o desenrolar dos Jogos Pan-Americanos.

            É bom lembrar que a esse fato se soma outro fato grave, que foi a tentativa de fuga coletiva dos atletas, o que provocou, inclusive, a retirada intempestiva e antecipada da delegação cubana do território nacional, quebrando uma tradição marcada pela convivência esportiva, que é a de atletas e equipes que representam países participarem da abertura e do encerramento das competições.

            A retirada desses atletas foi marcada por um aparato cinematográfico, pela antecipação de vôos e por notas irritadas do Presidente Fidel Castro, em razão da falta de ação do Governo brasileiro.

            E aí, Senador João Pedro, vem a grande pergunta. O Ministro declarou - V. Exª estava lá e assistiu a isso - que os jovens inocentes cubanos pediram para voltar, retornaram de livre e espontânea vontade. Está escrito, V. Exª confirma. V. Exª, que é homem que tem passado vinculado aos que sofreram, lembra-se de que, na ditadura, muitas declarações sob tortura foram dadas. Vamos raciocinar juntos, Senador João Pedro: se fosse realmente espontânea essa saída, por que os atletas não procuraram diretamente o Consulado cubano, pediram passagem e voltaram normalmente? Para que a ação da Polícia? Por que não recorreram ao Consulado, já que era um retorno pacífico de dois rapazes arrependidos? Por que a interferência da Polícia? É estranho.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Pois não, com o maior prazer.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Obrigado pelo aparte, Senador Heráclito Fortes. Esta Casa vem travando um debate já há alguns dias, e V. Exª vem reafirmando suas preocupações. V. Exª é Presidente de uma Comissão importantíssima, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, na qual, em virtude de requerimento cuja iniciativa coube ao Senador Arthur Virgílio Neto e a outros Senadores, contamos ontem com a presença do nosso Ministro. Veja só: veio aqui um Ministro de Estado. Veio o Ministro aqui, e travou-se um debate com a Polícia Federal, com o Delegado-Geral Paulo Lustosa. Penso que é significativo esse gesto de enfrentar o debate que V. Exª vem travando aqui. Para mim, a presença do Ministro foi simbólica e também esclarecedora. V. Exª é um expoente da Oposição e deve manter essa firmeza no debate. Mas a postura da Polícia Federal e do Ministério da Justiça não pode ser outra, deve ser uma postura republicana. Para mim, é emblemático o acontecido com esses quatro cubanos. O Brasil permitiu que dois ficassem, porque os dois pediram. Por que o Governo não trataria da mesma forma os dois pugilistas? A Polícia Estadual foi atrás, mas os cubanos não foram presos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - A Polícia Estadual foi atrás, é V. Exª que está afirmando isso.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - A Policia Militar foi atrás, porque dois estrangeiros que participavam dos Jogos Pan-Americanos - olhe a responsabilidade do Brasil, do Governo brasileiro! - saíram, e não se sabia se tinham sido seqüestrados, se estavam perdidos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - V. Exª me desculpe, mas a imprensa já divulgava que eles tinham desertado e que corria, inclusive, processo de solicitação de visto para residirem na Alemanha.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - O certo é que a Polícia teria de ir atrás. Que outra instituição no Brasil poderia fazer isso? O Ibama? Quem poderia ir atrás deles? Que Ministério, qual a instituição? A Polícia Estadual. A Polícia Estadual do Rio de Janeiro os encontrou. V. Exª retoma o debate, mas olhe o detalhe: foram os dois atletas cubanos que pediram para um cidadão ligar para a Polícia e dizer onde eles estavam, o alojamento em que se encontravam.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Senador, por que não foram ao Consulado?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Eles estavam numa praia!

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Podiam ter telefonado para o Consulado, Senador!

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Não tinham dinheiro, não tinham telefone. Foram eles, Sr. Presidente, que pediram para acionar a Polícia.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Ora, por que não pediram para acionarem o Consulado?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - A Polícia foi lá. Eles não foram presos e foram tratados conforme as normas. Havia um Procurador, a OAB do Rio do Janeiro.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - A OAB do Rio de Janeiro não teve contato direto com eles.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - A Delegada da Polícia Federal esteve com eles, enfim, as instituições tomaram conta de dois renomados atletas, de dois estrangeiros que voltaram para seu país, porque quiseram. A imprensa brasileira registra isto, Senador Heráclito Fortes: eles pediram para voltar. Os dois cubanos que pediram para ficar ficaram aqui, e espero que esses dois atletas possam contar com a solidariedade dos que estão próximos a eles agora, porque ficaram aqui, estão no Brasil. Não sei onde eles estão morando, mas eles merecem, sim, uma campanha de solidariedade, principalmente no que diz respeito às suas famílias, que ficaram lá em Cuba. V. Exª trava um bom debate, mas, ontem, o Ministro Tasso Genro foi muito explícito, foi esclarecedor quanto ao papel do Governo e das instituições nesse procedimento. Saí com a certeza de que os atos da Polícia Federal e do Ministério Público - o Procurador-Geral da República lá esteve - não podem macular a história do nosso País. Os cubanos voltaram, porque pediram para voltar.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Senador, eu era bem jovem e acompanhava as justificativas que o Ministro da Justiça Gama e Silva dava para os atos arbitrários tomados naquela época. É muito fácil ocupar uma tribuna para justificar uma legalidade pela metade. Não se justifica uma prisão feita numa tarde de sexta-feira, seguida por uma deportação no domingo. Pergunto a V. Exª: se o ato foi tão espontâneo assim, por que os dois rapazes não procuraram o Consulado? Se pediram ao hotel para ligar para a Polícia, podiam ter pedido ao hotel para ligar para o Consulado!

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª me concede mais um aparte?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Permito tantos apartes quanto V. Exª quiser.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Quero só discordar do exemplo que V. Exª dá. Aquele era o contexto do período da ditadura militar, que combatemos. Mas, agora, vivemos com tranqüilidade. Não há por que açodar nenhum procedimento. O Brasil recebe todos os estrangeiros que pedem asilo. Dois cubanos pediram e ficaram no Brasil, Senador Heráclito Fortes. Eles estão no Brasil. Por que, com relação aos outros dois, não haveria o mesmo procedimento?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Expliquei isso, mas V. Exª estava falando ao celular e não prestou atenção. Os dois são atletas de esporte coletivo, e isso não teve repercussão na Ilha. Foram substituídos pelos reservas. Esses dois eram atletas de boxe, atletas de modalidade individual, esporte em que Cuba, tradicionalmente, era campeã. Um era campeão mundial; outro, campeão olímpico. Os dois saíram da competição antes de acontecer a luta de que eles deveriam participar. Eles se negaram a participar da pesagem. Isso criou um desgaste grande e um exemplo ruim para a juventude da Ilha. E Fidel Castro ficou irado, tanto é que ligou para cá, cobrou, pediu providências, retirou a delegação. V. Exª precisa ser isento nesses fatos.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Sou isento.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Tirou a delegação de maneira abrupta e rompeu a tradição pan-americana. Aconteceu isso.

            O que parece, meus caros Senadores, é que esse episódio é muito semelhante ao da Operação Entebe, quando Israel invadiu a ditadura do Sr. Idi Amin Dada. Se não houve participação, se não houve pedido e se os cubanos saíram daqui com avião estrangeiro, então o Brasil foi invadido. Não quero crer nisso. É um fato grave, gravíssimo.

            Dessa forma, a comparação com Gama e Silva - não estou traçando nenhum perfil do atual Ministro com Gama e Silva -, serve para dizer que as justificativas se parecem, porque se jogam na lata de lixo os direitos humanos, joga-se na lata de lixo a preocupação - que sempre existiu no atual Governo quando era Oposição - com o destino das pessoas. O que se fez agora é o mesmo que se fazia na ditadura, jogando idealistas em fundo de veraneio para destino incerto, não sabido, como o dos dois jovens cubanos.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Permite-me um aparte, Senador Heráclito Fortes?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Com o maior prazer, Senador.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador Heráclito Fortes, eu estava aqui ansioso para entrar nesse debate, até porque participei dele na Comissão de Relações Exteriores. E quero começar dizendo o que disse lá: não tenho posição ideológica quanto a essa questão, até porque...

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Não é ideológica; é humanitária.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Estou querendo dizer justamente isso. Eu, inclusive como médico e professor da Universidade Federal de Roraima, fui a Cuba, a fim de tratar da contratação de professores visitantes para a nossa Universidade, em vários cursos, mas principalmente...

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Heráclito Fortes, a Mesa já lhe concedeu mais cinco minutos, mas, como V. Exª recebe um aparte, gostaria de saber se deseja utilizar a tribuna por mais alguns minutos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Agradeceria a V. Exª.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - De quantos minutos V. Exª necessita? (Pausa.)

            Darei mais cinco minutos a V. Exª, para garantir o aparte.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Confio na generosidade de V. Exª.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Sem dúvida.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador Heráclito Fortes, como eu estava falando, estive em Cuba, contratamos professores que colaboraram muito com nossa Universidade, principalmente para a consolidação do curso de Medicina no Estado de Roraima. Então, realmente, tenho admiração por muitas coisas de Cuba. Mas a primeira questão que levantei no nosso debate foi a seguinte: por que acionaram logo a Polícia Federal? Não entendi o porquê, mas parece que o Ministro levou o Diretor-Geral da Polícia Federal, para dizer que aquilo foi atribuição da Polícia Federal e que a Polícia Federal foi correta, agiu de forma certa. Isso é muito preocupante. Tenho pela Polícia Federal um respeito como instituição extremamente necessária ao Brasil, mas não se pode dizer que a ação foi da Polícia Federal, mas, sim, do Governo. A ação foi de Governo.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Exclusivamente de Governo. A Polícia Federal foi acionada e cumpriu com as determinações.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Aliás, de maneira correta. Então, o que não foi explicado - e V. Exª diz muito bem - é a rapidez na deportação - o termo é esse; inclusive foi dito pelo Ministro - desses dois atletas, na pressa do governo cubano de fretar um avião venezuelano para vir buscar os dois. Vejam bem: Cuba está nadando em dinheiro, pois freta um jato venezuelano para vir buscar dois atletas cubanos. E buscá-los para quê? Para que - e assim disse o Chanceler de Cuba, ontem, no Brasil - eles não saiam mais de Cuba para competir de jeito nenhum.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Os defensores dos direitos humanos não falam nesse episódio, nas declarações do Chanceler. É triste ver isso.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - A defesa de direitos humanos não pode ser algo que tenha cor.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Seletiva.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Tem de ser ampla, de todos. Todo mundo tem direito a ter seus direitos humanos garantidos. Por que, então, esses atletas, que, espontaneamente - como dizem - quiseram voltar, receberam como prêmio o fato de que não vão mais poder lutar?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Nem tão pouco sair da Ilha.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Sair da Ilha nem se fala! Está dito: não saem mais da Ilha.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - O que V. Exª pensa disso, Senador João Pedro, que é um democrata que luta pela liberdade?

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - E queria concluir, dando o exemplo da minha profissão. O Brasil depende muito da atuação de médicos cubanos no interior. Até tenho tido uma discussão com nossos colegas do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Regional de Medicina, que, legitimamente, não aceitam, pura e simplesmente, que os médicos cubanos venham para cá e façam uma adaptação do currículo da faculdade deles com nossas faculdades brasileiras, que, diga-se de passagem, são melhores. Nosso nível é melhor, mas nossos médicos não querem ir para o interior. Os médicos cubanos têm boa formação, mas, como evidentemente estão limitados porque estão isolados - não têm a assistência das grandes potências -, têm dificuldade de se atualizar em algumas especialidades. Mas o que está acontecendo com os médicos cubanos? Eles vêm para cá e devolvem 75% do que recebem para Cuba, e, mesmo assim, a maioria deles - a família de alguns casados fica lá - termina, às vezes, separando-se da família e casando aqui para poderem permanecer no Brasil; e os solteiros que aqui vêm casam e não voltam mais. Ora, Senador Heráclito Fortes, é aquela história: não é Esquerda, Direita ou Centro, mas se trata de defender os direitos, realmente.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - É uma questão humanitária.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - E estão aí médicos e esportistas cubanos que querem ter o direito de ir e vir. Ora, se Cuba forma tão bons profissionais - e os forma -, por que não deixa que, livremente, escolham onde trabalhar? Por que esse cerceamento? E por que um profissional, quando vem para cá, devolve 75% do que ganha para o governo de Cuba?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Defensores do Dr. Fidel devem ter resposta para isso, com certeza.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - O pretexto é o de que isso é feito para custear as despesas com manutenção de suas famílias em Cuba. Deixo aqui, portanto, meu registro com relação, como disse V. Exª, ao respeito aos direitos humanos. E mais - e digo ao Senador José Pedro: não é algo muito louvável a vinda do Ministro Tarso Genro, pois isso não representa um gesto de humildade, não! É um dever dele, como Ministro, vir aqui, convidado inclusive.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Em democracia, é assim.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Aliás, quase todos os Ministros da Justiça, desde que sou Senador, vieram aqui prestar algum esclarecimento, o que deveria até ser uma rotina, com data marcada.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Senador João Pedro, imagine o silêncio do Partido de V. Exª com relação às declarações do Chanceler cubano de que os rapazes jamais sairão da Ilha, jamais praticarão esporte e terão suas vidas maculadas!

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Heráclito Fortes, V. Exª terá mais cinco minutos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Esse é um gesto de fraqueza e de pusilanimidade deste Governo! O Governo não podia ter feito isso. Alegaram que os rapazes deram declarações por escrito, mas é preciso que se leiam os textos: são exatamente iguais, até nas vírgulas. Nada foi espontâneo, Senador. Vamos refletir sobre isso. Olga Benário chegou a assinar documento dizendo que queria ter o filho na Alemanha. Em que circunstância?

            Não vamos levar essa questão para o campo ideológico, mas, sim, para o humanitário. Qualquer que fosse o deportado para um país com o regime como o que, sabemos, existe lá, teríamos de ter cuidado. Não se podia, de maneira alguma, ter agido dessa forma.

            Alegou o Ministro que não acionou a Igreja, porque não era preciso, era o espírito da lei. Mas, quando vocês eram da Oposição e seus companheiros estavam no porão da ditadura, sofrendo, não era à Igreja que recorriam? Por que não a procuraram, até para se proteger de um fato lamentável como esse?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Não há ditadura alguma.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - É o caso Olga Benário na cibernética, na modernidade. A grande diferença é que uma foi levada no porão de um navio, e os rapazes, em jatinho executivo, de maneira mais rápida.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Não existe Hitler aqui.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Heráclito, por gentileza...

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Pois não.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - O Senador João Pedro está tentando interferir, e o Regimento garante o pedido de aparte, se V. Exª conceder.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Com o maior prazer.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - É que o tempo concedido por V. Exª ao Senador Heráclito é muito pequeno, é menor que a Ilha de Fidel Castro.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Mas S. Exª é generoso e sabe que o debate está interessante.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Senador Heráclito Fortes, V. Exª trabalha bem as palavras, a lógica do discurso, para tentar embaraçar a postura do nosso Governo em relação...

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Desembarace V. Exª!

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Está claro! O Ministro Tarso Genro foi ontem à Comissão em que V. Exª é o Presidente. E V. Exª teve a oportunidade de travar o debate, a discussão.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Estou aqui exatamente prestando contas do que ouvi ontem.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - V. Exª sabe que o Ministro tem uma história transparente e sofreu com a ditadura militar. S. Exª prestou todos os esclarecimentos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - É isso que estarrece!

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Mas V. Exª tenta trabalhar esse episódio, ocorrido no contexto de hoje do Brasil, onde vivemos a plena democracia, com o contexto da década de 40, quando existia Hitler, quando o nazifacismo fazia uma propaganda e agia. As situações são diferentes: não existe nesta conjuntura um Hitler; o Brasil vive a plena democracia. Então, não há por que trazer essa discussão e fazer comparações com a ditadura. V. Exª reclama da presença da Igreja Católica nesse episódio.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - V. Exª achou correto não terem ouvido a Igreja?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Os procedimentos foram legais.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Foram humanos?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Foram legais. A Igreja não estava lá, mas, nem por isso, vai diminuir...

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Foram humanos?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Eles não foram presos.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Foram humanos?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Sem dúvida alguma, porque eles não sofreram qualquer coação.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Aqui, no Brasil.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Aqui, no Brasil.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - E lá?

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Estou falando do Brasil, estou defendendo meu Governo.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Mas seu Governo entrega às feras dois jovens!

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Não entregou, não entregou. V. Exª sabe que, dos quatro cubanos, dois pediram para ficar aqui e estão no Brasil.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Estão em processo de regularização.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Não vão sair daqui.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Agora, V. Exª está me dando a oportunidade de dizer que minha tese de que foi Operação Entebe está certa. Se o Governo não os entregou, eles vieram aqui e os tomaram.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Saíram daqui, porque pediram.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - E por que não pediram ao Consulado? Por que pediram à Polícia? Vamos esclarecer isso. O caminho mais próximo entre dois pontos é uma reta.

            Senador, o caso foi tão grave, que a pressa fez com que aquele governo tivesse um gasto - ou aceitasse uma cortesia, não sei. Temos vôos para Havana, via Venezuela e via Panamá.

            O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - E via México.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - E via México. São três ou quatro vôos por dia. E optaram por esse jatinho, para saírem na calada da noite, na madrugada, em um avião que veio da Venezuela. Não é tradição de um país como Cuba fretar jato. É um país austero. Os Ministros vêm para cá em avião de carreira, fazendo, às vezes, viagens penosas, via Argentina, naqueles aviões sucateados, velhos, da Rússia antiga, onde a pessoa entra como passageiro e chega ao destino como sobrevivente.

            O Partido de V. Exª não vai tirar jamais a mácula de ter repetido, em tempo moderno, de globalização, um ato praticado na ditadura. E o grave é que lá foram duas ditaduras de direita...

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Em seguida.

            Aqui, são dois Governos de esquerda que participaram de um episódio lamentável, triste, vergonhoso.

            Com o maior prazer, ouço V. Exª, Senador Mozarildo Cavalcanti.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Senador Heráclito Fortes, lembrei-me de outro ponto registrado na Comissão: um pedido dirigido a V. Exª e ao Senador Suplicy de trinta profissionais cubanos, médicos e outros, que querem ficar no Brasil e que não estão conseguindo essa permissão.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Estão escondidos, assombrados, com medo de perseguição.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Então, é outro caso de direitos humanos. Chamo a atenção até da OAB e da Comissão de Direitos Humanos, porque essa é uma situação muito delicada. A OAB, inclusive, precisa esclarecer a participação dela nesses episódios, porque foi dito pelo Ministro que a OAB esteve presente nos interrogatórios, fez-se representar. E, portanto, a OAB não viu nenhuma...

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Não é verdade, não é verdade. Sr. Presidente, a declaração do Presidente da OAB é a de que ouviu dizer e de que se baseou em informação do Procurador.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Mas o Ministro insistiu em que a OAB designou um advogado. Estou interferindo novamente, Senador João Pedro, não por problema partidário ou ideológico, mas pela minha formação humanística. Como médico, não posso aceitar esse tipo de coisa. Há poucos dias, fizemos uma homenagem à Maçonaria. Há três palavras que são nosso lema: liberdade, igualdade e fraternidade. Se essas pessoas não estão tendo liberdade para fazer o que querem, se não têm o direito de ir e de vir, se não têm o direito de exercer a profissão onde querem, se não têm igualdade de tratamento com outras pessoas de outros países, realmente não pode haver fraternidade. Portanto, registro minha posição de profundo protesto em relação a esse episódio. O Governo brasileiro - não é o Presidente Lula, mas o governo de todos os brasileiros - não pode ficar com essa suspeita em sua história diplomática. O fato tem de ser bem esclarecido. E quero apelar novamente, publicamente, na TV Senado, à OAB, para que investigue o caso, por meio da Comissão de Direitos Humanos. Não pode ficar parecendo que V. Exª, porque é Oposição, diz uma coisa e que o Senador João Pedro e o Ministro dizem outra, porque estes são do Partido do Presidente Lula.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Exatamente, a questão não é ideológica, mas humanitária.

            Senador João Pedro, o Chanceler disse, em território brasileiro, que esses rapazes jamais praticarão esporte - e é a vocação deles - e jamais deixarão a Ilha. Quem é o algoz disso tudo? É o Governo brasileiro, que protestou a vida inteira contra a tortura, que crucificou pessoas, inclusive do próprio movimento, acusadas de entregar os outros e de dedurar. E pratica um dedurismo com a participação institucional!

            Os agentes cubanos agiram ao bel-prazer em território brasileiro. Não podemos aceitar isso.

            O SR. PRESIDENTE (Gilvam Borges. PMDB - AP) - Senador Heráclito, chamo a atenção de V. Exª para a necessidade de concluir seu pronunciamento. E peço a gentileza de, em seguida, dirigir-se a esta Presidência, pois tenho um comunicado a fazer a V. Exª.

            O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Pois não, Sr. Presidente.

            O debate, ontem, transcorreu civilizadamente. O Ministro é uma pessoa de bom trato, e eu esperava que o encerramento fosse pacífico, até o momento em que recebi uma provocação da Líder do PT, aconselhando-me a deixar o Senado e a ingressar numa Comissão de Direitos Humanos da ONU. Isso se deu por que S. Exª - que não estava lá durante todo o debate, que chegou ao final - leu uma declaração de uma suposta presença no episódio do Presidente da OAB, que já havia sido desmentida, e um documento, em tese, do organismo da ONU sobre o episódio.

            Eu não tinha despertado para esse fato, Senador João Pedro, mas esse organismo precisa esclarecer sua participação nesse episódio. A ONU foi acusada de conivência pelo Governo de V. Exª. Não podemos aceitar isso. A partir do momento em que a Líder do Partido lê aquele documento como peça de defesa, põe-se esse organismo em suspeita internacional, em xeque. Esses fatos precisam de esclarecimento.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é lamentável que, hoje, no País, estejamos vivendo isso!

            Senador João Pedro, quando falei a V. Exª sobre o comportamento do Ministro, V. Exª lembrou o passado de S. Exª, de exilado. Concordo, mas quero dizer a V. Exª que a caneta e o poder transformam as pessoas. Imagine, Senador João Pedro, do outro lado da praça, quantos colegas de V. Exª estão sob julgamento da justiça, acusados de corrupção! E eles eram paladinos da moralidade, acusadores e enxovalhadores de honra alheia. O poder e a caneta mudam o homem. Daí por que não achar nenhum fato estranho a mudança de atitude, de comportamento do cidadão.

            Já disse aqui e repito: Agamenon Magalhães dizia que o cidadão, o homem público devia dormir com um alfinete na cabeceira da cama, para, pela manhã, ao acordar, na primeira atitude, espetar-lhe o corpo, para ver que dói igualmente a qualquer ser humano.

            A deformação do poder faz com que se tente justificar ato como este: entregar a uma ditadura dois rapazes que - não importa se foi um ato de rebeldia ou um grito de liberdade - quiseram mudar de pátria.

            A grande pergunta é esta: eles foram para lá espontaneamente? Se eles foram para lá por que quiseram, por que não procuraram o Consulado? Tiveram de ir para lá sob o comando da Polícia brasileira a serviço de Cuba.

            Sr. Presidente, na Operação Entebe - velho episódio que virou filme -, Israel invadiu um país africano para libertar seus reféns. Certa vez, Sr. Presidente, num cinema de Brasília, vi alguns governistas chorando, derramando lágrimas, ao assistirem ao filme sobre Olga Benário. Se amanhã esse episódio virar filme, quero saber de que lado estará o choro deles.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/08/2007 - Página 28595