Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação de divergência com relação a afirmações do Presidente do PT, Deputado Ricardo Berzoini, no último congresso do Partido, sobre a supressão do Senado Federal e instituição de um Parlamento unicameral.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PARTIDARIA. SENADO. POLITICA SOCIAL.:
  • Manifestação de divergência com relação a afirmações do Presidente do PT, Deputado Ricardo Berzoini, no último congresso do Partido, sobre a supressão do Senado Federal e instituição de um Parlamento unicameral.
Aparteantes
Marcelo Crivella, Marco Maciel, Mário Couto.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2007 - Página 29861
Assunto
Outros > POLITICA PARTIDARIA. SENADO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, CONGRESSO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DEFESA, DEBATE, PLURALIDADE, PENSAMENTO, DEMOCRACIA, SUPERIORIDADE, PARTICIPAÇÃO, ASSOCIADO.
  • CRITICA, PRONUNCIAMENTO, PRESIDENTE, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DEFESA, EXTINÇÃO, SENADO.
  • JUSTIFICAÇÃO, MANUTENÇÃO, SENADO, DEMONSTRAÇÃO, HISTORIA, PARTICIPAÇÃO, INDEPENDENCIA, BRASIL, PROCLAMAÇÃO, REPUBLICA, DEFESA, FEDERAÇÃO, INTEGRIDADE, TERRITORIO NACIONAL, BUSCA, REDUÇÃO, DESIGUALDADE REGIONAL.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, SENADO, DERRUBADA, REGIME MILITAR, REDEMOCRATIZAÇÃO, ELABORAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PROCESSO, IMPEACHMENT.
  • CRITICA, APROVAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), RESOLUÇÃO, APOIO, DISCRIMINAÇÃO, ABORTO, ADVERTENCIA, NECESSIDADE, DEBATE, ESCLARECIMENTOS, ASSUNTO, ANUNCIO, NOTA OFICIAL, DEMONSTRAÇÃO, OPOSIÇÃO, GRUPO PARLAMENTAR, DEFESA, MELHORIA, PROGRAMA, PLANEJAMENTO FAMILIAR.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Alvaro Dias, Srªs e Srs. Senadores, trago ao Plenário do Senado Federal uma manifestação pessoal, também, em relação ao último Congresso do PT, quando tivemos um extraordinário encontro do Partido dos Trabalhadores, um partido que tem em sua essência a democracia e o pluralismo de idéias, formado de maneira tão extraordinária a partir do movimento operário brasileiro, do movimento estudantil, das comunidades de base da Igreja, do movimento intelectual, de todos os cidadãos e cidadãs que acreditaram nas liberdades, na luta contra a ditadura e por um Brasil que de fato afirmasse a soberania de seu povo, indicadores de dignidade para o povo. Então, esse Congresso foi, mais uma vez, rico em debates, idéias e divergências, porque não se faz democracia sem a diversidade, sem as diferenças de idéias, sem as teses mais distintas.

            O meu Partido conseguiu reunir, naquele evento, uma extraordinária presença de militantes e grupos organizados, que têm suas idéias e matizes ideológicos de pensamento, de organização e de visão de intervenção da sociedade.

            Por essa razão, não tenho como não ser frontalmente contrário às adjetivações que foram feitas ao meu Partido aqui e também às específicas em relação ao Presidente Ricardo Berzoini, um grande brasileiro, um homem que deu enorme contribuição à democracia, um ex-Ministro de Estado, um cidadão que representa muito bem a autoridade do Partido diante da democracia brasileira. Evidentemente, esse debate envolve respeito à opinião de todos. Não me cabe ter nenhum tipo de intervenção no tocante à opinião dos outros, a não ser a humilde discordância que a democracia, com sua autoridade, me permite.

            Mas o que me traz aqui é uma divergência de conteúdo em relação ao Presidente Ricardo Berzoini, no que diz respeito a seu entendimento sobre o Senado Federal. S. Exª entendeu que o Senado era uma Casa prescindível; poderíamos viver num sistema unicameral no Brasil e, com isso, ganharia a federação. Isso me trouxe uma franca divergência de idéias. E como procurei reportar-me em relação a isso? Vejam bem: neste fim de semana, como amplamente divulgado, ocorreu o Congresso do Partido dos Trabalhadores, evento que reitera a prática histórica que tão bem caracteriza o PT. Qual seja: o inarredável compromisso com o debate e a troca de idéias, além da cabal demonstração de sua própria vitalidade.

            É compreensível que, em situações dessa natureza, surjam teses as mais variadas. Não foi diferente dessa vez. Assim, ao tempo em que são discutidas e aprovadas resoluções, muitos temas são oferecidos ao debate, o que, em si mesmo, é altamente positivo. Isso não significa dizer que haja concordância com as propostas apresentadas, razão pela qual o Partido que as acolhe estimula o debate em torno delas para aprovação ou rejeição.

            É justamente pela proposta de uma dessas idéias ventiladas por ocasião do encontro de São Paulo que ocupo a tribuna neste momento. Trata-se da opinião manifestada pelo Presidente do meu partido acerca de uma eventual supressão do Senado e a instituição de um Parlamento Unicameral, tal como acontece em muitos outros países.

            Venho à tribuna para externar minha posição rigorosamente contrária à do Deputado Ricardo Berzoini. Faço-o por respeito ao companheiro, merecedor de toda a nossa consideração; faço-o por atenção ao pensamento de parcela dos militantes partidários; faço-o também para cumprir o que considero um dever de quem optou pela vida pública: o de não se omitir jamais, o de ter posições e externá-las sem dubiedade.

            Sintetizo aqui algumas das razões pelas quais sequer admito cogitar a discussão em torno da extinção do Senado Federal. A primeira dessas razões é de ordem história. A maior e mais importante obra de engenharia política que o Brasil protagonizou foi conquistada, a independência, em grande parte fruto da madura negociação de assegurar a integridade do imenso território nacional.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa vitória nós a obtivemos em larga medida, graças à ação ponderada, cautelosa e prudente dos integrantes do Senado Federal. Que ninguém ouse pensar ter sido essa uma tarefa fácil, basta verificar o ocorrido com as antigas colônias espanholas da América. O sonho bolivariano da unidade se dissolveu na fragmentação dos novos países. Concreta e objetivamente, havia o risco de que algo semelhante acontecesse entre nós. É suficiente lembrar o separatismo claramente defendido pela Confederação do Equador, no Nordeste, em 1824; pela Revolução Farroupilha, que incendiou o Rio Grande do Sul entre 1835 e 1845.

            A segunda razão, Sr. Presidente, é essencialmente institucional. Proclamada a República em 1889, a Constituição de 1891 consagrava, entre nós, o federalismo - a meu ver, avanço notável, quando comparado com o unitarismo vigente no Império. Um País de dimensões continentais, assinalado por evidentes contrastes regionais, encontrou no Federalismo a saída adequada para o respeito às diferenças, para a correta compreensão de que o todo, a Nação, teria de ser formado por partes; as unidades federadas, pelos Estados, respeitadas em suas singularidades e características específicas. Coube ao Senado Federal assegurar, no campo político-institucional, a concretização desse objetivo.

            Assim foi ao longo do tempo. Interessante destacar que o federalismo e o seu fiel mantenedor, o Senado, deixaram de existir ou sofreram graves mutilações apenas em períodos de exceção ou francamente autoritários. Foi assim durante o Estado Novo de Vargas, de inspiração fascista; foi assim ao longo do período militar instaurado pelo Golpe de 1964. Ora, o horizonte que hoje descortinamos em nosso País, felizmente, não vislumbra nada que minimamente possa se assemelhar à ditadura. Portanto, que o Senado continue a cumprir a sua missão tão própria da democracia!

            Em meio a tantas vicissitudes, a grande vitória política do Brasil, da Independência aos dias de hoje, foi ter assegurado sua integridade territorial e ter construído uma estrutura federativa. Creio que ambos, federalismo e integridade territorial, são faces da mesma moeda, um se sustentando no outro. Ao Senado, ainda mais indiscutivelmente no Período Republicano, cabe arbitrar divergências, aparar discrepâncias e assegurar o equilíbrio da União.

            Por fim, mas não menos importante...

            O Sr. Marco Maciel (DEM - PE) - Nobre Senador Tião Viana, quando V. Exª puder, eu gostaria que me concedesse um aparte.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Peço a V. Exª e ao Senador Marcelo Crivella apenas a conclusão de mais um raciocínio e já, com muita honra, concederei aparte a V. Exªs.

            Por fim, mas não menos importante, enfatizo o papel de absoluta centralidade política adquirida pelo Senado a partir de meados da década de 70. Foi graças às históricas eleições de 1974, quando a Oposição conquistou 16 cadeiras entre as 22 em disputa, que os alicerces da ditadura começaram a ser efetivamente abalados. Desde então, nada de importante para o País deixou de contar com a presença vigorosa desta Casa. A tradicional prudência que sempre a caracterizou somou-se à experiência política de seus integrantes, fator decisivo para o encaminhamento do fim do regime militar, para a volta do poder civil, para a elaboração da nova Constituição e para a superação do trauma proveniente do inédito impeachment presidencial, entre tantos outros acontecimentos marcantes.

            Antes de dar continuidade ao meu pronunciamento, concedo o aparte ao eminente Senador Marco Maciel e, a seguir, ao Senador Marcelo Crivella.

            O Sr. Marco Maciel (DEM - PE) - Senador Tião Viana, Vice-Presidente desta Casa, gostaria de apartear V. Exª para fazer breve consideração sobre alguns pontos que V. Exª fere no seu discurso. V. Exª, Exª citou com muita propriedade, a questão da Federação no Brasil, que antecede as aspirações republicanas. José Bonifácio, o Patriarca da Independência, era extremamente preocupado com a consolidação do Império e a unidade nacional. Tinha presente que a questão brasileira somente seria resolvida com a descentralização, sinônimo de Federação; ou seja, descentralização rima com Federação. E a mesma coisa poderíamos dizer com relação a Rui Barbosa, que somente se converteu em republicano depois de ver que, na Monarquia, não se conseguiria uma federação. O mesmo ocorreu com um conterrâneo meu, Joaquim Nabuco, não menos ilustre, que, durante toda a sua vida - era monarquista convicto - defendeu a Monarquia mas entendia que deveríamos ter uma Monarquia federativa. Um país com a extensão territorial e a expressão demográfica do nosso não pode ser governado a partir de Brasília, de forma centralizada. Faço tal observação por V. Exª mencionar proposta que está surgindo com vistas à extinção do Senado. Ora, acabar com o Senado seria, no caso, extinguir a peça mais importante de toda vertebração federativa. Quando concebemos o Senado como Casa da Federação, estávamos agindo sob a inspiração do constitucionalismo norte-americano, que criou o mais robusto Estado Federal no mundo. A Constituição americana, de 1787, com mais de 200 anos de existência e pouquíssimas emendas, tem como ponto nuclear a questão da descentralização da republicana. Um dos últimos Presidentes dos Estados Unidos - pode ter sido Clinton ou Bush pai que o antecedeu - disse, certa feita - tenho o discurso em casa - que é bom ter presente que não foi a União que criou os Estados; foi o contrário. Foram os Estados que criaram a União. Com isso, quero dizer como os norte-americanos, os estadunidenses, têm consciência de que a Federação é essencial ao País. Por isso, eles conceberam o Senado, que foi fonte de inspiração para os nossos constitucionalistas em 1891, isto é, um Senado que seria a Casa da Federação, onde todos os Estados, independentemente da expressão territorial ou da significação demográfica, tenham o mesmo número de Senadores. Nos Estados Unidos, são dois Senadores por Estados. Há 50 Estados, e todos têm dois representantes. No Brasil, optamos por três representantes por Estado e, independentemente de tamanho, de peso territorial ou de expressão demográfica, todos têm a mesma representação. Roraima, o menor Estado do País em termos demográficos, tem o mesmo número de Senadores de São Paulo, o Estado mais rico da Federação, economicamente falando, e de maior número de habitantes. Extinguir o Senado é desvertebrar o pilar central da institucionalidade brasileira, porque somos, por definição, desde a Carta de 1891, uma República Federativa bicameral e presidencialista. Para encerrar e não tomar muito tempo do discurso de V. Exª, gostaria de lembrar que, ao longo de todo o percurso republicano, sempre a Federação foi considerada cláusula pétrea. Veja, a República também o foi sempre, mas acontece que, na Constituição de 1988, admitiu-se, aliás um equívoco, que a República podia ser excluída da relação das instituições que seriam amparadas pela imutabilidade do Código Constitucional, mas não a Federação. A Constituição de 1988, entre os seus dispositivos, dispõe, a exemplo das anteriores, que não se admitirá emenda tendente a abolir a Federação. Via de conseqüência, não pode admitir extinguir o Senado. Então, encerro o aparte à manifestação de V. Exª, para me associar integralmente ao pronunciamento que faz. Espero que idéias nesse sentido não prosperem, porque vêm contra a descentralização do processo de crescimento do País e aquilo que constitui a própria essência do Estado brasileiro, porque vai provocar a hegemonia dos Estados mais populosos, mais fortes economicamente, em detrimento dos Estados mais carentes e menos desenvolvidos do ponto de vista econômicos e social. Muito obrigado.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço imensamente o elegante e elevado aparte que V. Exª faz ao meu pronunciamento. V. Exª é um dos maiores estudiosos neste País da vida institucional do Estado brasileiro, das suas responsabilidades como República Federativa, da visão de territorialidade, da nossa geopolítica, da história das Constituições. V. Exª sempre enriquece o Senado com a sua postura de estudioso, de alguém que olha um Brasil atual para o século XXI, que tem a capacidade de entender o passado para poder interferir, da melhor maneira, no presente, para assegurar um futuro de Estado-Nação que tanto almejamos. Então, o seu aparte enriquece o meu pronunciamento e é integralmente absorvido.

            Concedo a palavra ao Senador Marcelo Crivella.

            O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Senador Tião Viana, quero ser muito breve. Afonso Arinos dizia que a concepção do Senado era de inspiração divina, porque os pais da Pátria americanos, Washington, Jefferson e Adams, quando se reuniram, imaginavam ter uma assembléia bicameral para garantir leis justas. Mas não sabiam como fazer isso. Então, foram para casa dormir. Já era alta a noite. No dia seguinte, Jefferson voltou com a idéia. Eles se propuseram a orar e buscar a Deus por uma inspiração - daí Afonso Arinos ter dito que o Senado era de inspiração divina. Jefferson voltou e disse: “O Senado vai representar as províncias - eram 13 naquela ocasião - e vamos ter leis mais justas”. Alguém perguntou a ele: “Mas para que essa despesa? Nós já vamos ter aqui a casa dos comuns, os Deputados”. Eles não queriam ter uma casa de lordes, como a Inglaterra, que era a inspiração que tinham na época. Portanto, fizeram uma representação da Federação das 13 províncias. Nesse momento, ele estava tomando uma xícara de chá, com o costume inglês de colocar um spot of milk (uma gota de leite). Ele disse o seguinte: “Vai ser para isto: para esfriar”. O Senado é onde não só se retempera a nacionalidade. V. Exª disse bem. Nos idos do século XIX, foi aqui que nasceu a idéia de nacionalidade, antes da República Federativa, com o Senado representando as províncias que queriam se separar. E V. Exª se referiu muito bem ao fato de a Constituição republicana consagrar como cláusula pétrea, impositivo de todas as constituições brasileiras desde então, o nosso regime federativo. Quando alguém tenta quebrar essa vértebra, parece que a proposta vem de um invertebrado. E V. Exª faz, neste instante, um pronunciamento muito lúcido, mostrando que esse não é o pensamento de todos. Meu Deus, se não há perspectiva histórica nessa proposta, será por que vem de um líder tão importante a idéia de fechar o Senado? Será que é pelas crises por que passamos agora, com o Presidente da Casa sendo submetido ao Conselho de Ética? Eu acho que esses momentos não devem servir de base para decisões intempestivas que vejam o momento e não a retrospectiva. Nem também se deve imaginar acabar com o PT por serem 40 os julgados e admitidos no Supremo, comandados pela cúpula do PT. O PT é muito mais do que os 40 do pretenso esquema do mensalão, como o Senado é muito mais do que problemas que ocorram com seus membros. Quero parabenizar V. Exª, que, no Partido dos Trabalhadores, sempre traz aqui uma palavra calma, uma palavra lúcida, mostrando que V. Exª é dos maiores do seu tempo e, sobretudo, do seu Partido, para dar à Nação brasileira um contrapeso, uma outra visão, uma outra palavra, muito mais equilibrada, e, eu diria, com certeza, mais próxima do sentimento nacional. Parabéns a V. Exª, Senador Tião Viana.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço imensamente a V. Exª, Dr. Marcelo Crivella, que é um dos mais brilhantes tribunos que esta Casa já teve e que só enriquece também o meu pronunciamento.

            Com a palavra, para um aparte, o Senador Mário Couto.

            O Sr. Mário Couto (PSDB - PA) - Senador Tião Viana, quero ir na mesma linha dos que me antecederam e parabenizar V. Exª pelo pronunciamento que faz hoje à tarde. Quero dizer que a mim, especialmente, ele me traz uma tranqüilidade porque eu ia à tribuna exatamente fazer críticas à proposta feita pelo Presidente do Partido dos Trabalhadores. E fico muito feliz e tranqüilo em saber que a proposta dele não é a proposta do PT e que membros do PT discordam, como é o caso de V. Exª, que sempre teve seus enfoques próprios, as suas idéias próprias, as suas vontades próprias. Isso me faz, cada dia mais, admirar V. Exª. É crítico, sabe ouvir, sabe debater, debate com ética e tenho certeza, Senador Crivella, que não é o problema do caso do Presidente desta Casa que faz uma afirmação tão conturbada do Presidente do PT. Não é. Tenho certeza de que não é porque esse caso, o Senado está levando-o como devia: com democracia, ouvindo as partes, questionando, apurando e tenho certeza - vou terminar - de que a democracia não vai ser quebrada. Tenho certeza porque, se for quebrada, será a decepção para o País inteiro. Tenho certeza absoluta de que esse caso do Presidente do Senado vai ser apurado com democracia até o seu final para saber quem tem culpa e quem não tem culpa. Tenho certeza de que não foi por isso a afirmação do Presidente do PT; foi uma infeliz afirmação, que logicamente deve ser questionada, assim como V. Exª está questionando. Parabéns pelo pronunciamento de V. Exª na tarde de hoje, que me traz tranqüilidade e me fez, inclusive, riscar este item do meu pronunciamento. Parabéns.

            O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço também a V. Exª, Senador Mário Couto, tribuno excepcional que esta Casa ganha e um guardião do Estado do Pará, um grande defensor dos interesses da Amazônia e que acompanha todo o debate nacional de maneira vigilante e judiciosa nesta Casa. Muito obrigado.

            Sr. Presidente, o Senado é a única instância de representação popular existente no País cuja missão primordial é garantir igualdade entre entes desiguais. Imaginar sua supressão é, a rigor, aceitar que algumas unidades da Federação possam naturalmente jogar todo o peso de seu poderio para o atendimento de seus pleitos, passando à maneira de rolo compressor sobre as regiões mais carentes e indefesas. Aceitar isso é compactuar com o retrocesso e admitir a perpetuação da desigualdade e é, na prática, submeter-se ao Estado unitário.

            Contra tudo isso, digo não. Preservar o Senado é defender a essência do que somos como Nação, irmanados no projeto maior de construção da Pátria que sonhamos, uma pátria que seja de todos e que possa contar com uma instituição respeitada, poderosa e legitimamente constituída, o Senado, cuja vocação é a de promover o equilíbrio regional, condição primeira para o equilíbrio social.

            O Senado é indispensável!

            O Senado é insubstituível!

            Sr. Presidente, antes de encerrar, eu não poderia também, por questão de consciência e de responsabilidade política com o mandato, com os setores que estão identificados com meu mandato e meu trabalho também, deixar de tratar de outro assunto polêmico no meu Partido. 

            Ressalvo a riqueza da pluralidade que envolve o PT. Lá temos um ambiente de absoluta liberdade, de democracia plena, de divergências as mais amplas. Isso só enriquece a vida brasileira. No entanto, outro ponto me afetou diretamente: a aprovação de uma resolução a favor do aborto, da descriminalização do aborto.

            Entendo que foi uma matéria conturbadamente discutida, porque redundou em uma certa hostilidade a uma defensora contrária a esta tese, que foi a Deputada Ângela Guadagnin, a quem aproveito para externar a minha solidariedade à coragem que ela teve de assumir as suas posições. Entendo que esse debate tem de ser mais bem amadurecido e mais bem depurado. Pessoalmente, já fiz contato com vários parlamentares. Estamos estudando os recursos que a democracia partidária nos dá para recorrer de tal decisão, se for possível; senão, proclamaremos uma nota deixando claríssima a nossa posição contrária a esse entendimento de uma parte setorial do Partido dos Trabalhadores.

            Por formação cristã, por princípio e por consciência, sou absolutamente contrário ao tema legalização do aborto ou à introdução de outro elemento nesse assunto que não envolva o que já está na Constituição brasileira, salvo pequenas ressalvas como, por exemplo, o assunto eutanásia, que deve ser discutido de maneira mais ampla numa visão bioética, numa visão mais holística da sociedade. No entanto, o tema aborto encontra a minha absoluta reprovação. Penso que deveríamos, sim, concentrar todo o esforço de uma política de governo a favor da prevenção e de assegurar às mulheres brasileiras o fim da gravidez indesejada, com educação sexual, com anticonceptivos, já numa divergência clara com a linha religiosa da Igreja Católica, numa visão clara de todos os meios de informação, proteção e responsabilidade da sociedade brasileira com a prevenção da gravidez indesejada. Não tratar a conseqüência, mas, tratar a causa me parece o elemento mais oportuno.

            Então, deixo claro que jamais romperia com minha consciência para me submeter a tal resolução dentro do meu Partido. Felizmente a democracia do Partido dos Trabalhadores garante, como princípio do seu Estatuto, a convicção e o voto dado por razões de consciência. E é a ele que me apego, o que não impede também o recurso para o amplo debate interno, inclusive o recurso para tal decisão, na rica democracia que o Partido dos Trabalhadores oferece ao Brasil como opção de poder.

            Muito obrigado.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2007 - Página 29861