Discurso durante a 152ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexões sobre a votação do parecer do Conselho de Ética a respeito da representação contra o Senador Renan Calheiros. Proposta de que o Senado empreenda um esforço concentrado para a votação de matérias imprescindíveis para o País.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Reflexões sobre a votação do parecer do Conselho de Ética a respeito da representação contra o Senador Renan Calheiros. Proposta de que o Senado empreenda um esforço concentrado para a votação de matérias imprescindíveis para o País.
Aparteantes
Ideli Salvatti, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/2007 - Página 30745
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, OMISSÃO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, AUSENCIA, CONTRIBUIÇÃO, CONSTRUÇÃO, BRASIL, IMPORTANCIA, DECISÃO, VOTO, ESPECIFICAÇÃO, PROXIMIDADE, VOTAÇÃO, PARECER, COMISSÃO DE ETICA, CASSAÇÃO, MANDATO, PRESIDENTE, SENADO, PROTESTO, SESSÃO SECRETA, DEFESA, ALTERAÇÃO, REGIMENTO INTERNO, EXPECTATIVA, RESPONSABILIDADE, COMPROMISSO, VERDADE.
  • CONCLAMAÇÃO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, COMPROMISSO, DEBATE, PROBLEMAS BRASILEIROS, REALIZAÇÃO, ESFORÇO CONCENTRADO, LIBERAÇÃO, PAUTA, DEFESA, INTERESSE NACIONAL, PREVENÇÃO, CORRUPÇÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Alvaro Dias, Srs. Senadores, Srª Senadora presente, a cada manhã, quando um operário brasileiro acorda, tem a plena sensação, mesmo que nem se lembre disso, de que ajudará a construir o País; quando o pedreiro acorda, espera o ônibus, vai em direção ao canteiro de obras e, mesmo que não pense, sabe que, ao colocar um tijolinho em cima de outro tijolinho, construirá uma parede, que é um pedaço do Brasil; quando um enfermeiro sai de casa para ir ao hospital cuidar de um doente, sabe que está construindo o Brasil - ainda mais as enfermeiras que, nas maternidades do País, ajudam crianças brasileiras a virem ao mundo.

            Eu me pergunto, Sr. Presidente: nós, Senadores, quando acordamos e vimos para cá, por acaso pensamos que vimos aqui construir o Brasil? Será que temos essa sensação que tem o operário?

            Senador Geraldo Mesquita, sinceramente, na maior parte dos dias que venho para cá, não venho com a sensação de ser um pedreiro do Brasil, não venho com a sensação de que aqui venho botar um tijolinho. Aqui e ali, de vez em quando, temos certos projetos de lei que correspondem a um tijolinho. Mas aqui, nesta Casa, sobretudo no momento que atravessam este País e o mundo inteiro, não é hora nem mesmo de tijolinhos, mas de fazer a revolução que este País precisa para encontrar o seu rumo, diante de tantos problemas que vemos, e nenhum deles tem uma razão em si.

            A sensação que tenho, e espero que se houver um debate nesta Casa eu descubra que estou equivocado, não é a mesma que sinto, por exemplo, quando dou minha aula na universidade. Ao ir lá, na terça-feira de manhã, tenho a sensação de que estou colocando um tijolinho no edifício Brasil. Aqui, raramente tenho essa sensação.

            E a gente não devia vir para aqui votar, Senador Mão Santa, sem a consciência de se perguntar: esse voto que vou dar ajuda ou atrapalha a construção de um país? Creio que esse deveria ser, Senador Alvaro Dias, o eixo de reflexão na hora de a gente votar. Mais importante do que partido, mais importante do que amizades, mais importante do que todos os aspectos, é: o meu “sim”, o meu “não”, a minha abstenção - os três votos que a gente dá apertando os três botões ali -, esse voto vai ajudar a construir ou a não construir o Brasil? E o Brasil significa uma sociedade democrática. Então, o meu gesto vai ajudar a construir uma democracia? O Brasil significa um país mais justo. O meu voto vai ajudar a trazer mais justiça para o meu País? Construir o Brasil significa melhorar a infra-estrutura. O meu voto vai ajudar a melhorar a infra-estrutura do País? Essa é a sensação que a gente deveria ter ao votar.

            E não quero fugir do tema. Quarta-feira, a gente vai ter aqui uma votação muito importante: aprovar ou não o parecer da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar pedindo a cassação de um companheiro nosso, de um colega nosso e, mais que isso, do Presidente da Casa. Acho - e é isto que vai nortear o meu voto - que nós devíamos nos perguntar: é o “sim” ou é o “não” que ajuda a construir o Brasil? É aprovar o relatório da Comissão de Ética e Decoro Parlamentar ou é recusá-lo que ajuda este País a caminhar mais para a luta contra as injustiças, contra a corrupção, pela democracia, pela estabilidade? É o “sim” ou é o “não”? Se a gente pensar nessa idéia como um operário pensa e sente quando sai de casa de manhã para construir a parede de um edifício; se nos víssemos aqui como operários da construção de um País, creio que a gente começaria a encontrar o rumo certo na hora de dar os votos.

            Antes de avançar nessa análise...

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Professor Cristovam...

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - ...quero conceder o aparte à Senadora Ideli Salvatti, que me pediu antes.

            A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Senador Cristovam, quero até, neste aparte, dar continuidade àquilo que iniciei na sua cadeira. Semana passada, V. Exª não estava aqui, no plenário, e não tive oportunidade de fazer essa referência. Recentemente, houve dois acidentes gravíssimos: o do avião da TAM e, agora, mais recentemente, o do trem, no subúrbio, na Baixada Fluminense. Seguindo a linha que V. Exª está abordando, como é que a gente deve se comportar, temos de ter alguma coerência também no comportamento. Foi bastante estranho, porque, enquanto o acidente, gravíssimo, com o avião da TAM gerou inúmeros debates, inúmeros pronunciamentos, inúmeras ações, o acidente com o trem na Baixada Fluminense não provocou a mesma indignação, a mesma preocupação, inclusive. Da mesma forma que precisamos ir fundo na investigação das causas do acidente da TAM, do meu ponto de vista, também precisamos ir fundo nas causas do acidente com o trem na Baixada Fluminense. O que levou àquele acidente, em que oito pessoas morreram e mais de cem ficaram feridas? Tive até a oportunidade de, na tribuna, ler trechos da carta de um leitor da Folha de S. Paulo, que fazia uma comparação entre os comportamentos. Não houve reportagens intermináveis vários dias seguidos, várias semanas seguidas sobre o assunto. Até na carta, o leitor dizia assim: “Diferentemente, nem uma pensão barata os parentes das vítimas do acidente de trem, na Baixada Fluminense, tiveram, para aguardar o reconhecimento dos corpos dos seus familiares”. Então, a forma com que nos comportamos frente a problemas que dizem respeito a qualquer cidadã brasileira ou cidadão brasileiro é muito bem apreciada, observada pela população, e aqueles que defendem a justiça, que defendem o bem-estar de todos não podem ter comportamento diferenciado. São duas situações. Lembro - nunca esqueço, e até gostaria muito que V. Exª estivesse aqui - que V. Exª foi um dos primeiros a trazer à tribuna este questionamento: por que determinadas situações de gravidade na infra-estrutura não tinham a mesma importância? Por exemplo, por que os pontos de ônibus superlotados - lembro-me até do discurso que V. Exª fez - não tinham a mesma importância de um aeroporto superlotado? Por que esse assunto não vinha para a tribuna do Senado com a mesma força? Eu apenas queria fazer este registro de público. Quando fiz referência ao assunto - inclusive apresentei voto de pesar pelas vítimas, pedido de informações, para que pudessem ser esclarecidas as razões do acidente, o Senador Crivella e eu pedimos audiência pública na Comissão de Serviços de Infra-Estrutura para tratar do acidente de trem na Baixada Fluminense -, quando fiz esse pronunciamento na tribuna, senti muito por V. Exª não estar presente, porque eu queria fazer referência àquele discurso em que V. Exª trouxe a questão de que parece que há dois pesos e duas medidas: situação que é grave para determinada parcela da população tem mais ressonância do que uma situação grave para outras parcelas da população. Então, era apenas a isso que eu queria fazer referência, Senador Cristovam Buarque. Agradeço. Desculpe-me por ter esticado um pouquinho meu aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senadora.

            De fato, no dia-a-dia da imprensa, não aparecem 30 milhões de brasileiros que, hoje à noite, vão ficar esperando - às vezes, por horas - pelo ônibus, na chuva ou no sol, com ameaça de violência etc.

            Senador Geraldo Mesquita, quero retomar a idéia de que devemos nortear nosso voto, pensando: “isso ajuda a construir um País ou não ajuda?”, como operários de uma Nação. Às vezes, a gente até erra! O pedreiro também, às vezes, comete falhas, mas não erra na intenção; ele erra por algum defeito, mas não na intenção. Aí, para começar, quero dizer que votar secretamente, numa sessão escondida, não vai ajudar a construir o Brasil.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Vou lhe conceder o aparte, Senador Mão Santa.

            Não ajuda a construir o Brasil fazer uma sessão escondida, porque a sessão não é secreta; secreta seria se ninguém soubesse que ela estava acontecendo. Todo mundo sabe que ela está acontecendo. É pior, é mais grave, é escondida. Como fazíamos alguns de nós, durante a clandestinidade, para evitar que entrasse a Polícia, agora fazemos na clandestinidade para impedir que entre a opinião pública.

            Não estaremos ajudando o Brasil ao fazermos uma sessão escondida, com voto secreto. Claro que se argumenta que o Regimento assim diz. Então, está na hora de mudarmos o Regimento, ainda que isso não sirva para a sessão de quarta-feira. Convém explicitarmos que não é um gesto de operário brasileiro, no sentido de operário da Nação, que é o papel de um Senador, votar qualquer matéria secretamente, ainda mais de forma escondida, sobretudo quando se trata de algo que diz respeito diretamente a nós próprios, Senadores, como o é o destino de um dos Senadores.

            Mas não quero ficar só nisso. Esta Casa não vai cumprir seu papel se não assumirmos a responsabilidade de operários construtores de uma nação. Isso vai, sim, estar em jogo na quarta-feira, pela manhã, aqui; e não vai terminar na quarta-feira, como vou mencionar depois de ouvir o aparte do Senador Mão Santa.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Cristovam Buarque, primeiro, quero cumprimentá-lo, aplaudi-lo. Tive a impressão de que V. Exª - todos os brasileiros, encantados - estava na Presidência da República. De repente, na Esplanada dos Três Poderes, em todos os edifícios dos Ministérios, as frases comemorativas da nossa Independência iam buscar o tema que nos fará independentes: educação, como V. Exª prega. O Governo reconheceu a mensagem de V. Exª. Aplausos a V. Exª e ao Luiz Inácio, que, na certa, sentiu remorso por aquele infeliz telefonema. Realmente, a parte bela da comemoração do Dia da Pátria foram as frases que estão ali apostas em outdoors, lembrando que só vamos ter liberdade mesmo, independência, quando houver educação para nosso povo. Mas, quanto a isso, quero dizer a V. Exª: acho que todos nós estamos errados. Atentai bem! O filósofo Descartes disse: “Penso, logo existo”. Penso que, sobretudo quarta-feira, haverá um julgamento anti-Deus, anticristão. Está no Livro de Deus: “A sabedoria está no meio”, a verdade está no meio. Pergunto: qual é o meio, ô Papaléo? Fica, como está, o Renan na Presidência, ou bota para fora o Renan? Só há essas opções? Quede o meio? Quede a verdade? Quede a sabedoria? Ô Renan, firmeza é outra coisa diferente. Existe um filósofo que escreveu um livro sobre a tirania das circunstâncias. Ortega y Gasset, no livro que tem o melhor discurso da história do mundo, diz que “o homem é o homem e suas circunstâncias”. Um quadro vale por dez mil palavras. Getúlio Vargas, da região do Paim, foi um homem trabalhador, Presidente. Café Filho o substituiu. Teve um enfarte. Um enfarte, nos anos cinqüenta - o Papaléo sabe -, deixava automaticamente a pessoa uma inválida, porque a Medicina não oferecia o que oferece hoje. Tanto é verdade que a primeira pensão para Presidente da República foi por isso: porque ele teve um enfarte e não conseguia trabalhar. Foi a primeira. Aí, quem era Presidente, ô Cristovam Buarque? O Presidente da República era o Presidente da Câmara: Carlos Luz, forte... Se ele era Presidente da Câmara, ele era forte. O Paim que conviveu lá. Vou até estudar a biografia desse homem. Ele era forte politicamente, porque tinha o apoio da Aeronáutica, tinha o apoio da Marinha - a Marinha tinha navio, agora não tem mais nem canoa, está acabando, vai acabar em 2025, quem disse foi Júlio Soares, o Comandante -, a Marinha tinha o Tamandaré, houve até troca de tiros com os getulistas, porque ele era da linha do Carlos Lacerda. Pegou o porta-aviões Tamandaré e foi até São Paulo - ele podia, o Presidente era ele, de direito, de fato e de força, ele tinha a Aeronáutica com ele, ele tinha a Marinha, tinha Carlos Lacerda e tudo. Mas, com bom senso e sabedoria, foram lá e negociaram. Disseram: “Carlos Luz, abdique da Presidência da República - atentai bem: a História é para nos ensinar! -, abdique e vamos botar o Presidente do Senado”, o sereno Nereu Ramos, que dirigiu esta Casa e o Congresso por 87 dias; depois assumiu Juscelino Kubitschek, que nos deu essa inspiração. Então, temos de buscar essas alternativas. É a tirania das circunstâncias, a circunstância é essa. Temos de ter alternativas. Eu, por exemplo, acho que, no momento, o Renan devia ser um Senador como nós. Processos há contra nós, contra V. Exª. Aí ele se defende como nós, como Senador, como cidadão. Está aí a Justiça. Mas, Carlos Luz deu-nos esse exemplo: não houve guerra, e ele voltou como Deputado Federal, e escreveu-se uma das mais belas histórias do Brasil num dos momentos mais dramáticos. Houve até tiro entre o Forte de Copacabana e a nau Tamandaré, em que estava o Almirante Pena Boto, o Almirante que sabia mais balística deste País. Foi até Capitão dos Portos da minha cidade, Parnaíba.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Presidente, eu vou pedir mais tempo para a minha fala, porque...

            O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - A Presidência solicita aos aparteantes que se atenham ao Regimento, que estabelece o tempo de dois minutos.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Mas vou pedir uma extensão, porque não vai dar tempo.

            Srªs e Srs. Senadores, primeiro, agradecer ao Senador Mão Santa o discurso que ele fez, lembrando o fato de termos, na Esplanada, na lateral de cada Ministério, escrito que “o caminho de cada problema brasileiro é a educação”. De fato, lembrou-me da minha campanha para a Presidência, que foi chamada de “campanha de uma nota só”. A Esplanada está com uma nota só. Felizmente! Falta, agora, executá-la. Falta, agora, que o maestro toque essa nota só.

            Mas, Srªs e Srs. Senadores, volto ao tema sobre o qual estava pensando, falando, refletindo: como ajudar a construir o Brasil, Senador Alvaro Dias, quando, na quarta-feira, vamos ter de votar “sim” ou “não” ao parecer de uma Comissão de Ética, que fez um trabalho cuidadoso, rigoroso e longo a respeito de um dos nossos Colegas que recebeu acusações? Não é construir o Brasil, não é construir a democracia votar numa sessão secreta e escondida. Mas parece-me que vai ter de ser assim. Esquecem-se, entretanto, que, nos tempos de hoje, com as técnicas de hoje, não dá mais para ter nada escondido, gente! Não vai faltar celular, aqui, transmitindo. Esses computadores vão ser desligados, mas não tem mais jeito, Senador Mão Santa, de fazer nada escondido! Vai, de qualquer maneira, ser do conhecimento público o que for feito, falado e dito nesta Casa, nesta sala. Acabou-se o tempo, e está-se acreditando nisso!

            Mas, vou mais longe. Quero analisar a própria votação. Quem estiver consciente, com convicção, de que a Comissão fez um mau trabalho, que as acusações contra o Senador Renan Calheiros são falsas não vai ajudar a construir o Brasil votando contra essa convicção; tem de ter a coragem de votar contra o parecer da Comissão. Mas aí, Senador Mão Santa, não se pode aceitar que ele renuncie à Presidência. Se a gente aqui der o voto absolvendo-o, ele tem de receber o apoio para continuar Presidente. Se, aqui, este Plenário o absolve e ele renuncia, o que vai parecer é que houve um acordo e houve uma transação para que fizéssemos a metade do caminho. Esta é a pior de todas as alternativas: a idéia de o Plenário ser conivente, porque senão ele não renunciaria.

            O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Cristovam, enquanto o Presidente está ao telefone, eu queria ajudá-lo. O senhor disse que “não há... que o tempo não é o mesmo”. Pelo contrário. Quando começou a democracia, era na praça de Ágora, lá na Grécia. Era o povo todo participando e discutindo. Não houve esse tempo não. Os nossos, os que nos antecederam, foram mais capazes do que nós agora.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - O tempo de que eu falo é o tempo nosso, aqui, desses últimos dois meses. Além disso, a nossa Ágora vai ser fechada e escondida. Lá, era pública, e todos participavam!

            Mas vou mais longe: aquele que, por acaso, tiver convicção de que o trabalho da Comissão foi um trabalho sério, um trabalho cuidadoso, tem de ter a coragem, a responsabilidade de votar para aprovar o parecer, o que significará não a absolvição, mas a cassação do Senador Renan Calheiros.

            Sei que essa será uma decisão muito dura para a maior parte de nós aqui. Mas não vamos estar construindo o Brasil se, por amizade, por coleguismo ou por qualquer outra razão votarmos diferentemente do que achamos em relação ao parecer. Quero ir mais longe: há alguns que não têm certeza se o parecer está bom ou ruim, alguns estão em dúvida. Na Justiça, a dúvida é a favor do réu. Na política, a dúvida tem de ser contra o político.

            Aprendi com o Mão Santa, quando ele disse, há alguns dias, que ninguém pode estar num lugar sob suspeição. Se houver dúvida, o voto tem de ser para que não pese dúvida. Não temos o direito de dizer que somos construtores da Nação, operários deste País e, aqui, deixarmos o povo em dúvida. Na política, a dúvida é contra qualquer um da gente. Na Justiça, a dúvida é a favor do réu.

            Também não estará construindo o Brasil aquele, como tenho lido nos jornais, que vai votar contra a Comissão de Ética com medo do dia que vai ser sobre cada um de nós. Não porque aqui alguns se julguem acima de qualquer suspeita e de que um dia não haverá uma matéria na imprensa nos acusando; qualquer um de nós, aqui, pode ter. Agora, não temos o direito de, com medo disso, ficarmos nos protegendo hoje. No dia em que acontecer com um de nós, teremos duas alternativas: conseguirmos, de imediato, barrar e mostrar que a imprensa está mentindo, ou termos o mesmo destino de cassação, o que pode acontecer com qualquer um de nós. Mas, ter medo de que amanhã possa pesar sobre um de nós uma acusação, mesmo que falsa, mesmo que criada, inventada, a gente não tem o direito de ficar com medo disso.

            E o que a gente ouve falar por aí, que lê nos jornais, é que muitos não querem correr o risco de que amanhã aconteça o mesmo. Estar nesta Casa implica riscos permanentes, inclusive de uma imprensa que pode, sim, às vezes, inventar coisas. E o caso do Deputado Ibsen Pinheiro é um exemplo. E ele pagou o preço dele. Mas, naquele momento, diante da dúvida, era aquilo mesmo que a Comissão devia fazer, aquilo mesmo que o Plenário da Câmara fez, porque havia dúvidas, dúvidas inventadas, criadas. Mas esse é o preço que a gente paga pela imprensa livre.

            O que a gente não pode é, como operários da construção deste País, aqui nesta Casa, deixar que continuem pesando dúvidas sobre qualquer um da gente. Ou a gente limpa essa dúvida rapidamente para que o povo saiba: “era mentira”, ou a gente tem de ter a coragem de, em nome de sermos construtores do Brasil, operários de uma nação, protegermos esta Casa, protegermos o Congresso, protegermos a democracia.Mesmo que isso custe o peso de votar contra um colega nosso, especialmente colega de que possamos gostar.

            Mas não quero parar nisso, Senador Tião Viana, e peço um pouco mais de paciência, porque o meu tempo foi todo levado pelos apartes, e hoje não parece ter tanta gente inscrita.

            O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Concederei mais cinco minutos a V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador.

            Depois de dizer a minha posição a respeito de como devemos votar na quarta-feira para merecermos o título de operários de uma nação, quero dizer que isso não vai bastar. Não basta! E o Senador Mão Santa tem razão quando há pouco disse que o problema desta Casa não se esgota em função de equívocos, erros e denúncias contra o nosso Presidente Renan Calheiros. Não. Nós todos temos uma responsabilidade aqui, e, depois da decisão de quarta-feira, pelo visto, talvez não levemos adiante a nossa responsabilidade, obrigação, compromisso, de sermos operários de uma nação.

            É preciso que esta Casa descubra que não pode continuar se dedicando apenas a críticas e autocríticas, a acusações e defesas. Não é possível que continue o País sendo construído com base em um Congresso que se limita aparentemente às CPIs, porque é isso que passa nos últimos três anos para o Brasil. Não temos um Congresso, temos CPIs.

            E insisto na proposta que já fiz em outros momentos, que não dá para ser levada adiante enquanto não resolvermos o problema da Presidência, mas que podemos começar já. É preciso, Senador Paulo Paim - e conversei com o Senador Heráclito Fortes um desses dias -, mostrar ao povo brasileiro que esta Casa tem o compromisso de construir uma nação, e que, por isso, pelo menos durante um, dois ou três meses, estejamos todos os dias aqui dentro trabalhando, e não trabalhando, como trabalhamos, fora daqui, junto às bases. Para a opinião pública, Senador não trabalha quando sai daqui, na quinta-feira à tarde. Às vezes, trabalha mais do que aqui, mas o Senado, não. O Senado não trabalha se essas cadeiras estão vazias. O Senador trabalha onde estiver, mas o Senado não. Está na hora de mostrar que o Senado trabalha, e isso seria fazer o contrário do recesso. Vamos fazer um anti-recesso, assumir o compromisso de estarmos dois, três meses, um mês que seja, aqui dentro, de manhã e de tarde, permanentemente, transmitindo pela televisão não em reuniões escondidas, como vai se fazer na quarta-feira, mas em reuniões públicas, e não para discutir o futuro de um colega, e sim para discutir o futuro de um país, de uma nação.

            Senador Alvaro Dias, em dois meses - dois meses -, limpamos a pauta desta Casa. E, mais que isso, Senador Tião Viana, trazemos aqui para dentro os temas fundamentais da sociedade brasileira, que, de vez em quando, aparecem e vão embora. Outro dia, o senhor fez um belo discurso sobre a saúde. No que deu aquilo? Eu faço meus discursos sobre educação. No que dá isso? O Senador Paulo Paim faz seus discursos sobre os direitos trabalhistas. No que dá isso? É porque fazemos os discursos e vamos cada um para sua casa, não para relaxar, porque político não relaxa, mas para trabalhar, e trabalhar sem construir o País. Trabalhar construindo o mandato, trabalhar se preparando para a próxima eleição, trabalhar atendendo eleitores, mas não construindo uma nação. Para construir uma nação é aqui dentro que temos que trabalhar, é nessas cadeiras azuis que estão aqui. Por que não ficamos aqui, durante um período do ano, discutindo uma agenda que sirva para reformar este País? Porque reformar um país é sinônimo de construí-lo. Se nós somos operários de uma nação, Senador Eurípedes Camargo, nossa agenda aqui deveria ser outra. A agenda aqui é sobre o que nós vamos fazer para que as políticas funcionem sem corrupção, e não como nós fazemos para punir quem fez a corrupção. Nós só discutimos, Senador Alvaro Dias, como punir quem fez. Nós não discutimos como evitar que aconteça. Está na hora de discutirmos isso. Está na hora de sabermos o que vamos fazer para que o povo brasileiro não continue morrendo em porta de hospital, apesar de tanto dinheiro que gastamos. Está na hora de discutirmos como se faz, de fato, uma reforma em que, neste País, a democracia seja democrática, e não plutocrática, controlada pelo dinheiro, como é hoje. Vamos fazer uma pauta do Congresso, através do Senado, sobre o qual nós podemos falar, compatível com as necessidades não só do povo, mas de toda a Nação, levando em conta o longo prazo.

            Sr. Presidente, vou encerrar, porque já tive uma ampliação do tempo e, com os apartes, terminou sem ser possível aprofundar a proposta que voltarei a fazer aqui, mas quero deixar claro que, na quarta-feira, continuarei dando meu voto conforme é a minha obrigação de operário de uma nação. Vou dar meu voto pensando no que é melhor para o Brasil, pensando no que é melhor para esta Casa, pensando no que é melhor para o futuro da Nação, e não no que é melhor para o meu Partido, não no que é melhor para mim, não no que diz respeito aos medos que eu e outros aqui possamos ter sobre o futuro pessoal de cada um. Vou dar meu voto pensando em como construir o Brasil, da mesma maneira que, de manhã cedo, sai de casa cada pedreiro, pensando como vai colocar um tijolo em cima do outro para fazer a parede de um edifício.

            Obrigado, Sr. Presidente, pelo tempo extra que me concedeu.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/2007 - Página 30745