Discurso durante a 154ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao Círio de Nazaré, denominado "Patrimônio Imaterial da Cultura Brasileira" pelo transcurso dos seus 240 anos.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao Círio de Nazaré, denominado "Patrimônio Imaterial da Cultura Brasileira" pelo transcurso dos seus 240 anos.
Publicação
Publicação no DSF de 12/09/2007 - Página 30912
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO, FESTA, CERIMONIA RELIGIOSA, IGREJA CATOLICA, MUNICIPIO, BELEM (PA), ESTADO DO PARA (PA), PATRIMONIO CULTURAL, IMPORTANCIA, BRASIL.

            O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Exmº Sr. Mozarildo Cavalcanti, que preside a presente sessão; Exmº Sr. Prefeito de Belém, ex-Senador, ex-colega nosso, Duciomar Costa. Desejo fazer uma saudação especial à presença entre nós do Arcebispo de Belém, D. Orani Tempesta, e registrar também a presença da representante da Governadora Ana Júlia Carepa, a Deputada Ann Pontes. Entre muitas pessoas ilustres presentes a esta homenagem, quero dirigir-me também ao Revmº. Sr. Padre Ramos, Presidente da Diretoria da Festa de Nazaré e Reitor do Santuário de Nazaré.

            Srªs e Srs. Senadores, o Círio de Nazaré, no Pará, é uma das maiores demonstrações de fé do Brasil. São centenas de milhares os que acorrem dos rios e igarapés amazônicos até Belém, para acompanhar a Berlinda, transportando a imagem de Nossa Senhora de Nazaré da Basílica ao Centro Arquitetônico, também sob sua invocação, numa longa caminhada de ida e volta de um dia para o outro.

            A homônima e mais antiga devoção portuguesa aculturou-se no Brasil, entre nós cresceu e multiplicou-se. Passaram a vir ainda mais peregrinos de vários pontos do Brasil e até do exterior.

            O culto católico de Maria estendeu-se sob várias formas pelo País inteiro. Em 12 de outubro, por exemplo, de cada ano, é comemorada a Padroeira do Brasil, a partir do Santuário de Nossa Senhora Aparecida.

            Em todas as regiões há festas populares marianas, mesmo em companhia de invocações locais, como no Recife, minha cidade, através da proteção de sua Padroeira - Nossa Senhora do Carmo.

            O título do Carmo lembra o Monte Carmelo, na Palestina, a herança espiritual de Elias, o Profeta defensor do Deus único de Israel.

            Sr. Presidente, Maria entrou também na literatura brasileira desde o poema em seu louvor escrito nas areias da praia por Anchieta, no primeiro século da colonização do Brasil, aos dias atuais no Auto da Compadecida e Uma mulher vestida de sol, de autoria de Ariano Suassuna.

            O Círio de Nazaré insere-se, assim, numa das mais belas tradições brasileiras. Também, através do culto ao Círio de Nazaré, continua muito presente entre nós mais esta autêntica semente cultural portuguesa. Ao seu lado, entraram outras afins influências ibéricas e ibero-americanas - a espanhola de Montserrat, a boliviana de Nossa Senhora de Copacabana, enfim e por fim, a mexicana de Guadalupe, proclamada por Pio X como Padroeira da América Latina, dando nomes a bairros em inúmeras cidades brasileiras -, além de devoções mais internacionais de Nossa Senhora de Lourdes e de Fátima, esta tão próxima de todos nós brasileiros.

            Sr. Presidente, na definição do sociólogo Gilberto Freyre, o catolicismo latino e latino-americano é dionisíaco - é o que acontece com a festa do Círio de Nossa Senhora de Nazaré -, ao contrário das expressões religiosas apolíneas nórdicas.

            Gilberto Freyre, quando se referia a essas manifestações dionisíacas, fazia-o no sentido expansivo e entusiasta, em vez de apolíneas introspectivas e intelectualizadas.

            A participação em massa gerou liturgia popular própria. A corda, que arrasta a Berlinda, vê-se puxada por milhares de pessoas, demonstrando a força da fé e da tradição.

            Há 300 anos que o povo participa, em número cada vez maior, dessa grande solenidade. Foi um humilde lenhador, filho de português, que encontrou e recuperou o ícone perdido, pouco a pouco transformado em centro de peregrinação, síntese da Amazônia e outro tanto do Brasil.

            O Círio de Nazaré é, Sr. Presidente, uma das mais profundas expressões da nacionalidade, e não só do regionalismo. Vianna Moog já demonstrara antes, em conferência feita em 1942, que o Brasil se compõe de um arquipélago de cinco grandes regiões: Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e Norte - este, o Norte, a maior delas. É importante salientar que todas se integram em plena sinfonia.

            O ritual católico institucionaliza e internacionaliza esta e outras devoções locais. Assim, podemos manifestar nossa provisão de fé, às vezes recôndita em nossa alma, e logo todos nós - inclusive turistas e curiosos - somos igualmente contagiados pelo entusiasmo popular.

            O Círio, sabe-se, na forma de procissão litúrgica, data de 1793, quando a devoção foi oficializada pela Igreja, fazendo crescer o prestígio popular, como se vê na crescente freqüência ao evento.

            Em duas oportunidades lá estive: como Deputado Federal e, posteriormente, na condição de vice-Presidente da República, ao tempo em que era Arcebispo de Belém Dom Zico.

            Sr. Presidente, muitos simbolismos permeiam o Círio de Nazaré.

            O pensador Ernst Cassirer demonstrou tratar-se de algo imperceptível ao conhecimento, conquanto captado através de símbolos. Assim, os conceitos chegam à percepção humana, individual ou coletiva.

            Semana passada, a Igreja celebrou a natividade da Virgem; seu nascimento é aurora que prenuncia o sol da justiça -- o Cristo, nosso Deus; a origem dele, dirá a profecia de Miquéias, “vem de tempos remotos, desde os dias da eternidade,... ele mesmo - o Cristo - será a paz”.

            Agora nos aprestamos para viver, no segundo domingo do próximo mês de outubro, a festa de Nossa Senhora de Nazaré, a simbologia mais profunda do Círio, em torno de Maria - a luz da fé representada pela chama da grande vela, consagrada pelo povo na confirmação de mais uma manifestação de fé cristã e de uma rica herança cultural e regiliosa.

            São essas demonstrações, Sr. Presidente, construídas também nas tradições que contribuem para dar coesão nacional ao Brasil, através de sua diversidade regional e riqueza étnica, que colorem o País sob a inspiração da cruz.

            Era o que tinha a dizer. (Palmas.)

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/09/2007 - Página 30912