Discurso durante a 156ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação sobre a sessão secreta realizada ontem no Senado, contrária à cassação do Senado Renan Calheiros. Apelo em favor do fim das sessões e do voto secretos. Anúncio de obstrução seletiva à pauta. (como Líder)

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. REFORMA AGRARIA.:
  • Manifestação sobre a sessão secreta realizada ontem no Senado, contrária à cassação do Senado Renan Calheiros. Apelo em favor do fim das sessões e do voto secretos. Anúncio de obstrução seletiva à pauta. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 14/09/2007 - Página 31298
Assunto
Outros > SENADO. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • FRUSTRAÇÃO, PREJUIZO, PAIS, DECISÃO, SENADO, SESSÃO SECRETA, REJEIÇÃO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, RENAN CALHEIROS, SENADOR, COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, CONSELHO, ETICA, DECORO PARLAMENTAR, REPRESENTAÇÃO, AUTORIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL), REGISTRO, MANIFESTAÇÃO, REPUDIO, CIDADÃO, INFORMAÇÃO, ORADOR, CONTINUAÇÃO, PENDENCIA.
  • SOLIDARIEDADE, MOBILIZAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, INVASÃO, SUPERINTENDENCIA, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), ESTADO DO PARA (PA), REIVINDICAÇÃO, DESAPROPRIAÇÃO, TERRAS, GRILAGEM, NEGOCIAÇÃO, GARANTIA, DIREITOS, REFORMA AGRARIA.
  • CONCLAMAÇÃO, BRASILEIROS, RESISTENCIA, LUTA, DEMOCRACIA, JUSTIÇA SOCIAL.
  • INFORMAÇÃO, REUNIÃO, LIDERANÇA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), DEMOCRATAS (DEM), PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL), DEBATE, PROVIDENCIA, UNIFICAÇÃO, REPRESENTAÇÃO, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, QUEBRA, DECORO PARLAMENTAR, PRESIDENTE, SENADO, DEFESA, REGIME DE URGENCIA, PROPOSIÇÃO, EXTINÇÃO, VOTO SECRETO, SESSÃO SECRETA, DECISÃO, SELEÇÃO, MATERIA, OBSTRUÇÃO PARLAMENTAR.

            O SR. JOSÉ NERY (P-SOL - PA. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, vejo este Plenário, hoje com pouca participação dos Senadores, contrastando com aquela cena, ao mesmo tempo histórica e vergonhosa, que vivemos ontem aqui: Plenário completo; 81 Senadores e Senadoras, reunidos em sessão secreta, com voto secreto, para apreciar o Projeto de Decreto Legislativo, oriundo do processo ocorrido no Conselho de Ética, que pedia a cassação do mandato do Senador Renan Calheiros.

            A representação que o P-SOL fez, no último mês de junho, que teve tramitação nos últimos cento e poucos dias, no âmbito do Conselho de Ética, foi uma batalha, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores. A cada momento nós dizíamos que esta representação sobreviveu a ignomínias, ataques, manobras e protelações de toda a natureza. Mas, a partir da representação, os novos fatos que foram surgindo, a contribuição do jornalismo investigativo, o apoio de tantos Senadores e Senadoras de vários partidos nesta Casa, tudo isso foi decisivo para que a primeira representação protocolada pelo P-SOL junto à Mesa e levada ao Conselho de Ética obtivesse o desfecho que ocorreu no dia de ontem, quando o Plenário reunido, e a totalidade da Casa aqui reunida, deveria proferir, como fez, o veredicto, o voto sobre o Decreto Legislativo que determinava a perda de mandato do Senador Presidente desta Casa.

            Infelizmente, o que o Senado, por sua maioria, fez ontem é um desserviço à luta histórica dos brasileiros e brasileiras e a tantos nesta Casa, às organizações sociais e aos partidos políticos que tem compromissos com a luta pela ética, pela honestidade, pelo respeito à coisa pública, pelo decoro parlamentar. Infelizmente, sofremos aqui neste plenário secreto uma derrota na primeira batalha, que classifico, também, como a derrota da ética nessa primeira batalha, Senador Mão Santa.

            Mas, como nós sabemos, existem outras três representações: duas de iniciativa do PSOL e uma de iniciativa do PSDB e Democratas. Em todas elas, os Partidos representaram junto à Mesa do Senado, e dois desses processos já foram encaminhados ao Conselho de Ética, também por quebra de decoro parlamentar do Senador Presidente desta Casa. O resultado da votação de ontem - 35 sim; 40 não e 6 abstenções -, primeiro, demonstra que a maioria desta Casa já não tem a confiança necessária no Presidente para continuar a dirigi-la, tendo em vista que, se somarmos os 35 votos sim com as 6 envergonhadas abstenções, nós chegamos a 41, que seria o número mínimo necessário para a aprovação daquela Resolução.

            Esse resultado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, povo brasileiro que acompanha as sessões do Senado Federal e brasileiros e brasileiras que estão aqui, nesta tarde, na galeria deste Senado, podemos sentir, no dia de hoje, a reação indignada de milhares e milhares de cidadãos e cidadãs que se manifestaram das mais variadas formas, em telefonemas, em mensagem eletrônica, e-mails, repugnando, denunciando o que aconteceu, no dia de ontem, aqui, muitos desmotivados, decepcionados. A esses todos, a todos e todas que se manifestaram e acompanharam com interesse o resultado final daquela triste sessão secreta aqui realizada, a nossa mensagem, de quem vem da luta social, dos movimentos populares, dos movimentos sociais dos partidos, da luta socialista, é a de que não cabe desânimo, porque, se hoje vivemos situações absolutamente inaceitáveis, como essa da impunidade que continua inclusive aqui, no Congresso Nacional, é bem verdade que já vivemos momentos tão difíceis, com a privação da própria liberdade, do poder militar da ditadura fechando o Congresso, cassando mandatos - e V. Exª, há pouco, se referiu a isso, Senador Mão Santa -, da falta de liberdade de expressão, da proibição do direito de manifestação. O povo brasileiro já lutou muito e tem muitas conquistas que podem ser creditadas à luta popular e à sua mobilização. Vivemos um momento de democracia formal, muito longe da democracia real, substantiva, que garanta, efetivamente, condições dignas de vida à maioria do nosso povo: educação de qualidade, terra para quem queira trabalhar.

            Inclusive, Sr. Presidente, denuncio que mais de 500 trabalhadores rurais do meu Estado do Pará, Senador Jarbas Vasconcelos, ocupam a Superintendência do Incra no Estado do Pará, neste momento, para reivindicar o direito a desapropriações de fazendas griladas no nordeste paraense. Eles exigem negociações imediatas para verem atendido o seu direito à terra e à possibilidade de trabalhar, produzir, sobreviver com dignidade, com o suor de seu rosto e não à custa do dinheiro público, da corrupção, de atos ilícitos que mancham a história política de nosso País. Apesar de tudo, temos motivo de sobra, e faço aqui uma conclamação aos brasileiros e às brasileiras desesperançados...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador José Nery, V. Exª, pelo Regimento, teria direito a cinco minutos. Já dei dez e vou dar mais dez. Faço isso com consciência porque foi o próprio Montesquieu que criou essa divisão de poder e escreveu Espírito das Leis.

            E Norberto Bobbio, o maior teórico, disse que a função maior do Parlamento é denunciar.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Obrigado, Senador Mão Santa.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Então, V. Exª está exercitando a maior grandeza deste Parlamento. E não precisaríamos buscar em Norberto Bobbio, o mais extraordinário Senador da história da Itália. Aqui mesmo tivemos o Senador Teotônio Vilela, que morreu dizendo que este Parlamento serve para se falar resistindo e resistir falando.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Obrigado, Senador Mão Santa, que preside esta sessão do Senado Federal.

            Eu estava dirigindo uma mensagem aos brasileiros e às brasileiras desesperançados, decepcionados, que se encontram nos mais diversos lugares deste País, nas grandes cidades, nas pequenas cidades, nas comunidades do interior, mas muitos, com o avanço da tecnologia, aqueles de onde já chegou energia elétrica, principalmente no campo - ainda falta chegar a muitos lugares - têm a possibilidade de acompanhar, inclusive, as sessões do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, uma forma de acompanhar e saber melhor como trabalham, votam, discutem e decidem os destinos do País aqueles que estão aqui, no Parlamento nacional. Mas quero dizer a esses brasileiros e brasileiras que temos mil motivos para continuar lutando, porque, enquanto houver injustiça, desigualdade e violência contra a maioria do nosso povo, há razões de sobra para lutar e resistir.

            Não podemos fazer da indignação apenas um gesto de inconformismo, de denúncia e de desesperança mesmo. Precisamos, sim, fazer da nossa indignação coletiva ações, atitudes, causas que nos mobilizem para avançarmos nas conquistas que ajudem a construir um Brasil mais justo e democrático, levando em consideração todos os avanços que já conquistamos. Se pensarmos, há pouco mais de 20 anos sequer tínhamos o direito de votar para escolhermos os nossos governantes, o Presidente da República, os Governadores de Estado e os Prefeitos de capitais, todos eram nomeados segundo as normas, a violência do regime de plantão. Há avanços, sim. Negar isso seria negar a própria história, mas é necessário avançar muito mais, inclusive em tarefas, em ações que ajudem a democratizar a sociedade brasileira, o poder político, que aproximem mais os Poderes da República do sentimento, da luta e da vida concreta do nosso povo.

            E a nossa mensagem a cada brasileiro e a cada brasileira neste instante é a mensagem da luta e da resistência apesar dos obstáculos, porque, como eu disse no início do meu pronunciamento, a representação inicial feita pelo PSOL, para apurar possível quebra de decoro por parte do Senador Renan Calheiros, foi recebida num primeiro momento com ceticismo, com indiferença por muitos.

            Mas, aos poucos, os fatos e o seguimento da investigação foram demonstrando a coerência daquela representação. Tanto é que, depois de idas e vindas, de obstáculos de toda ordem, chegou-se ontem a uma decisão no plenário deste Senado Federal, embora não tenha sido a decisão que o povo brasileiro esperava.

            Portanto, Sr. Presidente, o caminho é sempre o caminho da luta, da resistência. E, por falar em resistência, há poucas horas reuniram-se num encontro lideranças do PSDB, do DEM, do PSOL e parlamentares de vários partidos para discutir justamente os próximos passos da batalha que continua.

            Tomamos como deliberação discutir, trabalhar junto aos nossos Pares de todos os partidos, enfim, um trabalho dirigido a todos os Senadores e Senadoras desta Casa, uma pauta mínima urgente, à qual não cabe nenhum tipo de obstáculo a uma discussão que trata de apressarmos a votação, no plenário do Senado, do fim do voto secreto, do fim das sessões secretas.

            O voto secreto é matéria constitucional. A partir de projetos já apresentados na Casa, que estão na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, vamos trabalhar para obtermos regime de urgência para a votação no sentido de mudar a matéria que trata do art. 55 da Constituição, que determina o voto secreto quando se tratar da votação de perda de mandato de Senador ou Deputado Federal.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma outra iniciativa é trabalhar para unificar as três representações feitas e apresentadas à Mesa e ao Conselho de Ética para continuar a investigação sobre quebra de decoro parlamentar por parte do Presidente Renan Calheiros. Desse modo, pretendemos unificar procedimentos e obtermos economia processual. Se formos investigar cada um dos três processos, acreditamos que isso vá, de certa forma, prolongar-se indefinidamente.

            O Brasil que luta, que quer justiça e o fim da impunidade, quer que essas representações sejam processadas e julgadas neste plenário não mais sob o manto covarde do voto secreto, mas sob o olhar atento, fiscalizador do povo brasileiro, que tem todo o direito de saber como votam seus representantes desta chamada Casa Alta do Legislativo brasileiro. Mas, ontem, esta Casa se abaixou diante de conveniências pouco adequadas à República, à democracia, a tudo aquilo que todos professam aqui, mas que na hora de tomar uma decisão tão séria como a de ontem acovardam-se por meio do voto secreto e oferecem ao País aquele espetáculo. O Brasil teve que suportar e, pelo voto secreto, manter o princípio que para alguns, com certeza, é muito caro - não para nós -, o princípio da impunidade, Sr. Presidente. Caro para alguns, para poucos, é verdade, mas que ontem aqui demonstraram muita força.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, juntamente com os demais partidos - PSDB, DEM e vários Senadores que igualmente se irmanam nessa perspectiva da luta imediata pelo fim do voto secreto, da luta imediata pelo fim das sessões secretas do Senado, pela unificação das representações em curso no Conselho de Ética - também decidimos que nesta Casa não votaremos medidas provisórias inconstitucionais ou medidas que abram crédito extraordinário, por entendermos...

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI. Fazendo soar a campainha.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vai V. Exª para o 21º minuto mostrando o amor e a liberdade que nós temos.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL- PA) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Já concluo.

            Quero dizer, enfim, que faremos nesta Casa uma obstrução seletiva. Não vamos anunciar qualquer decisão de obstrução geral da pauta de votações, mas, não haverá acordo para votar medidas provisórias inconstitucionais, abertura de crédito extraordinário ou outros projetos que entendamos não sejam, segundo nossa avaliação, de interesse do País ou que não tenham a urgência necessária.

            Entendemos que só podemos retomar o curso...

(Interrupção do som.)

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL- PA) -...normal das votações quando esta Casa tiver paz, tranqüilidade e, sobretudo, pelo voto dos seus membros, se reconciliar com a maioria do povo brasileiro que não suporta a impunidade, a descrença, não suporta ver os seus representantes de alguma forma votando aqui contra os interesses da maioria.

            Por último mesmo, Sr. Presidente, por tudo isso que abordamos aqui neste instante, por tudo que temos acompanhado em relação ao que o Senado vem sofrendo nos últimos 120 dias, os processos que envolvem o Senador Renan Calheiros, que ontem...

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - V. EXª viu ontem que a sua Presidente falou por dez minutos. V. Exª tem de seguir a Senadora Heloísa Helena. Há aquele santo, Santo Estevão, que falou demais e jogaram pedra nele.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Pois, é, Sr. Presidente, eu agradeço a sua benevolência com o tempo, mas quero lembrar...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - E Cristo fez o Pai Nosso em um minuto.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Exato. Mas há muitos Senadores, Sr. Presidente, que ocupam esta tribuna e dispõem, como eu, de apenas dez minutos, mas já vi Senador aqui usar três horas. Então, aqui, não existe Senador maior ou Senador menor. E eu respeito V. Exª justamente porque eu sei que V. Exª trata todos com igualdade. Essa injustiça ninguém pode cometer com o Senador Mão Santa, no sentido de garantir a quem está na tribuna o direito de se pronunciar. Eu agradeço a sua benevolência, mas vou encerrar dizendo isso. O Presidente Renan Calheiros...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - E minha presença da Presidência é para V. Exª acreditar neste Senado.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Com certeza.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Eu represento o Juscelino, que disse: “É melhor ser otimista. O otimista pode errar, mas o pessimista já nasce errado e continua errado.”

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Exatamente.

            É por isso, Sr. Presidente, que eu acabei de dizer que, apesar de tudo o que vivemos aqui, desta crise, sou otimista com o Brasil, com o povo brasileiro, com o sentimento que leva muitos a não desanimar, apesar dos reveses, apesar dos obstáculos. E dizer, finalmente, que por tudo que vivenciamos aqui nesta Casa, nos últimos 20 dias, defendo que o Senador Renan Calheiros, mesmo tendo vencido a primeira batalham ontem aqui, mas foi apenas, a primeira batalha, há outras, há outros processos. Creio que o Senador Renan Calheiros não reúne condições para continuar dirigindo o Senado Federal, enquanto não se dirimirem todas as dúvidas e se encerrar todo o processo.

            Por isso, Sr. Presidente, clamamos por justiça, pelo fim da impunidade e chamamos o povo brasileiro à mobilização para cobrar e fiscalizar cada um de nós, para que não permaneçamos aqui alheios, distantes da vontade, do desejo de justiça e de punição para quem merece ser punido.

            Muito obrigado ao Senador Mão Santa pela paciência e pelo tempo concedido de quase trinta minutos de pronunciamento nesta tarde. 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/09/2007 - Página 31298