Discurso durante a 164ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre as observações feitas pelo Dr. Paulo Safady Simão, Presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, no artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo de hoje intitulado "Os Riscos da Emenda Suplicy".

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Comentários sobre as observações feitas pelo Dr. Paulo Safady Simão, Presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, no artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo de hoje intitulado "Os Riscos da Emenda Suplicy".
Publicação
Publicação no DSF de 26/09/2007 - Página 32719
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVERGENCIA, PRESIDENTE, ENTIDADE, INDUSTRIA, CONSTRUÇÃO CIVIL, PARECER, ORADOR, PROJETO DE LEI, PROPOSTA, SUBSTITUTIVO, ESCLARECIMENTOS, DIFERENÇA, OPINIÃO, EMPRESARIO, REPRESENTANTE, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), MINISTERIO DO ORÇAMENTO E GESTÃO (MOG), ORGÃO, CONTROLE, FALTA, UNANIMIDADE, AUDIENCIA PUBLICA, INCORPORAÇÃO, QUALIDADE, RELATOR, CONTRIBUIÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, COMISSÃO DE CIENCIA E TECNOLOGIA, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, CONCILIAÇÃO, INTERESSE, SETOR, PRESERVAÇÃO, INTERESSE PUBLICO, DETALHAMENTO, MATERIA, LEGISLAÇÃO, LICITAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, UTILIZAÇÃO, LEILÃO, INTERNET, INFERIORIDADE, VALOR, OBRA PUBLICA.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Efraim Morais, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, na Folha de S.Paulo hoje, o Dr. Paulo Safady Simão, Presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, publica o artigo “Os Riscos da Emenda Suplicy”. Começa com inúmeras referências positivas à minha pessoa, reconhecendo a minha atuação como um dos Senadores mais trabalhadores, éticos e coerentes do Congresso. Entretanto, diz que discorda frontalmente do meu parecer, oferecido à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, a respeito do Projeto de Lei da Câmara nº 32, de 2007.

Gostaria de aqui comentar cada uma das observações, da maneira mais respeitosa e construtiva possível, em relação a esse artigo com que me honrou o Sr. Paulo Safady Simão. Os argumentos apresentados para embasar as suas críticas são muito similares aos que vêm sendo colocados pelo setor da construção civil, especialmente os grandes empresários, desde o início da discussão da referida proposição.

Quais são esses argumentos?

Primeiro, diz o Sr. Paulo Safady Simão:

O Senador Suplicy sobrepõe sua opinião à dos deputados, dos depoentes da audiência pública e dos membros da CAE.

Esse primeiro argumento reproduz um falso silogismo porque não se trata aqui da minha opinião, mas de um conjunto de entendimentos que vem sendo construído no Senado Federal desde a primeira análise, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, passando pela aprovação do parecer na Comissão de Ciência e Tecnologia e chegando, agora, à discussão na CAE.

O fato de ser proposto um substitutivo (e não um “emendão”, como faz entender o artigo) está explicado no meu relatório, no item 23:

(...) a multiplicidade de emendas aprovadas, muitas das quais com subemendas e prejudicando-se umas às outras, poderiam gerar uma votação tumultuada em Plenário. Assim (...), julgamos prudente apresentar substitutivo integral, uma versão consolidada de todas as mudanças propostas nas comissões anteriores, bem como nesta Comissão de Assuntos Econômicos.

Quando o autor do artigo se refere à opinião dos “depoentes da audiência pública”, tenta fazer crer que todos eram unânimes, quando, na realidade, houve posicionamentos diametralmente opostos, sobretudo opondo, de um lado, os órgãos de controle e de gestão pública, como o Tribunal de Contas da União, os próprios representantes do Ministério do Planejamento, e, de outro, os interesses de muitos grandes empresários do setor.

O mesmo se diga quanto à opinião “dos deputados”. Ora, o Senado Federal tem por função justamente revisar o trabalho feito na Câmara e vice-versa. Existem circunstâncias em que o Senado se limita a ratificar o trabalho da Câmara, quando assim entende que deve fazê-lo, por nada haver a alterar. No entanto, o Senado, quando discute a matéria a fundo, em três comissões distintas, havendo realizado audiência pública, estudos, análise de direito comparado e uma série de sessões para discutir a matéria, até mesmo em número superior àquele realizado na Câmara, inclusive com o Sr. Paulo Safady Simão, com quem tive o prazer de encontrar-me, obviamente, está aqui cumprindo a função constitucional de aperfeiçoar aquilo que vem da Câmara. É natural, portanto, que haja contribuições.

Essas contribuições não são apenas “do Senador Suplicy”, mas a consolidação das conclusões a que cheguei na CAE, com uma série de alterações já realizadas no projeto nas duas outras comissões que o apreciaram anteriormente, alterações essas, aliás, aprovadas por unanimidade.

A minha postura como Relator da CAE foi a de buscar conciliar ao máximo os interesses de todas as partes envolvidas em diversos pontos, fazendo concessões aos pedidos do setor da construção civil, levando-se em conta aquilo que é de bom senso, mas sempre procurando preservar o interesse público. Cite-se, apenas como exemplo, que o parecer aprovado na Comissão de Ciência e Tecnologia, sob a relatoria do Senador Romeu Tuma, previa a obrigatoriedade do pregão eletrônico para as licitações do tipo “menor preço” de valor inferior a R$51 milhões. Estou diminuindo esse valor, Senador Romeu Tuma, para R$3,4 milhões, ou seja, para menos de 10% do valor da Comissão de Ciência e Tecnologia, mas o setor da construção civil gostaria que o baixasse ainda mais.

Cheguei a um valor que me pareceu de bom senso, depois de ouvir muitas das partes, seja o Ministério do Planejamento, seja o Tribunal de Contas, sejam os inúmeros empresários que têm colaborado e que nos têm dito que esse seria um valor de bom senso.

Outro ponto é que “o pregão pode resultar em preços inexeqüíveis”, diz o Sr. Paulo Safady Simão.

Por que seria o pregão responsável por gerar preços inexeqüíveis? A impressão que dá a argumentação do artigo é que, empolgados com a evolução dos lances, os empresários do setor farão propostas de preços abaixo de seus custos e, em conseqüência, não poderão executar as obras.

É evidente que esse argumento não é real. Nenhum empresário participará de um leilão de lances regressivos sem saber de antemão o menor preço que ele poderá oferecer para executar a obra.

Digamos, entretanto, que o empresário haja calculado mal seus custos e que ofereça um preço abaixo do exeqüível. Pois bem: em que isso se diferenciaria do atual sistema de licitações, em que o empresário também pode oferecer esse mesmo preço baixo? Qual o perigo que pode ser imputado ao pregão?

Na verdade, justamente a pedido das entidades representativas do setor da construção civil, as garantias contratuais e mecanismos de controle foram consideravelmente incrementados pelo texto do substitutivo apresentado na CAE. Senão, vejamos:

- qualquer contrato superior a R$34 milhões e que envolva alta complexidade técnica e riscos financeiros consideráveis estará sujeito à prestação de uma garantia adicional. O limite a partir do qual essa garantia hoje é exigida é de R$37,5 milhões, e a Câmara dos Deputados havia proposto o valor de R$65 milhões;

- essa garantia, que antes era de no máximo 5% do valor do contrato, agora deverá ser fixada no mínimo em 4% e no máximo em 10%;[Atendendo, inclusive, à emenda do Senador Francisco Dornelles].

- além disso, qualquer proposta de preço que se situe abaixo do patamar de 85% [Outra sugestão do Senador Francisco Dornelles] do orçamento elaborado pelo órgão licitante terá que oferecer garantia suplementar para a execução do contrato, equivalente à diferença entre o preço oferecido e o valor orçado pela Administração;

- aumentou-se o prazo mínimo para a elaboração de propostas nas licitações de obras de 8 para 15 dias, visando a possibilitar que os empresários tenham mais tempo para preparar-se para a licitação que lhes interesse;

- no mesmo sentido, passará a ser exigida a elaboração dos projetos básico e executivo previamente à licitação, de forma que os empresários poderão saber exatamente os custos envolvidos e, além disso, eliminar-se-á uma larga porta de corrupção e desperdício de dinheiro público (hoje representada pelas modificações do projeto que ocorrem freqüentemente, por ausência de sua elaboração prévia à licitação);

- a empresa responsável pela elaboração do projeto e fiscalização de sua execução não poderá ser a mesma responsável pela obra, corrigindo distorção absurda atualmente permitida;

- nas licitações superiores a R$3,4 milhões, somente poderão participar as empresas previamente cadastradas ou que demonstrem em tempo hábil terem condições de executar o contrato, a fim de evitar que empresas sem condições técnicas possam comprometer a execução de obras públicas.

Senador Francisco Dornelles, quero muito conceder-lhe aparte, mas preciso acabar de responder às diversas afirmações de Paulo Safady Simão.

Criar regras ainda mais restritivas, como deseja o autor, Paulo Safady Simão, seria concentrar ainda mais o setor de construção civil, beneficiando grandes empresas com capital para oferecer altas garantias, a despeito de pequenas e médias empresas eficientes e dotadas de uma composição de custos enxuta. Parece-nos que essa é a melhor estratégia para o desenvolvimento do setor e para a economia dos recursos públicos.

Terceiro ponto que ele observou: 90% das obras públicas situam-se em patamares inferiores a R$3,4 milhões. Eu gostaria que fosse informada a fonte desse número, que vem sendo repetido insistentemente por setores da construção civil. Aparentemente, ele se constitui em um argumento retórico para dizer que quase todos os contratos situar-se-iam abaixo desse valor. Até hoje não foi dito de onde essa estatística foi extraída ou quais atos a sustentam.

No entanto, para mostrar como esse número está deturpado, no dia 19 de setembro, o Tribunal de Contas da União apresentou seu relatório anual de obras públicas, dizendo que fez a fiscalização de 231 obras, com um orçamento total de R$23,9 bilhões, representando 90% do volume total previsto para o setor. Ora, se 90% do orçamento para obras, que representam R$23,9 bilhões, concentram em 231 contratos, vê-se que o valor médio do contrato

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Eu precisaria de um pouquinho mais de tempo, Sr. Presidente, dada a relevância desta oração.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. DEM - PB) - V. Exª já está com três minutos a mais e esta Presidência vai dar mais três minutos.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Obrigado.

O valor médio do contrato situa-se, muitas vezes, acima do limite de obrigatoriedade do pregão eletrônico, que se propõe de R$3,4 milhões.

É verdade que, dentro desse universo de 10% do orçamento restante, pode-se ter uma infinidade de pequenos contratos de obras. São contratos como a reforma de uma pequena escola ou a construção de refeitórios. Assim, mesmo admitindo que esses contratos representem, em número, uma grande parte das obras realizadas no Brasil, verifica-se que não apresentam, em geral, nenhuma complexidade que impeça o uso do pregão em sua forma eletrônica ou presencial.

Diz em outro item, o Sr. Paulo Safady Simão, que os órgãos públicos são despreparados para realizar licitações. Essa afirmação, embora não possa ser generalizada, suscitou também preocupações externadas no meu relatório. Acreditamos que esse problema tenha sido contornado com a ampliação da vacatio legis, ou seja, o tempo que transcorrerá antes da entrada em vigor da lei, que, sobretudo para os Municípios, pode ser adiada em até 120 dias. Além disso, os dispositivos que implicarão um maior treinamento dos funcionários terão uma vacatio legis ainda maior, variando, conforme sua complexidade, entre um, dois ou quatro anos, conforme disposto no art. 7º do Substitutivo.

Em outro ponto, o Sr. Paulo Safady Simão diz que a inversão de fases compromete a isenção de análise da capacidade técnica.

Ora, a inversão de fases é uma medida que diminui custos e tempo para a Administração, sendo racional por dispensar que a Comissão de Licitação examine todos os documentos de todos os licitantes.

Se o que interessa à Administração é saber se o licitante com a melhor proposta reúne as condições de habilitação exigidas, por que motivo deveria analisar todos os documentos de habilitação de todos os licitantes?

Muitos insistem em não compreender. Mas a verdade é que o filtro da habilitação prévia à abertura das propostas tem servido para estimular a indústria de liminares e os expedientes mais anticoncorrenciais, por meio dos quais empresas cartelizadas procuram afastar da licitação - muitas vezes com o apóio da própria Comissão de Licitação - empresas idôneas e com propostas exeqüíveis e mais vantajosas para a Administração. Muitas dessas propostas sequer chegam a ser examinadas, porque somente passam para fase de julgamento as empresas integrantes do cartel, que já fizeram um acerto prévio e a divisão do mercado de obras, podendo, com isso, apresentar propostas em valores bem mais elevados.

Observa Dr. Lucas Rocha Furtado, Procurador-Geral do Tribunal de Contas, em obra doutrinária:

É sabido que a fase de habilitação costuma ser a que mais causa embaraço em uma licitação. É normalmente nesta fase da licitação onde costumam ocorrer a maior parte dos recursos; é nela onde é proposta a maioria dos mandatos de segurança. A solução para resolver problema foi alterar o procedimento a ser observado no pregão, fazendo com que a fase de habilitação somente se realize após o julgamento das propostas.

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. DEM - PB) - Senador Eduardo Suplicy, para concluir.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - O mesmo autor adverte:

Qualquer previsão legal que incentive a competitividade e que amplie a possibilidade de novos interessados poderem apresentar propostas deve ser aceita e incentivada. Quanto maior a competitividade do processo e maior o número de interessados em apresentar propostas à Administração, menor a possibilidade de conluios ou fraudes. Isso, indiscutivelmente realizará o interesse público.

Sr. Presidente, há um ponto em que o Sr. Paulo Safady Simão observa que as micros, pequenas e médias empresas são contrárias ao pregão em obras públicas. Ora, quero justamente aqui anexar cópia de carta que recebi de um empresário que fala sobre a importância do pregão. E leio o depoimento de Genilson Marcos Ferreira:

Sou pernambucano, 46, formado em Administração de Empresas pela UFPE,...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Efraim Morais. DEM - PB) - Concluindo, nobre Senador Eduardo Suplicy. 

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Concluirei.

... representante em Pernambuco de uma empresa baiana de produtos químicos. Sou apenas um admirador da seriedade do Senador,... etc.

Assistindo ao debate sobre a nova lei de licitações, pois o assunto, além de fazer parte do meu dia-a-dia, compõe matéria de concurso ao Tribunal de Contas da União, ao qual me inscrevi. Fiquei feliz e preocupado ao mesmo tempo: feliz pelos avanços que o pregão eletrônico irá proporcionar a este País, pois aqui em Pernambuco a Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) economiza bastante com o pregão eletrônico há alguns anos e isso pode ser ampliado para todo o País; e preocupado quando querem inverter a ordem, passando a se abrir a documentação antes do preço. Aí surge uma dúvida, será que tal atitude irá impedir que os preços caiam?

Portanto, Sr. Presidente, coloco o depoimento muito importante de um médio empresário.

Concedo o aparte, com muita honra, ao Senador Francisco Dornelles.

Já que V. Exª declina, Senador Francisco Dornelles, quero pedir que seja transcrito o restante de meu pronunciamento.

E quero dizer ao Sr. Paulo Safady Simão que são bem-vindas as suas observações, mesmo que discordando, e teremos a oportunidade de examinar até terça-feira próxima as suas sugestões e as sugestões de todos os demais Senadores.

Também quero dizer, Senador Francisco Dornelles, que das 39 emendas apresentadas, acatei 20. Algumas foram modificadas. Mas isso significa que o meu parecer leva em conta a cooperação e as sugestões de 20 emendas apresentadas pelos mais diversos Senadores. Algumas eu acatei, outras não, e outras, ainda, modifiquei. Portanto, os mais diversos segmentos têm tido e terão a oportunidade, até terça-feira que vem, de apresentar sugestões. Inclusive, na semana passada, recebi sugestões de empresários da área de leilões, sugestões estas muito significativas e positivas, as quais colaboraram para o aperfeiçoamento deste meu parecer.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY.

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O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - RJ. Sem apanhamento taquigráfico) - Análise dos argumentos apresentados pelo Sr. Paulo Safady Simão em artigo publicado na edição da Folha de S.Paulo, de 25 de setembro de 2007

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de comentar o artigo do Dr. Paulo Safady Simão, Presidente da CBIC - Câmara Brasileira da Indústria da Construção, publicado no jornal Folha de S.Paulo, de 25 de setembro de 2007. Os argumentos apresentados para embasar suas críticas ao parecer que apresentei ao PLC 32/2007 são os mesmos que vêm sendo utilizados pelos representantes do setor da construção civil desde o início da discussão da referida proposição, com a diferença que, agora, foram mesclados com comentários relacionados à minha atuação parlamentar.

Discutamos cada argumento individualmente:

1. O Senador Suplicy sobrepõe sua opinião à dos deputados, dos depoentes da audiência pública e dos membros da CAE

Esse primeiro argumento reproduz um falso silogismo. Isso porque não se trata aqui da minha opinião, mas de um conjunto de entendimentos que vem sendo construído no Senado Federal desde a primeira análise, na CCJ, passando pela aprovação do Parecer na CCT e chegando agora à discussão na CAE.

O fato de ser proposto um substitutivo (e não um “emendão”, como faz crer o autor do artigo) está explicado no Relatório apresentado:

“23. (...) a multiplicidade de emendas aprovadas, muitas das quais com subemendas e prejudicando-se umas às outras, poderiam gerar uma votação tumultuada em Plenário. Assim (...), julgamos prudente apresentar substitutivo integral, uma versão consolidada de todas as mudanças propostas nas comissões anteriores, bem como nesta CAE.”

Quando o autor do artigo se refere à opinião dos “depoentes da audiência pública”, tenta fazer crer que todos eram unânimes, quando, na realidade, houve posicionamentos diametralmente opostos, sobretudo opondo, de um lado, os órgãos de controle e de gestão pública e, de outro, os interesses dos grandes empresários do setor.

O mesmo se diga quanto à opinião “dos deputados”. Ora, o Senado Federal tem por função justamente revisar o trabalho feito na Câmara dos Deputados, e vice-versa. Até existem circunstâncias em que o Senado se limita a ratificar o trabalho da Câmara, quando assim entende que deve fazê-lo, por nada haver a alterar. No entanto, vê-se que o Senado discutiu a matéria a fundo, em três comissões distintas, havendo realizado audiência pública, estudos, análises de direito comparado e uma série de sessões para discutir a matéria, até mesmo em número superior àquele realizado na Câmara. É natural, pois, que haja contribuições a serem feitas.

Essas contribuições, no entanto, não são “do Senador Suplicy”, mas a consolidação das conclusões a que cheguei na CAE com uma série de alterações já realizadas no projeto nas duas outras comissões que o apreciaram anteriormente, alterações essas, aliás, aprovadas por unanimidade.

Diga-se de passagem, a minha postura como relator da CAE foi a de buscar conciliar ao máximo os interesses de todas as partes envolvidas, em diversos pontos fazendo concessões aos pedidos do setor de construção civil. Cite-se, apenas como exemplo, que o parecer aprovado pela CCT, sob a relatoria do Senador Romeu Tuma, previa a obrigatoriedade do pregão eletrônico para todas as licitações do tipo “menor preço” de valor inferior a 51 milhões de reais. Esse valor foi reduzido para 3,4 milhões de reais, ou seja, para menos de 10% do valor da CCT, mas parece ainda não contentar o setor de construção civil.

2. O pregão pode resultar em preços inexeqüíveis

Por que seria o pregão responsável por gerar preços inexeqüíveis? A impressão que dá a argumentação do artigo é que, empolgados com a evolução dos lances, os empresários do setor farão propostas de preço abaixo de seus custos e, em conseqüência, não poderão executar as obras.

É evidente que esse argumento não é real. Nenhum empresário participará de um leilão de lances regressivos sem saber de antemão o menor preço que ele poderá oferecer para executar a obra.

Mas digamos que o empresário haja calculado mal seus custos e que ofereça um preço abaixo do exeqüível, pois bem: em que isso se diferenciaria do atual sistema de licitações, em que o empresário também pode oferecer esse mesmo preço baixo? Qual o perigo que pode ser imputado ao pregão?

Na verdade, justamente a pedido das entidades representativas do setor de construção civil, as garantias contratuais e mecanismos de controle foram consideravelmente incrementados pelo texto do substitutivo apresentado na CAE. Senão vejamos:

- qualquer contrato superior a R$34 milhões e que envolva alta complexidade técnica e riscos financeiros consideráveis estará sujeito à prestação de uma garantia adicional. O limite a partir do qual essa garantia hoje é exigida é de R$37,5 milhões e a Câmara dos Deputados havia proposto o valor de R$65 milhões;

- essa garantia, que antes era de no máximo 5% do valor do contrato, agora deverá ser fixada no mínimo em 4 e no máximo em 10%;

- além disso, qualquer proposta de preço que se situe abaixo do patamar de 85% do orçamento elaborado pelo órgão licitante terá que oferecer garantia suplementar para a execução do contrato, equivalente à diferença entre o preço oferecido e o valor orçado pela Administração;

- aumentou-se o prazo mínimo para elaboração de propostas nas licitações de obras de 8 para 15 dias, visando a possibilitar que os empresários tenham mais tempo para preparar-se para uma licitação que lhes interesse;

- no mesmo sentido, passará a ser exigida a elaboração dos projetos básico e executivo previamente à licitação, de forma que os empresários poderão saber exatamente os custos envolvidos e, além disso, eliminar-se-á uma larga porta de corrupção e desperdício de dinheiro público (hoje representada pelas modificações no projeto que ocorrem freqüentemente, por ausência de sua elaboração prévia à licitação);

- a empresa responsável pela elaboração do projeto e fiscalização de sua execução não poderá ser a mesma responsável pela obra, corrigindo distorção absurda atualmente permitida;

- nas licitações superiores a R$3,4 milhões, somente poderão participar as empresas previamente cadastradas ou que demonstrem em tempo hábil terem condições de executar o contrato, a fim de evitar que empresas sem condições técnicas possam comprometer a execução de obras públicas.

Criar regras ainda mais restritivas, como deseja o autor do artigo, seria concentrar ainda mais o setor da construção civil, beneficiando grandes empresas, com capital para oferecer altas garantias, a despeito de pequenas e médias empresas eficientes e dotadas de uma composição de custos enxuta. Parece-nos que essa é a melhor estratégia para o desenvolvimento do setor e para a economia dos recursos públicos.

3. 90% das obras públicas situam-se em patamares inferiores a R$3,4 milhões

Eu gostaria que fosse informada a fonte desse número, que vem sendo repetido insistentemente por setores da construção civil. Aparentemente, constitui um mero argumento retórico para dizer que quase todos os contratos se situariam abaixo desse valor. Até hoje não foi dito de onde essa estatística foi extraída ou quais os dados que a sustentam.

No entanto, para mostrar como esse número está deturpado, no dia 19 de setembro o Tribunal de Contas da União apresentou seu relatório anual de obras públicas (Acórdão TCU Plenário nº 1953/2007). Para isso, fez-se a fiscalização de 231 obras, com orçamento total de 23,9 bilhões de reais, representando 90% do volume total de recursos previstos para o setor.

Ora, se 90% do orçamento para obras, que representa R$23,9 bilhões, concentra-se em 231 contratos, vê-se que o valor médio do contrato situa-se muitas vezes acima do limite de obrigatoriedade do pregão eletrônico, que propõe-se de R$3,4 milhões.

É verdade que, dentro desse universo de 10% do orçamento restante, pode-se ter uma infinidade de pequenos contratos de obras. São contratos como a reforma de uma pequena escola ou a construção de refeitórios. Assim, mesmo admitindo que esses contratos representem, em número, uma grande parte das obras realizadas no Brasil, verifica-se que não apresentam, em geral, nenhuma complexidade que impeça o uso do pregão, em sua forma eletrônica ou presencial.

4. Os órgãos públicos estão despreparados para realizar licitações

Essa afirmação, embora não possa ser generalizada, suscitou também preocupações externadas no meu Relatório. Acreditamos que esse problema tenha sido contornado com a ampliação da vacatio legis, ou seja, o tempo que transcorrerá antes da entrada em vigor da lei, que, sobretudo para os Municípios, pode ser adiada em até 120 dias.

Além disso, os dispositivos que implicarão um maior treinamento dos funcionários terão uma vacatio legis ainda maior, variando, conforme sua complexidade, entre 1, 2 ou 4 anos, conforme disposto no art. 7º do Substitutivo.

5. A inversão de fases compromete a isenção da análise da capacidade técnica

A inversão de fases é uma medida que diminui custos e tempo para a Administração, sendo racional, por dispensar que a Comissão de Licitação examine todos os documentos de todos os licitantes. Se o que interessa à Administração é saber se o licitante com a melhor proposta reúne as condições de habilitação exigidas, por que motivo deveria analisar todos os documentos de habilitação de todos os licitantes?

Muitos insistem em não compreender. Mas a verdade é que o filtro da habilitação prévia à abertura das propostas tem servido para estimular a indústria de liminares e os expedientes mais anticoncorrenciais, por meio dos quais empresas cartelizadas procuram afastar da licitação - muitas vezes com o apoio da própria Comissão de Licitação - empresas idôneas e com propostas exeqüíveis e mais vantajosas para a Administração. Muitas dessas propostas que sequer chegam a ser examinadas, porque somente passam para a fase de julgamento as empresas integrantes do cartel, que já fizeram um acerto prévio e a divisão do mercado de obras, podendo, com isso, apresentar propostas em valores bem mais elevados. Conforme observa o Procurador-Geral do TCU, Dr. Lucas Rocha Furtado, em obra doutrinária:

"É sabido que a fase da habilitação costuma ser a que mais causa embaraços em uma licitação. É normalmente nesta fase da licitação onde costumam ocorrer a maior parte dos recursos, é nela onde é proposta a maioria dos mandados de segurança. A solução para resolver esses problemas foi alterar o procedimento a ser observado no pregão, fazendo com que a fase da habilitação somente se realize após o julgamento das propostas." (Curso de Direito Administrativo, p. 518)

O mesmo autor adverte:

"Qualquer previsão legal que incentive a competitividade, que amplie a possibilidade de novos interessados poderem apresentar propostas, deve ser aceita e incentivada. Quanto maior a competitividade do processo e maior o número de interessados em apresentar propostas à Administração, menor a possibilidade de conluios ou fraudes. Isso, indiscutivelmente, realizará o interesse público." (Curso de Licitações e Contratos Administrativos, p. 111)

Vale a pena lembrar as palavras do Dr. André Kresch, representante do TCU na audiência pública realizada na CAE. Naquela ocasião, os mesmos argumentos defendidos pelo Sr. Safady Simão foram levantados contra o pregão e a inversão de fases nos certames de obras. Comentando-os, assinalou o Dr. Kresch:

“Falou-se que um pregoeiro não vai inabilitar uma empresa que deu o menor preço. Ele é obrigado a inabilitar. Da mesma forma que ele é obrigado a habilitar a empresa antes, ele é obrigado a inabilitar depois, porque a Lei nº 8.666 tem vários artigos que exigem que o critério seja objetivo.

Os critérios de capacitação são objetivos. Se uma empresa de fundo de quintal oferecer o menor preço, ela tem que apresentar um atestado, um engenheiro com experiência nisso. Se ela não apresentou, não pode ser contratada. O gestor que a contratar, deverá ser punido, porque ele tem que inabilitar a primeira colocada, a segunda, a terceira, a quarta, a quinta, até aparecer uma que cumpriu os objetos do edital.”

Não é a inversão de fases que produz fraudes, mas sim a desonestidade de quem conduz e participa do processo licitatório, desonestidade que já existe hoje e é responsável por tantos desvios em concorrências e outras licitações sem inversão de fases. É, portanto, falacioso o argumento de que a inversão de fases não pode ser adotada porque incentivaria o dirigismo. Não apenas falacioso, mas também extremamente danoso ao interesse público, porque impede que a Administração possa se beneficiar das vantagens da inversão de fases em licitações promovidas de forma legítima. Imaginar que sem a inversão de fases serão evitadas as fraudes é como acreditar que tais vícios não existem hoje.

6. As micro, pequenas e médias empresas são contrárias ao pregão em obras públicas

Certamente a CBIC, órgão presidido pelo autor do texto, é dotado de uma ampla representatividade no setor da construção civil. No entanto, questiono-me quanto a afirmações contidas no artigo, do tipo “os eventuais aventureiros estão exatamente entre as 100 mil empresas que vão disputar os contratos com valor de até R$3,4 milhões. Aí é que mora o perigo.”

Ou seja, em outras palavras, o sr. Safady Simão entende que são as pequenas empreiteiras, as que disputam os pequenos contratos, que põem em xeque o interesse público, ao mostrarem-se como “aventureiras”.

Não é exatamente isso que sugere uma leitura do último relatório consolidado dos levantamentos de auditoria realizados pelo TCU em obras públicas, ao qual já fizemos referência anteriormente. O maior número de irregularidades encontradas pelo TCU refere-se ao sobrepreço e ao superfaturamento (52 em um total de 199 ocorrências). Entre as 20 empresas cujos contratos apresentaram maior número de irregularidades se encontram cinco das maiores empreiteiras do País. Uma delas chegou a apresentar irregularidades graves em 75% de seus contratos auditados, algumas das quais autorizadoras da paralisação da obra. Convém registrar que as licitações que resultaram em tais contratações foram promovidas na modalidade de concorrência, tão elogiada pelos que exorcizam a inversão de fases e o pregão eletrônico em obras.

Evidentemente, não nos compete discutir os critérios de ação de um órgão representativo, mas o artigo sugere que a opinião do autor representa as preocupações de todas as micro, pequenas e médias empresas de construção civil, representadas pela instituição que preside, e que todas seriam unânimes ao posicionar-se contra as mudanças aportadas pelo PLC 32/2007.

Parece-nos estranho, pois temos conhecimento de diversas manifestações de várias entidades apoiando o substitutivo apresentado na CAE, sobretudo provenientes de pequenos e médios empreiteiros que, assim como as entidades de fiscalização de gastos públicos, têm elogiado o texto.

7. Conclusão

Por todo o exposto, parece-nos que a argumentação expendida pelo Sr. Safady Simão em seu artigo publicado na Folha de S.Paulo não aporta novos elementos que já não tenham sido amplamente discutidos no Relatório que apresentei.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/09/2007 - Página 32719