Discurso durante a 169ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo pela regulamentação do financiamento da saúde.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Apelo pela regulamentação do financiamento da saúde.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 02/10/2007 - Página 33496
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS ECONOMICOS, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, DEFINIÇÃO, PERCENTAGEM, RECURSOS, DESTINAÇÃO, SAUDE, DETERMINAÇÃO, COMPETENCIA, MUNICIPIOS, ESTADOS, UNIÃO FEDERAL.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROJETO, DEFINIÇÃO, SETOR, INVESTIMENTO, VERBA, SAUDE PUBLICA, OBJETIVO, CONTENÇÃO, IRREGULARIDADE, APLICAÇÃO DE RECURSOS, COMENTARIO, DIFICULDADE, GOVERNADOR, ESTADOS, CUMPRIMENTO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • COMENTARIO, INICIATIVA, PATRICIA SABOYA, SENADOR, QUALIDADE, RELATOR, APRESENTAÇÃO, EMENDA, POSSIBILIDADE, MUNICIPIOS, INFERIORIDADE, POPULAÇÃO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, SAUDE PUBLICA, INVESTIMENTO, SANEAMENTO BASICO, PREVENÇÃO, DOENÇA, PAGAMENTO, FUNCIONARIOS, SETOR, SAUDE.
  • REGISTRO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ANALISE, PROJETO DE LEI, REGULAMENTAÇÃO, SAUDE, COMENTARIO, COMPETENCIA, PROGRAMA, ACELERAÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO, INVESTIMENTO, SANEAMENTO BASICO.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje vi uma importante manifestação na imprensa brasileira do respeitável jornalista Ribamar Oliveira, do jornal O Estado de S. Paulo, fazendo considerações sobre um projeto de lei que deverá ser votado no dia de amanhã, no Senado Federal. O projeto diz respeito à regulamentação da Emenda Constitucional nº 29, que nós aprovamos como sendo um dos mais importantes marcos regulatórios do financiamento da saúde pública brasileira e da responsabilidade que deveriam ter os entes federativos - os Municípios, os Estados e a União. Foi uma grande decisão política tomada por gerações de sanitaristas e agentes políticos do Brasil, que ocorreu no Governo anterior, com uma emenda de autoria do Deputado Eduardo Jorge, do Partido dos Trabalhadores.

Eu tive o prazer de ser um agente de mobilização e articulação da aprovação dessa matéria no Senado, o último grande marco de uma era em que se teria de assegurar ainda a vinculação orçamentária para os entes federados em áreas vitais para o Brasil - aquele conceito de que educação, saúde e segurança são áreas extremamente sensíveis e impõem responsabilidade direta do Estado, por meio dos governos. Nós tivemos a ousadia de determinar tal medida.

Lamentavelmente, todos esses anos seguintes à aprovação da Emenda nº 29 não exigiram do Parlamento ainda a sua regulamentação. E a eficácia da norma constitucional depende, em si, quando estamos diante de uma emenda constitucional, de sua regulamentação, e tem sido essa luta que alguns Parlamentares têm travado.

Eu tenho, com muito esforço, procurado valorizar essa matéria. Em 2001, comecei a discuti-la com mais profundidade. Em 2002, apresentei-a como autor, defendendo a sua regulamentação e, amanhã, podemos ter a sua aprovação na Comissão de Assuntos Econômicos, após ter sido aprovada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Posteriormente, terá ainda de ir à Comissão de Assuntos Sociais e, então, poderá ir à Câmara dos Deputados.

Quase dois anos após a minha apresentação do projeto, em 2002, o Deputado Roberto Gouveia, do PT, discutiu comigo e apresentou matéria semelhante, entendendo que ela também poderia entrar em discussão. Houve decurso de prazo legislativo, pela legislatura que se encerrou no final do ano passado, e o meu projeto de lei complementar caiu. Em função do decurso de prazo legislativo, fui forçado a reapresentá-lo, mas amanhã teremos um grande dia: a União está decidida a aprovar e a apoiar tal matéria, o que é um fato inédito. Nesses anos todos, não tivemos o apoio do Governo Federal no sentido de assumir os avanços que a regulamentação da Emenda nº 29 iria propor.

Tivemos a evolução dos Municípios com a Emenda Constitucional nº 29, estabelecendo que 15% das receitas dos Municípios seriam aplicadas com saúde, e 12% por parte dos Estados. Na Região Norte, quase todos os Governadores cumprem muito bem a sua parte. Alguns passam, inclusive, daquilo que a norma constitucional determina.

Quando olhamos para o Nordeste, encontramos uma oscilação entre os diversos Governadores na não-aplicação daquilo que são as suas obrigações constitucionais. Quando nos transferimos aos Municípios, observamos uma evolução favorável, em que temos em torno de 74% dos Prefeitos brasileiros cumprindo o que determina a Emenda Constitucional nº 29.

E a União agora está colocada diante da chamada tomada de decisão que precisa ocorrer.

O que está posto: o projeto de lei que apresentei estabelece que 10% da receita corrente bruta tem de ser aplicada na área da saúde. O do Deputado Gouveia, a mesma coisa. Consegui participar, envolvi a assessoria, num amplo debate com o movimento sanitário nacional, com técnicos do Ministério da Saúde, com outros Parlamentares e agentes públicos, para que achássemos a equação definitiva.

Definimos 33 itens que apontam as obrigações do que é gasto, definitivo e específico, com a saúde, o que não é gasto com saúde, e como podemos intervir. Por exemplo, alguns Governadores pagam pensão de policiais militares e dizem que estão gastando com saúde; outros compram arroz para merenda escolar e dizem que aquilo é gasto com saúde; outros dizem: “Estou fazendo uma ponte, e isso é saneamento básico; portanto, é gasto com saúde”.

Então, não tinha eficácia a norma constitucional, porque não resolvemos aprovar. Então, o debate, que é a crise da saúde, diz respeito a dois elementos: gestão e funcionamento, que ficam completamente frágeis quando não temos a regulamentação da Emenda Constitucional nº 29, que foi exatamente o esforço que tive.

Olha a ousadia da matéria, Senador Mão Santa: alterar os arts. 34, 35, 156, 160, 167 e 198 da Constituição Federal.

Não foi fácil o movimento amplo para a aprovação de tal matéria. Naquela época, foi muito importante a participação do movimento sanitário como um todo. Tive o prazer de estar ao lado de tantos quantos pude na aprovação, e não posso deixar de reconhecer a importância e a determinação política do então Ministro José Serra em sua aprovação. São Paulo começa a ter suas dúvidas, neste momento, porque não tem a segurança orçamentária da capacidade de fazer cumprir suas obrigações com a regulamentação da Emenda Constitucional nº 29 nos moldes determinados. Outros Governadores começam a demonstrar suas inseguranças, o que não é adequado. Não temos ainda 60% dos Governadores brasileiros cumprindo a Emenda Constitucional nº 29.

Então, temos de avançar nesse debate. É muito rico poder estabelecer o que é gasto específico com saúde. Quinze por cento dos gastos com saúde serão destinados para ações básicas de saúde, considerando o que são as ações básicas e o que não pode ser considerado gasto com saúde, como fazer uma ponte, pagar pensão de policiais militares, comprar arroz e dizer que isso é gasto com saúde. Só assim vamos superar esse drama das filas e do sofrimento humano dentro do Sistema Único de Saúde, um dos melhores sistemas de toda a história da Humanidade na área de gestão, mas que encontra a crise do financiamento aliado à própria gestão como barreiras ao seu desenvolvimento adequado.

A área de educação avançou porque houve toda uma etapa de responsabilidade, de envolvimento, de controle de gestão, e o financiamento foi assegurado. E a área de saúde não consegue proporcionar a mesma correspondência, porque não há a regulamentação da norma constitucional.

Portanto, faço um apelo para que, amanhã, na Comissão de Assuntos Econômicos, dirigida pelo Senador Aloizio Mercadante, que já me assegurou o compromisso de que colocará como Item nº 1 da pauta essa matéria, possamos tê-la aprovada.

Espero que a Relatora, Senadora Patrícia Saboya, que se sensibilizou, discutiu a matéria com o Governador do Ceará, ouviu recomendações de outros Governadores, possa fazê-lo.

O Senador Francisco Dornelles, em discussão comigo, apresentou uma emenda que pode ser o ponto de entendimento: em vez de aprovarmos a responsabilização da União em 10% das receitas correntes brutas, responsabilizá-la pela variação nominal do PIB, já que hoje temos o gasto do exercício financeiro anterior, e o mínimo que se pode fazer é acrescentar ou não outros itens.

O Governo Lula, ao pegar as despesas com saúde, viu o gasto do Governo anterior, em 2002, em torno de R$28 bilhões a R$29 bilhões, e hoje estamos caminhando para uma cifra superior a R$50 bilhões em gastos com saúde - R$49 bilhões a R$51 bilhões é a expectativa que fica para este ano. Se aprovarmos essa matéria, estaremos caminhando com pelo menos R$3,5 bilhões a mais.

Há detalhes que ficaram das emendas apresentadas pela Senadora Patrícia Saboya e outros Senadores, que dizem respeito, por exemplo, como defendo, à regulamentação de que município com menos de 30 mil habitantes que aplique em saneamento básico pode ser considerado gasto com saúde. Isso porque aí está o foco da mortalidade infantil, aí está o foco das internações hospitalares pelas doenças por transmissão hídrica, aí está o foco da qualidade de vida como um todo para essas pessoas, para as chamadas mortes e doenças evitáveis, já que só a crise de saneamento básico, nessas pequenas localidades, gera internações da ordem de 880 mil pessoas, por ano, dentro do Sistema Único de Saúde. Então, a emenda aumenta o limite para 50 mil habitantes, considerando que isso poderia abranger um número maior de Municípios. É um debate compreensível, e eu ficaria com os 30 mil, mas vou respeitar.

Gastos com servidores. Aqui diz que só pode ser considerado gasto com servidor da saúde aquele utilizado para servidor em exercício, em plena atividade. A Senadora Patrícia, em diálogo com alguns Governadores, entende que se tem de estabelecer o gasto no déficit do que é a arrecadação previdenciária atual mais a despesa desfavorável com os aposentados ligados ao setor de saúde.

Portanto, o déficit previdenciário desses setores seria uma reposição considerada gasto com saúde por parte do Governo do Estado. É algo que estamos discutindo, para vermos até onde é possível ceder. Agora, só entendo que não podemos deixar de votar amanhã e levar essa matéria para a Câmara dos Deputados. O Deputado Arlindo Chinaglia, Presidente da Câmara dos Deputados, está de prontidão, extremamente sensibilizado. Assumiu um compromisso que votará a regulamentação da Emenda nº 29 este ano ainda.

Então, a minha expectativa é a melhor possível, desde que não haja nenhum tipo de protelamento ou de discussão que possa significar encolher, reduzir, desfazer, desfigurar uma matéria que garantirá a eficácia à norma constitucional daquilo que foi o sonho dos sanitaristas dos anos 20, como Carlos Chagas, como Oswaldo Cruz, que o antecedeu, e outros que determinaram um novo caminho para a saúde pública brasileira.

Senador Mão Santa para um aparte.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Tião, hoje mesmo fiz crítica à Presidência das duas Casa, ao Chinaglia e ao Renan, sobre isso. Eu, Governador do Estado, vim aqui, com outros, debater sobre esse assunto. Quer dizer, já estamos aqui há quatro anos e nove meses. Governador de Estado, eu participei do debate.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - O projeto é de 2002. Cinco anos.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Pois é. Quer dizer, todos sabemos que educação no Brasil chegou muito tarde. A universidade, em 1920; ali, no Peru, muito antes, há quatrocentos anos, o Vice-Rei da Espanha já tinha colocado a Universidade de São Marcos. Mas os pilares da sociedade são estes: segurança... Como diz Norberto Bobbio, o mínimo que um Governo tem que oferecer a seu povo é segurança à vida, à liberdade e à propriedade.Nós estamos fracassados. A educação melhorou com aquelas exigências de 25% dos Municípios e alguns, de até 30%. E essa Emenda nº 29 que salvaguardava, e sabiamente o Município, que é a sede, deve participar com 15%, e o Governo do Estado... Hoje mesmo nós fizemos críticas. Por isso, parabenizamos e cumprimentamos V. Exª por estar sempre atento em dar essa grande colaboração ao Governo do Luiz Inácio, porque sabemos que a saúde está muito precária. Está muito bom para nós aqui, Senadores. E, de quando em quando, chega um funcionário, quer ir para São Paulo fazer exame. Então, está bom para nós, para quem tem esses planos de saúde, para quem tem dinheiro, mas, para o povo, está difícil. Então V. Exª presta mais um extraordinário serviço ao Governo Luiz Inácio e à valorização do Congresso. Hoje mesmo o Papaléo fez um discurso mostrando as falácias da saúde, e eu fiz uma intervenção, dizendo que uma das vergonhas do nosso Parlamento, mais do que os imbróglios que estão aí, são essas coisas de utilidade que V. Exª repara e que, com isso, engrandece este Congresso.

O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC) - Agradeço a V. Exª que traz uma observação solidária ao pronunciamento que faço, Senador Mão Santa.

Veja o valor que nós teríamos que estabelecer: de fato 75% dos gastos da receita em saúde seria dividida pelo número de habitantes, por habitantes em si, em cada unidade federada deste País; teríamos 25% nos termos da Lei nº 8080, de 1990, que determina, organiza, estabelece o que são as grandes diretrizes do Sistema Único de Saúde; e 5% por metas pactuadas entre o gestor estadual, municipal e o gestor federal, do que o inverso da capacidade instalada. Ou seja, em vez de os doentes migrarem para o Centro-Sul, para São Paulo, para o Rio de Janeiro, para Minas para recorrer, não. Eles começariam a ter investimentos diferenciados em tecnologia e resolutividade nas suas regiões, para que pudessem, um dia, ter a sua autonomia também em saúde. Então, é um projeto absolutamente racional e nos termos das necessidades da população.

Veja a riqueza de estabelecer um vínculo direto de gastos com saúde. E muitos Governadores e Prefeitos não têm sensibilidade para reconhecer a vigilância em saúde, incluindo a epidemiológica e a sanitária, pois poucos gastam ou entendem isso como um gasto importante à saúde; a atenção integral e universal à saúde em todos os níveis de complexidade, incluindo a assistência terapêutica e a recuperação de deficiências nutricionais; capacitação do pessoal de saúde do SUS; desenvolvimento científico e tecnológico e controle de qualidade promovidos por instituições do SUS; produção, aquisição e distribuição de insumos para os serviços de saúde do SUS, tais como imunobiológicos, sangue, hemoderivados, medicamentos e equipamentos médico-odontológicos; saneamento básico de domicílios ou de pequenas comunidades, desde que aprovado pelo Conselho de Saúde do ente da Federação financiador da ação; saneamento básico dos distritos sanitários especiais indígenas; manejo ambiental vinculado diretamente ao controle de vetores de doenças; apoio administrativo realizado por instituições do SUS, desde que vinculado à execução das ações relacionadas neste artigo; gestão do sistema público de saúde e operação de unidades prestadores de serviços públicos de saúde; a remuneração do pessoal de saúde em atividade nas regiões.

E o que não constituirão despesas com saúde. Especifico completamente, também, o que não são gastos com saúde, porque algo grave são os desvios que ocorrem hoje e trazem prejuízo direto à população. E, também, o que se considera devam ser os 15% de gastos em ações básicas de saúde com todos os itens do que são gastos efetivos com ações básicas de saúde.

Então, Sr. Presidente, fica nas mãos do Parlamento aquilo que é uma sua prerrogativa.

Este Parlamento teve a coragem de aprovar a Emenda nº 29, de estabelecer a responsabilidade mínima e direta dos Municípios, dos Estados e da União. Agora, tem de regulamentar, tem de dar eficácia à norma constitucional.

Esse desafio não pode sair das nossas mãos. Espero que a Comissão de Assuntos Econômicos, amanhã, esteja atenta.

Hoje, o jornal O Estado de S. Paulo, por meio do jornalista Ribamar Oliveira, prestou sua homenagem, mostrando-se atualizado e comprometido com o tema. Trouxe observações importantes sobre o que significa o PAC em relação às áreas de saneamento básico, sobre qual é a limitação, de apenas R$1,2 bilhão para as áreas de saneamento básico, o que significa uma emenda que amplia para 50 mil habitantes os gastos com saneamento básico.

O debate está posto. Entendo se nós dissermos que o PAC da saúde foi uma homenagem do Congresso Nacional a esse tempo, aos desafios que tivemos. Dizem que as crises da saúde são frutos do financiamento e da gestão. Aqui estaria o PAC da saúde, independente do Governo. Seria a aprovação da regulamentação da Emenda nº 29.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/10/2007 - Página 33496