Discurso durante a 165ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à prorrogação da CPMF. A crise do setor de saúde no País.

Autor
Valter Pereira (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Valter Pereira de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. TRIBUTOS.:
  • Posicionamento contrário à prorrogação da CPMF. A crise do setor de saúde no País.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2007 - Página 32808
Assunto
Outros > SAUDE. TRIBUTOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DESVIO, DESTINAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), AREA, SAUDE, ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SAUDE PUBLICA, HOSPITAL, CONDIÇÕES DE TRABALHO, MEDICO, OMISSÃO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, REGISTRO, PARALISAÇÃO, CATEGORIA PROFISSIONAL, SERVIÇO PUBLICO, ESTADO DE ALAGOAS (AL), ESTADO DA PARAIBA (PB), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ESTADO DO CEARA (CE), ESTADO DE SERGIPE (SE).
  • ANALISE, VALOR, TABELA, REMUNERAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), CONSULTA, EXAME, TRATAMENTO, COMENTARIO, AUSENCIA, RESPONSABILIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ANTERIORIDADE, PROBLEMA, SAUDE, REGISTRO, DADOS.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PRORROGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), DESRESPEITO, VINCULAÇÃO, TRIBUTOS, SAUDE, ALEGAÇÕES, INCOERENCIA, VOTO FAVORAVEL, CONTRIBUIÇÃO.
  • REGISTRO, VOTO CONTRARIO, ORADOR, PRORROGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), DEFESA, PRIORIDADE, SAUDE PUBLICA, NECESSIDADE, GARANTIA, APLICAÇÃO DE RECURSOS.

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Serys Slhessarenko; Srªs e Srs. Senadores, o médico Adib Jatene receitou a CPMF para tratar a saúde pública. E, de fato, ela sofria de grave enfermidade financeira.

O então Presidente Fernando Henrique descobriu que o remédio era a vitamina ideal, mas para engordar o superávit primário. E passou a apropriar-se da maior parte de suas receitas.

Assim, Srª Presidente, o tributo que era apenas para salvar vidas humanas foi destinado também para a saúde das contas públicas do nosso País.

            As conseqüências estão amargando até hoje. São hospitais sucateados, filas degradantes, macas substituindo camas, corredores substituindo leitos. Há poucos dias, a televisão noticiou atendimento médico no jardim de um hospital, sem falar, Senador Mão Santa, daquela paciente que anteviu, em declaração feita a uma emissora de televisão, que, se não fosse atendida, pereceria. E, de fato, acabou falecendo.

Os maus tratos e a omissão de socorro habituais estão provocando mortes plenamente evitáveis, Sr. Presidente, e espalhando o luto e a dor. Estou falando sobre fatos que estão nas páginas dos jornais, nos noticiários das rádios e da televisão, fatos que nem comoção pública acarretam mais, já que se incorporam a uma rotina mórbida, a uma resignação humilhante e à banalização da própria vida. E, mais grave, a vítima de tais mazelas é o pobre, aquele que não tem plano de saúde, aquele que é dependente exclusivo do Sistema Único de Saúde, o SUS.

As manifestações e paralisações de médicos da rede pública de Alagoas, da Paraíba, de Pernambuco, do Ceará e de Sergipe não esgotam as áreas onde o descaso faz as suas vítimas

Em todo o território nacional, a rede pública vem mostrando claros sinais de exaustão. Em alguns pontos, Estados e Municípios vêm assumindo obrigações que seriam da União e gastando mais do que lhes caberia, sacrificando, assim, outras prioridades.

Com tais atitudes, governadores e prefeitos acabam contornando defasagens que comprometem a prestação de serviços médico-hospitalares.

Há casos em que são os médicos e hospitais que se submetem a condições degradantes para não interromper o atendimento a quem procura socorro para enfrentar a dor e a doença.

São os profissionais mais leais à causa e mais fiéis ao juramento que fazem na colação de grau. No entanto, Sr. Presidente, essas atitudes voluntariosas que têm conseguido contornar uma maior disseminação desse verdadeiro apagão que ocorre na saúde pública não podem servir de biombo para esconder o descaso do Governo com área tão delicada: a área que trata da vida humana.

E o maior pouco caso, Sr. Presidente, ocorre quando o Governo tranca os seus cofres para a saúde pública! Basta atentar para alguns valores da tabela de remuneração do SUS. Por uma consulta, o Sistema paga R$7,55. Com esse valor, é difícil comprar um pacote de arroz com cinco quilos. Na hipótese de um parto normal, o hospital recebe R$186,05. Além da maternidade, o trabalho da equipe médico-hospitalar que faz o acompanhamento recebe R$125,84. A hemodiálise, tratamento extremamente delicado e indispensável para os renais crônicos, é remunerada com o valor de R$130,51.

É bem verdade, Sr. Presidente, que o Presidente Lula não é o precursor desse apagão, nem o Ministro José Gomes Temporão pode ser responsabilizado pelas mazelas que contaminam a saúde pública. Têm eles a responsabilidade pelo que acontece no atual Governo, mas é preciso ficar claro que essas mazelas vieram antes dos dois.

Foi por isso que o Congresso Nacional, já em 1996, aprovava a CPMF. Rendia-se aos apelos de um respeitável médico, o então Ministro Adib Jatene, que advertia duramente para as conseqüências da falta de recursos e postulava um tratamento de choque que exigiria grande soma de dinheiro para viabilizá-lo.

No ano 2000, a Câmara e o Senado dão um novo e importante passo para enfrentar esse grave problema: aprovam a Emenda Constitucional nº 29. Essa emenda determinou a vinculação de recursos à saúde no orçamento das três esferas do Poder. Estados ficaram compelidos a gastar 12%; municípios, 15% de suas receitas. A União obrigava-se a aplicar o orçamento do ano anterior acrescido da variação do PIB nacional.

Para frustração de quantos acreditavam no inspirador da CPMF, o festejado Dr. Adib Jatene deixou o Ministério. Parte do dinheiro novo foi parar nos cofres da Fazenda Pública. O que era da saúde foi para o superávit primário. A contabilidade pública foi mais importante, tanto na avaliação do governo anterior como do atual, que o ser humano. E o povo continuou e continua desassistido.

O que se esperava é que o Presidente Lula, em cujo passado desferira tantas críticas a esse menoscabo com a saúde e à própria criação e cobrança da CPMF, ousasse interromper esse nefasto desvio de finalidade da CPMF. No entanto, não foi isso que aconteceu.

Hoje, ele aposta todas as suas fichas na renovação desse tributo. E mais grave: quer renovar o tributo, mas não quer renovar o compromisso de aplicá-lo integralmente na saúde.

Presenciar a crise em todos os hospitais e ambulatórios, testemunhar a indigência das tabelas do SUS para consultas, exames, cirurgias e não ouvir nenhum compromisso do Governo no sentido de destinar esse imposto disfarçado de contribuição para sua finalidade original é compartilhar com a avidez perniciosa do Fisco e avalizar a indiferença do Governo com o sofrimento do povo.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Valter Pereira?

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Honra-me, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - É muito mais triste a tabela do que o que V. Exª está apresentando. Isso daí ainda é descontado. A mesma consulta que o médico, teoricamente, receberia, ele a recebe a R$2,50 líquido, porque é descontado por 76 impostos. Há aqueles que fazem, por exemplo, citologia oncológica e, como V. Exª falou, hemodiálise, cuja medicação é importada. E isso não pára: o instrumental e o material são gastos em uma consulta médica. Ainda há mais um agravante: eles saem credenciando, e muitos desses médicos recebem quase seis meses depois. Esse Governo está acabando com a classe médica, que está desesperada. Nunca se via médico em greve. Eles estão lutando pela sobrevivência. Uma manchete do jornal de Fortaleza, cuja Prefeita é do PT, diz que lá se pagam R$720 a um médico do melhor pronto-socorro municipal que existe, que é o José Frota. Fui interno lá, ganhava quase esse salário no tempo da ditadura - o prefeito era Murilo Borges - como acadêmico, universitário bolsista. Então, hoje se vê usualmente médico com 94 anos trabalhando, porque as aposentadorias são ridículas. Muitos desses credenciamentos, essas consultas... Esse Governo é velhaco! Só faz cobrar os impostos. Não estão pagando médico, não. Ele atrasa de quatro a seis meses.

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Agradeço o aparte de V. Exª, que, tenho certeza, enriquece sobremaneira a nossa fala sobre esse assunto, que é a fala do Congresso. O Congresso hoje fala sobre saúde...

(Interrupção do som.)

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Obrigado. Já estamos concluindo o nosso pronunciamento, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, de nada adianta um sanitarista do porte do Ministro José Gomes Temporão, tão festejado por seus conhecimentos científicos, por sua visão racional e por sua indômita vontade de enfrentar os problemas da saúde e de fazer uma verdadeira revolução nessa área, se as suas armas ficam presas nos cofres da Fazenda e a prioridade do Governo é sempre o superávit primário, e não a saúde da população.

Com uma das maiores cargas tributárias do planeta, só justificaria seguir sangrando o contribuinte se fosse para tirar a saúde pública da UTI e se o Governo estivesse contendo os gastos públicos. Sabendo que a gastança segue crescendo e que a renovação do tributo não vai pôr fim ao desvio de sua finalidade, não é coerente aprovar a prorrogação da CPMF nos termos em que foi proposta. Se for para manter a saúde pública nessa situação de penúria, o Congresso deve avaliar muito bem antes de dar mais uma prorrogação à CPMF.

O meu Partido, o PMDB, faz parte da Base do Governo, como V.Exª sabe, como todos os Senadores têm conhecimento, e tem contribuído decisivamente para a governabilidade do País. Esse é o nosso compromisso.

(Interrupção do som.)

O SR. VALTER PEREIRA (PMDB - MS) - Peço mais um minuto para concluir, Sr. Presidente.

Com histórico arraigado de fidelidade partidária, tenho observado, disciplinadamente, o compromisso com a governabilidade que o meu Partido assumiu, e vou continuar observando. Todavia, é preciso ficar claro: esse pacto não pode transformar a mim nem a outro parlamentar do meu Partido num robô que obedece comandos, mesmo que incoerentes e inconseqüentes. E não existe incoerência maior do que prorrogar a drenagem de um imposto que veio para salvar a saúde pública exatamente no momento em que toda essa rede de assistência se agoniza, semeando a dor e o sofrimento.

Assim, Sr. Presidente, Srs. Senadores, sem nenhum rompimento com o Governo, quero anunciar a minha posição contrária à CPMF, nos termos em que está proposta e que fora aprovada na Câmara dos Deputados. Se o Governo, aqui no Senado, partir para uma negociação que coloque a saúde pública como prioridade e que inclua na proposta instrumentos eficazes para garantir a aplicação desses recursos - e, entre esses instrumentos, é preciso ficar muito claro que é necessária uma sanção, uma penalidade para o administrador responsável pelo seu descumprimento -, estarei plenamente à vontade para votar a CPMF. Mas, nos termos em que está posta a renovação da CPMF, devo anunciar a V. Exª que não posso concordar.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2007 - Página 32808