Discurso durante a 177ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a fidelidade partidária.

Autor
Garibaldi Alves Filho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RN)
Nome completo: Garibaldi Alves Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Considerações sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a fidelidade partidária.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2007 - Página 34820
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, PRESENÇA, SENADO, DIRETOR, CINEMA.
  • ANALISE, EFEITO, NATUREZA POLITICA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), REFERENCIA, FIDELIDADE PARTIDARIA, RECONHECIMENTO, DIREITOS, TITULARIDADE, PARTIDO POLITICO, MANDATO ELETIVO, JUSTIFICAÇÃO, OPINIÃO, ORADOR, INCONSTITUCIONALIDADE, PERDA, MANDATO, FALTA, REGULAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, OMISSÃO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, CONGRESSO NACIONAL.
  • APREENSÃO, INTERFERENCIA, JUDICIARIO, POLITICA PARTIDARIA.
  • OPINIÃO, DIREITOS, ELEITOR, POSSE, MANDATO ELETIVO, INDEPENDENCIA, PARTIDO POLITICO, CANDIDATO ELEITO.
  • ANALISE, DIREITO CONSTITUCIONAL, AUTONOMIA, PARTIDO POLITICO, EFEITO, AUTORITARISMO, DIRIGENTE, PERDA, LEGITIMIDADE, REPRESENTAÇÃO POLITICA, ASSOCIADO, NECESSIDADE, GARANTIA, RECIPROCIDADE, FIDELIDADE, AMBITO, RESPEITO, PROGRAMA PARTIDARIO, ESPECIFICAÇÃO, OCORRENCIA, AFASTAMENTO, JARBAS VASCONCELOS, PEDRO SIMON, SENADOR, MEMBROS, COMISSÃO, URGENCIA, REFORMA POLITICA, PROTESTO, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Mão Santa, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, também quero dirigir minha saudação à cineasta que, ao lado da sua produtora, dá-nos a honra da sua presença neste instante. Espero que os contatos que ela vem mantendo aqui sejam proveitosos para a realização do seu objetivo.

Sr. Presidente, venho aqui falar sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal em torno da fidelidade partidária. O debate sobre essa decisão foi, no primeiro momento, muito pobre, Sr. Presidente. Foi um debate que não nos deixou antever suas conseqüências. Agora, pretendo encarar essas conseqüências, Senador Paulo Paim, não pelo aspecto jurídico, mas muito mais pelo aspecto político.

O Tribunal julgou mandados de segurança contra atos do Presidente da Câmara dos Deputados, que se negara a cassar os mandatos de vários parlamentares, a pedido de Partidos políticos, dando posse aos respectivos suplentes. Por ser assim, conforme a técnica processual até aqui vigente, tinha o Supremo dois caminhos a seguir: ou concedia o mandado de segurança, porque os Partidos tinham o direito líquido e certo alegado, ou o denegava, precisamente porque, em sentido inverso, os Partidos não tinham esse direito líquido e certo. Denegado o mandado de segurança, estava convalidado o ato da Presidência da Câmara dos Deputados, e mantidos estavam os Deputados no exercício dos seus mandatos.

Foi isso o que aconteceu, porque nenhum mandato foi cassado pela decisão do Supremo Tribunal Federal. Estava delineada, portanto, a conclusão: o Supremo Tribunal considerou que o mandato é dos Partidos, e quem abandona o Partido deve deixar com ele seu mandato, o que só poderá ocorrer - e isso será objeto de uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral - depois do dia 27 de março, data da resolução do Tribunal Superior Eleitoral.

A história começa aí, mas ela tem um desfecho surpreendente, não só por esses aspectos de inovador arrojo na pratica judiciária, mas especialmente pelo núcleo da argumentação da maioria da Corte, no sentido de ser titular do mandato o Partido, não o cidadão eleito pelo povo.

Sr. Presidente, em uma aparente leitura da Constituição, fora do seu sentido literal, temos que a Câmara dos Deputados não é composta de representantes do povo, como este Senado é composto de representantes dos Estados. A Câmara passa a ser composta por representantes dos Partidos.

Quanto ao primeiro aspecto, Sr. Presidente, sempre se observou no Brasil a regra constitucional segundo a qual às Casas do Parlamento cabe o julgamento dos seus membros, como está acontecendo agora com relação ao Presidente da Casa. Mas não está incluída a fidelidade partidária no elenco das causas de perda de mandato inscrito na Constituição. E, exatamente em face dessa omissão da Constituição, cujo silêncio sobre o tema é eloqüente, será preciso que o Tribunal Superior Eleitoral se substitua ao Congresso Nacional, para, por meio de resolução, disciplinar o que a Constituição e as leis não disciplinam.

As conseqüências disso, Srs. e Srªs Senadores, são evidentes e contribuem para o crescente empobrecimento da atividade legislativa do Congresso, já diminuído pelo proliferar de edições de medidas provisórias pelo Poder Executivo.

Por outro lado, Sr. Presidente, Senador Mão Santa - esta parece ser a questão mais grave, que não foi ainda devidamente percebida e absorvida pelo meio político -, num olhar sobre as conseqüências da deliberação do Supremo Tribunal Federal, haverá a intervenção do Judiciário em questões partidárias ou na disciplina da ação dos Partidos políticos, o que nunca houve e só pode despertar iguais apreensões.

Embora, hoje, haja muitas dúvidas sobre o real alcance do que foi decidido pela Suprema Corte, num primeiro instante, o que parece haver é a subordinação do mandato parlamentar aos Partidos políticos, a pretexto de se coibir e punir a infidelidade partidária.

A respeito de fidelidade partidária, o orador que está aqui, nesta tribuna, pode falar - e o Senador Mão Santa sabe disto - com absoluta franqueza, porque defendo a fidelidade partidária com intransigência nos seus contornos políticos. Mal saído da adolescência, obtive meu primeiro mandato pelo MDB, em 1970 - lá se vão mais de 20 anos -, e, no PMDB, permaneci sob a liderança de Ulysses Guimarães e, no plano regional, do Ministro Aluízio Alves e do Presidente Tancredo Neves.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - São 37 anos.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - São 37 anos.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - De 1970 a 2007.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Já fez a conta, não é? Não é difícil de fazê-la. Muito obrigado, Senador Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - O MDB foi transformado em PMDB, salvo engano, de 1979 para 1980.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - V. Exª não nega que já passou pelo MDB, não é verdade?

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Ingressei, em 1977, no MDB. Foram extintos o MDB e a Arena em 1979, e, em 1980, participei da fundação do PT. Já são 27 anos desde a fundação do PT e quase igual tempo da fundação do PMDB, que sucedeu o MDB.

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Lamento que V. Exª tenha deixado o MDB, o PMDB, mas, ao mesmo tempo, conforta-me ver V. Exª, cada vez mais, defendendo aquelas grandes causas e princípios que construíram o MDB.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Por isso, tenho tanta afinidade com essas causas e com os amigos do PMDB até hoje!

O SR. GARIBALDI ALVES FILHO (PMDB - RN) - Obrigado, Senador Suplicy.

Na verdade, não vim aqui para falar sobre minha vida política, embora ela tenha sido pautada, ostensivamente, pela fidelidade partidária. Vim dizer que não creio que se possa submeter o mandato popular, outorgado pelo povo aos seus escolhidos, aos Partidos políticos. E aí, perdoem-me, são todos os Partidos, sem exceção; não estou generalizando, o que estou dizendo é que todos têm seus pecados. Vamos, portanto, falar a respeito dessa autonomia que a Constituição assegura aos Partidos e que vem sendo usada não para fortalecê-los e arejá-los com a prática democrática, mas para transformá-los em feudos de caciquismo, Sr. Presidente. A autonomia prevista na Constituição dá às direções partidárias a propriedade nua e crua das legendas, especialmente se olharmos para o tratamento dado às bases dos Partidos e aos seus núcleos municipais.

Sob o ponto de vista teórico, Senador Delcídio, o modelo é primoroso, pois contamos, nas bases municipais, com os filiados aos Partidos, sendo que, nessa instância, abre-se a possibilidade de participação direta nas deliberações partidárias. Dessa forma, os Partidos seriam canais de expressão de parcela da opinião pública, justamente porque suas bases municipais são formadas por filiados, eleitores comuns, que seriam os condutores de toda a atuação do Partido.

De fato, em eleições diretas e em convenções municipais, são eleitos não só os dirigentes no Município, mas também os delegados para as instâncias hierarquicamente superiores. Mas, Sr. Presidente, sabemos como, muitas vezes, constituem-se cartorialmente esses Partidos. Inclusive, não estou aqui para atirar a primeira pedra, porque, se fosse atirar a primeira pedra, eu iria, Sr. Presidente, atirá-la no meu próprio Partido. Estou aqui para fazer uma reflexão sobre o desvirtuamento que, hoje, aniquila grande parte da legitimidade e da autoridade desses Partidos.

Houve, aqui, um pequeno acidente, e eu pediria aos nossos assessores que me pudessem providenciar o discurso. Ainda bem, Senador Delcídio Amaral, que não passei por aquele vexame de determinado orador que tinha um discurso no bolso do paletó, discurso que foi surrupiado por alguns amigos-da-onça, que deixaram o pobre do orador sem o discurso e sem a possibilidade de fazê-lo de improviso, porque ele não era dos mais versáteis oradores da Assembléia Legislativa do meu Estado. Não vou contar o nome do santo, contei apenas o milagre.

Sr. Presidente, volto a falar sobre essa fidelidade partidária. Vê-se, Sr. Presidente, não ser possível, com esses exemplos de que falei aqui, exigir-se fidelidade do filiado se o Partido não lhe é fiel, nem é fiel à opinião da maioria de seus correligionários. Quero citar o exemplo do que se passou com os Senadores Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon.

A fidelidade partidária está em evidência, mas essa evidência só se justifica se a fidelidade se estender aos Partidos. E fidelidade nos Partidos se afere na medida em que suas direções, em todos os níveis, estiverem em harmonia com o pensamento e as deliberações das bases. Para se exigir fidelidade aos filiados, o Partido deve, antes de tudo, ser a eles fiel. Isso só se obtém, Sr. Presidente, se, com a urgência mais absoluta, empreendermos a reforma da disciplina jurídica e, por conseguinte, da prática e da ação dos Partidos políticos no Brasil. Pode-se até dizer que isso aconteceu nesta Casa, porque o Senado, afinal de contas, enviou um projeto de reforma política para a Câmara dos Deputados, mas o projeto do Senado morreu, Sr. Presidente! Na Câmara dos Deputados, não houve quem o ressuscitasse, e ele morreu. Assim, estamos, hoje, sem uma reforma política contemporânea que atenda aos melhores anseios do povo brasileiro.

Quero terminar, Senador Mão Santa, dizendo que, diante do problema do tempo e sabendo que há outros oradores inscritos, mutilei este discurso, mas acredito que ficou bem claro que fidelidade partidária não é apenas fidelidade do filiado ao seu Partido, mas é também a fidelidade do Partido aos seus filiados, pois a militância dos Partidos, que se constitui na sua gênese, na sua força, existe em função da fidelidade dos Partidos aos seus filiados.

Sr. Presidente, deixo aqui essa palavra. Pode ser que não a aceitem como tal, mas não deixa de ser uma palavra de advertência, para que nossos Partidos e nossos dirigentes partidários reflitam e para que, quem sabe, depois da eleição que vem aí, possa haver uma reforma política verdadeira.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2007 - Página 34820