Pronunciamento de Pedro Simon em 19/10/2007
Discurso durante a 190ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Reflexão sobre artigo intitulado "Como endireitar um esquerdista", autoria de Frei Betto, publicado no jornal Correio Braziliense, edição de hoje.
- Autor
- Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
- Nome completo: Pedro Jorge Simon
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SISTEMA DE GOVERNO.
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- Reflexão sobre artigo intitulado "Como endireitar um esquerdista", autoria de Frei Betto, publicado no jornal Correio Braziliense, edição de hoje.
- Aparteantes
- Cristovam Buarque, Heráclito Fortes.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/10/2007 - Página 36730
- Assunto
- Outros > SISTEMA DE GOVERNO. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
-
- COMENTARIO, LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), AUTORIA, FREI BETTO, SACERDOTE, ANALISE, ALTERAÇÃO, IDEOLOGIA, GRUPO, OPOSIÇÃO, INFLUENCIA, PODER, GOVERNO.
- COMENTARIO, DETALHAMENTO, ATUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), COMPROVAÇÃO, ALTERAÇÃO, IDEOLOGIA.
- ELOGIO, ATUAÇÃO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VIAGEM, CONTINENTE, AFRICA, ANALISE, IMPORTANCIA, COMERCIO, PAIS ESTRANGEIRO.
- IMPORTANCIA, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, MELHORIA, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, INFLUENCIA, REELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
- ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), COMPARAÇÃO, QUALIDADE, ERRO, IMPORTANCIA, EMPENHO, EXTINÇÃO, CORRUPÇÃO, BENEFICIO, BRASIL.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, foi importante o pronunciamento do Senador Marcelo Crivella, mas S. Exª fica devendo informações sobre a viagem do Presidente Lula, que ele acompanhou.
Estou vendo nos jornais uma notícia muito importante: a reunião do Presidente Lula com o Presidente da África do Sul e o Primeiro-Ministro da Índia. Essa discussão deles é muito importante para a história do mundo. É verdade que eles formam um bloco de 1,5 bilhão de pessoas, mas 1,3 bilhão é a Índia. A Índia sozinha já é praticamente um quarto do mundo.
Mas estou aqui porque me emocionei com um artigo de hoje, no Correio Braziliense, do Frei Betto: “Como endireitar um esquerdista”. Eu tenho respeito pelo Frei Betto, que muitas vezes comparece à reunião do nosso grupo, que se reúne uma vez por mês para rezar a missa e fazer reflexões; e uma das reflexões foi ele que fez. Comunicou-nos que estava deixando a assessoria especial do Presidente Lula no Palácio. Continuava com a amizade, o carinho e o respeito que tinha pelo Presidente Lula, mas, como não tinha mais condições de ajudar, ia se afastar.
Pois bem; a solenidade era uma missa e, no meio da missa, se dá a palavra para um dos membros para, na hora do sermão, fazer uma exposição. Mas eu me intrometi naquele momento - todo mundo ficou olhando - e disse: “Olha, Frei Betto, eu acho que o senhor errou”. Todo mundo continuou olhando para mim, mas eu continuei dizendo: “O senhor devia ter ficado lá. A sua presença era muito importante, pois o senhor nos dava confiança como conselheiro. Mesmo que o senhor não tivesse como ajudar, o senhor devia ter ficado lá”. E ele assim respondeu - depois eu fiquei até encabulado: “A gente fica enquanto pode ajudar, mas se eu vi que eu ia prejudicar e não podia fazer nada, saí fora”.
Esse é o Frei Betto que está aqui no jornal. Uma coisa interessante! Lembro-me de que, quando era rapaz, jovem, um artigo publicado em uma revista que circulou durante algum tempo, falava da diferença entre o comunista e o simpatizante. Naquela época, o comunismo estava no ápice de seu prestígio, da sua credibilidade. No meio estudantil havia um debate muito intenso nesse sentido. E o artigo dizia o seguinte: o comunista é um cara que apanha da polícia, tem de pregar cartaz, pintar os muros, tem de viver pobre, meio maltrapilho, reunir-se na clandestinidade; enfim, é o diabo! Mas o simpatizante é um professor universitário, que poderá ocupar um cargo importante, viaja para o exterior, é convidado. É gostoso ser simpatizante. Não seja comunista; seja simpatizante! Nunca me esqueci disso, e lá se vão mais de cinqüenta anos. E agora me aparece o Frei Betto com esse artigo: “Como endireitar um esquerdista”.
Não quero nem entrar em detalhes se isso vale para o Governo atual. Vejo, na minha vida, três momentos em que senti isso que ele está dizendo. Quando nós, do velho MDB do Rio Grande do Sul, achávamos que éramos o novo cristianismo, que iríamos salvar o mundo, esse era o nosso ideal. E quando chegamos ao governo, vi que não sobrou muita coisa. Quando o PSDB chegou ao governo, praticamente o mundo estava se curvando perante a Social Democracia: era o Felipe Gonzalez na Espanha, que deu um salto enorme, era o Mitterrand com seu ideal, era o Primeiro-Ministro da Inglaterra, um jovem que assumia depois daquela mulher extraordinária, a Dama de Aço que tinha dominado a Inglaterra por três mandatos sucessivos. E ele chegava lá. Então, parecia que ia mudar. O que era o PSDB? Eram os puros do MDB. Eram contra o Quércia e criaram o MDB.
Fui convidado. O Covas foi ao Rio Grande do Sul, quando eu era governador. Ele insistia comigo. E eu dizia: “Mas, Covas, por que não fizemos isso dentro do MDB? O próximo Governador de São Paulo serás tu, Covas! Com Quércia ou sem Quércia, por que não fazem isso? Vou até fazer uma justiça: o Covas era o que menos queria, mas foi levado pelo Richa, que estava em briga no Paraná, pelo Pimenta, que estava em briga em Minas Gerais. E terminaram indo com Fernando Henrique, Serra. Eram os puros. Chegaram ao governo. E agora o PT.
Não vejo na história do mundo partido mais bonito, mais lindo, mais idealista do que o PT na Oposição. Tenho saudades do PT, do Suplicy ali, daquela moreninha, que agora disse que saiu do PT, que era secretaria da bancada dele.
Já contei aqui, repito, que disse para Dom Evaristo Arns: “Dom Evaristo, o senhor foi um dos lideres da fundação do PT; o senhor pegou as comunidades de base, estruturou e criou o PT, ensinou. Uma maravilha. Mas não ensinou o que era para fazer quando chegasse no Governo. O senhor tem culpa. O senhor os ensinou a chegarem lá, mas, ao chegarem lá, o que fazer?” Ele me deu uma resposta que nunca vou esquecer: “Mas, Senador, era uma gente tão pura que achei que seriam ordenados padres. Eram pessoas espetaculares. Nunca me passou pela cabeça que iriam mudar”.
Repito aqui que só se conhece um homem na vida pública quando ele tem a caneta na mão. Nem ele se conhece. Não tem a caneta na mão, é homem de oposição, é um líder etc. Por exemplo, o Paim um homem fantástico. Coloco as minhas mãos no fogo. Mas o Paim tem de sentar na cadeira de Governador - e eu acho que ele não muda - para a prova definitiva. Ali é que vamos ver se ele se dobra, se curva.
Dentro desse contexto, com o que se deu com o MDB, com a Social Democracia do Fernando Henrique e com o que está hoje acontecendo, que faço questão de ler, com tranqüilidade, este artigo:
Ser de esquerda é, desde que essa classificação surgiu na Revolução Francesa, optar pelos pobres, indignar-se frente à exclusão social, inconformar-se com toda forma de injustiça ou, como dizia Bobbio, considerar aberração a desigualdade social.
Ser de direita é tolerar injustiças, considerar os imperativos do mercado acima dos direitos humanos, encarar a pobreza como nódoa incurável, julgar que existem pessoas e povos intrinsecamente superiores a outros.
Ser esquerdista - patologia diagnosticada por Lênin como “doença infantil do comunismo” - é ficar contra o poder burguês até fazer parte dele. O esquerdista é o fundamentalista em causa própria. Encarna todos os esquemas religiosos próprios dos fundamentalistas da fé. Enche a boca de dogmas e venera o líder. Se o líder espirra, ele aplaude; se chora, ele entristece; se muda de opinião, ele rapidinho analisa a conjuntura para tentar demonstrar que na atual correlação de forças...
O esquerdista adora as categorias acadêmicas da esquerda, mas iguala-se ao general Figueiredo num ponto: não suporta cheiro de povo. Para ele, povo é aquele substantivo abstrato que só lhe parece concreto na hora de cabalar os votos. Então, o esquerdista se acerca dos pobres, não preocupado com a situação deles, e sim com um único intuito: angariar votos para si e/ou sua corriola. Passadas as eleições, adeus trouxas, e até o próximo pleito!
Como o esquerdista não tem princípios, apenas interesses, nada mais fácil do que endireitá-lo. Dê-lhe um bom emprego.
Não pode ser trabalho, isso que obriga o comum dos mortais a ganhar o pão com sangue, suor e lágrimas. Tem que ser um desses empregos que pagam bom salário e concede mais direitos que exige deveres. Sobretudo se for no poder público. O importante é que o esquerdista se sinta aquinhoado com um significativo aumento de sua renda pessoal.
Isso acontece quando ele é eleito ou nomeado para uma função pública ou assume cargo de chefia numa empresa particular. Imediatamente abaixa a guarda. Nem faz autocrítica. Simplesmente o cheiro do dinheiro, combinado com a função do poder, produz imbatível alquimia capaz de virar a cabeça do mais retórico dos revolucionários.
Bom salário, função de chefia, mordomias, eis os ingredientes para inebriar o esquerdista em seu itinerário rumo à direita envergonhada - a que age como tal, mas não se assume. Logo, o esquerdista muda de amizades e caprichos. Troca a cachaça pelo vinho importado, a cerveja pelo uísque escocês, o apartamento pelo condomínio fechado, as rodas de bar pelas recepções e festas suntuosas.
Se um companheiro dos velhos tempos o procura, ele o despista, desconversa, delega o caso à secretaria e à boca pequena se queixa do “chato”. Agora todos os seus passos são movidos, com precisão cirúrgica, rumo à escalada do poder. Adora conviver com gente importante, empresários, ricaços, latifundiários. Delicia-se com seus agrados e presentes. Sua maior desgraça seria voltar ao que era, desprovido dos afagos e salamaleques, cidadão comum em luta pela sobrevivência. [Deus o livre!]
Adeus ideais, utopias, sonhos! Viva o pragmatismo, a política de resultados, a cooptação, as maracutaias operadas com esperteza (embora ocorram acidentes de percurso. Neste caso, o esquerdista conta com o pronto-socorro de seus pares: o silêncio obsequioso, o faz-de-conta de que nada houve, hoje foi você [que caiu], amanhã pode ser eu...).
Lembrei-me dessa caracterização porque, dias atrás, cruzei num evento com um antigo companheiro de movimentos populares, cúmplice na luta contra a ditadura. Perguntou se eu ainda mexia com essa “gente de periferia”. E pontificou: “Que burrice a sua largar o governo [o Palácio]. Lá você poderia fazer muito mais por esse povo”.
Tive vontade de rir diante daquele companheiro que, outrora, faria um Che Guevara sentir-se um pequeno-burguês, tamanho o seu aguerrido fervor revolucionário. Contive-me, para não ser indelicado com aquela figura ridícula, cabelos engomados, trajes finos, sapatos de calçar anjos. Apenas respondi: “Tornei-me reacionário, fiel aos meus antigos princípios. E prefiro correr o risco de errar com os pobres do que ter a pretensão de acertar sem eles”.
Que texto profundo! Que texto profundo! Muita gente deveria ler seu conteúdo.
O Lula falou recentemente, da África - não sei se V. Exª ouviu, Sr. Presidente. O PT foi contra a CPMF, mas o PT era Oposição. Porém, quando se chega ao poder é que se entendem as necessidades, as exigências. E hoje ele entende que esse imposto é insubstituível e tem de ser aprovado. Tem sido assim em várias causas. O Governo, hoje, diverge do Partido que estava na Oposição ontem.
É verdade. Ser Governo não é muito “bom”!
Depois, nunca imaginei que o Lula tivesse tanto amigo! Conheci o Lula quando eu era Governador de Estado. Não sei se fui o único Governador, mas até o Dr. Ulysses o Lula não aceitou no segundo turno da eleição. Hoje, ele se arrepende e pede desculpas. Se ele tivesse aceitado o Dr. Ulysses no palanque do segundo turno, na primeira eleição, ele teria sido eleito naquela ocasião; e, talvez, tivesse sido muito bom: jovem, com ideais. Não seria este Lula, quarta vez candidato, com essas misturas e com essas alianças que ele fez, porque era a única maneira de ele chegar lá.
Fui para o palanque. Chorei de emoção ao sentir que o Lula estava eleito.
Acho que sou pé-frio, Sr. Presidente! Foi a coisa mais engraçada: o Lula estava em primeiro lugar, em todas as pesquisas; fui para o palanque e o apoiei. Todo o meu Governo foi comigo, com exceção de meia dúzia. E, uma semana depois, o Lula começou a ganhar. Houve aquele debate na televisão, na TV Globo. Acho que houve maldade da TV Globo, primeiro, porque o debate foi de duas horas e meia a três horas, lá pela meia-noite; segundo, porque o debate foi mais ou menos parelho. Mas o Jornal Nacional, da TV Globo, pinçou os erros do Lula e pinçou as frases espetaculares do Collor. E ele perdeu.
Mas aquele Lula, o Lula da caminhada, o Lula que não tinha nenhum compromisso em todas as campanhas dele, nem com dinheiro, nem com empresário, nem com burguês, nem com idéia, nem com nada, a não ser com o compromisso da bandeira dele, não nego.
Quando o Lula e o José Dirceu jantaram na minha casa, antes de assumir o Governo, houve uma insistência na perspectiva de eu assumir o Ministério. Não assumi, não levei o convite adiante. Eu achava que o PT, no Rio Grande do Sul, era intransigente conosco, mas fiquei magoado comigo mesmo. Muitos me diziam: “Pô, mas tu estás nisso aí há 50 anos. Agora chegou a hora de fazermos as coisas, e tu não aceitas, rapaz?” Eu achava que era a vez do Brasil. Achava.
Mas, hoje, há um pragmatismo. As pessoas me perguntam: “E a CPMF?” Digo a eles: “Não tenho nenhuma dúvida de que ela vai ser aprovada no Senado”. A força do poder é tão grande, que, quando ele diz que ela vai ser aprovada de qualquer jeito é porque vai ser aprovada de qualquer jeito. Custe o que custar. Isso é uma pena! Exigem que votemos a CPMF sem emenda. Podemos falar à vontade, mas a matéria tem de ser votada.
E assim são as coisas.
O Lula foi à África. Vi o Presidente e disse-lhe: “Achei que Vossa Excelência foi um privilegiado”, porque essa viagem, na minha opinião, foi excepcional. Unimo-nos aos africanos numa hora como essa, dialogamos com a Índia, que tem, com a China, esse progresso fantástico, com a África do Sul. Acho que é uma grande perspectiva. Vejam a grandeza do Lula: quando ele fala em fazer comércio com o mundo, África, Índia e Brasil, ele já se vira para outros países do Mercosul e da América do Sul e diz: “Como a África do Sul busca a África no seu todo, nós também o faremos”. E seria realmente fantástico um mercado comum: América do Sul, África e mais a Índia.
Esses são os grandes gestos. Essa é uma atuação. As pessoas vêm falar comigo: “Tu não achas que é um absurdo estar lá na África, de país em país?” Acho espetacular. Penso que determinados paises, pela primeira vez, estão recebendo um Presidente do Segundo Mundo. Espetacular! Mas não sei como as duas situações podem conviver ao mesmo tempo. Esse Lula! Acho o Chanceler do Itamaraty espetacular, acho que é um homem de Primeiro Mundo, de primeira grandeza, um grande nome, mas não entendo essas coisas miúdas que estão acontecendo.
Senador Cristovam, não sei se V. Exª leu o artigo do Frei Betto no Correio Braziliense. Fiquei emocionado. Creio que se tem de para. Alguém vai dizer: “Essas coisas do passado estão superadas, esse negócio de comunismo; hoje o mundo está globalizado e, na globalização do mundo, mercado é mercado, as realidades são essas, e temos de crescer baseados nisso”. Mas há princípios que podemos manter; há princípios que podemos manter: o da dignidade e o da seriedade são alguns desses princípios.
Por isso, levo meu abraço ao Frei Betto e gostaria que alguém levasse esse artigo para o Presidente Lula ler. Seria bom que ele lesse. Acho que lhe faria bem.
Pois não, Senador Cristovam, concedo-lhe um aparte.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Pedro Simon, V. Exª está trazendo uma reflexão que, a meu ver, vai além do Governo Lula, vai além dos partidos. É uma reflexão sobre o papel daquelas forças que a gente chamou de progressistas ou de Esquerda, como sempre foram chamadas. De início, quero dizer que estou totalmente de acordo no que se refere à política externa. O Presidente Lula, salvo um ou outro aspecto, salvo, às vezes, a mistura entre relações pessoais dele com chefes de Estado e relações de Estado, que são coisas diferentes, age de forma muito correta. O fato de haver mais 30 novas embaixadas brasileiras no mundo para alguns é desperdício, mas, ao contrário, é prova de que o Brasil está lá. É um retorno altíssimo, a um custo baixo, termos os pés, a cabeça e o coração nesses países todos. O fato de a maior parte dessas novas ser na África ou em países da Ásia, eu acho, é outra coisa fenomenal. Agora, o que é triste - e essa reflexão sua é importante, e o artigo de que o senhor falou durante o meu discurso, do Frei Betto, que eu fui ler logo depois, traz também essa preocupação - é a idéia de que nossas forças progressistas perderam todo o vigor transformador, acomodaram-se, entregaram-se à realidade. Isso é que me preocupa. Entregaram-se do ponto de vista do comportamento da política. Não há nenhuma diferença no comportamento do Lula, como Presidente, do comportamento dos Presidentes anteriores. Se tiver alguma diferença, é o fato de que ele tem mais carisma do que os de antes, ele é mais hipnotizador, no bom sentido - o Lula é um hipnotizador -, do que os outros, mas não houve uma ruptura, uma mudança de estilo na forma de fazer política. Não houve, também, na maneira de enfrentar o problema social. Ficou mais generoso, mas não ficou mais emancipador. Não houve um gesto, durante esses cinco anos do Governo Lula, para que a gente diga: o povo brasileiro está mais emancipado do que antes. Não houve. Está melhor atendido, é verdade; passa menos fome, é verdade; a renda subiu um pouco, é verdade, sobretudo quanto ao salário mínimo, mas não houve um processo de emancipação. E não é o Lula. As forças ao redor dele, todos os Partidos, não só o PT, nós, falemos assim, perdemos o vigor transformador, perdemos a capacidade de sonhar com algo que vá além. O Lula, como eu digo, se não é o melhor, é um dos melhores Presidentes que o Brasil teve, mas não é diferente dos outros, tanto que a gente diz que é melhor. Ninguém diz que Mandela - Senador Crivella, o senhor que tem tantos laços na África do Sul - é melhor do que os presidentes de antes. Ele é outra coisa. Não se compara Mandela com os de antes. Eu esperava isto do Lula: o Presidente do novo, do diferente, e não o Presidente do melhorzinho que os outros. A essa reflexão a gente deveria dedicar um tempo, porque não é o Lula. Somos nós, é o processo, é a perda de esperança, que vem também do fracasso de algumas das esperanças que nos eram vendidas no passado, vindas lá do Oriente, fosse China, fosse União Soviética, e que mostraram que não representam o caminho que a gente deseja. O fato é que a globalização e o neoliberalismo vieram para ficar, e criaram as amarras das quais a gente não vai sair. Não tem como! Na economia, não tem como mexer muito - e isso eu digo agora, dizia no Governo, quando eu era Ministro, e dizia antes. No Governo do Fernando Henrique Cardoso, quando saiu o Real, eu disse: não vejo como fazer diferente do que eles estão fazendo. E disse mais: há um gesto de genialidade nesses economistas que criaram aquela coisa de duas moedas, durante seis meses, até que uma sumiu e ficou a outra.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - No Governo Itamar.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - No Governo Itamar, é verdade. Tem razão, o Ministro da Fazenda era Fernando Henrique. Foi muito bem lembrado: Governo Itamar, a gente se esquece disso. O fato é que aqueles meninos que fizeram aquele plano mereciam até o Nobel de Economia, eu disse na época. Mas, naquela época, eu dizia, continuei dizendo e digo hoje: isso não quer dizer que a gente não deva mudar, é que o espaço da mudança é outro. É na saúde, é na moradia, é na educação, é no social, não é no econômico. Lamentavelmente, o Governo perdeu essa capacidade de vender sonhos. Havia, no Brasil, uma Esquerda que dizia ao povo: “Você vai ter algo diferente.”. Hoje, o que ouvimos são as forças do Governo dizerem: “Vocês já estão tendo tudo o que precisam. O salário mínimo já está melhor; já se pode medir em dólar o salário mínimo. Vocês já estão tendo renda e não tinham nenhuma.”. E acomodados. Para mim, o gesto mais negativo desses cinco anos do Governo Lula é o processo de acomodamento dos que traziam sonhos, dos que traziam propostas, dos que traziam projetos. Os sindicatos se acomodaram, os universitários ficaram quietos, o povo perdeu a capacidade de sonhar.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - O Presidente da CUT é Ministro, não vai querer que a CUT vá para a rua.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - É verdade, mas com um discurso modificado, porque se fosse Ministro executando o que falava, estava tudo bem, mas não.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É evidente.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Ele adaptou o discurso ao que faz e não o que faz ao discurso, e o povo perdeu a capacidade de sonhar, porque acha que já está tendo muito, na medida em que tem uma simples assistência. O Governo Lula é um governo generoso, mas é conservador, esse é o problema. É mais generoso que os anteriores e responsável, felizmente, embora, às vezes, a gente tenha dúvidas, porque os gastos estão crescendo demais, estão crescendo mais do que deveriam, mas não trouxe o que o PT falava antes: a falta de responsabilidade. Nessa reunião recente com o Vice-Presidente, o Senador Mercadante disse, quando o Tasso Jereissati cobrou dele que antes ele era contra a CPMF: “Naquela época, a gente não tinha sido Governo, então, não tinha a responsabilidade de Governo.”.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É a frase que diz tudo.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Eu, modéstia à parte, sou responsável desde antes de ser Governo e depois de ser Governo.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Por isso caiu fora.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Provavelmente.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Não entendeu que ser Governo é diferente. V. Exª pensou que era a mesma coisa.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Então, para mim, o pior é o que o senhor traz no seu discurso: a perda do vigor transformador, a perda da capacidade de sonhar com algo que vá além e não apenas com algo que melhore um pouquinho. Nós temos de reconhecer que é um Governo que tem grau de generosidade, no bom sentido. Tiremos o fato do risco nas contas públicas. Não, é bom ser generoso, desde que responsavelmente generoso, mas não basta ser generoso. É preciso fazer com que não se precise de generosidade, que é o que se chama de emancipação de todos, como Mandela fez com os negros da África do Sul em relação os brancos. O Lula tinha de fazer isso com os pobres em relação aos ricos. Uma vez, disse para ele, e, aliás, escrevi-lhe também uma carta: Presidente, o Mandela ficou na História porque garantiu que brancos e negros andassem na mesma calçada. O senhor ficará na História se conseguir que pobres e ricos estudem na mesma escola. A diferença é que Mandela fez isso com a lei, o senhor vai ter que fazer com um processo que vai levar muitos anos, mas tem de começar agora. Lamentavelmente, perdeu-se esse vigor transformador que caracterizava, antes, a Esquerda brasileira. Para concluir, finalmente, falo de um exemplo que vi no jornal e que me entristece. Eu também não gostaria de “fulanizar”, mas não há como não fazê-lo. Para mim, um dos ícones de todos nós da minha geração - que foi preso, saiu do Brasil graças à troca por Embaixador, em vez de ir para Paris foi para Cuba, treinou para voltar e fazer a revolução, teve de fazer cirurgia plástica, correu risco de vida a vida inteira, aqui, e conseguiu chegar ao Governo -, o ex-Deputado Dirceu, hoje, é lobista de empresas internacionais. Para mim, esse é um dos símbolos mais fortes da degradação da Esquerda. Não, não é ele, não. Não é ele! É das forças da Esquerda. É uma mudança muito radical. Um ícone! Um ícone da minha geração, um herói da minha geração, hoje, pelo que leio nos jornais, faz lobby, e ainda se chama de consultor. No fundo, é “lobismo” o que está fazendo. Isso é muito triste, não na figura dele, apenas, mas da minha geração inteira de militantes progressistas.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Já lhe darei o aparte, Senador Heráclito Fortes.
Eu era Líder do Governo Itamar, aqui no Congresso Nacional. O Senador Suplicy me procurou: “Senador, o PT tem um plano para o problema da fome. Queríamos uma audiência.”. Não me recordo se era com o Ministro da Educação, mas era com um Ministro do Governo. Eu olhei, vi e disse para ele: Não, o Lula e essa equipe do PT serão recebidos pelo Presidente da República, porque esse projeto é muito importante. Falei com o Presidente Itamar. O Itamar, o Ministro da Fazenda, o Ministro da Educação, enfim, uns seis Ministros fizemos uma reunião enorme, à mesa, com o Lula e mais uns dez do PT. Ele apresentou o projeto, a idéia que tinha, etc. e tal. O Itamar aceitou de cara. Trouxe o Betinho, o Bispo de Duque de Caxias e entregou-lhes o projeto, que não tinha nada a ver com o governo dele - o Betinho era um crítico permanente do Governo e o Bispo de Duque de Caxias também era um homem ligado ao PT. Entregou para os dois, Presidência e Secretaria-Geral, e foi lançado o projeto. Foi lançado o projeto de combate à fome e colocou-se na estrutura o Banco do Brasil.
Veio o Fernando Henrique, e botou até a esposa dele no Solidariedade. Foi um grande projeto. Entrou o Lula. Não há dúvida nenhuma de que o Lula está fazendo bem melhor do que o Itamar e bem melhor do que o Fernando Henrique. O Programa Bolsa-Família é altamente positivo. Concordo com V. Exª, V. Exª tem razão, é altamente positivo. Qual é o aspecto negativo? É que ele não é um meio, ele é um fim. O Bolsa-Família tinha de ser um meio para preparar o cidadão para ser cidadão. O Bolsa-Família até corre o risco de o cidadão ser menos cidadão e ser mais agente passivo. Eu tenho visto várias vezes isto. Tenho andado pelo interior e pessoas que estão no Bolsa-Família dizem isso: “Olha, Senador, eu estou vivendo muito bem. Fazia tempo que eu não vivia tão bem. Mas eu chego em casa, o senhor não calcula como eu me sinto mal. Porque eu sou um inútil. Eu estou ali tirando a comida do meu filho, etc e tal, porque eu não faço nada, não contribuo, eu quero é trabalhar”. Enquanto o PT não entender que este é o aspecto...O Bolsa-Família dá voto. Quem garantiu a reeleição do Lula, quando ele estava em queda, foi o Bolsa-Família. O Bolsa-Família é algo espetacular. Tu ganhas a eleição. Não precisas distribuir nem alimento, nem favor, nem isso, nem aquilo, porque o cidadão já está contigo. E só dizer: “Olha, se o outro ganhar, vai terminar com o Bolsa-Família”. Está ganha a eleição. E o Lula e o PT - parece-me - que se comprometeram com isso e acham que é suficiente. Este é o aspecto realmente negativo da questão. Agora, quando a pessoa se acomoda nessa questão e não vê a grandeza de olhar adiante, aí fica difícil. Aí fica difícil.
Concedo o aparte ao Senador Heráclito Fortes.
O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Pedro Simon, embora o pronunciamento seja de V. Exª, quero, aqui, provocar, no bom sentido, o nosso querido companheiro Senador Cristovam Buarque. O Brasil tem a tradição de moralizar estruturas e desmoralizar ideologias. Quando falo de estruturas, lembro-me bem do episódio envolvendo a máfia: o Sr. Buscheta, preso no Brasil, durante algum tempo, mafioso e procurado, foi o primeiro participante daquela corporação a fazer delação premiada dos companheiros, exatamente aqui no Brasil. E hoje, temos um artigo fantástico, lido pelo Senador Pedro Simon, do Frei Betto, mostrando que o Governo Lula desmoralizou a Esquerda no Brasil. É um fato. A Esquerda brasileira está desmoralizada pelo Governo. Fiquei muito feliz, primeiro porque tenho profunda admiração pelo Frei Betto, segundo porque o que ele afirma hoje aqui, eu disse no seu primeiro ano de Governo: que o PT estava mudando, não comprava mais na Casa Colombo, havia mudado para o Ricardo Almeida; não freqüentava mais prato feito, era o Porcão, embora soubesse o por quê; deixaram o Hotel Torre e foram Blue Tree; começaram a trocar de sapato; a usarem glostora no cabelo à moda antiga; o lenço saindo do bolso. Mudaram. Este artigo do Frei Betto, para mim, é antológico. Não havia tomado conhecimento dele ainda, quem me deu essa oportunidade foi o Senador Pedro Simon. Tanto que, confesso, perdi o vôo para ouvir o pronunciamento do Simon, porque acho fantástico o que diz o Frei Betto, e que me deixa muito tranqüilo, porque, uma das coisas que me deixava complexado era, ao tomar posição em algum assunto contrária ao interesse do Partido dos Trabalhadores, ser tachado de pertencer à Direita. E eu não sou. Se quiserem que eu seja da Esquerda, também não sou. Eu não sou de uma geração - e aqui ele descreve muito bem o que é Esquerda e o que é Direita - que tenha passado por esse privilégio. Sou de uma geração mais pragmática e objetiva. Então, não adianta, sou cabeça dura. Não me bote para cá nem me bote para acolá. Sou coerente e objetivo. Acho que o Frei Betto, hoje, me dá um certo conforto. E é isso, Senador Cristovam: a gente vê a diferenciação de comportamento das pessoas e de líderes. Quero lembrar a V. Exª o seguinte: Senador Pedro Simon foi Líder do Itamar. Há quantos anos acabou o Governo do Itamar? Há 14 anos. Assim mesmo ele continua tendo o cuidado de defender o Governo do qual ele foi Líder. Quando V. Exª errou na criação do Plano Real, adiantando dois anos, um ano e meio, ele ficou vermelho ali - fiquei prestando atenção nele, que ficou vermelho - e corrigiu imediatamente V. Exª. É a coerência. Queria ver um líder do PT, hoje, ter o mesmo discurso que teve quando Oposição, por exemplo, com relação à privatização, à CPMF, o troca-troca de Partidos e corrupção. Queria ver, Presidente Crivella, falar-se da mesma coisa. Hoje, o PT sabe que está no banco dos réus e quer companhia. Nessa CPI das ONGs, vejo que eles querem companhia; eles querem dividir o bolo. Aí vão buscar assuntos que não têm nada a ver, querem misturar ONGs estaduais com federais, é o verdadeiro “samba do crioulo doido”. Já disse aqui, Senador Pedro Simon, pegaram o José Bové trouxeram para o Brasil para combater os transgênicos. O José Bové levou pancada nas ruas, aqui, acreditando naquilo que o Partido defendia. E hoje o PT nada de braçada com os transgênicos, e o José Bové continua defendendo os seus ideais. Senador Pedro Simon, não vamos longe: o que o PT pregava, ou o que o PT ainda prega - e as declarações de campanha dos candidatos -, porque, ajuda de campanha é algo que as pessoas pouco examinam. Ontem vi, aqui, o episódio da invasão da Vale do Rio Doce, e os que defendiam a invasão foram financiados pela própria Companhia. Não se entende mais nada! Este é o Brasil que desmoralizou a máfia com a denúncia do Buscheta, e agora o PT desmoraliza a esquerda fazendo com que até o Frei Beto “encha o saco”. Muito obrigado!
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Crivella. PRB - RJ) - Senador Pedro Simon, quero apenas lembrar V. Exª que vamos prorrogar a sessão, para termos o privilégio de assistirmos a esse extraordinário pronunciamento que faz V. Exª, que tanto tem a contribuir para o País.
Fica a sessão prorrogada por 20 minutos.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Obrigado pela gentileza de V. Exª, Sr. Presidente.
Eu vou ser muito sincero: eu gosto do Presidente Lula. Vamos dizer, assim, na intimidade - que não sei se ainda tenho -, eu gosto do Lula. Gosto! Eu gosto dele, acredito na sinceridade dele. Acho que, quando fala - e, inclusive, ele está falando bem -, ele fala com emoção, com sentimento. Vejo que ele não teve sorte, vamos dizer, com o petit comité que o rodeia. Não tenho nenhuma dúvida, foi citada aqui a figura do ex-Chefe da Casa Civil. Ali se vê a diferença. Está lá a atual Ministra. Eu não vi, até hoje, uma notícia de jornal de qualquer fato negativo que tenha passado por ela. Naquele negócio do tesoureiro do PT da época, do secretário do PT da época, as reuniões eram na Casa Civil. Hoje, não se fala nisso. A Ministra Dilma - podem dizer o que disserem - é um padrão de seriedade, de correção, de respeitabilidade. Ele não teve essa sorte no primeiro governo. E o PT também não teve a sorte.
Agora, hoje, concordo que não é fácil. Nem no Governo Fernando Henrique, nem nunca, a Petrobras, por exemplo, foi tão “partilharizada”. O tesoureiro, o secretário, não sei o quê... E também no PMDB. A Petrobras era uma tradição, quase que eu dizia, de cargos técnicos. Era um órgão que estava acima do bem e do mal, acima dos partidos. Hoje, não. Vê-se que o PMDB está brigando pela diretoria tal; o PT está brigando pela diretoria tal. E o dinheiro rola.
Não dá para eu dizer que foi o Lula quem deixou mal o PT. Eu acho que foi o PT quem deixou mal o Lula. A equipe que ele montou... E ele montou com ideal aquele primeiro Ministério. O segundo já foi diferente. Mas, no primeiro, ele botou alguns caras. Botou o Olívio. O Olívio tinha perdido uma eleição para Governador. Mas botou o Olívio, porque o Olívio era um homem dele, amigo dele, tradicional, ele conhecia quem era. Foi um governo composto na base por homens do PT com os quais ele tinha intimidade e em quem ele tinha confiança. Ali é que não deu certo.
Eu vejo o seguinte: o Ministro Ananias é um homem que está conduzindo o projeto da renda família. É uma pessoa espetacular, séria, digna, correta. Está vendo essa coisa toda que está andando aí? Ele podia estar nesse projeto. O Ministro Ananias podia estar na frente desse projeto, lançando a candidatura dele a Presidente da República. Ele não aparece em lugar nenhum. Ele não está lançando projeto, não está distribuindo bolsa, não está fazendo coro. Está lá no gabinete dele. E é um homem sério. Mas não se vê que o Lula tenha conversado com o Ananias, que ele tenha se reunido, que ele faça parte do grupo que se impõe.
É que tem uma coisa muito interessante, eu sou assim: eu só vou quando me chamam. Geralmente, quando é festa, eu não apareço. Se alguém está precisando, um companheiro meu... No Rio Grande do Sul, todos já sabem, desde que eu era Vereador em Caxias do Sul: festa de aniversário do clube, eu não vou; casamento, eu não vou; negócio de campeonato, porque ganharam campeonato, não vou. Não vou. Morreu um companheiro, que é um cara importante, eu estou lá. Se o cara precisou, teve um problema, teve alguma coisa, eu estou lá. Eu sempre fui assim. E tem gente que é assim. Esse Ananias é assim: aparece quando é chamado; não é chamado, não aparece. E o Lula não teve a felicidade...
O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Pedro Simon, o Ministro Luiz Dulci, que foi nosso colega na Constituinte, é Ministro, está lá, dentro do Palácio. Ninguém ouve nada, nada, nada contra Luiz Dulci. É um homem de vida tranqüila, pacata, colaborador do Presidente Lula, para V. Exª vê, confirmando exatamente o que V. Exª diz.
O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Mas parece que essas pessoas não conseguem ter influência no andamento do Governo. Por isso que eu digo: eu gosto do Presidente Lula, ele é um homem de bem. E, quando digo isso, muita gente ri de mim lá, no Rio Grande do Sul: “O senhor acredita? O senhor acha que ele não sabia?”. Eu não sei se sabia ou se não sabia, o que eu acho é que ele tinha confiança absoluta no Chefe da Casa Civil. Como eu, quando fui Governador, tinha confiança absoluta no meu Chefe da Casa Civil. A diferença é que, se falasse mal de mim, eu ia ver logo. E o Lula, não: é amigo, é amigo. Mas acho que ele pode, sinceramente pode.
Essa viagem dele para a África foi histórica, e V. Exª teve a felicidade de participar dela. Eu o admiro e tenho uma certa inveja - inveja cristã, não tem nada de maldade. V. Exª teve a oportunidade de ver fatos realmente significativos. Aquela reunião entre o Presidente da África do Sul, o Lula e o Primeiro-Ministro da Índia foi uma reunião histórica, foi uma reunião realmente histórica. Pela primeira vez, os homens que não são do Grupo dos Oito mais a Rússia tomam uma posição, tomam uma discussão, e cobram realmente uma posição.
Não acho que... O Fernando Henrique lançou esta bandeira e o Lula está nela, de fazermos parte do Conselho de Segurança. Não. Não tenho essa preocupação. Preferia que nos dessem um cargo importante na Unesco, na FAO. Conselho de Segurança... Mas o trabalho realmente é muito importante.
Por isso, agora que a questão de honra é o imposto sobre o cheque, que o Governo não admite nada que não seja a votação, é preciso que o Governo seja menos pragmático e tenha um pouco mais de sensibilidade.
Reparem, meus queridos Senadores: nós votamos, em 24 horas, um projeto que estava há 20 anos aqui e não se conseguiu votar, o da fidelidade partidária. Estava há 20 anos aqui, e não saía do papel. Não podemos criticar o Superior Tribunal Eleitoral. Legislou? Legislou. É erro? É erro. Fez o que não era dele? Fez o que não era a missão dele. Mas, se não fizemos nada, como vamos cobrar do Tribunal? O Tribunal fez o que não soubemos fazer. Mas o Tribunal fez. As Lideranças sentiram a bofetada nelas e, em 24 horas, na quarta-feira, fizemos cinco sessões à noite, e foi aprovado. Primeiro turno, segundo turno... Foi aprovado. Por que o Governo não reúne Câmara e Senado e nos deixa votarmos o projeto, podendo emendar? E assumimos um compromisso com a Câmara, porque, se emendarmos, volta para a Câmara. Mas a reunião, se voltar para a Câmara, pode ser feita em 24 horas. Porque a Câmara não vai fazer novo estudo, não vai fazer novo debate. A Câmara não tem que fazer nada. É botar no plenário e decidir: ou vota a emenda do Senado ou vota a emenda da Câmara. Ou é o original da Câmara ou a emenda do Senado. Não tem o que debater, não tem o que discutir. Se o Governo decidir, assim como nós votamos aqui em 24 horas, no primeiro e no segundo turno, a questão da fidelidade, a Câmara pode votar, em dois dias, a questão referente ao que nós votarmos aqui, repito, Sr. Presidente. E aqui não. Aqui era uma votação em que se podia apresentar emendas, tinha substitutivo, tinha isso, tinha aquilo. Lá não tem nada. A Câmara, ou vota o projeto original dela ou vota o substitutivo nosso à emenda apresentada aqui.
Isso pode ser feito tranqüilamente, de uma vez. É querer. Que o Governo faça isto: que nos dê chance de sermos gente, e não um Congresso sem o mínimo de personalidade!
Muito obrigado, Sr. Presidente.