Pronunciamento de Serys Slhessarenko em 23/10/2007
Discurso durante a 193ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Protesto contra sentença proferida pelo juiz mineiro Edilson Rumbelsperger Rodrigues, que desrespeita a Lei Maria da Penha.
- Autor
- Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
- Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
FEMINISMO.:
- Protesto contra sentença proferida pelo juiz mineiro Edilson Rumbelsperger Rodrigues, que desrespeita a Lei Maria da Penha.
- Publicação
- Publicação no DSF de 24/10/2007 - Página 37076
- Assunto
- Outros > FEMINISMO.
- Indexação
-
- ANALISE, NECESSIDADE, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, MULHER, POLITICA NACIONAL, ELOGIO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL, BUSCA, IGUALDADE, ESPECIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, SECRETARIA, DEFINIÇÃO, POLITICA, SETOR, DETALHAMENTO, PROGRAMA, REGISTRO, PROJETO, TRAMITAÇÃO, SENADO.
- LEITURA, TRECHO, ENTREVISTA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, JUIZ, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), DISCRIMINAÇÃO, MULHER, SENTENÇA JUDICIAL, DESRESPEITO, LEGISLAÇÃO, COMBATE, VIOLENCIA, AMBITO, DOMICILIO.
- QUESTIONAMENTO, SISTEMA, VALOR, SOCIEDADE, REPRESENTAÇÃO, JUIZ, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).
- PROTESTO, DECLARAÇÃO, JUIZ, INCONSTITUCIONALIDADE, LEGISLAÇÃO, PROTEÇÃO, MULHER, VIOLENCIA, AMBITO, FAMILIA, CONCLAMAÇÃO, LUTA, EFETIVAÇÃO, APLICAÇÃO, LEI FEDERAL, PUNIÇÃO, AGRESSÃO, ANUNCIO, ENCONTRO, BANCADA, CONGRESSISTA, FEMINISMO, PRESIDENTE, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CONSELHO NACIONAL, JUSTIÇA, BUSCA, PROVIDENCIA, CONVITE, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENCIA, SENADO.
- SOLICITAÇÃO, ENTIDADE, BRASIL, REMESSA, CURRICULO, MULHER, RELEVANCIA, TRABALHO, DIREITOS, FEMINISMO, OBJETIVO, ENTREGA, DIPLOMA, SENADO.
A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, com tantos assuntos da mais extrema relevância, no Brasil e no meu Estado de Mato Grosso, hoje eu tenho que voltar a falar de um tema que é da maior relevância, mas que se torna extremamente repetitivo, principalmente da minha parte.
Sr. Presidente, o fato que aconteceu nos últimos dias, por meio de declarações de um Magistrado brasileiro, faz com que eu tenha que vir a esta tribuna reforçar as nossas posições e as nossas defesas nas questões relativas às mulheres. É um tema aparentemente “batido”. Não vou surpreender ninguém ao dizer que nós somos em torno de 51% da população e que continuamos sendo sub-representadas nas esferas de poder.
Reconheço aqui o esforço do nosso Governo para diminuir as desigualdades entre homens e mulheres. Podemos citar, rapidamente, a instituição das cotas, que, apesar de possuir algumas falhas, no meu ponto de vista, aponta para o reconhecimento de que são legítimas as reivindicações de nós, mulheres, para maior participação nos espaços de poder.
A criação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres é outro grande indicador da vontade política do nosso Governo Federal, e as ações dessa Secretaria são inúmeras. Tal Secretaria, que tem status de ministério, tem à sua frente a nossa grande Ministra Nilcéia Freire, que vem fazendo um trabalho realmente da maior grandeza na defesa das políticas públicas, ou melhor, na defesa das mulheres brasileiras. Só a título de ilustração, podemos citar o programa diversidade nas escolas, o selo pró-eqüidade de gênero, o programa de enfrentamento à Aids e o programa mulher ciência. Entre muitos outros, esses são programas que reputo da maior importância e que faço destacar como grandes programas implementados pela nossa Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, sob o comando realmente decidido e determinado da nossa Ministra Nilcéia Freire.
As iniciativas desta Casa, Sr. Presidente, também são muito importantes. São vários os projetos que versam sobre as mulheres e seus direitos. Mesmo com produção limitada, procuro atender as demandas do dia-a-dia em meu gabinete, como a que me chegou, da Comissão da Mulher da OAB de Mato Grosso, pedindo que eu enviasse a elas os meus projetos que abordam o tema e causa das mulheres. Muitos deles versam sobre “detalhes” como, por exemplo, dar o nome de Cora Coralina ao Arquivo do Senado Federal, inscrever o nome de grandes mulheres como Maria Quitéria de Jesus no livro de Heróis e Heroínas de nossa Pátria.
Julgo, senhores e senhoras, que o simbolismo é importante, sim. Se formos analisar o rol de nomes dados em homenagem aos espaços, seja aqui no Senado Federal, seja em qualquer prédio, público ou não, em nosso imenso País, vai parecer que só temos heróis, nunca heroínas, que só temos cientistas homens, que somente homens são bons médicos e que esta Casa só produziu bons Senadores. Pretendo contribuir para equilibrar essa situação.
Reconheço, Sr. Presidente, a importância de Rui Barbosa sobre nossas cabeças, iluminando a todos nós, homens e mulheres, mas por que não colocar ao seu lado a imagem de grandes mulheres, como das baianas Joana Angélica e Maria Quitéria, como a de Bárbara Heliodora, grande poetisa da Inconfidência Mineira, ou da grande Anita Garibaldi, de Santa Catarina, cujos feitos atravessaram o Atlântico, sendo heroína também na Itália?
Mas, Sr. Presidente, muitos dos homens que batem em mulheres o fazem porque as consideram como um não-sujeito, como um objeto de sua posse. Isso acontece por quê? Eu gostaria de arriscar uma linha de pensamento: isso ocorre porque esses homens foram criados em um mundo onde todas as informações sobre mulheres as colocam como objetos, seja numa propaganda de cerveja, seja pela ausência de modelos femininos que ultrapassem o esteriótipo de uma mulher com dignidade.
Um exemplo muito claro do que este tipo de pensamento e de cultura pode acarretar está estampado - Srs. Senadores, peço atenção - na Folha de S.Paulo de domingo passado, dia 21. Um absurdo, Srs. Senadores! Um absurdo, em pleno século XXI, as palavras de um magistrado, de um juiz. Faço questão de citar, palavra por palavra, parte da entrevista desse juiz: “Ora, a desgraça humana começou no Éden: por causa da mulher, todos nós sabemos, mas também em virtude da ingenuidade, da tolice e da fragilidade emocional do homem(...). O mundo é masculino! A idéia que temos de Deus é masculina! Jesus foi homem!” Por isso, as mulheres não têm que ter direito.
Sr. Presidente e Srs. Senadores, os absurdos que essa frase contém são enormes, mas o maior absurdo ainda é quando sabemos quem foi o autor; e eu já disse quem foi. A primeira reação ao se ouvir uma frase dessas é de não acreditar que isso tenha sido dito. Mas pasmem: quem proferiu essas palavras foi o Sr. Edilson Rumbelsperger Rodrigues, um juiz de Sete Lagoas, Minas Gerais. E ainda as proferiu no exercício de sua profissão, em uma sentença, Srs. Senadores, e não como mero cidadão, atitude por si só também injustificável. Essas palavras foram proferidas numa sentença em que esse juiz tinha que julgar uma questão diante da Lei Maria da Penha, e ele disse, inclusive, que essa lei é inconstitucional.
Esse triste episódio me traz inúmeros questionamentos, mas o principal deles é: como entender que um cidadão com esse tipo de pensamento “surja” ainda em nossa sociedade em pleno século 21? E o mais grave: como um sujeito com esse pensamento chega ao cargo de juiz? O Estado brasileiro não é laico, senhores? Esse indivíduo devia ter, pelo menos, a vergonha de dizer essas palavras da cadeira que ocupa! O que estamos ensinando para nossos filhos? Com que modelos de mulheres e de cidadania a população brasileira está convivendo e construindo?
Se a maioria da população tiver o mesmo tipo de pensamento que esse juiz - felizmente, graças a Deus, não tem -, teremos muito ainda que avançar mesmo assim, porque, para ele, a mulher ideal deve ser aquela mulher subserviente ao homem. Não temos dúvida de quais modelos esse juiz teve ao longo de sua vida e volto a me perguntar: são esses os modelos que eu quero para meus netos e minhas netas? Faço a mesma pergunta a V. Exªs. E a maior prova de que devemos nos preocupar, e muito, com o tipo de socialização que temos é que elas têm conseqüências práticas na vida de todos, principalmente na dessas mulheres.
O tal juiz de Sete Lagoas, com os argumentos já expostos e que não gosto nem de repetir, rejeitou, Sr. Presidente, pedidos de medidas contra homens que agrediram, ameaçaram e machucaram suas companheiras considerando inconstitucional a Lei Maria da Penha, uma Lei conquistada a duras penas nesta Casa, com dificuldade e com a luta conjunta do movimento feminista. Ele deu todos os seus pareceres, que passaram por conta de procedimentos que ele tinha que julgar mediante a Lei Maria da Penha, que ele disse ser inconstitucional.
Segundo esse juiz, “a Lei Maria da Penha é um conjunto de regras diabólicas”, chegando, Srs. Senadores, à mesquinhez de dizer que “a mulher moderna, dita independente, nem de pai para seus filhos precisa mais, a não ser dos espermatozóides”. Foi o que disse esse cabeça de monstro travestido de autoridade, que, na verdade, é um doente e que precisa ser afastado de seu mister para rigoroso tratamento mental.
Infelizmente, Srªs e Srs. Senadores, esse não é o primeiro caso em que isso acontece. Um outro juiz de Mato Grosso do Sul também já considerou inconstitucional a Lei Maria da Penha com o argumento central, Srs. Senadores, de que ela viola “o direito fundamental à igualdade entre homens e mulheres”. Se não fosse trágico, seria cômico. Agora eu me pergunto: o que é o princípio da isonomia? Até onde eu me lembro, era tratar os iguais com igualdade e os desiguais na medida de suas desigualdades, e é exatamente isso que a Lei Maria da Penha faz!
Falta pouco, Sr. Presidente, eu pediria um pouquinho de espaço.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Se me permite também um espaço para um aparte.
O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Eu quero conceder o espaço à Senadora Serys, mas informo que o Regimento não permite aparte após o término do prazo regimental. Peço desculpas ao Senador Eduardo Suplicy, porque nós estamos cumprindo o Regimento de uma maneira rigorosa...
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Como ficará a solidariedade de pelo menos um Senador homem às mulheres?
O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - V. Exª, após o uso da palavra da Senadora, pode pedir a palavra pela ordem para fazer essa homenagem justa.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Obrigado.
A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT) - Obrigada, Sr. Presidente.
Como considerar homens e mulheres iguais se os homens continuam ganhando mais exercendo as mesmas atribuições que as mulheres? Como considerar homens e mulheres iguais se nesta Casa, que tem o papel de representar a população brasileira, nós não chegamos 12%? Senadoras e Senadores, homens e mulheres não são iguais neste País e nós, mulheres, sentimos essa diferença no dia-a-dia. E pesquisas mostram isso quando revelam que somente 8% das mulheres brasileiras se sentem respeitadas! Considerar a Lei Maria da Penha inconstitucional é uma externalização de nossos preconceitos, dos preconceitos de alguns magistrados. A Lei Maria da Penha não é inconstitucional e eu me arrisco a dizer que ela é uma das leis mais justas que esta Casa já aprovou dada a conjuntura da sociedade brasileira.
Srªs e Srs. Senadores, nós devemos lutar pela efetiva aplicação da Lei Maria da Penha. Não podemos deixar que os agressores fiquem impunes, como esse juiz vem deixando, um após o outro.
Nesse sentido, enviarei, como coordenadora da Bancada Feminina do Senado Federal, juntamente com a coordenadora da Bancada Feminina da Câmara, Deputada Erundina, um ofício para que a bancada feminina das duas Casas se reúna com a Ministra Ellen Gracie, que preside o Conselho Nacional de Justiça, a fim de que as devidas providências sejam tomadas com urgência.
Eu gostaria de deixar aqui formulado convite ao Senador Tião Viana para que nos acompanhe, já que a luta pelo fim da violência contra a mulher é uma luta de todos. Esta Casa tem que se pronunciar de maneira institucional e não somente pela Bancada Feminina.
Resumindo, Sr. Presidente. Após externar toda minha indignação, quero deixar também uma comunicação aos Srs. e Srªs Senadoras, a todas as instituições organizadas que nos ouvem no Brasil que, por favor, encaminhem, até dia 1º de novembro, os currículos de mulheres que têm grandes trabalhos prestados em defesa dos direitos da conquista da igualdade entre homens e mulheres porque o prazo está terminando; que encaminhem ao Senado da República os trabalhos, para que disputem, com a galhardia que lhes compete, o diploma Bertha Lutz, que é entregue, todo ano, pelo Senado da República, no dia 08 de março, àquelas mulheres que têm maior destaque na luta pela igualdade de direitos das mulheres em nosso País.