Discurso durante a 193ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem à memória de Ernesto Che Guevara.

Autor
LIDICE DA MATA
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória de Ernesto Che Guevara.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2007 - Página 36910
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • ANALISE, HISTORIA, POLITICA INTERNACIONAL, EXPERIENCIA, SOCIALISMO, CRESCIMENTO, PODER, ECONOMIA, CAPITALISMO, EXCESSO, CONSUMO, MINORIA, POPULAÇÃO, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, IMPORTANCIA, RESISTENCIA, BUSCA, JUSTIÇA SOCIAL, SOLIDARIEDADE, CONGRATULAÇÕES, REALIZAÇÃO, SENADO, SESSÃO ESPECIAL, HOMENAGEM, ERNESTO CHE GUEVARA, VULTO HISTORICO, REVOLUÇÃO, AMERICA LATINA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, TENTATIVA, DESVALORIZAÇÃO, VULTO HISTORICO, IMPORTANCIA, POLEMICA, BENEFICIO, DEBATE, IDEOLOGIA, REVOLUÇÃO.
  • HOMENAGEM, FRANCISCO PINTO, EX-DEPUTADO, ESTADO DA BAHIA (BA), ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DEMOCRACIA.

A SRA. LÍDICE DA MATA (PSB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente Senador José Nery; saúdo também o Senador Tião Viana, que se retira; Srªs e Srs. Senadores e Deputados; Sr. Embaixador de Cuba Tirso Saenz; Deputada Federal Manuela D’ávila. Desculpe, Sr. Pedro Juan Nuñez Mosquera, Embaixador de Cuba; Sr. Tirso Saenz, Presidente da Associação dos Cubanos Residentes no Brasil.

Peço desculpas pelo equívoco na leitura; certamente fui movida pela emoção que me domina neste momento. Para mim, Senador, uma Deputada nordestina, tímida, da capital da Bahia, falar no Senado Federal, Casa maior do Legislativo Brasileiro, é, sem dúvida, uma grande emoção, principalmente ao falar em homenagem a Che. Companheiros e companheiras estudantes, representantes do movimento social presentes nesta sessão.

Ainda sob os estrondos da queda do Muro de Berlim, um acadêmico norte-americano, Francis Fukuyama, decretou o fim da história. Para ele, o fim do regime soviético inaugurava uma nova era para a humanidade. Os confrontos ideológicos mundiais seriam substituídos pela eficiência da economia, e todo desenvolvimento humano seria agora um mero desdobramento natural da ação das forças no mercado. Palavras como revolução, igualdade e justiça social passaram a estar abolidas como coisas superadas e anacrônicas de um passado que se deveria esquecer. O pragmatismo passou a ser a ideologia única e soberana, e os velhos senhores da guerra e novos donos do mundo tentaram fazer da utopia uma espécie de esquisitice infantil.

O luxo e o desperdício de um consumismo desenfreado de uma minoria devora as reservas ambientais do Planeta, enquanto milhões de seres humanos espalhados pelos cinco continentes lutam duramente pelo mínimo de água e alimento capazes de garantir sua sobrevivência diariamente.

Na onda triunfante dos oligopólios tudo se transforma em produto, tudo tem seu preço e pode e deve ser negociado. E mesmo as imagens e símbolos da contestação a tudo isso que está aí são pasteurizados e transformados em novos ícones de consumo.

Esta sessão solene é um exemplo, portanto, senhoras e senhores, de que a resistência existe; de que homens e mulheres em todos os cantos da terra ainda sonham, teimosamente, com um futuro diferente e guardam, resistentes, a memória do tanto que foi feito para isso por gerações e gerações que nos antecederam. A isso chamamos história e é por isso que a quiseram matar. Por isso, parabenizo o Senado, que se abriu mais que a Câmara para realizar esta sessão.

Fomos autores do requerimento para que esta sessão ocorresse primeiro na Câmara. Com as dificuldades encontradas, pedimos que fosse feita solenemente no Plenário da Câmara dos Deputados, ou seja, no Congresso Nacional, uma sessão solene conjunta. Mas somente conseguimos realizá-la no Plenário do Senado, que é um plenário maior politicamente, apesar de menor para a quantidade de pessoas que poderiam chegar até ele.

Portanto, esta sessão solene é uma decisão também solene do Senado Federal, que demonstra uma capacidade e uma abertura democrática até maior do que a da Câmara dos Deputados.

Ernesto Che Guevara foi apenas mais um homem; e ao homem mataram. Mas o seu exemplo de coerência, integridade e compromissos com seus sonhos e com a humanidade sobreviveram como uma marca dessa história; dessa esperança teimosa que é a própria essência de sermos humanos.

Muito se falará da vida desse homem, neste dia, mas quero falar do que sobreviveu ao homem; do que faz com que a sua imagem tenha se transformado em bandeira de luta para tantos.

Recentemente, uma revista nacional da grande imprensa brasileira fez uma grande homenagem involuntária ao Che numa matéria em que se reproduziram todas as difamações já produzidas.

Esse órgão de imprensa, com seu ataque político digno da Direita mais reacionária, nos devolveu o verdadeiro Che, o revolucionário, o que desafinou o coro da mediocridade, o que se recusou a ser uma unanimidade, porque sempre soube de que lado estava.

Nesses tempos de pragmatismo e de pastiche, Che está vivo! E segue merecendo os ataques de quem sempre combateu. Ao tentarem atingir sua honra em vida, o fizeram mais imortal, pois ao revolucionário não interessam os aplausos vazios, mas, sim, a polêmica e o debate. Sob fogo cerrado, Che está mais vivo do que quando é estampado como ícone pop, como se fosse uma coca-cola.

Os erros do homem Ernesto Guevara serão julgados pela história, mas o exemplo de revolucionário de Che, a coragem de lutar por suas convicções, mesmo que ao preço da própria vida, seguirão sendo sempre uma chama viva a aquecer os corações e mentes daqueles que acreditam, como nós, que um outro mundo é possível!

Há 24 anos, Sr. Presidente - fazendo uma confidência a todos vocês -, na primeira semana de outubro, eu me via tensa, esperando o meu filho, cercada do companheiro Haroldo Lima, grande amigo e Líder do Partido, que desejava e torcia para que Bruno nascesse, Manuela, no dia 7, o que seria uma homenagem ao próprio Haroldo. E ele, que só tinha filhas mulheres, talvez me convencesse, pelo enorme afeto que nos unia e nos une, a homenageá-lo dando o nome de Haroldo ao meu filho. Preocupada, um pouco desesperada com essa possibilidade, guardei-me, e Bruno nasceu no dia 8. Não lhe dei o nome de Ernesto; não queríamos que tanta responsabilidade pudesse ser carregada nos seus ombros. Aos 13 anos, Bruno leu a biografia de Ernesto Che Guevara, e hoje segue considerando-o seu grande ídolo.

Portanto, aos 50 anos, estendo Manuela com 25, esta sessão, sem dúvida nenhuma, é uma homenagem a Bruno e a Manuela - que continuem essa luta -, assim como é uma homenagem a todos os brasileiros e às brasileiras que deram suas vidas para constituir a nossa democracia.

Queria fazer, também, uma homenagem baiana a um baiano, não dentre aqueles que morreram, mas dentre os que ficaram, àquele que foi uma referência, e ainda é, para os democratas da Bahia, vivo, com sua saúde abalada, mas que nos levava às praças públicas, aos milhares, no período da ditadura militar a todos nós, adolescentes e jovens, com o gorro que tinha ganhado de presente de Fidel, e conclamava todos os baianos e baianas a ingressarem na fileira da luta democrática.

Portanto, dedico também esta sessão ao ex-Deputado, grande homem público, grande brasileiro e grande democrata Francisco Pinto.

Muito obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2007 - Página 36910