Discurso durante a 204ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a reação causada pelo artigo do apresentador de televisão Luciano Huck, publicado na Folha de S.Paulo, em que reivindicava medidas que garantam a segurança dos cidadãos honestos.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações sobre a reação causada pelo artigo do apresentador de televisão Luciano Huck, publicado na Folha de S.Paulo, em que reivindicava medidas que garantam a segurança dos cidadãos honestos.
Publicação
Publicação no DSF de 08/11/2007 - Página 39552
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEBATE, ARTISTA, ESCRITOR, SITUAÇÃO, FALTA, SEGURANÇA PUBLICA, MOBILIZAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, ASSUNTO, CRIME, JUSTIÇA SOCIAL, DESIGUALDADE SOCIAL, PROTESTO, ORADOR, IMPUNIDADE, CRIMINOSO.

O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no final do mês passado, o apresentador de televisão Luciano Huck foi assaltado em São Paulo por dois bandidos que levaram seu relógio. Revoltado, decidiu escrever um artigo, publicado pelo jornal Folha de São Paulo, em que reivindicava medidas que garantam a segurança dos cidadãos honestos, reclamava que, no Brasil, perdemos o direito de ir e vir - e concluía que, em nosso país, virou crime trabalhar e ganhar dinheiro honestamente.

Se tivesse a mínima noção da tempestade que seu artigo iria desencadear, acho que Luciano teria ficado quieto. Ainda bem que não ficou. Porque a publicação do desabafo expôs uma distorção vigente há muito tempo em nossa sociedade, e que faz do combate à criminalidade uma tarefa difícil e ingrata.

Refiro-me à crença, disseminada em boa parte da intelectualidade brasileira, entre muitas das chamadas “cabeças pensantes” do País, de que os bandidos são uma espécie de justiceiros sociais, capazes de contribuir, com suas ações criminosas, para a eliminação das desigualdades. Os atos que praticam são saudados como estímulo à redistribuição de riquezas.

Esse raciocínio torto, que aprova e mal consegue disfarçar a admiração pela violência, vê em traficantes de drogas, assaltantes, seqüestradores, e outros tipos de delinqüentes, não o que eles realmente são - homens violentos, sem escrúpulos nem respeito pela lei -, mas “vítimas do sistema”, “excluídos”, “injustiçados por uma sociedade que não lhes dá voz”. Logo, teriam todo o direito de exercer suas atividades, entre as quais se incluem difundir o vício, assaltar, promover seqüestros e até mesmo matar. Afinal, estariam contribuindo, com seus ofícios, para a construção de uma sociedade mais igualitária...

Um bom exemplo dessa ótica distorcida é o artigo de autoria de um escritor que se auto-intitula “porta-voz da periferia”, publicado na mesma Folha. Ele chegou ao extremo de sugerir que Luciano Huck “teve muita sorte”. Saiu ganhando porque ficou com a vida, seu bem mais valioso. Os assaltantes também foram sortudos. Conseguiram o que queriam, o relógio. Então, terminou tudo bem para os envolvidos, e ninguém tem do que reclamar. Quem mandou o apresentador usar no pulso um relógio que “daria para comprar várias casas populares”?

Para resumir a “brilhante” teoria do pensador da periferia, merecemos todos ser assaltados. Os pobres, a classe média que suporta uma carga de impostos digna do Primeiro Mundo e nada recebe em troca, os ricos, os muito ricos - todos devem ser despojados de seus bens e privados dos mais elementares direitos. Enquanto isso, os marginais precisam ter sua atividade garantida, uma vez que cumprem um importante papel social...

O antropólogo Roberto DaMatta já alertou, há pouco tempo, que vivemos uma fase de “glorificação da bandidagem”. Para ele, a reação que Luciano Huck enfrentou “é um exemplo de neofascismo”, pois partiu de quem não respeita o direito elementar de qualquer pessoa, de reclamar da injustiça de que foi vítima.

Eu diria que para essa glorificação, além de fatores como a corrupção que permanece impune, colaboram em muito os teóricos que nunca tiveram diante de si um “justiceiro social” armado com um revólver pronto para disparar, mas abusam do direito de proferir besteiras sobre a necessidade de “dar voz aos excluídos” - porque para eles, não há bandidos, só “excluídos” - e abrir as portas dos presídios.

            A reação ao artigo de Luciano Huck demonstra a que ponto chegou a distorção a que me referi no início. Não deveríamos estar discutindo se o assalto foi justo ou não. Em qualquer país, lugar de bandido é na cadeia, não importa se assaltou um apresentador de televisão conhecido e rico, ou o morador de uma favela. Defender delinqüentes é fazer apologia da criminalidade. O crime não promove justiça social alguma, nem existem bandidos bonzinhos. Será que algum dia vamos aprender essa lição tão simples?


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/11/2007 - Página 39552