Discurso durante a 207ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a crise no setor aéreo brasileiro e o episódio envolvendo o encerramento das atividades da companhia aérea BRA. Registro da reestréia do Ministro Marco Aurélio Garcia como assessor do Presidente Lula.

Autor
Heráclito Fortes (DEM - Democratas/PI)
Nome completo: Heráclito de Sousa Fortes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA EXTERNA.:
  • Considerações sobre a crise no setor aéreo brasileiro e o episódio envolvendo o encerramento das atividades da companhia aérea BRA. Registro da reestréia do Ministro Marco Aurélio Garcia como assessor do Presidente Lula.
Aparteantes
João Pedro, Papaléo Paes.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/2007 - Página 40016
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, TRANSPORTE AEREO, FALENCIA, EMPRESA DE TRANSPORTE AEREO, CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANTERIORIDADE, APOIO, PRESIDENTE, EMPRESA, LIBERAÇÃO, FINANCIAMENTO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), AQUISIÇÃO, AERONAVE, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER).
  • QUESTIONAMENTO, ANTERIORIDADE, INEXATIDÃO, PRONUNCIAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ANUNCIO, AUTO SUFICIENCIA, BRASIL, PETROLEO, AUSENCIA, PROBLEMA, GAS NATURAL, CRITICA, ANTECIPAÇÃO, DIVULGAÇÃO, DESCOBERTA, JAZIDAS, COMBUSTIVEL FOSSIL, POSSIBILIDADE, AGRAVAÇÃO, FALTA, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA, CHEFE DE ESTADO.
  • QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, ASSESSOR ESPECIAL, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CONFIRMAÇÃO, INVESTIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, DEFESA, ORADOR, NECESSIDADE, ANALISE, SITUAÇÃO, IMPEDIMENTO, PREJUIZO, BRASIL.

O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no momento em que o Brasil esperava que, finalmente, a situação da crise aérea, Senador Osmar Dias, tivesse resolvida, nós vemos aí esse episódio envolvendo o encerramento - não se sabe ainda se provisório ou definitivo - das atividades da companhia aérea BRA.

É lamentável que o prejuízo seja exatamente para a população mais carente e que procurava, por meio de passagens populares, substituir os perigosos e cansativos ônibus pela viagem de avião.

Senador Augusto Botelho, sábado, fui abordado por um passageiro em desespero no aeroporto de Brasília. Ele estava sem saber o que fazer. Disse-me, Senador Osmar, que comprou, para ele e para a família toda, passagens para a realização de viagens de fim de ano e que estava no aeroporto, antecipadamente, procurando uma saída.

Senador João Pedro, eu usei um argumento: “Por que o senhor me compra com tanta antecipação uma passagem de uma companhia de terceiro nível para uma viagem de férias?” E ele me deu uma resposta que eu quero cobrar do Governo: “Por um motivo muito simples, Senador Heráclito Fortes: há um mês e meio, eu vi o Presidente da República sendo fotografado ao lado do Presidente dessa companhia e anunciando o financiamento de vinte aviões pelo BNDES. O Presidente ali avalizava. Era o garoto-propaganda não só da companhia aérea, mas também daquela negociação”.

O raciocínio daquele homem, funcionário público aposentado, me mostrou a responsabilidade dessa crise. Vejo o Procon cobrar da companhia, vejo o Procon cobrar da Anac, mas é preciso que o Procon cobre também de Sua Excelência o Senhor Presidente da República.

Aliás, os seus companheiros de Governo têm de ter mais cautela para não expor o Presidente da República nessas esparrelas. Há dois anos, levaram-no para o interior do Pará para inaugurar aquela famosa Amafrutas, uma cooperativa que iria fazer milagres na agricultura paraense. Foi um técnico de Santa Catarina, depois conhecido como um dos aloprados, com nome de chuveiro, Lorenzetti, e expôs o Presidente da República àquele vexame, porque era um grande “mico” aquele empreendimento.

Meu caro Presidente, o chefe maior da República se deixar fotografar ao lado de um protótipo de um avião, endossando as atividades de uma companhia num momento de necessidade de alternativas, sem ter tido pelo menos o cuidado de examinar a saúde financeira dessa empresa, é uma temeridade.

O Presidente anunciou há dois anos, como se verdade fosse, a auto-suficiência em petróleo. Dançaram aqui no plenário. E não era verdade. Agora estamos com a notícia alvissareira de que, num tempo médio, sendo viável economicamente, nós seremos, daqui a cinco ou dez anos, auto-suficientes em petróleo. Mas já se anuncia como se, na semana que vem, os postos de gasolina do Brasil fossem estar lotados da nova descoberta.

Um cidadão, que é contribuinte, me chamou a atenção para esse caso da BRA sob esse ângulo. Senador Tasso Jereissati, ele me disse mais: que é eleitor do PT. A maior decepção dele era essa.

Para que V. Exª acompanhe o raciocínio, vou repetir aqui. Um cidadão estava desesperado no aeroporto de Brasília porque comprou, para ele e para toda a família, passagens da BRA. Ele me abordou e eu perguntei: “Mas por que você compra passagens de uma empresa de terceiro nível que não tem nem linhas regulares claras?” Ele respondeu: “Porque acreditei no Presidente da República. Ele, há 45 dias, tirou um retrato com o Presidente dessa empresa, num modelo de avião nacional para financiamento, com o BNDES garantindo. Como é que eu podia imaginar que eu estava entrando num conto-do-vigário avalizado pelo Presidente da República?”

Isso é grave, Senador Tasso Jereissati. Raciocinem! A popularidade do Lula, sua credibilidade e a irresponsabilidade. É usar uma popularidade a serviço da inconseqüência. Não podia jamais fazer isso, a não ser que tenha por trás disso algum aloprado interessado na BRA.

Amanhã vão dizer que não, que o futuro é que diz.

Mas que é estranho, é: o Presidente da República virar garoto-propaganda de uma companhia que logo em seguida quebra.

Senador Tasso Jereissati, esse é um fato da maior gravidade, como também o é a suspeita de vazamento, beneficiando Deus sabe quem, do anúncio desse famoso campo de petróleo. É preciso que a CVM investigue quem se beneficiou, Senador João Pedro. Quais as empresas, as pessoas físicas, quem teve acesso a esse tipo de informação, provocando a euforia do aumento de quase 17% das ações da companhia. Os jornais noticiam que, no vôo para Zurique, o Presidente Lula comentou com os Governadores a grande descoberta. É evidente que, tecnicamente, já se sabia dessa existência, até porque editais técnicos já vinham sendo publicados pela Petrobras.

Senador Botelho, todos nós receberemos com a maior alegria a concretização desse fato e desse sonho iniciado por Getúlio Vargas e que continua tendo, nessa descoberta, mais uma etapa a ser cumprida nessa escalada de sucesso da petrolífera brasileira.

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Permite-me V. Exª um aparte nesta segunda-feira?

O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. João Pedro (Bloco/PT - AM) - Primeiramente, não posso deixar de registrar a sua habilidade, como homem da Oposição, em abordar essa crise. Faz parte da crise aérea esse calote ao consumidor, ao povo brasileiro, por uma empresa, e V. Exª, com habilidade, por exemplo - esse é o defeito no discurso de V. Exª, com o maior carinho -, atribui tudo isso ao Presidente Lula. V. Exª é um homem público experiente, e todos nós - para ilustrar essa crítica ao Presidente Lula - estamos sujeitos a receber alguém de comportamento condenável em nosso gabinete. Nesse episódio, penso que o Presidente Lula estava destacando a indústria nacional, porque que fato fez os donos da BRA irem ao Palácio? Para dizerem que estavam adquirindo 20 aviões da Embraer. Que coisa boa uma empresa investir no mercado nacional, em uma empresa nacional como a Embraer, com a compra de aviões para ampliar a sua frota. Isso é uma coisa positiva e penso que o mercado comporta isso, porque, se há um setor da economia brasileira que vai bem, é o da aviação aérea brasileira, mercado interno e todo mundo viajando para fora. Enfim, é positivo esse setor da economia. Penso que o que temos de criticar é a postura desses empresários, Senador Heráclito Fortes. Não se pode expor um Presidente. Não se pode vender 70 mil passagens aéreas... A BRA vendeu 70 mil passagens aéreas! Onde está esse dinheiro? Onde está esse dinheiro? E dá um calote! Faço este aparte para participar do pronunciamento de V. Exª, mas condenando a postura desses empresários. Isso é irresponsabilidade. Isso não ajuda o Brasil. Isso não ajuda a aviação brasileira, e expõe as outras empresas. Todos ficam com dúvidas, perguntando: “Como é? A próxima será a TAM? “ Estou ilustrando, não estou afirmando. A próxima será a GOL? Como fica isso? A economia vai bem; todas as empresas vão muito bem. Acabamos de concluir uma CPI. Não metemos o dedo na BRA, embora eu tenha apresentado, no final do meu voto em separado, auditoria nas empresas, porque gera uma intranqüilidade ao povo brasileiro, para quem viaja. Então, V. Exª faz bem ao anunciar esse escândalo aqui no Senado. E nós precisamos refletir e tomar providências. Agora, a minha discordância está em atribuir a gestão da empresa privada ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Muito obrigado.

O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - V. Exª está no papel. V. Exª, além de militante, é amigo pessoal do Presidente Lula, e está no papel de defendê-lo. Agora, o Presidente foi leviano e inconseqüente. O Presidente jamais poderia avalizar essa transação. Meu caro Senador, ele não foi ali apenas bater palma. Ele foi o avalista, como Presidente da República, de um negócio feito pelo BNDES. Quantos brasileiros honestos, com negócios em dia, tentam acesso ao BNDES e não conseguem? Por que logo esse senhor conseguiu? Quantos brasileiros que têm sucesso em seus lançamentos querem fazê-lo no Palácio do Planalto e não conseguem? Por que logo o dono da BRA conseguiu? É difícil explicar isso? Explicar que uma empresa, em uma solenidade presidida pelo Presidente da República, assumiu o compromisso de comprar 20 aviões e não pagou sequer a primeira prestação. Não pagou sequer a primeira prestação. Pelo contrário, foi cancelada! O Governo está informando mal, inclusive V. Exª. Foi cancelada! E, se está mantida, mais criminoso ainda é o Governo, que não tomou a decisão urgente de mandar cancelar. É lamentável!

É lamentável que se dê guarida a negociações dessa natureza e - repito - muito parecida com aquela ida do Presidente ao interior do Pará para inaugurar a Amafrutas. V. Exª se lembra? Foi lá o PT: “Com a Amafrutas, vamos ter agora um novo tempo”. Foi no interior do Pará, uma festa danada. Não sei nem se V. Exª estava lá. V. Exª estava na inauguração da Amafrutas? Perdeu essa. Perdeu essa. Não foi convidado. Sendo da região Amazônica, foi desprestigiado. Um calote grande, prejuízo grande para o País.

O pessoal tem de poupar o Presidente Lula. Os órgãos de informação têm de funcionar. O cadastro do BNDES não avisou o Presidente ou a sua assessoria que estavam levando o mandatário maior da República a uma fria, a uma gelada! E o mais engraçado é que ninguém foi demitido. Tudo fica como dantes no reino de Abrantes.

É triste, Senador João Pedro, e sei que, no fundo, no fundo, pelo semblante de V. Exª, a indignação repousa aí, porque V. Exª não é homem de concordar com esse tipo de coisa. V. Exª sabe que estão levando a imagem do Presidente para o caminho errado. O que se fez com o Presidente da República é um crime, é uma desumanidade, já que ele sempre não sabe o que acontece no Governo. Esses que sabem das coisas não tiveram o cuidado de alertá-lo. Logo a aviação, que é um assunto da preferência do Presidente! E faz muito bem. Estamos vivendo um momento em que a Embraer precisa de apoio, mas de apoio concreto. Não de apoio dessa natureza. Porque são 20 novos aviões, aumenta-se a linha de montagem, a empresa prepara-se para a venda e, de repente, é frustrada. É verdade que se pode transferir, como estão tentando negociar, para um novo comprador, mas o desgaste da imagem do Presidente da República... Olhe, Senador João Pedro, é um avião deste tamanho, ao lado do qual está o Presidente, juntamente com o Presidente da BRA e do BNDES, uma imagem que é de causar pena.

O Presidente não foi informado de que essa empresa, no dia em que houve a assinatura do contrato, teve um avião paralisado em Lisboa. Na semana anterior, houve algo parecido em Madri. E chegou num momento, seu momento final, em que se se entrava no avião como passageiro e chegava ao destino como sobrevivente. Grande coisa!

Concedo um aparte ao Senador Papaléo Paes, com o maior prazer.

O Sr. Papaléo Paes (PSDB - AP) - Senador Heráclito Fortes, quero parabenizar V. Exª por trazer um tema importante e complexo, nesta segunda-feira, para ser discutido nesta Casa. Tema importante e complexo porque se trata de uma concessão pública a questão da BRA. E fica uma pergunta no ar: “Quem vai reparar os danos que a empresa, que é uma concessão pública, causou e está causando aos usuários, ao consumidor?” Essa é uma grande pergunta. O que vemos, por não termos uma definição oficial do Governo para a população, é a imprensa supor que uma ou outra companhia irá atender aos pacientes - pois são verdadeiros pacientes mesmo -, os consumidores, os usuários em situações especiais, não ficando garantia para que essas pessoas sejam ressarcidas em seu prejuízo. Então, nessa questão da crise aérea brasileira, vemos muito falatório, muito discurso, Senador Heráclito, mas a situação continua a mesma. Se V. Exª for analisar a questão do apagão aéreo, verá que não mudou nada, só que, hoje, a imprensa já não dá mais aquelas informações que dava antes, principalmente depois da lamentável maneira como terminou a CPI. Hoje, não temos mais as notícias como recebíamos quando estávamos em plena crise, que politicamente foi “resolvida” pela CPI. Então, Senador, a pergunta que fica é: quem vai ressarcir os prejuízos que essa empresa, que é uma concessão pública, causa aos consumidores.

O SR. HERÁCLITO FORTES (DEM - PI) - Essa realmente é uma questão que deve ser... Hoje essa é preocupação das 70 mil pessoas que investiram. Mas o Governo é assim, Senador João Pedro: falou que não tinha mais problemas de gás no Brasil, e o problema volta, o apagão energético está aí, e, providência concreta, nenhuma está sendo tomada. Então é a tal pergunta: para que essa mania de auto-afirmação com o que não existe, com o que não é verdadeiro? Quebra-se, inclusive Senador, a gordura da credibilidade do Presidente da República. O Presidente da República foi garoto-propaganda da BRA. Foi publicamente garoto-propaganda, pois endossou, avalizou essa empresa.

O desespero desse senhor me chamou a atenção para esse fato: comprou porque acreditou no Lula. Ora, se o Lula está ali, festejando, se ufanando... Até vou pedir a minha assessoria o discurso, o que o Presidente da República disse naquela solenidade, pois é bom que a gente veja, Senador.

Agora, vou encerrar, registrando aqui a reestréia do Ministro Marco Aurélio Garcia como homem das relações internacionais do Presidente Lula, principalmente no que diz respeito à América Latina. Essa estupenda estréia do Sr. Marco Aurélio no Chile. Mas não é motivo nem momento para se tratar desse assunto. Acho que o tema merece um discurso maior.

Marco Aurélio pode dizer o que quiser. Mas eu quero saber se a Petrobras vai investir, por capricho de quem quer que seja, na Bolívia sem garantias antecipadas. Se for investir, Senador João Pedro, a responsabilidade de quem será, porque é uma empresa de capital aberto. É uma empresa que se preocupa, Senador Papaléo, com comentários sobre ONGs na CPI, imagine com investimentos dessa natureza num País que lhe deu um prejuízo há menos de um ano. E quer voltar para lá como se nada tivesse acontecido. Vamos investir de novo, perder de novo, o dinheiro não é seu. Mas a Petrobras é uma empresa de capital aberto. O Sr. Chávez pode fazer da PDVSA lá o que ele quiser, constitucionalmente está garantido, mas, enquanto o Sr. Marco Aurélio não mudar a Constituição brasileira, a Petrobras deve satisfações inclusive à CVM. 

Daí porque essas afirmações ufanísticas de “vou investir” precisam ser medidas. Essa é uma questão que precisa ser mais bem analisada. O prejuízo que o Governo brasileiro teve no episódio primeiro da Bolívia, não só financeiro por intermédio da Petrobrás, mas principalmente o prejuízo moral, não podemos vê-lo repetido sem mais nem menos.

Acho que essa viagem ao Chile deixou algumas pessoas frustradas, porque, lá, nós vimos que rei é rei e que quem é rei não perde a majestade. Tem muita gente querendo ser, mas há uma enorme distância entre querer e poder.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/2007 - Página 40016