Discurso durante a 207ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

A luta incessante para a instalação da CPI das ONG. Cobranças das autoridades a formulação de um marco regulatório para a atuação das ONG no Brasil e especialmente na Amazônia.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG).:
  • A luta incessante para a instalação da CPI das ONG. Cobranças das autoridades a formulação de um marco regulatório para a atuação das ONG no Brasil e especialmente na Amazônia.
Aparteantes
Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/2007 - Página 40019
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG).
Indexação
  • IMPORTANCIA, EMPENHO, HERACLITO FORTES, SENADOR, INSTAURAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), APURAÇÃO, DESVIO, RECURSOS, SETOR PUBLICO, ESPECIFICAÇÃO, IRREGULARIDADE, REPASSE, VERBA, CONVENIO, MINISTERIOS, DESRESPEITO, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO), IMPEDIMENTO, INCORPORAÇÃO, PATRIMONIO, ENRIQUECIMENTO ILICITO, ORGANIZAÇÃO.
  • ANALISE, ESTUDO, CONSULTORIA, ORÇAMENTO, CAMARA DOS DEPUTADOS, LEVANTAMENTO, DEFINIÇÃO, SETOR, REGIÃO, PREFERENCIA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), EXECUÇÃO, IRREGULARIDADE, ESPECIFICAÇÃO, CONVENIO, MINISTERIO DO TURISMO, ENTIDADE, INFERIORIDADE, PRAZO, FUNCIONAMENTO, REGISTRO, RECEITA FEDERAL, INEXISTENCIA, VERACIDADE, INFORMAÇÕES, ATUAÇÃO, DIVERSIDADE, ORGANIZAÇÃO, BRASIL, INEFICACIA, LEGISLAÇÃO, IMPEDIMENTO, CORRUPÇÃO, DESVIO, FUNDOS PUBLICOS.
  • CRITICA, GOVERNO, FALTA, AVALIAÇÃO, CRITERIOS, ESCOLHA, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), RECEBIMENTO, RECURSOS, SETOR PUBLICO, DEFESA, NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, LEGISLAÇÃO.
  • REGISTRO, ANTERIORIDADE, VISITA, ORADOR, AUDITORIA, ESTADO DO AMAPA (AP), CONFIRMAÇÃO, EXCESSO, IRREGULARIDADE, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), ESPECIFICAÇÃO, INTERMEDIARIO, PATROCINIO, CAMPANHA ELEITORAL, MALVERSAÇÃO, FUNDOS PUBLICOS.
  • DEFESA, INVESTIGAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), ATUAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, CONTRABANDO, BIODIVERSIDADE, ESTADO DO AMAPA (AP), SUSPEIÇÃO.
  • COBRANÇA, AUTORIDADE, REGULAMENTAÇÃO, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente, Senador Augusto Botelho.

Srªs e Srs. Senadores, quero mais uma vez registrar o importante pronunciamento feito pelo Senador Heráclito Fortes. O tema que trago a esta tribuna hoje está relacionado a uma luta incessante que o Senador Heráclito Fortes travou para a instalação da CPI das ONGs.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) inicia seus trabalhos, e o Senado Federal se vê pressionado a estabelecer marcos precisos de investigação. Sob pena de politicamente invalidar os resultados futuros, deve esclarecer ao público o escopo das ações, restringindo o foco inquisitivo. Tais considerações são oportunas, agora que funciona a pleno vapor a CPI das ONGs, destinada a apurar supostos desvios de recursos obtidos do Estado.

Como se sabe, a CPI tem mandato para, em princípio, investigar casos suspeitos de 1999 a 2006, período em que os cofres públicos federais reservaram R$34 bilhões a ONGs.

Nota-se, portanto, que o alcance das inquirições poderia atingir uma miríade de entidades, sem que se conquistassem resultados elucidativos sobre os esquemas de fraudes e de desvios de recursos públicos.

Exageros à parte, as investigações em torno das ONGs devem, preferencialmente, concentrar-se em organizações nitidamente associadas com verbas públicas, sobretudo aquelas cujas prestações de contas não condizem com os compromissos previamente acertados com os agentes do Governo.

Não por coincidência, a imprensa divulgou, há bem pouco tempo, a ocorrência de convênios suspeitos nos últimos quatro anos, totalizando um valor da ordem de R$330 milhões. Repassados pela União, tais valores abasteceram a contabilidade de 546 organizações não-governamentais, de cujos acordos com os Estados se depreenderam irregularidades patentes.

A informação decorreu de um estudo conduzido pela Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, segundo a qual, entre 2003 e 2007, repasses financeiros relativos a 860 convênios em sete Ministérios transgrediram duas normas basilares da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Enquanto a primeira versa sobre a vedação das transferências de capital para obras de construção civil e para a aquisição de máquinas, veículos e equipamentos, a segunda trata da exigência preliminar de, no mínimo, 3 anos de funcionamento da entidade para que esta seja apta a receber recursos da União.

Vamos à análise de ambos os fatores. Da LDO pode-se criticar muita coisa, exceto sua disposição em incorporar tais equipamentos e propriedades ao patrimônio da União. Mais do que isso, é muito transparente quando prevê a exclusão dessa específica modalidade nos convênios averiguados pelos pesquisadores da Câmara dos Deputados. Em realidade, as cláusulas dos convênios que prevêem eventuais incorporações não são, em absoluto, superiores à LDO.

No caso da habilitação das ONGs aos repasses públicos, devemos esclarecer que alocações não autorizadas em lei podem, sim, configurar crimes de responsabilidade e de prevaricação. No fundo, o espírito da lei repousa sobre a intenção de impedir o enriquecimento daquelas organizações às custas do dinheiro público.

Por outro lado, acompanha tal pesquisa levantamento sobre o perfil, os setores e as regiões preferenciais para a realização das irregularidades no meio das ONGs. Por exemplo, constatou-se que, via de regra, as entidades nos crimes assinavam contrato tendo menos de três meses de funcionamento. Isso se repetiu em demasia, sobretudo na esfera do Ministério do Turismo.

De acordo com os dados coletados, nada menos que 55 convênios foram assinados pelo Ministro do Turismo com organizações com menos de três anos de registro junto à Receita Federal. Desse ilícito, o Erário viu subtraído de seus cofres o valor nada inexpressivo de R$12 milhões.

Vale acrescentar que a própria LDO exige que os convênios sejam precedidos por declarações em funcionamento regular por parte das entidades beneficiárias, por pelo menos três anos. Emitidos em 2006, tais documentos devem ser subscritos por três autoridades locais, acompanhados de comprovantes de regularidade do mandato das respectivas diretorias.

Ciosos do problema em andamento, representantes da própria Associação Nacional de Procuradores e Promotores de Justiça confirmam que há falta de informações confiáveis sobre as ONGs no Brasil. Com uma legislação desassistida de clareza, irrompem-se espaços e brechas para a ocorrência de corrupção. Ineficazes na atuação para a qual foram contratadas, tais entidades incorrem em deslizes criminosos, surrupiando o dinheiro do povo.

De fato, Sr. Presidente, quando o Estado contrata sem exigir metas, sem definir tarefas e sem avaliar resultados, está sujeito a condições perigosamente favoráveis para que, desta situação, algumas organizações tirem proveitos perversos. Historicamente, as ONGs, quando começaram a se desenvolver aqui, no Brasil, eram vistas como a “salvação” do País, eram percebidas como “puras”, dedicadas exclusivamente ao bem, compondo uma visão muito positiva, quase ingênua. Porém, sem transigência, devemos compreender, de uma vez por todas, que hoje tal capítulo está absolutamente encerrado.

Com muita honra, concedo um aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador, V. Exª pode ficar absolutamente tranqüilo que nada fará tão bem ao País quanto esta CPI, da qual V. Exª é signatário. Ela vai, como dizia desde o começo, ter a oportunidade de separar o joio do trigo. E é preciso que isso aconteça. Não é uma CPI destinada a prejudicar - V. Exª tem acompanhado o desdobramento dela - “a” ou “b”; é uma CPI que vai, além de apontar irregularidades, abrir caminhos para a regulamentação, para a criação de um marco regulatório que talvez seja a grande lacuna que há nesta proposta. O terceiro setor é uma atividade muito utilizada no mundo inteiro, mas utilizada com responsabilidade. E é preciso que, no Brasil, o terceiro setor seja fortalecido, mas que haja responsabilidade da parte dos que dirigem esses organismos. Daí por que a oportunidade ímpar de se criar essa comissão. Espero que haja a compreensão de todos nesta Casa, no sentido de que ela não tome caminhos que não sejam exatamente os caminhos da apuração equilibrada, segura, firme e, acima de tudo, justa. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Senador Heráclito Fortes. Eu quero dizer que, realmente, nós precisamos ter normas para serem cumpridas, porque essa benfeitoria que nós esperávamos das ONGs - da maioria delas - ficou prejudicada, e muitos oportunistas se aproveitaram da facilidade que teriam de relações com Governos, para que nós tivéssemos a deturpação exata dos verdadeiros objetivos das ONGs.

Senador Augusto Botelho, quero registrar aqui uma surpresa que tive. Fiz uma visita à Auditoria do Amapá, que é um Estado pequeno, quando da transição de Governo, em 2002, para o atual. Lá eu me surpreendi quando um técnico de gabarito, de alto nível, daquela instituição, me disse eles estavam completamente desorientados, desnorteados, para apurar o que tinham executado as 500 ou 600 ONGs no meu Estado. É um verdadeiro absurdo!

Chegamos até a ouvir depoimentos de que muitas ONGs serviam de intermediário para o patrocínio de campanhas políticas. Ou seja, o Governo repassava determinada quantia a algumas pessoas - muitas delas não preparadas para tal procedimento -, que assinavam os documentos que lhes eram pedidos para assinarem, havia aquela movimentação financeira dentro da contabilidade da ONG e, depois, os recursos retornavam para patrocinar campanha, ou campanhas, no Estado.

Então, isso tem que ser observado, tem que ser elucidado, para não prejudicar aquelas instituições não governamentais sérias, que fazem o seu trabalho com dedicação. Há muitas pessoas realmente reconhecidas como cidadãos de bem, que até se sacrificam compondo a diretoria de uma ONG e não podem ficar, de forma alguma, prejudicadas pelos maus que conduzem essas instituições - que deveriam ser, todas, respeitadas - para a malfeitoria, para o desperdício do dinheiro público.

Sr. Presidente, ao lado desse perfil de entidades detectadas, devemos levar igualmente em consideração ONGs cuja base operacional se ancora na região amazônica, com graves suspeitas de cumplicidade na prática de nossa biodiversidade. Esse é um assunto sério, Senador Augusto Botelho. Há mais ou menos 15 anos, já havia comentários no Estado do Amapá de que determinada cidadã francesa, que era a diretora de uma ONG, lidava diretamente com as tribos indígenas e ali ela fazia uma verdadeira doutrinação nos índios, impedindo que outras pessoas pudessem entrar. Informavam-nos que traficavam muita biodiversidade e que o nosso material mineral de alto valor era contrabandeado, retirado das próprias terras indígenas. Então, temos que ficar atentos, porque oportunistas estão se valendo dessas instituições como as ONGs para fazer a exploração e o verdadeiro roubo da nossa biodiversidade.

Sem dúvida, a Amazônia se converteu em presa fácil de uma avalanche de organizações supostamente interessadas na preservação ambiental, mas obscuramente comprometidas com o tráfico de plantas, ervas medicinais e conhecimentos nativos.

Nessas circunstâncias, é mais do que pertinente cobrar das autoridades a formulação de um marco regulatório para a atuação das ONGs no Brasil e mais especificamente na Amazônia. Afinal de contas, o terceiro setor chega a receber um bilhão de reais por ano do Governo.

Na ausência desse marco regulatório, proliferam as práticas viciosas entre as ONGs sob o amparo deletério da proposital falta de avaliação de resultados e de competição para a seleção de contrapartida. Em suma, como representante de um Estado amazônico, cabe-me solicitar aos representantes da CPI das ONGs uma abordagem densa e cabal sobre as irregularidades que contornam a conduta dessas organizações na Amazônia.

Está mais do que na hora de o País exercer sua soberania na área, estabelecendo restrições mais explícitas sobre o âmbito de atuação das ONGs.

Por outro lado, Sr. Presidente, temos de reconhecer que muitos programas estatais de sucesso seriam inviáveis sem a participação de ONGs e associações similares. Tal relação ficou patente, por exemplo, na ação da Pastoral da Criança e sua rede nacional de voluntários contra a desnutrição infantil. De fato, alguns atributos lhes proporcionam muita agilidade, como serem menos sujeitas à burocracia de prestação de contas, típica do setor público. Mas, insisto, isso é pouco numa rede perversa de atuação de parte do terceiro setor.

Enfim, para encerrar, Sr. Presidente, reitero minha convicção de que os trabalhos dessa CPI culminarão em resultados elucidativos sobre os laços obscuros e indecorosos das ONGs com o Estado brasileiro. Mais especificamente no caso da atuação delas na Amazônia, a expectativa é de que uma onda inibidora se espalhe pela região, de sorte a melhor credenciar o terceiro setor lá instalado.

Em resumo, que saiamos dessa investigação com a consciência do dever cumprido, resguardando os cofres públicos, a boa prática administrativa e os valores republicanos.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/2007 - Página 40019