Discurso durante a 205ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Resultado de visita realizada por S.Exa. ao México, onde participou do Seminario Ingreso Ciudadano Universal, realizado pelo Partido Alternativo Social Democrata, em colaboração com a Fundação Voz Alternativa. Considerações sobre o artigo "O outro lado da CPMF", o artigo publicado na Folha de S.Paulo do Presidente do IPEA, Marcio Pochmann.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. TRIBUTOS. REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Resultado de visita realizada por S.Exa. ao México, onde participou do Seminario Ingreso Ciudadano Universal, realizado pelo Partido Alternativo Social Democrata, em colaboração com a Fundação Voz Alternativa. Considerações sobre o artigo "O outro lado da CPMF", o artigo publicado na Folha de S.Paulo do Presidente do IPEA, Marcio Pochmann.
Aparteantes
Kátia Abreu.
Publicação
Publicação no DSF de 09/11/2007 - Página 39709
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. TRIBUTOS. REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, SEMINARIO, PAIS ESTRANGEIRO, MEXICO, DEBATE, PROPOSTA, COMBATE, POBREZA, DESIGUALDADE SOCIAL, RENDA MINIMA, CIDADANIA, PRESENÇA, ESPECIALISTA, AMBITO INTERNACIONAL, SAUDAÇÃO, CRESCIMENTO, DIVULGAÇÃO, MATERIA, MUNDO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, BOLSA FAMILIA, REDUÇÃO, POBREZA, BRASIL, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • ANALISE, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, PRESIDENTE, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), AVALIAÇÃO, INEFICACIA, INJUSTIÇA, SISTEMA TRIBUTARIO NACIONAL, JUSTIFICAÇÃO, PRORROGAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), AUSENCIA, RESPONSABILIDADE, AUMENTO, TRIBUTAÇÃO, PAIS, DEBATE, PROPORCIONALIDADE, INCIDENCIA, RENDA, APRESENTAÇÃO, DADOS.
  • IMPORTANCIA, DEBATE, AUMENTO, TRIBUTAÇÃO, RIQUEZAS, HERANÇA, CRITICA, PERDA, RECEITA, TRIBUTOS, TERRAS, QUESTIONAMENTO, FLEXIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, ARRECADAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).
  • REPUDIO, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, FORMAÇÃO, SUPERAVIT, RECURSOS, AREA, POLITICA SOCIAL.
  • DEFESA, REFORMA TRIBUTARIA, INCLUSÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), JUSTIFICAÇÃO, INFERIORIDADE, CUSTO, ADMINISTRAÇÃO, REDUÇÃO, SONEGAÇÃO, DETALHAMENTO, AVALIAÇÃO, MARIA DA CONCEIÇÃO TAVARES, ECONOMISTA, PROFESSOR, EXPECTATIVA, POSSIBILIDADE, ENCONTRO, KATIA ABREU, SENADOR, RELATOR, MATERIA.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, quero transmitir o resultado da visita que fiz ao México, onde participei do Seminario Ingreso Ciudadano Universal, realizado pelo Partido Alternativo Social Democrata, em colaboração com a Fundação Voz Alternativa. Preocupados com a desigualdade e a insegurança econômica no México e ante a aparente resignação de diversas forças políticas frente a essa problemática, organizaram esse seminário para debater propostas de política pública que permitam eliminar a pobreza e reduzir a desigualdade.

Pude participar deste Seminario Ingreso Ciudadano Universal - a renda básica de cidadania universal -, que foi realizado na última terça-feira, ao lado de outros especialistas neste assunto de diversos países do mundo.

E aqui destaco a participação do professor Daniel Raventós, que é Presidente da Red Española de Renta Básica, que, juntamente com a participação de Leonor Soria, do Uruguai, e Adriana Ortiz-Ortega, Marina Arvizu e também de Pablo Yánez, que é um dos responsáveis pelo programa de desenvolvimento social do Distrito Federal, de Mauricio de Maria Y Campos e, sobretudo, com a participação da Srª Patrícia Mercado, que foi a candidata à Presidência da República pelo Partido Alternativo da Democracia Social ali no México e que se constitui num exemplo importante de quem abraçou também a idéia de uma renda básica como um direito à cidadania.

Quero agradecer muito este convite da Srª Patricia Mercado e dizer que felizmente a proposta da renda básica incondicional universal vem se espalhando por quase todos os países. Tive ali oportunidade de informar que aqui no Brasil foi aprovada a lei que gradualmente institui a renda básica de cidadania. Expus ali como o Programa Bolsa Família, que, desde 2003, vem se expandindo, atinge hoje ¼ da população brasileira, aproximadamente 45 milhões de pessoas, 11.100.000 famílias, contribuindo significativamente para a diminuição da desigualdade e da pobreza e fazendo com que estejamos atentos à necessidade de dar continuidade ao Fundo de Combate à Pobreza, que justamente advém da contribuição contida na CPMF no que diz respeito aos 0,08% dos 0,38% que constitui a CPMF.

A propósito, Sr. Presidente, eu gostaria de aqui ressaltar alguns pontos do artigo hoje publicado pelo economista Marcio Pochmann, Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e Professor da Unicamp, uma das pessoas que mais conhecem política tributária e políticas de transferência de renda.

Marcio Pochmann, no artigo “O outro lado da CPMF”, salienta que:

A discussão proposta até o momento sobre a CPMF produz muito calor, porém, lança poucas luzes sobre as enormes ineficiências e injustiças praticadas pelo atual regime tributário no Brasil.

Percebe-se, por exemplo, que, em geral, as questões formuladas sobre a CPMF - em torno do aumento na carga tributária, do caráter cumulativo da cobrança, da inércia frente à progressividade e de sua parcial aplicação na saúde - são de uma pobreza franciscana.

Como atribuir tanta responsabilidade a um tributo que respondeu em 2006 a apenas 4% do total da carga tributária bruta do País? Além disso, no primeiro Governo Lula, o crescimento real da CPMF foi de 14,5%, bem menor que o aumento da carga tributária no período, que foi de 22,6%, e menor ainda que o aumento de 26,2% na carga tributária durante o segundo Governo FHC, de 1999 a 2002. Inferior também ao aumento da receita de tributos estaduais e municipais, como a do IPVA (+28,5%), do ICMS (+18,3%) e do ISS (+41,1%).

Quanto ao fato de a CPMF ser um tributo proporcional à renda, claro que o ideal seria que os mais ricos pagassem mais. Mas, diante da estrutura regressiva da tributação brasileira, ser pelo menos proporcional já soa como um aspecto positivo. Afinal, vive-se uma enorme regressividade de impostos, que oneram mais os pobres que os ricos. Vamos aos números: para os 10% mais pobres da população, o peso da tributação equivale a 32% do rendimento. Enquanto que na outra ponta da pirâmide, para os 10% mais ricos, a carga tributária chega a 21% da renda. Ou seja, um terço do salário dos mais pobres é engolido pelos impostos, enquanto os ricos sofrem uma mordida bem mais mansa, de apenas um quinto dos rendimentos.

Nesse sentido, valeria muito mais a discussão a respeito da escassez de tributos sobre riqueza e herança, bem como sobre as debilidades dos tributos diretos e indiretos no país.

Por exemplo, como pode o tributo nacional sobre a terra perder 29,4% da receita, em termos reais, de 1999 a 2006?

Por fim, é importante o questionamento sobre a flexibilidade no uso da CPMF para outros fins que não a saúde. Mas valeria, certamente, muito mais uma discussão a respeito da DRU (Desvinculação das Receitas da União), que ceifa 20% da receita vinculada. Esse iníquo mecanismo retira recursos da área social, bem como permite que o superávit fiscal seja formado com quase 2/3 dos recursos provenientes da educação, saúde, trabalho, entre outras áreas sociais.

O debate contemporâneo dos desafios enfrentados pela sociedade brasileira exigirá não apenas o foco na CPMF, mas em todo o sistema tributário nacional, especialmente sobre sua eficiência e justiça. Frente a isso, entende-se que a CPMF condiz com uma forma moderna e portadora de futuro em termos de tributação e arrecadação.

Ao contrário dos demais tributos, a aplicação da CPMF independe da declaração do contribuinte, como o IR (Imposto de Renda), e preenchimentos de guias (ICMS, ISS, entre outros), assim como apresenta baixa exigência de fiscalização, que nem sempre consegue evitar a sonegação. Portanto, seus custos administrativos são relativamente muito baixos.

Da mesma forma, a CPMF representa uma inegável contribuição no sentido da isonomia da competição, pois se trata de tributação que atinge todos os submetidos à intermediação financeira. Nesse sentido, reduz consideravelmente o “jeitinho” do uso da sonegação tributária como medida de competição no interior do sistema econômico nacional.

Se forem consideradas ainda as novas modalidades de produção e distribuição de bens e serviços, percebe-se o anacronismo que tendem a se tornar as formas tradicionais de tributação e arrecadação no Brasil. Com o tamanho da informalidade, da sonegação e da regressividade, pode-se compreender por que a CPMF enfrenta tanta resistência em persistir no sistema tributário nacional.

Na realidade, o debate que interessa mesmo, a construção de um país moderno e justo, deveria ser o de rebaixar alíquotas e tributos atrelados à estrutura produtiva e arrecadatória ainda no século XIX. Dessa forma, a CPMF poderia passar a ser justamente elevada, ao invés da atual visão predominante de reduzi-la, ou, até mesmo, de extingui-la. Por que será que isso não ocorre no Brasil?

Eu gostaria aqui de dizer sobre os pontos com os quais eu estou inteiramente de acordo com Marcio Pochmann, na verdade, avaliando que é positiva a CPMF. Entretanto, avalio que não seria o caso de aumentar a alíquota da CPMF porque ela tem justamente qualidades importantes na medida em que for efetivamente baixa. Aliás, conforme aquilo que um dos principais criadores de um imposto sobre transações financeiras, Prêmio Nobel de Economia, o Professor James Tobin, já falecido, infelizmente, ressaltou.

Eu gostaria de lembrar que, ainda hoje, em diálogo com a Professora Maria da Conceição Tavares - que é a favor da continuação da CPMF e que a defendeu perante o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores quando ela foi voto vencido nos anos 90 ainda -, ela ressaltou que James Tobin, um dos maiores economistas dos séculos XX e XXI, teve extraordinária qualidade em todas as suas contribuições. E partiu dele justamente a idéia de que se pudesse criar como que grãos de areia que, de alguma maneira, poderiam dificultar o movimento especulativo das transações financeiras e ter ainda uma finalidade social para o imposto sobre movimentação financeira, mas que esse imposto deveria ser sempre com uma alíquota bastante baixa, pois, do contrário, ele acabaria sendo autodestrutivo.

Também a própria Professora. Maria da Conceição Tavares observa que a característica da alíquota da CPMF, de 0,38%, faz com que ela seja cobrada em toda e qualquer transação financeira. Ela não tem caráter de progressividade, no sentido de os mais ricos terem alíquotas maiores, mas tem um sentido importante, que é o de que aqueles que gastam mais, os que têm receita maior, os que têm renda maior, os que têm patrimônio maior, fazem muito mais operações. Então, nitidamente, são os mais ricos que acabam contribuindo mais significativamente, sobretudo quando se tem em conta que a destinação da CPMF é para áreas sociais, como a Saúde, a Previdência e o Fundo de Combate à Pobreza. Então, certamente, os que se beneficiam mais com a CPMF são aqueles que mais necessitam dos serviços da Saúde, da Previdência, como aqueles que recebem o Bolsa-Família, que constituem justamente a parcela mais pobre da população brasileira.

Então, eu recomendo, sobretudo à nossa Relatora, Senadora Kátia Abreu que leve em consideração os argumentos do professor Marcio Pochmann, expostos em artigo publicado hoje na Folha de S.Paulo, que acabei de ler aqui. Vou dar uma cópia do mesmo a V. Exª. Avalio que seria muito interessante que a Senadora Kátia Abreu, antes de produzir o seu relatório, tenha um diálogo com uma das mais eminentes economistas deste País, que, embora nascida em Portugal, se tornou brasileira porque aqui vive há muitos anos. Se V. Exª quiser um encontro, farei questão de apresentá-la, se porventura ainda não conhecer a nossa querida professora Maria da Conceição Tavares. O ideal seria ter um encontro com ela, que eu gostaria de promover antes de segunda-feira, quando V. Exª vai apresentar o seu parecer, como disse. Mas, se isso não for possível, mesmo por telefone eu gostaria muito de promover a oportunidade de uma troca de idéias. Quero externar aqui meu respeito a V. Exª pela maneira como V. Exª se conduziu durante os debates havidos na semana passada. V. Exª demonstrou que está estudando muito bem os diversos aspectos da matéria, mas obviamente V. Exª tem mais ouvidos para os críticos da CPMF. Avalio que será muito importante que V.Exª... ...

A Srª Kátia Abreu (DEM - TO) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...também possa ter ouvidos atentos àquelas pessoas que colocam os aspectos positivos da continuidade da CPMF.

Com muita honra, Senadora Kátia Abreu.

A Srª. Kátia Abreu (DEM - TO) - Senador Suplicy, se me permite... V. Exª é um Senador experiente, que está na Casa há muito mais tempo do que eu, que cheguei outro dia. V. Exª sabe que poderia muito bem aprovar um requerimento na audiência pública, convidando quantos economistas contra a CPMF V. Exª quisesse trazer aqui. Infelizmente, a base do Governo não se interessou em trazer nenhum convidado para debater com os Srs. Senadores e todo o público presente, preocupado com o tempo, quão apressado está, porque atrasou a aprovação da CPMF lá na Câmara Federal, porque o Relator condicionou a entrega do relatório à nomeação do Presidente de Furnas. Agora querem que o Senado, rapidamente, às pressas, entregue o relatório. Então, eu quero, sinceramente, dizer a V. Exª que não sou responsável por não terem vindo aqui economistas ou juristas ou quem quer que seja a favor da CPMF. Eu responsabilizo por isso a base do Governo, que não protocolou os requerimentos e que não trouxe a esta Casa, para enriquecê-la ainda mais, essas pessoas tão valiosas, como V. Exª acabou de dizer. A seu convite, eu tenho certeza de que todas viriam. Então, por favor, Senador Suplicy, não transfira para mim essa responsabilidade, porque ela não é minha. Regimentalmente, V. Exª poderia tê-las convidado. Muito obrigada.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - V. Exª sabe perfeitamente - gostaria de recordar - que foi de minha autoria o requerimento para que aqui comparecessem os Ministros da Fazenda, Guido Mantega; da Saúde, José Gomes Temporão; da Previdência, Luiz Marinho e do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias. Esses dois, infelizmente, não puderam vir. Eu avaliei que, no mínimo, seria importante que pudessem esses Ministros estar aqui presentes - também veio o Ministro Paulo Bernardo - sobretudo para, com muita disposição e transparência, expor como são gastos os recursos provenientes da CPMF.

Desse modo, considero que, se houver ainda tempo para maior debate, poderemos ter a presença de outros economistas para que haja o aprofundamento do contraditório. Fica a minha sugestão, porque creio que será ótimo se V. Exª puder inclusive ouvir os argumentos da Professora Maria da Conceição Tavares.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/11/2007 - Página 39709