Discurso durante a 213ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações a respeito do episódio em que uma menor ficou presa em cela com 20 homens em delegacia de Abaetetuba, no Estado do Pará.

Autor
Mário Couto (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Mário Couto Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA PENITENCIARIA. SAUDE.:
  • Considerações a respeito do episódio em que uma menor ficou presa em cela com 20 homens em delegacia de Abaetetuba, no Estado do Pará.
Aparteantes
Demóstenes Torres, Jefferson Peres, Mão Santa, Tasso Jereissati.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2007 - Página 41578
Assunto
Outros > ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL. POLITICA PENITENCIARIA. SAUDE.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNADOR, ESTADO DO PARA (PA), AUSENCIA, PRONUNCIAMENTO, REFERENCIA, DETENÇÃO, MENOR, MULHER, PRISÃO, DESTINAÇÃO, HOMEM, REIVINDICAÇÃO, PUNIÇÃO, DELEGADO, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS, TENTATIVA, FALSIFICAÇÃO, DOCUMENTO, ALTERAÇÃO, IDADE.
  • APREENSÃO, OMISSÃO, GOVERNO ESTADUAL, PRECARIEDADE, SISTEMA PENITENCIARIO, SAUDE PUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, FALTA, ATENDIMENTO, CRIANÇA, VITIMA, FOGO, LIXO.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, quero agradecer ao Senador João Tenório, que me concedeu hoje o seu tempo para que eu pudesse falar do assunto que comove o meu Estado e, tenho certeza, comove o meu País. Por isso, agradeço a V.Exª, Senador João Tenório, a oportunidade que me concede na tarde de hoje.

V. Exª deve ter lido nos jornais de todo o País o que aconteceu com uma menina de 15 anos. Os oradores que me antecederam, do meu Estado, Senador Flexa Ribeiro e Senador José Nery, já tiveram a oportunidade de falar sobre o assunto. Não poderia eu deixar passar em vão, na tarde de hoje, críticas em relação ao que aconteceu no meu Estado.

É uma cidade com mais ou menos 150 mil a 200 mil habitantes, uma população ética, educada, tranqüila, com quem se tem vontade de conviver e que, neste momento, Senador Mão Santa, vive um drama.

Como é, Senador Tenório, que um delegado de polícia - não cabe na cabeça de ninguém - pode colocar uma menina de quinze anos dentro de uma cadeia com vinte bandidos?

Não venham aqui me dizer, Senador Mão Santa, que o delegado pediu permissão para o juiz e ele não concedeu. Nem assim! Nem assim! Nem que o juiz não tivesse concedido, ele não seria irracional de colocar uma menina de quinze anos junto com vinte bandidos. Nem assim!

Não adianta, agora, querer falsificar documentos para dizer que a menina não tem quinze anos. Não adianta. O que adianta, agora. é colocar esse delegado na cadeia. Esse delegado tem de ir para cadeia; o que ele cometeu foi um ato que se viu na época do racismo. O que ele cometeu foi o que se viu na época do racismo!

Esse delegado, Senador Tenório, teria de saber que essa menina é um ser humano. Se essa menina cometeu algum delito, com quinze anos de idade, ela tem recuperação. Essa menina não é nenhum animal, é um ser humano igual a qualquer um de nós. Com quinze anos de idade, Senador!

O País está estarrecido, Senador Flexa Ribeiro. A Governadora Ana Júlia, há três dias, Senador José Nery - e parabéns pelo requerimento e pela preocupação de V. Exª -, não toma nenhuma providência. Os jornais deste País, há três dias, falam desse assunto. A sua cidade, Senador, deve estar sofrendo esse drama. A população daquela cidade, que eu conheço, é uma população maravilhosa e deve estar sofrendo.

Senador Demóstenes Torres, há três dias os jornais deste País inteiro comentam esse bárbaro crime. Onde está a lei do adolescente e das crianças, Senador? Cadê? Será que esse delegado desconhece todas as leis que possam beneficiar e proteger as crianças deste País, que são inúmeras?

O Sr. Demóstenes Torres (DEM - GO) - Permite um aparte, Senador?

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Será que esse delegado não sabe de nada? Será que a Governadora não sabia que tinha um incompetente administrando a delegacia de uma cidade de mais de cinqüenta mil habitantes? Será que a Governadora não sabia disso?

O Sr. Demóstenes Torres (DEM - GO) - Senador, podemos invocar até a lei de proteção aos animais.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Lógico.

O Sr. Demóstenes Torres (DEM - GO) - Não é verdade? Porque até aqueles que maltratam os animais sofrem uma reprimenda grande. Agora, pegar uma criança, ou qualquer um, mesmo que fosse a maior bandida do Brasil, Senador, nós temos de respeitar, inclusive a figura do delinqüente. A lei existe para prendê-lo, sim, mas não para tocá-lo numa jaula como se um animal fosse. E repito: a lei de proteção aos animais. Porque não se admite tratar dessa forma nem os animais.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Senador Demóstenes, a Governadora Ana Júlia anda aborrecida comigo. Está até mandando os Deputados da Assembléia Legislativa do Estado do Pará... Hoje foi uma Deputada à tribuna questionar a minha administração.

Governadora, essa Deputada não merece nenhuma credibilidade. Arrume outra pessoa para investigar a minha vida. V. Exª pode pesquisar a minha onde quiser. Agora, em vez de a senhora estar tomando as providências em relação ao caso que aconteceu... Viu, Governadora, não vai calar a minha boca não! Pode vir quente que eu estou fervendo, como diz a música do Erasmo Carlos. Pode vir quente que eu estou fervendo! Não tenho medo! Já disse várias vezes aqui.

Em vez de a Governadora estar tomando providências, Senador Jefferson Péres, em relação a esse crime bárbaro que abalou o País - e tenho certeza o mundo inteiro -, a Governadora vem a Brasília para dançar o carimbó. E fica com raiva de mim, Senador Jefferson, e começa a pesquisar a minha vida. Vem dançar carimbó aqui no Congresso Nacional.

Senador Nery, é isso que dói; é isso que magoa; é isso que aborrece! Eu quero falar bem dessa Governadora, mas não consigo. Eu quero falar bem, mas não tenho motivo nenhum para falar bem dessa Governadora.

E se a gente for mais longe, Senador, veremos como está o meu Estado. Ela não quer que eu fale; ela fica aborrecida; ela fica magoada. O que ela tinha de fazer era colocar gente competente nas delegacias; o que ela tinha de fazer era aumentar e melhorar as delegacias; o que ela tinha de fazer era colocar delegados competentes que não viessem cometer um crime dessa natureza, esta barbaridade: tratar uma menina de quinze anos como se fosse um animal.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mário Couto, peço um aparte.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Olha aqui Senador, olhe a saúde do Pará como está! Um menino de três anos - TV Senado, por favor, mostre aqui -, com 80% de queimadura no corpo. Caiu dentro de uma fogueira, uma lixeira que estava sendo queimada. O menino caiu correndo atrás do pai e queimou 80% do seu corpo, e os hospitais do Governo do Estado não quiseram atender-lhe.

Olhem o que aparece do menino: a perna do lado esquerdo. Os hospitais da capital do Estado do Pará, hospital de referência, construído pelo Governador Simão Jatene, exatamente para tratar desses casos, casos de emergência, não atendeu ao garoto, o rejeitou. Ele foi para o Pronto Socorro, que também não lhe atendeu. Voltou ao hospital. Ficou sete horas dentro de um carro.

E não querem que eu fale.

Desculpe-me, meu Tião Viana. Eu tenho muita consideração por V. Exª, mas não posso deixar de falar, não posso deixar de cobrar. A Governadora tem culpa, sim, nesse episódio. Não tentem disfarçar isso, pelo amor de Deus! Pelo amor da Santa Filomena, não tentem disfarçar isso! A Governadora tem culpa.

Ouço o Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mário Couto e Brasil, esse problema não é do interior do Pará, do Pará ou do Brasil, não; é da humanidade. Senador Jefferson Peres, V. Exª tem amor à cultura. Esta semana fiz uma cirurgiazinha e, no pós-operatório, li o livro Historia Del Mundo, que tive a oportunidade de comprar no Chile. O livro conta a história desde o começo do mundo, da pedra lascada. Já estou na parte da industrialização, de Franklin Delano Roosevelt. Não há isso, não. Errou o Senador Demóstenes - cadê o Demóstenes? - ao dizer que isso ocorria na época medieval. Na época medieval, não existiu uma barbárie como essa. A época medieval vai justamente da queda de Roma ao Renascimento. Não houve essas atrocidades, não. Isso é uma barbaridade! Acabei de ler o compêndio chileno Historia Del Mundo. Não houve isso no campo de concentração, não houve isso na África. Isso é uma ignomínia e uma vergonha. Não é aquela vergonhazinha a que se referia o Boris Casoy. Isso é a maior vergonha da história da humanidade.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Concordo com V. Exª.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Este Senado não pode acabar, porque tem de denunciar isso, tem de punir essas coisas.

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Obrigado, Senador Mão Santa.

Ouço o Senador Tasso Jereissati.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Senador Mário Couto, gostaria de tirar algumas dúvidas que me parecem tão absurdas.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Senador Tasso Jereissati, interrompo V. Exª por um segundo para, com grata satisfação, registrar a visita de Raimundo Fagner, um patrimônio da cultura nordestina que vem ao plenário do Senado Federal.

O Sr. Tasso Jereissati (PSDB - CE) - Gostaria, também, de me juntar à Presidência da Casa para saudar a presença do cantor cearense Raimundo Fagner a este plenário. Trata-se de um dos maiores talentos, que engrandece a cultura do Estado do Ceará. Senador Mário Couto, existe uma dúvida sobre a qual gostaria que V. Exª esclarecesse, pois V. Exª acompanha de perto e com a atenção total que tem a seu querido Estado do Pará. Trata-se, sem dúvida nenhuma, de um dos acontecimentos mais bárbaros e mais cruéis, com requintes de um sadismo primitivo. Lembra, em algumas circunstâncias, talvez até pior, porque tem a tortura moral também, aqueles romanos que entregavam o cristão à sanha das feras dentro de uma arena. Acho que isso talvez seja até pior, porque há a humilhação moral, a agressão espiritual, enfim, a degradação, além da destruição física. É mais grave. Não lembro de uma polícia, em determinado momento, em algum lugar, ter feito. Sabemos de histórias de execuções. O Senador Mão Santa confirma que, na história, não há nenhum caso. Sabemos de execuções, de metralhamentos, de fuzilamentos, mas nem em campo de concentração - o Senador Mão Santa me lembra muito bem - nenhum judeu foi levado a uma situação como essa, nenhuma mulher judia. A minha pergunta é a seguinte: qual é a providência tomada pelo Governo do Estado? Com todo respeito que tenho pelo nosso querido Presidente Senador Tião Viana, esse ato bárbaro, o mais bárbaro da história da Polícia brasileira que conheço, está sendo responsabilidade de uma polícia petista, de orientação e administração petista. Lembro-me de quando houve, no seu Estado, a história de Carajás, em que o nosso querido amigo, inesquecível, grande Senador e Governador Almir Gabriel foi vítima de todo tipo de ataques, mas não tinha culpa, nem envolvimento. S. Exª não saiu do seu Estado. Assumiu imediatamente a responsabilidade de tomar todas as providências necessárias, puniu quem devia ser punido. Ficou lá, extremamente amargurado pelo que tinha acontecido e tomando todas as providências e recebia todas as instituições de direitos humanos. O PT praticamente tentou crucificar o Governador Almir. A minha pergunta é a seguinte: qual a providência tomada até agora em relação à Polícia, à delegacia, providência administrativa, corretiva, de mudança, enfim, o que foi feito de concreto pelo Governo petista?

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Senador Tasso Jereissati, há três dias a imprensa nacional vem falando desse assunto. Essa menina foi barbarizada na prisão, com 20 homens. Queimaram de cigarro a menina. Ela foi queimada, barbarizada. A Governadora Ana Júlia não se pronunciou em nenhum momento sobre o assunto. Em nenhum momento! Até hoje o que se viu foi a Governadora vir para cá dançar carimbó. Nada! Não se pronunciou absolutamente sobre nada.

Esse delegado - desculpe-me a expressão chula - é um imbecil! Ele tinha de estar preso, Senador Tasso Jereissati.

O SR. PRESIDENTE (Tião Viana. Bloco/PT - AC) - Senador Mário Couto, peço a V. Exª que conclua. 

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Não se permite nos dias de hoje que aconteça isso. Isso é uma barbaridade. Eu acho que nem nos tempos do nazismo aconteceu isso.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Com muita honra.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Só uma indagação, porque eu não quis acreditar na resposta que V. Exª acabou de dar ao Senador Tasso Jereissati.

O fato é gravíssimo. Quando eu vi aquilo, uma menina de quinze anos, jogada numa cela com vinte presos, eu achei quase inacreditável. Mas muito bem. V. Exª está me dizendo que o delegado não foi demitido e que a Governadora não se pronunciou sobre o caso?

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - O Senador Nery acaba de entrar com um ofício pedindo que ela se pronuncie.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Isso é estarrecedor!

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Acabou de entrar com um requerimento, que eu assino também, Senador, pedindo que ela se pronuncie e tome providências, porque até agora nós não sabemos das providências que ela tomou.

O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Isso é estarrecedor!

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - Logicamente, se o Senador Nery soubesse, ele não iria pedir a ela providências.

Há três dias, Senador Jefferson, a imprensa brasileira fala do assunto e não se vê nenhum pronunciamento da Governadora. Aí a Governadora se aborrece com o Senador Mário Couto.

Governadora Ana Júlia Carepa, eu quero poder falar bem de V. Exª, mas, estando a situação como está, não dá para falar bem da senhora, Governadora!

Senador Tião Viana, eu desço desta tribuna, sinceramente, muito chocado. Há poucos dias, a Veja disse que o Pará era uma terra sem lei. Vim a esta tribuna indignado, vim a esta tribuna chateado, vim a esta tribuna constrangido. Eu amo o meu Estado. Vim tentar amenizar aquela situação, porque...

(Interrupção do som.)

O SR. MÁRIO COUTO (PSDB - PA) - ...chamaram o Pará de Estado sem lei. Mas, sinceramente, Senador Papaléo, hoje estou acreditando que meu Estado é um Estado sem lei. Um delegado fazer o que fez e nenhuma providência ter sido tomada até agora, sinceramente, é de lamentar. É de lamentar a condição em que se encontra o querido Estado do Pará. Ele é realmente um Estado sem lei. O que aconteceu lá, oxalá não aconteça em nenhuma região do mundo, em nenhum Estado do mundo, porque é deplorável e é muito chocante para cada um que tem filha.

Muito obrigado, Senador Tião Viana.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2007 - Página 41578